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1. REVISÃO DE LITERATURA

1.4 NEONATOS DE RISCO E O PROGRAMA DE INTERVENÇÃO PRECOCE

1.4.2 O Programa de Intervenção Precoce Avançado (PIPA)

O Programa de Intervenção Precoce Avançado (PIPA) surgiu no Estado de Minas Gerais em 2013, a partir da necessidade de se “planejar e priorizar o foco da assistência à saúde, no acompanhamento dos neonatos de risco e na intervenção precoce, visando à prevenção de deficiências, ao diagnóstico e ao tratamento precoce” (MINAS GERAIS, 2018a). Sua criação fundamentou-se em atribuições legais (leis, decretos e portarias), considerando o Brasil um

(...) país de grandes desigualdades sociais, mergulhado em intermináveis escândalos de corrupção generalizada, onde a prevalência da dignidade da pessoa humana muitas vezes não passa de uma mera retórica política, todo artigo, alínea ou inciso de lei que puder conferir expressamente direitos a crianças e adolescentes com deficiência será muito benvinda pela comunidade jurídica nacional. (LEI 12.764, de 27 de dezembro de 2012).

A seguir (quadro 1), apresentam-se, na mesma sequência em que são mencionadas no documento, as atribuições legais utilizadas na Deliberação Comissão Intergestores Bipartite (CIB) - SUS/MG Nº 1.404, que instituiu o Programa de Intervenção Precoce Avançado (PIPA). A CIB é uma instância colegiada de decisão do Sistema Único de Saúde (SUS) estadual, integrada paritariamente pela Secretaria Estadual de Saúde e por representantes dos Secretários Municipais de Saúde do Estado.

Quadro 1 – Atribuições legais para a Deliberação CIB-SUS/MG Nº 1.404, que instituiu o PIPA

Atribuição legal

Conteúdo Fundamento para criação do PIPA

Lei Nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012

Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da

Pessoa com Transtorno do Espectro Autista

Formula ações que garantem as pessoas com Transtorno do Espectro Autista assistência adequada. Dentro de sua proposta está o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo.

Decreto Nº 6.949, de 25 de agosto de 2009

Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com

Deficiência.

Descreve a necessidade de serviços de saúde direcionados às pessoas com deficiência, incluindo diagnóstico e intervenção precoce, bem como serviços que busquem reduzir e prevenir deficiências adicionais, inclusive entre crianças e idosos.

Portaria Nº 793/GM/MS, de 24 de abril de 2012

Institui a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência no âmbito do Sistema Único de Saúde.

Destaca a importância de desenvolver ações de prevenção e de identificação precoce de deficiências na fase pré, peri e pós-natal, infância, adolescência e vida adulta, assim como acompanhamento dos recém-nascidos de alto risco até os dois anos de vida, com tratamento adequado das crianças diagnosticadas e o suporte às famílias conforme as necessidades. Portaria MS/GM Nº 1.635, de 12 de setembro de 2002 Inclui procedimentos no Sistema de Informações Ambulatoriais-SIA/SUS para acompanhamento de

usuários com Deficiência Mental e Autismo


Prevê a garantia às pessoas portadoras de deficiência intelectual e de autismo assistência por intermédio de equipe multiprofissional e multidisciplinar, utilizando-se de métodos e técnicas terapêuticas específicas.

Portaria Nº 1.060/GM, de junho de 2002

Institui a Política Nacional de Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência


Trata da reabilitação da pessoa com deficiência, a proteção a sua saúde e a prevenção dos agravos que determinem o aparecimento de deficiências, mediante o desenvolvimento de um conjunto de ações articuladas entre os diversos setores da sociedade e a efetiva participação da sociedade.

Portaria GM/MS Nº 2.488, de 21 de outubro de 2011

Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de

diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e

o Programa de Agentes Comunitários de Saúde

(PACS).

A Política Nacional de Atenção Básica tem na Saúde da Família sua estratégia prioritária para expansão e consolidação da atenção básica. A qualificação da Estratégia de Saúde da Família e de outras estratégias de organização da atenção básica seguem as diretrizes da atenção básica e do SUS considerando-se as especificidades locorregionais.

Portaria GM/MS Nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011

Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas

com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes

do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito

do Sistema Único de Saúde (SUS).

Trata da promoção de cuidados em saúde especialmente para grupos mais vulneráveis (criança, adolescente, jovens, pessoas em situação de rua e populações indígenas)

Decreto Nº 45.685, de 10 de agosto de 2011 Regulamenta a implantação e manutenção

da Rede Viva Vida

Regulamenta ações governamentais que objetivam a assistência integral à saúde das crianças menores de um ano e às gestantes, garantindo acesso oportuno e assistência qualificada.

Deliberação CIB-SUS/MG Nº 596, de 23 de novembro de 2009 Aprova a revisão da alocação de recursos financeiros de média e alta complexidade ambulatorial.

