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7. A SUSTENTABILIDADE NA CONSTRUÇÃO CIVIL

7.2. O Projeto Arquitetônico e a Sustentabilidade

Não nos parece possível o atingimento do nível de equilíbrio pleno para haver uma total sustentabilidade no mundo. Mesmo assim, os projetos arquitetônicos podem ser mais, ou menos sustentáveis, a partir da criação de graus ou índices de sustentabilidade na arquitetura, tendendo a se aproximarem cada vez mais do nível ideal e, portanto, contribuir para a manutenção da espécie humana e do planeta.

Para isso, no caso do Brasil, foi criado em 2007 o selo AQUA (Alta Qualidade Ambiental). É uma certificação nacional, que oferece referencial técnico para edificações residenciais e comerciais. Atualmente possui 18 construções contempladas. O selo francês HQE (Alta Qualidade Ambiental), criado em 1996, serviu como base para o selo AQUA usado para as construções sustentáveis no Brasil, e disponibilizado pela Fundação Vanzolini.

Contudo, o Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS), formado por acadêmicos, pessoas ligadas às áreas social e financeira, construtores e incorporadores, e representantes de organizações não-governamentais, com o objetivo de estudar os mecanismos e práticas desenvolvidas em outros países e

estabelecer novos parâmetros e sistemas de análise e certificação que podem adequar-se à realidade da arquitetura brasileira, para que,diante das necessidades do meio ambiente, a engenharia seja incentivada a elevar sua atuação sustentável.

De acordo com as Recomendações Básicas de Sustentabilidade da Construção, elaborado pelo Grupo de Trabalho de Sustentabilidade – Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (AsBEA, 2007), alguns conceitos básicos devem nortear a elaboração de um projeto de arquitetura na busca de melhores condições de sustentabilidade. São eles:

A sustentabilidade não é um objetivo a ser alcançado ou uma situação estanque, mas sim um processo, um caminho a ser seguido. Advém daí que a expressão mais correta a ser utilizada é um projeto “mais” sustentável. Todo o trabalho nesta área é feito a partir de intenções que são renovadas continua e progressivamente. Intenções estas genuínas, que devem estar verdadeiramente compromissadas com os valores do cliente, a saber, o contratante, o usuário e a comunidade onde a obra esta inserida. O projeto é o exercício de intenções e decisões que resulta em uma obra mais sustentável.

Como a sustentabilidade é baseada nos aspectos ambiental, econômico e social, que devem coexistir em equilíbrio, e estes aspectos apresentam variáveis independentes, e por isso as escolhas resultantes serão diferentes em cada situação apresentada, não existe receita nem cálculo absoluto que determine o que deve ser feito ou não, para que um projeto caminhe na direção de uma maior sustentabilidade, sendo a proposta de cada projeto fruto de escolhas específicas, únicas e originais.

A busca pelo caminho da maior sustentabilidade cabe a todos os envolvidos no projeto e execução do ambiente edificado. É um trabalho coletivo (em rede) onde todos devem fazer sua parte, e ao mesmo tempo incentivam os demais a fazê-lo. As decisões devem ser resultado de uma ação orquestrada com os demais projetistas, gerenciadores, consultores, fornecedores, executores e usuários, na medida em que esta escolha pode condicionar ações a serem efetivadas pelos demais.

A certificação entra neste processo como um reconhecimento de um trabalho desenvolvido, sem, no entanto, ser sua representação fiel. Um motivo para esta dicotomia é a não existência de processo adequado às condições regionais culturais, econômicas e físicas que permitam uma real avaliação do resultado obtido

pelo esforço de tornar uma edificação mais sustentável. Os critérios de certificação, portanto, devem ser utilizados como referências auxiliares, mas não determinantes na escolha de materiais e sistemas construtivos.

A mudança de paradigma acontece ao se contratar um time de profissionais comprometidos com a sustentabilidade, que consigam também conscientizar, envolver e comprometer todos os empregados e parceiros que, de forma direta ou indireta, influenciarão nas atividades obra. Deve-se investir mais em planejamento e projeto (que representa apenas um pequeno percentual do custo da obra) de modo a assegurar que sejam adotadas boas soluções para as edificações.

A elaboração dos projetos de edificações americanas e européias demanda de um a dois anos e as obras menos tempo. O inverso ocorre no Brasil, apesar dessa situação estar progredindo, em muitas construtoras, pouca atenção é dispensada aos projetos e isso reflete em construções de baixa qualidade - arquitetônica, de execução e sustentável -, afetando diretamente os custos de operação e manutenção, bem como o bem-estar e a produtividade dos usuários, e os danos ambientais.

