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4. O CASO

4.2. O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA E DITORA A BRIL

4.2.2. Internacionalização outward

4.2.2.3. O Processo de internacionalização em Portugal e na Argentina

O estabelecimento de escritórios e parcerias no exterior era visto pela empresa como uma conseqüência natural de seu desenvolvimento. A existência de uma rede de contatos era algo antigo na empresa, que “... recebe muitas visitas e sempre recebeu, de empresas internacionais que queriam os seus títulos publicados no Brasil.”

Esta forma de associação unicamente para a publicação de títulos no Brasil mediante licenciamento ocorria com freqüência, pois existia uma lei que proibia a participação societária de grupos estrangeiros no setor de comunicação. Mesmo esta lei tendo sido revogada posteriormente (em 2002) e substituída por outra que regulamentava a participação de grupos estrangeiros, esta participação ainda não havia ocorrido.

Estes contatos com empresas e profissionais estrangeiros propiciou a formação de uma rede de relacionamentos e a familiarização com as formas de trabalhar e negociar de pessoas oriundas de outros países, facilitando o posterior processo de internacionalização.

Motivadores e Barreiras

O processo de internacionalização era visto dentro da empresa como uma grande oportunidade de crescimento, uma oportunidade de “crescer exponencialmente e realmente virar um conglomerado mundial”. Ele era também percebido como um desafio estimulante e uma fonte de aprendizado fundamental, pois “é importante também saber como é que as outras pessoas fazem notícia, como é que as outras pessoas

lêem e aprendem. E nós fizemos isso muito bem lendo revistas, viajando...” Contudo, há uma consciência interna de que este processo deveria ser avaliado para que não ocorresse a “internacionalização a qualquer preço.”

O idioma representava uma barreira de entrada em países em que os executivos não dominavam a língua falada. Um exemplo citado foi a Alemanha, onde economicamente poderia ser interessante uma presença da Abril, mas a barreira do idioma era encarada como um impedimento, citando-se como exemplo o fato de não ser possível entender os relatórios enviados.

Escolha do parceiro e do local

O processo de escolha das empresas com quem seria firmada a parceria no exterior foi uma decisão que derivou de influência pessoal do executivo responsável pela escolha “que sabe de cor o publishing das principais revistas do mundo. Ele conhece todo mundo.” Neste caso ficou evidente que a network pessoal dos executivos de topo era um fator importante em decisões de associação, pois “quando se cogita fazer alguma coisa (...) a maioria das pessoas já tem um nome na cabeça.”

Sendo assim, o processo de escolha dos parceiros na Argentina e em Portugal derivou mais de “uma questão de conhecimento, de afinidades com essas empresas, do que de uma questão até mesmo de pesquisa.”

Argentina e Portugal foram consideradas pela empresa como escolhas óbvias, pois a primeira está muito próxima, tendo “até uma certa proximidade de pensamento e de interesses” e a segunda porque fala a mesma língua.

Nestes casos de internacionalização realizado pela Abril, a empresa percebeu que o negócio encontrava-se muito vinculado à cultura local. Portanto, ao internacionalizar uma publicação, a empresa estaria, na verdade, internacionalizando o modelo e adaptando a publicação à cultura local, conforme observou um dos entrevistados:

“... percebemos que o que estamos internacionalizando, na verdade, não é a revista. Ela tem que ser feita por pessoas que morem e conheçam a cultura local. Estamos internacionalizando o modelo.”

“Então é isso, na verdade, que exportamos para Portugal; é esse jeito de ser, é essa fórmula editorial da revista. Então eu acho que Portugal e Argentina foram escolhas óbvias.”

A empresa já cogitou a internacionalização para outros dois países: México e Estados Unidos. Os Estados Unidos foram cogitados por terem uma comunidade latina bastante expressiva. Contudo, até o momento do estudo, não houve instalação de estrutura operacional nestes países, que possibilitasse a publicação de alguma revista.

Diferenças entre Portugal e Argentina

Os entrevistados percebiam a existência de nuances de comportamento diferentes entre os profissionais que trabalhavam em Portugal e na Argentina.

Na Argentina, as pessoas que trabalhavam na Editora Primavera eram afetuosas, emotivas, informais e carinhosas, conforme observou um dos entrevistados:

“... os controladores da Argentina, com quem temos contato são muito, muito afetuosos... Muito emotivos.”

“Eles são extremamente emotivos e informais com a gente. Muito carinhosos.”

Por outro lado, em Portugal, as pessoas que trabalhavam no ACJ eram mais informais, imparciais e frios, conforme depoimento de um dos entrevistados, transcrito a seguir:

“Em Portugal já é uma coisa mais séria e imparcial. O diretor vem de uma outra multinacional, onde ele também ficou bastante tempo. Eu acho que lá é uma coisa mais americanizada, mais fria...”

