• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II – O VALOR DO DIPLOMA E DA LÍNGUA INGLESA NO

2.1 As escolas públicas

2.1.1 O trabalho e o perfil do professor de inglês da rede pública

Duas das escolas analisadas são da rede municipal de Belo Horizonte, tendo, portanto, a mesma relação institucional com seus professores. Para ser professor em uma das escolas da rede municipal, é obrigatório possuir licenciatura plena na matéria que se pretende lecionar e passar no concurso público promovido pela prefeitura.

No caso da rede estadual, o professor não precisa necessariamente ter passado em um concurso. É possível conseguir uma vaga de trabalho como professor designado, que é aquele que não se submeteu a um concurso, mas tem um contrato de trabalho temporário na rede estadual. Apesar de não ser avaliado em um concurso, idealmente é preciso que o professor comprove formação na área, apresentando o diploma de licenciatura. No entanto, de acordo com o depoimento do vice-diretor da escola Capanema, alguns estabelecimentos da rede estadual possuem professores designados que não possuem formação específica na disciplina que lecionam, mas que conseguem uma autorização temporária expedida pela Secretaria Estadual de Educação para lecionar.

Nesse aspecto, a rede municipal consegue estabelecer vínculos mais fortes com seus professores, já que todos os docentes são necessariamente concursados. De acordo com os depoimentos dos diretores das escolas José Reis e Zélia Gattai, a rotatividade de professores é muito baixa, o que favorece o desenvolvimento de um trabalho mais consistente.

Na escola Capanema, segundo o vice-diretor, a rotatividade de professores é baixa principalmente porque a instituição é considerada referência na rede estadual e atende alunos considerados por ele a elite do ensino público de Belo Horizonte. No entanto, o diretor admite que essa é uma situação pouco comum na rede estadual. De acordo com seu depoimento, na maioria das vezes, a rotatividade de professores é alta devido ao grande número de professores designados.

A seleção do professor de LE tanto da rede municipal quanto da rede estadual não leva em conta certificados de proficiência ou vivência no exterior; somente a licenciatura plena. A comprovação de que o professor está apto a lecionar é sua nota na avaliação escrita do concurso. A pontuação do candidato pode aumentar se ele apresentar diploma de pós-graduação e comprovação de experiência profissional no ensino básico.

Ao avaliar o candidato somente por meio de uma prova escrita, os concursos não têm como aferir a proficiência em LE por parte dos futuros professores das redes municipal e estadual. A competência comunicativa10 em língua inglesa não é avaliada em nenhum momento. Assim, não é possível saber o nível de conhecimento do professor de inglês em situações reais de comunicação que exigem o uso das quatro habilidades para a interação em uma LE: ler, falar, escrever, compreender o que o outro fala.

10Para CANALE (1983), competência comunicativa e comunicação são conceitos distintos na medida em que o primeiro refere-se aos conhecimentos e habilidades necessários para uma pessoa comunicar-se com outra, e o segundo está relacionado à realização desses conhecimentos e dessas habilidades dentro de contextos nos quais há interação social. CANALE (1983) define conhecimento como aquilo que está relacionado ao que uma pessoa sabe, consciente ou inconscientemente, sobre a língua e sobre outros aspectos do uso comunicativo da língua. Habilidade refere-se à transposição desses conhecimentos para a prática, no sentido de usá-los de modo adequado em situações de comunicação real. A competência comunicativa é, assim, parte essencial da comunicação em si e pode apresentar desvios exatamente porque as habilidades necessárias para usar esses conhecimentos em situações reais de comunicação estão situadas dentro de um contexto social, no qual existem variáveis que não são controláveis. Nesse contexto percebe- se que o conhecimento apenas gramatical da língua não garante a comunicação. A competência gramatical é apenas uma das competências necessárias para a comunicação. Ela faz parte de um conjunto de competências que formam a competência comunicativa.