Trata da distribuição de recursos financeiros destinados para cobertura de procedimentos da Rede de Atenção à Saúde do Deficiente Mental e Autismo e para procedimentos e formas de organização da Triagem Neonatal.

Fonte: Elaborado pela autora, 2019

Ressalta-se que essas atribuições legais que fundamentaram a criação do PIPA apresentam como ponto comum o direcionamento de ações que visam à prevenção ou mesmo diminuição do agravamento da deficiência, indicando que a intervenção precoce é um tipo de intervenção importante para assegurar à pessoa com deficiência o acesso aos serviços desde o início de sua vida.

Dessa forma, os principais avanços legislativos rompem com a exclusão à qual estas pessoas foram impostas ao longo da história, passando a evidenciar suas necessidades, indicar especificidades para seu atendimento bem como romper com padrões segregacionistas os quais impõem distorções do entendimento da diversidade (LANNA JUNIOR, 2011).

Destaca-se que tais conquistas foram possíveis pelo investimento por parte dos familiares das pessoas com deficiência, apoiados não apenas por profissionais das mais variadas áreas do conhecimento, visto que, em se tratando de atendimento a essas pessoas, é impossível afirmar que uma área possa se sobrepor à outra, reforçando a importância da interdisciplinaridade. Em especial, essas

Deliberação CIB-SUS/MG Nº 615, de 09 de dezembro de 2009 Aprova a alocação de recursos financeiros que

estabelece recursos a serem disponibilizados aos

Estados

Trata da distribuição de recursos financeiros distribuídos para financiamento do procedimento 0301070067 (atendimento e/ou acompanhamento à paciente que demande cuidados intensivos de reabilitação visual/mental/múltiplas deficiências).

Deliberação CIB-SUS/MG Nº 1.272, de 24 de outubro de 2012 Institui a Rede de Cuidados à Pessoa com

Deficiência no SUS-MG

Descreve o fluxo de atendimento às crianças com deficiência ou com potenciais riscos para desenvolvimento de deficiência, detectadas pelos serviços de referência de triagem neonatal, pré-natal ou auditiva neonatal, para encaminhamento para intervenção precoce e/ou monitoramento.

Deliberação CIB-SUS/MG Nº 1.403, de 19 de março de 2013 Define os Serviços Especializados de Reabilitação em Deficiência Intelectual da Rede de Cuidados à Pessoa com

Deficiência do SUS/MG

Ao tratar dos serviços especializados, a deliberação afirma que eles devem organizar e regulamentar o atendimento à saúde da pessoa com deficiência intelectual; capacitar os profissionais para tal atendimento; estabelecer mecanismos de avaliação, supervisão e acompanhamento da assistência prestada; planejar e priorizar o foco da assistência em saúde no acompanhamento dos neonatos de risco e na intervenção precoce, visando o diagnóstico, tratamento precoce e a prevenção de deficiências; estabelecer um trabalho articulado entre as demais Redes e Programas do SUS/MG.

conquistas também contaram com as próprias pessoas com deficiência, que mostraram ações de interesse e, gradativamente, direcionaram seus esforços para serem respeitadas em sua integralidade, para além da deficiência (LANNA JUNIOR, 2011).

Retomando ao PIPA, diante da identificação de sinais iniciais de problemas de desenvolvimento na criança, o programa disponibiliza intervenções imediatas, consideradas imprescindíveis, visando atingir resultados positivos, tendo em vista que os resultados de terapias são mais significativos quanto mais precocemente iniciadas (MINAS GERAIS, 2013). Assim, o PIPA em sua execução propõe ações que objetivam o incentivo do acompanhamento dos neonatos de risco, visando à realização de diagnósticos precoces, bem como a intervenção precoce para crianças com deficiência intelectual e, quando detectados comprometimentos, buscar a prevenção dos agravos, melhorando o prognóstico e a qualidade de vida das pessoas com deficiência.

De acordo com o portal eletrônico do programa8, este é adotado em

quase todos os serviços de reabilitação da deficiência intelectual em Minas Gerais. A rede de cuidados no âmbito do Sistema Único de Saúde de Minas Gerais – SUS/MG é composta pela Atenção Primária, que tem como ponto de atenção as Unidades Básicas de Saúde (UBS), sendo as ações desenvolvidas preferencialmente tanto pelas equipes de Saúde da Família com apoio dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), quanto pela Atenção Especializada em reabilitação auditiva, física, intelectual, visual, ostomia, múltiplas deficiências e saúde bucal (BRASIL, 2012).

Na Atenção Especializada, os Serviços Especializados de Reabilitação em Deficiência Intelectual (SERDI) é executado pelas APAEs, por meio de convênio com o Sistema Único de Saúde (SUS). Em Minas Gerais, das 489 APAEs, 127 estão cadastradas nesse serviço. O SERDI tem como propósito exclusivo o atendimento em saúde das pessoas com deficiência intelectual e do transtorno do espectro do autismo ( BRASIL, 2012).

