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Objetivos, objeto, demandas e público alvo do assistente

3 A INTERVENÇÃO PROFISSIONAL E AS POLÍTICAS

4.2 A ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL

4.2.1 Objetivos, objeto, demandas e público alvo do assistente

remetendo apenas ao conteúdo que está na legislação, seja ela nacional

ou municipal.

É o que está na legislação, o que está na carteira de serviços né? (ASNASF2).

Os objetivos que se encontram nas normativas nacionais para o

assistente social do NASF como: desenvolver ações que garantam

escuta e acolhida dos usuários; desenvolver ações integradas com os

profissionais das equipes; produzir conhecimento sobre a população

atendida na área da saúde; entre outros, não foram explicitadas no

decorrer da pesquisa. Os objetivos contidos na Carteira de Serviços e/ou

na PMAPS, mesmo que sejam mais restritos, também não foram

citados/identificados.

Apesar disso, surgiu como objetivo do profissional a ampliação

do conceito de saúde, remetendo à necessidade de interlocução entre as

diferentes políticas sociais com vistas à garantia dos direitos, na medida

em que a saúde em seu conceito ampliado tem como fatores

determinantes a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o

transporte, a educação, o lazer, o acesso a bens e serviços, entre outros.

O Serviço Social tem o objetivo de colocar em prática o conceito de saúde ampliada né? Porque na verdade assim... geralmente as pessoas visualizam a saúde somente como uma questão de doença... e o Serviço Social acho que entra para dar conta dessa ampliação de saúde. Porque geralmente o usuário vem com uma demanda, que ele pode até trazer uma demanda de uma questão física, mas atrelado a isso tem outras questões que com certeza o Serviço Social atua... (ASNASF1).

Já os objetivos do Serviço Social no PAIF apontados pelos

profissionais estão relacionados principalmente ao fortalecimento de

vínculos.

[...] é o fortalecimento de vínculos, vínculo da comunidade, vínculo do... da família, até mesmo o vínculo com os próprios profissionais do CRAS, vínculo com o CRAS assim... (ASPAIF1).

O fortalecimento de vínculos é o principal objetivo da PSB e, por

conseguinte, deve ser um objetivo do profissional de Serviço Social,

porém, os profissionais devem ter cuidado ao identificarem os objetivos

da política como próprios da profissão, principalmente, pois, conduzidas

sob a ótica neoliberal as políticas sociais podem ter objetivos que

tendam à focalização, à seletividade e à garantia de mínimos sociais,

desviando da ideia da política enquanto direito universal. Há que se

destacar também, que, ao contrário da política de APS, a assistência

social não estabelece objetivos claros para a atuação do assistente social

na PSB, devendo o profissional construir esses objetivos tendo como

base suas atribuições e competências profissionais, seu projeto ético

político e as demandas impostas pela própria política.

Em relação ao objeto de atuação do assistente social, é claro para

alguns profissionais que este são as expressões da questão social que

chegam aos serviços de diferentes formas. Essa compreensão foi

identificada no grupo focal das assistentes sociais do NASF, porém esse

é o objeto da profissão independente de seu local de atuação, variando

apenas as expressões que chegam em cada política social.

[...] o Serviço Social em qualquer instituição, seja na saúde tanto na APS quanto no hospital, né, de alta complexidade ou nos serviços de assistência social, ou em qualquer outra política pública de atenção, seja qual for, ele tem um objeto ne? Que são as expressões da questão social, que é [...] o varejo singular da barbárie... no nosso caso da atenção à saúde, na atenção primária. Aí como vai se desenvolver, como vai se desenrolar, tem em cada um as suas peculiaridades, né? (ASNASF4).

Também faz parte da compreensão dos profissionais que o papel

dos assistentes sociais frente às expressões da questão social é a

instrumentalização do sujeito visando a garantia dos direitos sociais.

A gente atende as expressões da questão social, a gente atende muito dentro de um espaço, de um território de saúde, de atenção primária sim e daí o que vai vir... vão vir várias pessoas doentes, pessoas com dificuldades, trabalhadores que a gente vai o que, instrumentalizar quanto aos seus direitos trabalhistas dentro desse viés da saúde, naquele momentos estão doentes, então vai muito para a instrumentalização do usuário em relação ao auxílio doença, em relação à legislação previdenciária, ou a gestante naquele período da vida onde tem uma série de direitos também, sempre ligados aos direitos sociais... mas hoje, cada vez mais com esse período que a gente vive, a conjuntura que a gente vive, né? A dificuldade

financeira mesmo, as situações de pobreza né? Desemprego, a realidade na nossa cidade que é de um altíssimo custo de vida né? Então isso é importante a gente também ter claro né? De que nosso objeto é objeto do Serviço Social (ASNASF4).

