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O TRABALHO DOCENTE ENTRE PRAZER E SOFRIMENTO

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ (páginas 64-68)

2. BASE TEÓRICO-EMPÍRICA

2.3 O TRABALHO DOCENTE ENTRE PRAZER E SOFRIMENTO

O trabalho docente tem aparecido com frequência em artigos acadêmicos, relacionado às vivências de prazer e sofrimento no trabalho. (OLIVEIRA, 2006;

MENDES et al, 2006; SANTOS; SIQUEIRA; MENDES 2009; MENEZES;

NEPOMUCENO; BATISTA-DOS-SANTOS, 2011; FROTA; TEODÓSIO, 2012;

CUPERTINO; GARCIA, 2012; VILELA; GARCIA; VIEIRA, 2013; MARTINS;

HONÓRIO, 2014; RIBEIRO; PEREIRA, 2016; FERNANDES; MARQUES, 2016;

MENDONÇA; VILAS BOAS; MORIN, 2016). Com relação à temática, Freitas (2007a), argumenta que a academia é um lugar de risco para a saúde dos professores, visto a frequência das doenças psicossomáticas que os acometem. A autora destaca alguns dos males mais diagnosticados, como gastrite, taquicardia, hipertensão, irritabilidade, insônia, depressão, síndrome do pânico, estresse e síndrome do esgotamento profissional (burnout). Ainda de acordo com a autora, com exceção da sala de aula e do relacionamento com os alunos considerados gratificantes, as cobranças excessivas, a compressão do tempo, a competição ferrenha, e a contínua atualização tecnológica e da área de estudos, dão origem a uma fadiga institucional que coloca “a carreira docente como uma das mais estressantes do mercado”. (FREITAS, 2007a, p. 190).

Os estudos mais expressivos sobre o trabalho docente, são os que se referem à Síndrome de Burnout (esgotamento profissional). Para Tamayo e Tróccoli (2002), a definição mais divulgada do burnout, compreende este fenômeno como uma síndrome psicológica, decorrente da tensão emocional crônica, vivenciada pelos profissionais, cujo trabalho envolve o relacionamento intenso e frequente com pessoas que necessitam de cuidado ou assistência. É um construto constituído pelas dimensões da exaustão emocional, da despersonalização e da diminuição da realização pessoal.

A primeira dimensão, a exaustão emocional, refere-se a sentimentos de fadiga e esgotamento energético emocional. O indivíduo se sente super exigido, e reduzido nos seus recursos emocionais. Esta dimensão reflete o aspecto de estresse individual do burnout. A despersonalização, caracteriza-se pelas atitudes negativas de dureza, e de distanciamento excessivo dos profissionais, em relação às

pessoas beneficiárias dos seus serviços, (os alunos, no caso dos docentes). Esta dimensão representa o aspecto interpessoal do burnout. A terceira e última dimensão, a diminuição da realização pessoal, retrata o aspecto de auto avaliação do burnout, sendo associada ao sentimento de incompetência, e à percepção de um desempenho insatisfatório no trabalho. (TAMAYO; TRÓCCOLI, 2002).

As manifestações ou sintomas do burnout, podem ser classificadas em diferentes grupos como: afetivas, cognitivas, físicas, comportamentais, sociais, organizacionais, e do trabalho. Acerca das manifestações afetivas, são relatados o humor depressivo, a desesperança, a falta de significado, a ansiedade e os sentimentos de impotência no trabalho, acompanhados de uma baixa autoestima. As manifestações cognitivas são, dificuldade de concentração, perda de memória, dificuldade para tomar decisões e presença de sintomas sensório-motores (tiques nervosos, agitação, incapacidade para relaxar). Em relação aos sintomas físicos, surgem os resfriados frequentes, problemas gastrointestinais, dores de cabeça, fadiga, insônia, sensação de exaustão, tremores e falta de ar. Do ponto de vista comportamental, ocorrem abuso de drogas, conduta de evitação, irritação, frustração, hiperatividade e dificuldade para controlar as emoções. Entre as manifestações sociais, encontram-se os problemas com colegas, superiores e subordinados. As últimas manifestações, relacionadas com a organização do trabalho, referem-se à perda de entusiasmo, do interesse e do idealismo, que podem levar ao absenteísmo e ao abandono do emprego. (TAMAYO; TRÓCCOLI, 2002).

Contudo, mesmo diante deste cenário, Freitas (2007a), também enumera alguns pontos que remetem ao sentido e às alegrias do trabalho docente, como a liberdade de expressão; a busca e contato com outros universos de ideias, de autores, de lugares e de temas que favorecem uma rica vida interior e a aprendizagem; o contato com os pares; o reconhecimento proporcionado pelas aulas, debates, conferências, publicações e participação em congressos; autonomia e certo grau de liberdade, relacionados a um maior controle sobre o seu tempo, e o conteúdo da prática docente.

Para Bastos (2007), assim como se constata nas demais categorias ocupacionais, uma gama diversificada de valores e de significados atribuídos ao trabalho, pode se encontrar na base da escolha pela docência e pesquisa. Para o

autor, fatores motivacionais intrínsecos, como a realização, crescimento, servir à sociedade etc., combinam com fatores extrínsecos (remuneração, status, poder), no trabalho docente. Com relação às posturas competitivas, Bastos (2007), afirma que a comunidade acadêmica, a exemplo de quaisquer outros agrupamentos humanos, não se diferencia quanto às tensões da competição entre seus membros. Nesse sentido, Freitas (2007a), reflete sobre os aspectos psicológicos da competição entre os docentes, como mostra a citação a seguir:

Existem demandas psicológicas contraditórias entre o ser professor e o ser pesquisador, entretanto elas não são inconciliáveis, pois é preciso se estar atento ao fato de que a competição na arena acadêmica é sutil e exige aparência de esportividade; porém, ela não é menos violenta que em outros cenários. Uma metáfora pertinente talvez seja a do jogo de xadrez, no qual não se quebram as pernas dos jogadores, apenas são massacrados os seus egos. (FREITAS, 2007a, p.188).