Ainda segundo as recomendações do Grupo de Trabalho da AsBEA, elaborar um projeto de arquitetura com melhor desempenho ambiental é projetar levando-se em conta o uso eficiente da energia, da água, de materiais certificados e renováveis, o aproveitamento de condições naturais locais, a qualidade ambiental interna e externa dos edifícios, e a utilização consciente dos equipamentos e do edifício pelo usuário. Todos esses temas estão detalhados (na íntegra) nos itens abaixo:

a) Uso eficiente da energia

Medidas que resultam em uma redução do consumo energético ou maior eficiência do uso em edifícios:

Especificação de equipamentos com menor consumo e melhor eficiência possível na utilização do gás natural para todos os fins.

Automatização de transporte vertical com otimização de carga e menor consumo energético possível com a adoção de sistemas eficientes como o ADC (antecipação de chamadas).

Iluminação de baixo consumo energético nas áreas comuns de uso contínuo, e iluminação “incandescente” com acionadores por sensor de presença nas áreas de uso esporádico ou intermitente.

Planejamento do consumo energético e utilização de equipamentos para gerar energia em períodos de pico.

Melhor aproveitamento possível da iluminação natural, levando-se em conta a necessidade do seu controle.

Melhor condição de conforto térmico evitando a incidência da radiação solar direta através da adoção de soluções arquitetônicas tipo venezianas, telas termo-screen externas, vidros especiais que dispensam o uso de brises, etc.

Implementação e otimização de ventilação natural.

Adoção preferencial de acabamentos claros nas áreas de grande incidência de luz solar.

Tratamento das coberturas do edifício analisando a possibilidade de implementação de áreas verdes ou, caso esta solução não seja possível, utilizar pinturas reflexivas para diminuir a absorção de calor para o edifício.

Uso de soluções alternativas de produção de energia como a eólica ou a solar, de acordo com as condições locais. A indústria brasileira está se tornando cada vez mais forte na produção de equipamentos para estes fins, tornando viáveis estes projetos.

b) Uso eficiente da água

Sistemas que reduzem o consumo de água em edifícios:

Captação, armazenamento e tratamento de águas pluviais para reutilização na irrigação, limpeza, refrigeração, sistema de combate a incêndio e demais usos permitidos para água não potável.

Utilização de bacias acopladas e válvulas especiais com o fluxo opcional por descarga, ou de sistemas a vácuo.

Reaproveitamento das águas de lavagem, com tratamento local, para utilização sanitária.

Utilização de torneiras com acionamento eletrônico ou temporizador por pressão em todas as aplicações passíveis.

c) Uso de materiais certificados e renováveis

Maximização na especificação de materiais sustentáveis objetivando o maior volume possível de utilização de materiais certificados, de manejo sustentável e recicláveis.

Planejamento para maior durabilidade possível nas especificações visando alta performance e evitando obsolescência prematura.

Utilização de materiais cujos processos de extração de matérias primas, beneficiamento, produção, armazenamento e transporte causem menor índice de danos ao meio ambiente nem estejam baseados em condições de trabalho indignas para os operários.

d) Qualidade ambiental interna e externa

Projetar utilizando técnicas que permitam uma construção mais econômica, menos poluente e que impacte de forma menos agressiva o meio ambiente.

Evitar danos à fauna, flora, eco-sistema local e ao meio ambiente.

Planejar toda a obra e futura operação do edifício procurando minimizar a geração de lixo e resíduos.

Evitar todo e qualquer tipo de contaminação, degradação e poluição de qualquer natureza, visual, sonora, ar, luminosa, etc.

Promover a segurança interna e externa do edifício e seus usuários.

Implantação e otimização de todos os recursos para a correta coleta seletiva do lixo visando a reciclagem de materiais e a menor geração de resíduos descartáveis.

Evitar grandes movimentos de terra, preservando sempre que possível a conformação original do terreno.

Elaborar um plano eficiente de drenagem do solo para durante e após a execução das obras, evitando-se danos como erosão ou rebaixamento de lençol freático.

Utilização consciente dos equipamentos e do edifício pelo usuário

O arquiteto deve procurar elaborar o projeto sempre com o apoio de quem irá operar o edifício, criando espaços e sistemas racionalizados, de baixo custo

operacional e com mínimo impacto ambiental. Quando se entrega uma obra, não importa a escala, esta deveria ser acompanhada de Manual de Operação, Gestão e Manutenção.

Orientar a criação e promoção de um curso de gestor ambiental do edifício. Amparar todo corpo de funcionários com treinamento adequado visando a educação, desenvolvimento intelectual e criatividade.

Difusão para o corpo de funcionários e todos os usuários do edifício dos princípios de sustentabilidade e conservação do meio ambiente.

e) Soluções que permitem flexibilidade e durabilidade

Adotar soluções construtivas que garantam maior flexibilidade na construção, de maneira a permitir fácil adaptação às mudanças de uso do ambiente ou de usuário, no decorrer do tempo, e evitar reformas que podem causar grande impacto ambiental, pela produção do entulho.

Adoção de materiais que sejam duráveis, não somente pelas suas características técnicas, mas também em função do seu desempenho e comportamento ao longo do tempo, o que resulta em longevidade para o edifício.