O debate em torno do objeto da atuação profissional, ou seja, das

expressões da questão social consiste um elemento teórico metodológico

central da análise crítica da inserção do Serviço Social na realidade

contemporânea e deve ser base para a atuação profissional. Por questão

social, compreende-se o conjunto das

expressões de desigualdades engendradas na sociedade capitalista madura, impensáveis sem a intermediação do Estado. Tem sua gênese no caráter coletivo da produção, contraposto à apropriação privada da própria atividade humana – o trabalho – das condições necessárias à sua realização, assim como de seus frutos. (...) expressa, portanto, disparidades econômicas, políticas e culturais das classes sociais,

mediatizadas por relações de gênero,

características ético-raciais e formações regionais, colocando em causa as relações entre amplos segmentos da sociedade civil e o poder estatal. (...) Esse processo é denso de conformismos e resistências, forjados ante as desigualdades, expressando a consciência e a luta pelo reconhecimento dos direitos sociais e políticos de todos os indivíduos sociais (IAMAMOTO, 2001, p. 17).

A questão social tem sua gênese, portanto, nas relações sociais

capitalistas e na relação capital-trabalho e expressa as inúmeras

desigualdades sociais presentes nessa relação. A questão social implica

ainda em processos de lutas e resistências que ultrapassaram o domínio

privado nas relações entre capital e trabalho, fazendo com que a questão

social seja extrapolada para a esfera pública, exigindo a interferência do

Estado para o reconhecimento e a legalização de direitos (IAMAMOTO,

2001).

A questão social é, portanto, base fundante do exercício

profissional e consequentemente da atuação profissional e exigem

respostas do profissional e seu posicionamento frente às disputas de

projetos sociais distintos, que impõe e confronta requisições distintas e

antagônicas no cotidiano do exercício profissional. De um lado, o

projeto de caráter universalista e democrático no enfrentamento às

expressões da questão social, que desafia o profissional a “reassumir o

trabalho de base, de educação, mobilização e organização popular, que

parece ter sido submerso do debate profissional ante o refluxo dos

movimentos sociais” (IAMAMOTO, 2001, p.23). De outro lado, o

projeto neoliberal no trato das questões sociais, que implica na

focalização das políticas sociais e se traduz em exigências de

seletividade cada vez mais excludentes, na redução do alcance e

efetividade das ações profissionais.

Dessa forma, as diversas expressões da questão social, que

aparecem de forma velada ou explícita nas demandas imediatas dirigidas

ao assistente social, constituem o objeto “bruto” que necessita ser

analisado, reelaborado no contexto dos processos de trabalho, e através

deste processo de mediações, ressignificadas e transformadas, já pela

incidência do trabalho, em matéria-prima profissional ou em matéria de

Serviço Social.

Em relação a essas demandas imediatas que aparecem para o

assistente social no NASF, foram destacadas pelos profissionais

questões relacionadas o desemprego, o acesso a benefícios e direitos,

situações de violência e negligência contra idosos e crianças e

adolescentes, gestantes em situação de vulnerabilidade, população em

situação de rua, saúde mental, a realidade dos migrantes, demandas por

benefícios eventuais, entre outros.

Quando eu entrei no NASF, 90% dos meus atendimentos era idoso, só caso de idoso. Hoje não. Hoje deu uma diferenciada, assim. Porque aumentou as demandas e esse aumento foi bastante para criança e adolescente, bastante questão de abuso sexual, muito assim, muito, muito... está aparecendo muito. Saúde mental também (ASNASF1).

Eu estou atendendo várias situações de HIV/AIDS, de câncer, DPOC32 e várias doenças que daí são situações bem amplas, né? (ASNASF2).

32

As demandas apontadas pelos profissionais do NASF nada mais

são do que os determinantes sociais da saúde, ou seja, “os fatores

sociais,

econômicos,

culturais,

étnicos/raciais,

psicológicos

e

comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e

seus fatores de risco na população” (BUSS; FILHO, 2007, p.77). Em

outras palavras, os determinantes sociais da saúde podem ser

considerados: as condições socioeconômicas, culturais e ambientais

gerais, as condições de vida e de trabalho, as redes sociais e

comunitárias estabelecidas pelo indivíduo ou grupo, o estilo de vida dos

indivíduos e questões como idade, gênero e fatores hereditários.

Dessa maneira, pode-se dizer que as formas de inserção

socioeconômica da população são relevantes para explicar a saúde e o

perfil epidemiológico de determinada situação, e as demandas atendidas

pelas profissionais de Serviço Social na área da saúde são reflexo da

relação entre o modo de vida da população e sua situação de saúde.

Modo de vida caracterizado como as condições de vida, ou seja, as

condições materiais necessárias para a subsistência, e o estilo de vida,

ou seja, as formas sociais e culturais de vida que se expressam no

padrão alimentar, nos hábitos etc.

