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Capítulo IV – O stresse ocupacional e a satisfação no docente do ensino superior

1. O stresse ocupacional na docência do ensino superior

Nos últimos anos o uso do termo stresse, associado a diferentes domínios e áreas do funcionamento humano, tem vindo a aumentar progressivamente e apesar dos níveis de stresse poderem emergir no funcionamento normal do dia-a-dia, aceita-se cada vez mais a ideia de que este problema se torna mais significativo quando associado ao trabalho. Esta questão é particularmente importante quando o referente é a classe profissional dos professores (Gomes, Silva, Mourisco, Silva, Mota, & Montenegro, 2006), uma vez que a atividade profissional destes é extremamente exigente, produzindo níveis de stresse superiores em relação a outras profissões onde o fenómeno é habitualmente observado. Assim, de acordo com Gmelch (1993), ao contrário dos estudos mais antigos que revelavam que os professores eram dos profissionais mais satisfeitos com o seu trabalho e menos problemas de saúde reportam, os estudos mais recentes em todo o mundo revelam insatisfação dos mesmos com o ambiente de trabalho, desilusão com a progressão na carreira e consequências do stresse derivado de vários aspetos dos seus papéis profissionais.

Na verdade, o ensino superior em todo o mundo experiencia mudanças constantes e significativas (Gillespie et al., 2001; Tytherleigh et al., 2005), nomeadamente, mudanças políticas, económicas e sociais, que se refletem em, reestruturações curriculares e estatutárias, novas políticas de contratação, downsizing e cortes orçamentais, e Portugal não foge à regra como procurámos ilustrar no capítulo 3 deste trabalho. Todas estas mudanças têm contribuído para o aumento e disseminação alarmante do stresse nos profissionais do ensino superior, como demonstram e salientam estudos realizados em diferentes países (Gillespie et al., 2001; Kinman et al., 2006; Tytherleigh et al., 2005; Winefield et al., 2003).

As conclusões destes estudos demonstram que as instituições de ensino superior já não oferecem ambientes de trabalho com baixos níveis de stresse como outrora (Winefield et al., 2003) e o stresse profissional exerce uma poderosa influência sobre a vida dos indivíduos e das organizações, na medida em que, altos níveis de distress no trabalho resultam em custos para a organização e para a comunidade, através de despesas com cuidados de saúde, compensações monetárias, perda de produtividade e turnover (Cooper & Cartwright, 1994).

Kyriacou (1987) refere que “os estudos, feitos em qualquer parte do mundo, indicam tipicamente uma grande proporção de professores a afirmar que experimentam estados de stresse ou burnout” (p. 147), afirmando que a experiência de stresse no

112 professor deve ser entendida como uma ameaça ao seu bem-estar, autoestima e valor pessoal, podendo levar ao desenvolvimento de sentimentos negativos, como a insatisfação e a desmotivação que se refletem na diminuição da qualidade das atividades por ele desenvolvidas, diminuindo assim as potencialidades de aprendizagem dos estudantes. Neste sentido, diversos são os estudos que abordam questões inerentes ao

burnout dos professores do ensino superior (Durán, Pacheco, & Peña, 2001; Lackritz,

2004; Moreno-Jiménez, Hernández, & Carvajal, R., 2009; Otero-López, Mariño, & Bolaño, 2008; Tümkaya, 2006, 2007), associando-o a intenções de abandono (Moreno- Jiménez et al., R., 2009). Assim, a maior razão para que os líderes das organizações estejam interessados no stresse ocupacional deve-se à preocupação de que o stresse excessivo venha a reduzir a produtividade dos trabalhadores (Miller et al., 2009).

Investigações conduzidas em diversos países, tais como, Reino Unido, Estados Unidos da América, na Nova Zelândia, na Austrália, no Brasil, na China, na Bélgica e em Portugal, identificaram fatores que mais comummente estão associados ao stresse ao nível do ‘staff’ académico, assim como têm identificado alguns fatores moderadores do stresse. O impacto específico do stresse ocupacional no sector universitário também tem sido objeto de investigação e as conclusões apontam para um impacto negativo a vários níveis (Abouserie, 1996; Akbar & Akhter, 2011; Barkhuizen & Rothmann, 2008; Biron et al., 2008; Catano, 2010; Davenport et al., 2008; Donovan, 2012; Doyle & Hind, 1998; Dua, 1994; Gillespie et al., 2001; Jacobs et al., 2007; Jreige, 2011; Kinman et al., 2006; Mahomed, 2004; Manzoor et al., 2011; Melo et al., 1997; Michailidis, & Asimenos, 2002; Mostert et al., 2008; Nortjé, 2007; Ofoegbu & Nwadiani, 2006; Reddy e Poornima, 2012; Sharpley et al., 1996; Smith et al., 1995; Thorsen, 1996; Tytherleigh et al., 2005; Winefield et al., 2003).

Gmelch (1993), ancorado no modelo transacional de Lazarus e Folkman (1984) apresentado anteriormente neste trabalho, procurou estudar o fenómeno do stresse nos professores do ensino superior e descreve o ciclo do mesmo em quatro estádios. Assim, o processo de stresse começa no estádio 1, que corresponde aos stressores, ou seja, um conjunto de exigências específicas, tais como, auto expectativas, reuniões, interrupções e confrontações excessivas. A quantidade de stresse produzida pelos referidos stressores depende do estádio 2, o da perceção que o indivíduo tem dessas exigências. Se o indivíduo não tiver recursos físicos ou mentais para lidar com a exigência, esta é percecionada como stresse. Assim, o stresse é criado pela discrepância entre a exigência e os recursos pessoais, resultando numa resposta específica de stresse, que corresponde

113 ao estádio 3. O quarto e último estádio, que corresponde às consequências, reflete a intensidade e os efeitos negativos a longo prazo do stresse.

No que diz respeito ao estudo do stresse ocupacional dos docentes do ensino superior, tem-se também procurado perceber o impacto da carreira profissional no mesmo. Desta forma, Jones, Weinrib, Metcalfe, Fisher, Rubenson e Snee (2012) concluíram que os professores de escalões inferiores operaram em condições de trabalho mais stressante, principalmente devido a experienciarem, no decorrer dos primeiros anos de incorporação na carreira docente, processos contínuos de legitimação profissional.

As investigações realizadas ao nível do stresse experienciado pelos professores do ensino superior têm-se focado na vertente negativa e disfuncional do stresse, como se pode observar nos estudos que acabámos de descrever, não existindo estudos sobre o

eustress em professores, contudo, as investigações realizadas com outros profissionais,

associam o eustress à saúde (perceção) (Quick et al., 1997; Salovey, Rothman, Detweiler, & Steward, 2000, cit. por Nelson & Simmons, 2003; Simmons & Nelson, 2001; Nelson & Simmons, 2005), elevada performance e resultados positivos e construtivos (Nelson & Simmons, 2005), ao bem-estar (Edward & Cooper, 1988; Salovey et al., 2000, cit. por Nelson & Simmons, 2003), maior envolvimento com o trabalho (Simmons, 2000).