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O PLANEJAMENTO NA ESCOLA: PRÁTICAS, AVANÇOS E PERSPECTIVAS

5.1 I nstrumentos de planejamento na escola

5.1.1 O Projeto Político-Pedagógico (PPP)

A LDB, ao reforçar a política com foco na escola, prevê, como incumbência do estabelecimento, aelaboração e execução de suaproposta (Art. 12,1 e VII). É neste contexto que o PlanoEscolar, chamado proposta pedagógica,ou projetopedagógico ou aindaprojeto

político-pedagógico, passa a ser visto como instrumento de ajuste ao processo avaliativo da escola hoje, documento políticoexigido formalmente da escola, que faz parte do conjunto da política educacional.

A centralidade da instituição escolar, na agenda educativa dos anos 1990, pode ser percebida na atenção àdiscussão acerca do projeto pedagógico, na Conferência Nacional de

Educaçãopara Todos (1994). Nesse evento, foi destacada “a dimensão política” desteplano, que deve abranger “um projeto mais amplo da sociedade”. O texto dos anais dessa conferência acrescenta ainda que

A dimensão política atribui ao projeto pedagógico uma natureza democrática e

requer o exercício da ousadia, a busca da utopia, rompendo imobilismos, desestruturando o presente para reestruturar o futuro; a construção dos projetos

político-pedagógicosdas escolas requer a descentralização e a democratização do

processo de tomada de decisões, a ampliação da participação da comunidade

escolar e de todos os seus membros na solução dos problemas da instituição. (BRASIL, 1994, p. 49). (Grifosmeus).

Vale ressaltar que o reconhecimento da importância do projeto pedagógico da escola pela Conferência Nacional deEducaçãopara Todos não éfortuito, haja vista o entendimento de que esse mecanismo é imprescindível na implantação das metas do Plano Decenal, cuja lógica está pautada nas orientações das reformas, na América Latina. Dissemina-se, com efeito, aidéia de que todaescola precisafazer seu plano, definirmetas e compromissos com os alunos e com a comunidade escolar, processo em que devem ganhar espaço práticas descentralizadas e dedemocratização da tomada de decisões.

Gadotti (1994), um dos educadores convidados para o evento, questiona se a escola precisa apenas de projeto pedagógico ou de projeto político-pedagógico. Fundamentando sua inquietação, faz a seguinte reflexão, que merece ser registrada, em função do contexto onde ocorre o embate ideológico:

Freqüentemente se confunde projeto com plano [...]. Oplano ficasempre no campo do instituído, ou melhor, no cumprimento mais eficaz do instituído. Um projeto

necessitasempre rever oinstituídopara, a partirdele, instituiroutracoisa. Tomar-se

história, os seus currículos, os seus métodos, o conjunto de seus atores internos e

externos e o seu modo de vida. Um projeto sempre confronta o instituído com o instituinte. Não selevantaum projeto semumadireção política,um norte, um rumo.

Por isso, todo projeto pedagógicoétambémpolítico.E, porisso mesmo, sempre um projeto inconcluso, uma etapa em direção de uma finalidade que permanece como horizontedaescola. (GADOTTI, 1994, p. 21).

Autores diversos (GANDIM, 1994, 1995; VEIGA, 1996; SANTIAGO, 1997; ROSSA, 1999; VASCONCELOS, 2000b; PADILHA, 2001; SACRISTÁN, 2000; LACERDA, 2004) assinalam a elaboração desse instrumento como tarefa para além da exigência formal. Compreendem o Projeto Pedagógico como aproximação do que se pensa sobre a educação, acercado ensino, no tocante àpráticapedagógica da escola. Portanto o Projeto Pedagógico da Escola são as intenções do seu corpo, geradas, discutidas e postas emação por todos aqueles que a fazem e, de modo particular, pelo trabalho dos professores. Assim, sua construção demandaatitude dereflexãocoletiva permanente do corpo da escola, em direção às intenções e à consecução de intentos por parte dos responsáveis pela condução do projeto. Requer do corpo da escola conhecimentos e saberes específicos, bem como ousadia coletiva, paulatinamente, traduzida na prática cotidiana aser feita erefeita dentro e fora da escola.

Diante dessa compreensão, analisam-se os relatos dos entrevistados sobre o que entendem por PPP e sua construção, na tentativa de descobrir o espaço ocupado pelo planejamento na escola.

Asafirmativas dos diferentes segmentos da escola sobre o queé o PPP são reveladoras do lugar desseinstrumento de planejamento, no cotidiano escolar: “nãome pergunte oque é o PPP quenãosabería dizer”(P2 - Escola Jaçanã); “o PDE é quase a mesma coisa do PPP” (CG - EscolaTucano); “o PPP é uma peça chave da escola” (D - Escola Arara); “sei que temos um projeto, mas se me pedires para falareu não sei dizer nada” (PI - Escola Avoante); “Eu entendo o PPP como uma meta a ser alcançada pela escola, o diaadiaemrelação aos alunos. O PPP é um segmento do PDE. Todas as metas que você pensa no PPP tem que priorizar no PDE. Eles dois se completam” (S - Escola Tucano); “Sei que a escola tem muitos projetos.

Participo de todos, mas nãosei dizero queé essePPP” (A- Escola Jaçanã); “Não sei dizer... ouço falar disso mas não sei” (PI - Escola Tucano).