Neste cenário de competição, valores diferenciados, cobranças por produção e qualificação, Bastos (2007), afirma ser desnecessário um amplo levantamento da literatura para se perceber que o trabalho docente, hoje, em todos os níveis em que ocorre, é fortemente associado a uma ameaça à saúde física e psicológica do trabalhador. Para Oliveira (2006), como forma de enfrentar o sofrimento psíquico, os professores desenvolvem estratégias singulares de defesa, como: excessiva submissão; resistência a todo tipo de mudança; baixo índice de envolvimento com o trabalho; psicossomatização; perda de percepção e consciência dos sérios problemas vivenciados no cotidiano da escola.

No estudo de Vilela, Garcia e Vieira (2013), sobre o trabalho do professor universitário em uma instituição pública, entre as causas do mal-estar docente podem-se destacar: carência de tempo suficiente para realizar um trabalho decente;

dificuldades dos alunos; aumento da carga horária; trabalho burocrático, que rouba tempo da tarefa de ensinar e que se transforma em fadiga; descrença no ensino como fator de modificações básicas das aprendizagens dos alunos; e modificação no conhecimento e nas inovações sociais como desafios que provocam grande ansiedade e sentimento de inutilidade.

Em outro estudo, sobre as estratégias de professores frente ao sofrimento no trabalho, Frota e Teodósio (2012), enumeram algumas das queixas dos professores

sobre os fatores de ameça à saúde, como o cansaço, estresse, e doenças como o infarto, a hipertensão, e a depressão, porém, segundo os autores, alguns professores se consideraram saudáveis, demonstrando a vergonha como ideologia defensiva, escondendo a ansiedade por se sentir doentes e incapacitados para o trabalho. Os dados obtidos neste estudo, revelaram que os professores reconhecem que o aumento das exigências, da carga de trabalho, impactam na saúde e no número de afastamentos por motivo de doença. Destacam-se, também, as condições de trabalho, com salas de aula de tamanho reduzido, com uma quantidade de alunos considerada excessiva.

Menezes, Nepomuceno, e Batista-dos-Santos (2011), em um seu estudo sobre os sentidos do trabalho para um grupo de professores de uma universidade pública, apresentam o trabalho onipresente, a divergência nos relacionamentos, e a burocracia como os fatores condicionantes para o sofrimento no trabalho de docentes. Da mesma forma, os autores apresentam o conhecimento, a flexibilidade de horários, o contato humano, o poder de ação, e a independência financeira como fatores condicionantes para o prazer no trabalho destes docentes.

Ainda nesse sentido, Vilela, Garcia e Vieira (2013), em seu estudo com docentes em uma instituição pública, apresentam as situações de mal-estar no trabalho docente, associadas a diversos fatores, como a intensificação da atividade de trabalho, incluindo novas demandas (pesquisa, extensão, encargos administrativos e publicações científicas), que acabam por provocar sobrecarga, estresse e adoecimento; a perda de autoridade de professor, que deve se relacionar com um aluno que é cliente, em um contexto que transforma o ensino em mercadoria; e a necessidade de lecionar em outras instituições de ensino como forma de complementação de salário. Os mesmos autores também apresentam os fatores de realização profissional, associados ao bem-estar ou prazer no trabalho, como o orgulho pelo que fazem, a identificação com as tarefas e liberdade para executar o trabalho, a autonomia didática, o uso da criatividade e à aprendizagem originada pelo próprio trabalho.

Refletindo sobre o trabalho docente de professores de Administração, Serva et al. (2013), trazem a questão da legitimação dos papéis do professor, perante os alunos, os pares, e a comunidade acadêmica, onde ser paraninfo ou patrono de

turma, ou assumir uma coordenação administrativa, trazem uma honraria simbólica para o docente, e ao mesmo tempo um peso no seu imaginário, o que pode levá-lo a uma procura cada vez maior pela produção, perfeição, e reconhecimento, que podem levar tanto a uma sensação de bem-estar e satisfação, quanto podem gerar situações de mal estar e sofrimento.

Todos os trabalhos citados, entre muitos outros, tem o objetivo de identificar quais são os fatores que levam os docentes às vivências de prazer e sofrimento no trabalho. Contudo, dentro dos parâmetros de busca utilizados neste estudo, não foram encontrados trabalhos que buscassem alguma relação entre a cultura organizacional das instituições de ensino, às vivências de prazer e sofrimento no trabalho de docentes. Enfatizando essa relação entre cultura organizacional e vivências de prazer e sofrimento no trabalho, em toda a pesquisa de literatura, foi encontrado somente um trabalho, o de Garcia (2014), que aborda a relação entre a cultura organizacional, e as vivências de prazer e sofrimento de trabalhadores de enfermagem. Assim, reforça-se o objetivo principal deste trabalho, que é o de analisar como a cultura organizacional se entrelaça às vivências de prazer e sofrimento no trabalho de professores de graduação, em instituições federais de ensino superior.

Após detalhar algumas das características do trabalho docente entre prazer e sofrimento, apresenta-se a seguir, algumas contribuições que os estudos sobre psicodinâmica do trabalho podem trazer para os estudos organizacionais, principalmente para a Administração.

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ (páginas 64-68)