Outra diferença percebida entre os dois processos dizia respeito a aspectos econômicos locais. “Portugal está num momento econômico muito bom .” Por outro lado, “... a Argentina não, a Argentina é um mercado que a gente está tendo muitas

dificuldades. Eu não sei se esse mercado vai sobreviver.” Esta percepção acabou se tornando uma realidade com o fim da associação entre a Abril e a Perfil na Editora Primavera.

Além do fato do mercado português estar em um momento interessante para o negócio da ACJ devido ao fato de estar em ascensão, a parceria local também era percebida como sendo um ponto positivo para o sucesso do negócio, pois “...é uma associação de três empresas muito fortes nos seus países, então cada um dá o melhor de si para essa sociedade.”

Mudanças estratégicas

A internacionalização realizada em Portugal trouxe contribuições para a forma de conduzir os negócios da empresa no Brasil. Algumas ferramentas de planejamento portuguesas foram adaptadas para serem utilizadas no Brasil “... mas na verdade é assim: eles mostravam a mesma coisa que nós mostrávamos, mas de um jeito que achávamos mais fácil de mostrar. Então começamos a mostrar do jeito deles.”

Na parceria formada, havia espaço também para que os grupos estrangeiros opinassem sobre questões relacionadas aos negócios da Abril no Brasil. Os executivos da ACJ, por exemplo, estavam “querendo desenvolver o mercado de bancas de jornal, pois eles acreditam que há pouca banca no Brasil e que há espaço para aumentar o número de bancas.”

Aparentemente não houve qualquer tipo de mudança na forma de conduzir os negócios no Brasil, que fosse originária de algum aprendizado no negócio da Editora Primavera, na Argentina.

Adaptação do Marketing Mix

Produto

Conforme observaram os entrevistados, o produto da Editora Abril dificilmente poderia ser exportado por ser feito em língua portuguesa falada no Brasil e por estar intimamente relacionado à cultura, às formas de ser, de pensar e aos interesses do povo brasileiro. Por isto “... se você for para Portugal, você vai contratar gente, não é?

Jornalista português que entende de Portugal...”, devido à necessidade de adaptação do conteúdo publicado, forçando a criação de uma nova estrutura operacional no local.

Por outro lado, apesar de muitas vezes a fórmula editorial ser mantida, o nome da revista quase sempre mudava para se adaptar à cultura local.

Isto criaria dificuldade ao processo de internacionalização já que, diferentemente de commodities que poderiam ser fabricadas no país de origem e exportadas em grande escala, o produto da Abril demandaria uma escala de mercado para que viabilizasse economicamente o estabelecimento de uma estrutura local e o seu lançamento no país estrangeiro. Esta observação foi corroborada pela declaração de uma dos entrevistados:

“A indústria também precisa de uma certa escala, diferentemente de produtos como gelatina ou chocolate, que você pode fazer e mandar para todo o lugar. A revista tem que ser feita no país, para aquele país, para aquele leitor.”

Outro item que também sofria adaptação era a propaganda contida no interior do produto, pois grande parte dos anunciantes tinha interesse de venda apenas no país onde estava sendo comercializada a publicação. A propaganda interna, que alavancava a rentabilidade da revista, só tinha relevância se fosse lida pelo potencial comprador do produto anunciado. Este era o leitor que fazia parte do(s) segmento(s)-alvo(s) da publicação, na região geográfica onde ocorria a circulação.

Assim, quando ocorria a decisão de se exportar a fórmula de uma revista para outro país tudo era analisado.

Distribuição e Promoção

Na Argentina o sistema de distribuição era muito diferente do brasileiro, por ser “um país essencialmente de bancas.” Outra diferença relatada era que, na Argentina, “ninguém assina revista.” Lá havia uma lei que proibia as assinaturas, feita “para proteger, na verdade, os jornaleiros.”

Isto provocava fortes mudanças em fatores como a promoção, que passava a ter um enfoque maior sobre o ponto de venda, e a venda de espaço publicitário, que ficava prejudicada por fatores como a falta de garantia de determinado volume de circulação. Este mercado sem assinatura era um desafio para a empresa, que era forçada a competir só em bancas.

Portugal também apresentava uma grande quantidade de bancas de jornal disponíveis, que serviam à estrutura de distribuição da ACJ. Contudo, o presidente da operação local decidiu testar a venda por assinaturas. Por este motivo, alguns profissionais da Abril que trabalhavam na área de assinaturas foram deslocados para Portugal, a fim de auxiliarem na implementação da estrutura necessária.

Os executivos da Abril estavam tentando desenvolver também em Portugal o canal de vendas através de supermercados, um canal que ainda não se encontrava desenvolvido neste país e que era “...uma operação de sucesso...” no Brasil.

Em Portugal era utilizada a propaganda em revista. Havia também propaganda em rádio e na televisão. Contudo a propaganda em outdoor não era uma prática local. Já na Argentina, conforme mencionado havia um enfoque maior sobre o ponto de venda.

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