As transcrições deixamentrever compreensão fragmentada do queé o projeto político- pedagógico, por parte dos sujeitosque integram as comunidades escolares investigadas. Entre os pais e alunos, a situaçãoé ainda mais gritante, predominando total desconhecimento desse instrumento de planejamento, confundido com os projetos curriculares (musicalização/ escolinha de esporte/ dengue,entre outros) que a escola desenvolve.

A visão fragmentada doPPP reside na não-incorporação conceituai danoção, embora os entrevistados confirmem saber da necessidade e importância desse instrumento de planejamento, na escola, e, em alguns casos, de sua presença. Ao assumirem esta postura, tendem arepassar para ‘outros’, sobretudo paraocoordenadorpedagógico, aresponsabilidade de saber o que éo PPP. Talvisão é reforçada pela associação constantede PDEcom PPP,ora vistos como complementares, ora como similares, tendência mais forte entre gestores, funcionários e professores das escolas estaduais pesquisadas. As orientações advindas do órgão central do sistema de ensino são apontadas como um dos fatores que favoreceu a associação,conforme estes trechos:

Nonovomilênio, a propostaé de que a escolapública tenha uma nova cara e tudose

passa em torno da questão do PDE e do PPP. Recebemos um livrinho dizendo

todos a passos para construir o PPP e o PDE. Nósnãotínhamos ainda o PPP.Já

fizemos dois encontros e estamos começandoa elaborar. (D - ESCOLAJAÇANÃ);

Iniciamos o processo de construção do PPP de acordo com as orientações que estão na cartilha da SEDUC. Fizemos a primeirareunião deacordo comacartilha recebidadaSEDUCe dela tiramos a síntesedotexto saídodacolaboraçãodogrupo. Sistematizamos e transformamosnotextoque está aqui. Tudo dentro do roteiro que

a SEDUC encaminhou - cartilhinha ‘que destaca as partesdo PPP. (CP-ESCOLA JAÇANÃ).(Grifos meus).

Estamos elaborando o nosso PPP. Como já disse, utilizamos o mesmo seminário

para elaboramos o PPP e o PDE. A própria SEDUC aconselhou que fizéssemos assim. E meio atropelado, mas foi essa a orientaçãoque tivemos (CP -ESCOLA TUCANO);Seguindo a orientação da SEDUC/ CREDE (a Cartilha da SEDUC) aproveitamos o mesmo momento de sistematizar o PDE para elaborarmos o PPP. Asquestões gerais sãocomuns aosdoisplanos,como a corrente filosóficaque vai dar suporte ao trabalho da escola, visão de futuro e missão da escola. (CG - ESCOLA TUCANO). (Grifos meus).

As falas sãoincisivas em distinguir as orientações advindas da SEDUC, pela cartilha, sugestivas da possibilidade de produção simultânea do PPP e PDE, bem como da utilização dos mesmos procedimentos, contribuindo para sedimentar interpretação equivocadasobre os pressupostos teóricos que dão suporte aos instrumentos de planejamento. A ‘confusão’ é sentida pelos sujeitos pesquisados, nas duas escolas, embora somente um dos professores tenha expressado conceitualmente contradição:

Fizemos o nosso PPP junto com o PDE. Tivemos um seminário de preparação e foramosdoisplanos trabalhadosao mesmo tempo. Tudo foi feitocommuitapressa. Justificaramque comoos dois têmpartes iguais não teria problema fazer junto. Mas eu fiquei confuso, pois estudei que o PDE tem uma matriz conceituai diferente do PPP. Este partedeuma perspectiva de planejamentoparticipativo e o PDEparte da perspectivadeplanejamentoestratégico. (P2- ESCOLATUCANO).

Outro argumento explicativo da ‘confusão’ das orientaçõesdo sistema está na fala de um dos coordenadores:

Hoje euentendo que o PPP é um documentoglobal, geral; defineotipode filosofia daescola,dá a visãogeraldaescola.Eparacolocar o PPPemação, para viabilizar o

plano de açãodoPPP, o PDE está lá. Adificuldade inicial de compreensão desses dois instrumentos foi porque o sistema inverteu o jogo. Antes de termos o PPP elaborado fomos chamados a construir o PDE. Como a escola trabalhou primeiro

o PDE ficou achando que são coisas separadas e que não se misturam. Hoje entendemosque o PDEéum instrumento que ajudaa viabilizar as ações do PPPem

função da filosofia, das crenças, dos valores da escola. Esta compreensão só passamos aterdepoisque passamos por umaqualificaçãoonde estas questões foram trabalhadas. (CG- ESCOLATUCANO). (Grifos meus).

Uma das críticas mais recorrentes entre os entrevistados, nas redes municipal e estadual,reporta-se à urgênciacomque as solicitaçõesdos órgãos centraise intermediários do sistema educacionalchegam à escola. Ao falarem sobre asistematizaçãodos instrumentos de planejamento, este é um aspecto bastante freqüente e expresso em afirmativas como: “Achei tudo muito corrido, um na carona do outro. Não entendo por que tanta pressa ou tanta ansiedade de ter o documento em mãos.” (PI - ESCOLA TUCANO); “A SEDUC continua sendo autoritária (...) atropelando a escola a toda hora com suas solicitações de última hora.” (D- ESCOLA JAÇANÃ).

A explicitação do processode construçãodo PPP, nas escolas pesquisadas,ao oferecer dados sobre o exercício, permite perceber como a ênfase do coordenador pedagógico, na construção do PPP, e a urgência do tempo, no atendimento das demandas solicitadas pelo órgão central do sistema educacional, se entrecruzam e comprometem a prática de planejamento. Eis oque dizem os sujeitos entrevistados.