Em relação ao plano de carreira, as redes municipal e estadual apresentam alguns aspectos distintos. Na rede municipal, o plano de carreira valoriza o investimento na formação continuada do professor. Assim, quem faz especialização, mestrado, doutorado, sobe na carreira e acaba conseguindo salários melhores. Outro benefício é a concessão de licença parcial ou até mesmo total para que os professores consigam investir nesse tipo de formação. De acordo com o depoimento do diretor da escola José Reis e do coordenador da escola Zélia Gattai, além de ser relativamente fácil conseguir a licença, a comprovação dos títulos leva a promoções praticamente imediatas na carreira do professor, o que estimula os docentes da rede municipal a investirem em sua formação.

Entretanto, segundo os entrevistados, o plano de carreira não contempla diplomas de proficiência, como o TOEFL e o IELTS (exigidos, respectivamente, para entrada em universidades americanas e britânicas, assim como para comprovação de proficiência em língua inglesa por cursos de pós-graduação) e aqueles concedidos pela Universidade de Cambridge e pela Universidade do Michigan, reconhecidos internacionalmente.

De acordo com Paiva (2006), os cursos de especialização não têm o objetivo de melhorar a competência comunicativa dos professores, mas sim, apresentar e aprofundar questões teóricas e práticas da linguística aplicada. Segundo a pesquisadora, os cursos de especialização e a pesquisa formam professores mais preparados em relação à teoria e à prática, mas dificilmente servirão como fonte para a aprendizagem do idioma e para o desenvolvimento da competência comunicativa do docente. De acordo com Paiva (2006), “sem a competência linguístico-comunicativa, o professor fica sem seu principal

instrumento de trabalho, pois é essa a competência que ele tem a expectativa de adquirir para depois desenvolver em seus alunos e é essa mesma competência que os alunos esperam atingir” (PAIVA, 2006, p. 63). Assim, o plano de carreira da rede municipal

desconsidera um aspecto fundamental para a qualidade do ensino das LEs, que é a proficiência no idioma por parte daquele que ensina. O pouco domínio da língua inglesa por parte dos professores é um dos grandes obstáculos para um ensino de qualidade.

Na rede estadual, segundo o vice-diretor da escola Capanema, o plano de carreira é praticamente inexistente para aquele que investe somente em sua formação. O diretor cita seu próprio percurso profissional como exemplo para justificar seu desânimo em relação à carreira docente na rede estadual. Ele ingressou na rede em 1991 como professor de geografia e, desde então, foi diretor do colégio Capanema duas vezes e vice-diretor uma

vez. Nesse período, concluiu o mestrado e agora está cursando disciplinas para um possível doutorado. Segundo o vice-diretor, o título de mestre, conseguido em 2007, não deu a ele nenhum benefício salarial, porque ainda não foi formalmente inserido no sistema da rede estadual devido à lentidão burocrática e mudanças no plano de carreira. Ainda que tivesse conseguido o reconhecimento do título, o diretor afirma que o acréscimo no salário seria mínimo. Entretanto, os cargos de diretor e vice-diretor oferecem benefícios salariais que, segundo ele, podem motivar o professor a conseguir ascensão profissional na busca por outros cargos, que não o de professor. É interessante observar que sair da sala de aula é a única maneira de avançar na carreira na rede estadual, o que é bastante controverso, já que se trata de uma carreira docente.

Segundo a descrição feita pelo vice-diretor, o plano de carreira da rede estadual não parece nada sedutor e, quando se analisam os critérios para a mudança de categoria, percebe-se que há pouco incentivo para a formação continuada do professor e, especificamente no caso da LE, nenhum interesse em motivá-lo para continuar investindo em sua proficiência. De acordo com seu depoimento, quando alguém lhe pergunta sobre ser professor, ele diz que essa é uma carreira que não compensa o esforço. O conselho que ele diz dar a quem o questiona sobre a profissão é que, apesar da importância da educação, para quem está começando é melhor optar por outra área de trabalho.