O Centro Especializado em Reabilitação (CER) é referência para a rede de atenção à saúde da pessoa com deficiência no território brasileiro, tratando-se de um ponto de atenção ambulatorial especializado em reabilitação, que direciona suas ações para diagnóstico, tratamento, concessão, adaptação e

manutenção de tecnologia assistiva. Sua organização ocorre a partir da combinação de no mínimo duas modalidades de reabilitação, entre as quais: auditiva, física, intelectual, visual. No estado de Minas Gerais, o CER se estabeleceu nas cidades de Patos de Minas, Uberlândia, Montes Claros, Formiga, Teófilo Otoni, Diamantina, Belo Horizonte, Alfenas, Pouso Alegre, Juiz de Fora e Governador Valadares.

Por se tratar de um programa de âmbito estadual, o PIPA é oferecido pelos Serviços Especializados de Reabilitação em Deficiência Intelectual (SERDI) e pelo Centro Especializado em Reabilitação (CER), os quais possuem atendimento de reabilitação em deficiência intelectual. Esses serviços fazem parte da rede de cuidado das pessoas com deficiência, sendo 127 municípios com adesão ao programa (MINAS GERAIS, 2014). Vale destacar que o PIPA ainda tem como objetivo capacitar e qualificar os profissionais do SERDI e CER.

As pessoas são atendidas pelo PIPA por meio do encaminhamento feito pela maternidade das crianças nascidas, as quais enquadram na classificação de risco para a atenção primária, já descrita nesta seção (MINAS GERAIS, 2014). O encaminhamento é acompanhado do relatório de alta da criança, que consta as informações da gestante e as condições de nascimento.

Os pais são orientados a se direcionarem à unidade básica de saúde mais próxima de residência, a qual, recebendo sua documentação, envia para a Junta Reguladora, que é responsável pela triagem de casos e os envia para os serviços necessários (MINAS GERAIS, 2014). Essa junta é uma comissão de profissionais indicada pelo gestor municipal de saúde, educação e assistência social, responsável pelo monitoramento da implantação e implementação da Rede de Cuidados a Pessoas com deficiência (MINAS GERAIS, 2014).

Entre as funções da Junta Reguladora, está auxiliar a articulação entre os componentes de atenção à saúde; estabelecer e regular os fluxos assistenciais; desenvolver estratégias que viabilizem a educação permanente entre os pontos de atenção; construir mecanismos que apresentem informações epidemiológicas da sua região de abrangência; e promover ações intersetoriais com vistas à inclusão da pessoa com deficiência (MINAS GERAIS, 2014).

O CER ou SERDI, por sua vez, entra em contato com os pais para o agendamento da avaliação e início do acompanhamento. O acompanhamento do

neonato compreende o período de zero a 24 meses de idade. A resolução sugere que esse acompanhamento aconteça periodicamente logo após a alta hospitalar ou no primeiro, quarto, sexto, nono, décimo segundo, décimo quinto, décimo oitavo, vigésimo primeiro e vigésimo quarto mês/meses de vida (MINAS GERAIS, 2014). A resolução, no entanto, não explicita a razão dessa indicação de tempo de vida. De forma profilática e terapêutica, serão atendidos os neonatos que não possuem diagnóstico, mas que apresentam critérios de risco ao desenvolvimento de deficiências, estabelecendo ações de prevenção e promoção à saúde (MINAS GERAIS, 2014).

O fluxo de entrada no PIPA, descrito acima, pode ser ilustrado conforme a figura 1 a seguir:

Figura 1 – Fluxograma de encaminhamento ao PIPA

Fonte: Elaborado pela autora (2019)

Durante o acompanhamento, caso a equipe defina algum diagnóstico clínico, o neonato é direcionado à intervenção precoce, e a mudança de atendimento será autorizada pela Junta Reguladora da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência. A Deliberação CIB-SUS/MG nº 1.403, de 19 de março de 2013, indica os moldes para que essa intervenção aconteça, o que inclui a realização de atendimento interdisciplinar que promova o desenvolvimento integral da criança, envolvendo os familiares para atingir esse objetivo (MINAS GERAIS, 2014). Caso não seja detectado comprometimento ou atraso no desenvolvimento

MATERNIDADE UBS REGULADORAJUNTA CER II SERDI

neuropsicomotor, o neonato receberá alta tendo completado os dois anos de idade, passando a ser monitorado pelos serviços de atenção primária (MINAS GERAIS, 2014).

Há, no entanto, que se destacar que outros programas estaduais semelhantes ao PIPA não foram encontrados, após uma busca minuciosa na rede mundial de computadores. Assim sendo, foi protocolada uma consulta junto à Coordenação de Atenção à Saúde da Pessoa com Deficiência da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (MINAS GERAIS, 2018) da qual se obteve a resposta de que programas estaduais com mesma finalidade do Programa de Intervenção Precoce Avançado (PIPA) são também desconhecidos pela referida coordenação.

O referencial aqui resenhado foi utilizado para se atingir os objetivos propostos nesta pesquisa, apresentados a seguir.