Segundo Buss e Filho (2007), existem inúmeros estudos que

buscam relacionar os determinantes sociais da saúde com a saúde. Entre

esses estudos, alguns possuem o enfoque que busca analisar as relações

entre a saúde das populações, as desigualdades nas condições de vida e

o grau de vinculo entre indivíduos e grupos. Outro enfoque privilegia os

aspectos físicos e materiais na produção da saúde e da doença,

entendendo que a renda da população influencia na saúde na medida em

que pode acarretar a escassez de recursos dos indivíduos e pela ausência

de investimentos em infraestrutura comunitária, implica no não acesso

da população aos serviços de educação, transporte, saneamento, entre

outros. Um terceiro enfoque privilegia os fatores psicossociais,

entendendo que as experiências das pessoas em sociedades desiguais

provocam estresse e prejuízos à saúde e os enfoques multiníveis, que

buscam integrar abordagens individuais e grupais, sociais e biológicas

numa perspectiva dinâmica.

Segundo as profissionais, muitas dessas demandas dependem da

rede intersetorial para serem atendidas e, nesse momento de cortes de

verbas para as políticas sociais, os benefícios e os direitos estão sendo

cada vez mais sendo restringidos, remetendo à lógica neoliberal de

garantia de mínimos sociais e acarretando na responsabilização do

terceiro setor para o acesso à esses benefícios.

Em se tratando do PAIF, as principais demandas que aparecem

para o serviço, segundo o relato dos profissionais, são relacionadas ao

acesso a benefícios e programas da política de assistência social e acesso

à rede de serviços, mas nem sempre essas demandas são reconhecidas

pelos profissionais como do assistente social.

Observo que tem determinadas situações que psicólogos e até mesmo administrativos encaminham para o assistente social porque eles identificam que o assistente social, sei lá, tem um conhecimento maior na questão de benefícios, questão de... mais benefícios de modo geral, né? Seja cesta básica, BPC, Bolsa Família, não sei o que... qualquer outro. Então esses sempre chegam para a gente, sempre é encaminhado e por mais que o psicólogo, que já está há muito mais tempo do que eu inclusive no CRAS, já saiba qual que é a orientação, qual que não é a orientação, por exemplo BPC, ele ainda assim encaminha para o Serviço Social. Não compreendo assim que é algo exclusivo do Serviço Social, né, de preencher formulários, enfim (ASPAIF1).

Historicamente ainda o assistente social tá renegado a questão de identificação de recurso, de falar do acesso a direitos, mas tem algo muito novo nesse acompanhamento familiar que está para além de uma política de encaminhamentos.

Que ainda precisaria se desdobrar

metodologicamente (ASPAIF3).

Para alguns profissionais, o assistente social precisa avançar em

relação à sua atribuição e seus objetivos junto ao PAIF, superando a

visão atual de que a atuação profissional é sinônimo do acesso aos

benefícios eventuais. Outra questão levantada pelos profissionais

também é a própria atuação do assistente social, que muitas vezes tende

ao imediatismo, a realizar encaminhamentos pontuais voltados às ações

sócio emergenciais, indicadas por Mioto e Nogueira (2009).

E às vezes a gente... pelo menos eu tinha a impressão, da pouca experiência que eu tive em outros locais, que a gente ia com muita sede ao pote, querendo dar respostas, como se fosse um portfólio de ações que vai resolver a vida desse usuário (ASPAIF3).

É fundamental para o assistente social, diante do imediatismo do

cotidiano, onde o foco vem sendo a meta e a responsabilização do

indivíduo, superar essa lógica, pensando em projetos coletivos na

profissão e na sociedade e a proposta levantada pelos assistentes sociais

acerca da coletivização das demandas é um caminho a ser seguido na

busca pela garantia dos direitos e pelo não retrocesso das políticas

sociais.

Por fim, em relação ao público alvo de atuação do NASF e do

PAIF, na política de saúde foi consenso não existir restrição em relação

ao público alvo para atendimento, enquanto que no PAIF, foi destacado

um público prioritário, voltado para o atendimento da população

beneficiária dos programas de transferência de renda, como Bolsa

Família e usuários que recebem benefícios sociais como o BPC, entre

outros.

Tanto a política de saúde quanto a política de assistência social

fazem parte do tripé da seguridade social e caracterizam-se por serem

não contributivas, ou seja, não há a necessidade de contribuição para

acessá-las. O que difere ambas as políticas é o fato da política de saúde

ser uma política universal enquanto a política de assistência social é

voltada a quem dela necessitar. Essas características restringem, de certa

forma, o público alvo da política de assistência social geralmente

voltada para o atendimento da população em situação de vulnerabilidade

social.

Assim, no caso do PAIF, o público alvo são as famílias em

situação de vulnerabilidade social e as famílias beneficiárias dos

programas de transferência de renda do governo federal, enquanto que

no NASF o público alvo é mais amplo, não restringindo-se apenas à

população usuária dos serviços. É fundamental destacar que as próprias

eSF também se constituem como público alvo da atuação do assistente

social no NASF.

4.2.2 Trabalho multiprofissional, interdisciplinar e intersetorial