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2 PANORAMA DA REGIÃO SUL CATARINENSE ENTRE OS SÉCULOS XVIII E

2.3 OCUPAÇÃO, ENCURRALAMENTO E “AFUGENTAMENTO” DOS XOKLENG

Durante praticamente todo o século XVIII e parte do século XIX, a região sul de Santa Catarina tinha sua população assentada basicamente nas vilas e nas localidades próximas ao litoral, sendo o interior coberto por densas florestas de Mata Atlântica, um importante bioma de floresta subtropical, cortada por rios e por lagoas, composta por diversificadas fauna e flora, “que cobriam as encostas das montanhas, os vales litorâneos e as bordas do planalto no sul brasileiro” (SANTOS, 2003, p. 434). Essas terras e florestas eram habitadas há séculos pelos Xokleng - um povo formado por caçadores e por coletores, cujos

grupos circulavam em processo de constantes e sistemáticos deslocamentos entre o litoral e a Serra Geral, de acordo com as estações do ano e, consequentemente, com a disponibilidade de alimentos.

De acordo com o historiador e antropólogo Silvio Coelho dos Santos,

O território que ocupavam não tinha contornos bem definidos. As rotas de perambulação eram frequentadas de acordo com o seu potencial em suprir, através da caça e da coleta, as necessidades alimentares do grupo. Mantinham uma disputa secular com os guarani e os kaingang para o controle desse território.25 (SANTOS,

2003, p. 434) [Grifo nosso].

De acordo com Santos, os Xokleng, de características nômade e estacionária, moviam-se de acordo com as estações do ano e a disponibilidade de alimentos entre as bordas do Planalto e a faixa litorânea. Esse povo da floresta vivia construindo abrigos/habitações temporárias e se deslocando pelo território; ignoravam limites, fronteiras e a propriedade privada, uma vez que essas noções e esses conceitos foram introduzidos e mobilizados pelos nacionais – luso-brasileiros – desde suas ocupações mais antigas no litoral, a partir de Laguna, e pelos imigrantes europeus não-ibéricos ao longo da segunda metade do século XIX, por meio da política de colonização.

Por outro lado, o historiador Clóvis Antonio Brighenti destaca, logo na introdução do artigo intitulado “Povos indígenas em Santa Catarina”, que a noção de território definida pelos povos Guarani, Kaingang e Xokleng leva em conta aspectos muito diferentes daqueles estabelecidos como resultante de um processo histórico recente, principalmente se considerarmos o tempo de ocupação desse território pelos povos originários.

Ao contrário da noção historicamente construída, sobretudo, no bojo do processo colonizador, para os povos originários,

Essas definições têm como referência a relação que cada povo estabeleceu com o meio e a inter-relação entre eles. Suas dimensões variam de acordo com cada grupo, assim, o território Guarani compreende as terras baixas, desde o litoral até a bacia do Paraná-Paraguai; o território Kaingang compreende as terras altas, desde o interior do estado de São Paulo até o centro norte do estado do Rio Grande do Sul; o

25 Silvio Coelho dos Santos aborda, em seus textos, a relação de disputa que os xokleng travavam com os

guarani e os kaingang pelo controle do território. De acordo com esse autor, “Os guarani dominavam extensa parte do planalto, as margens dos rios que integram as bacias do Paraná/Paraguai e o litoral. Os kaingang eram senhores das terras interiores do planalto”. Enquanto que “os xokleng tinham nas florestas que se localizavam entre o litoral e o planalto o seu território de domínio e de refúgio. Ao norte, chegavam até a altura de Paranaguá; ao sul, até as proximidades de Porto Alegre; ao noroeste, dominavam as florestas que chegavam até o rio Iguaçu e os campos de Palmas” (SANTOS, 2003, p. 434-435)

território Xokleng compreende a região intermediária, do planalto ao litoral e do Paraná ao Rio Grande do Sul.26 (BRIGHENTI, 2013, p. 1) [Grifo nosso].

Brighenti arremata e afirma que, desse modo, “não é adequado falar em povos indígenas ‘de’ Santa Catarina, mas em povos indígenas ‘em’ Santa Catarina”, justamente pelo fato de que as configurações territoriais do Estado catarinense, como as conhecemos hoje, “é resultado de um processo histórico recente”, levando-se em conta que a criação e a ocupação da província de Santa Catarina, quando essa se separou da de São Paulo, data de 1739. Do mesmo modo, que todo o oeste e parte considerável do planalto serrano catarinense foram incorporados apenas depois que o acordo de limites entre o Paraná e a província Catarinense foi firmado, no ano de 1916, após longos anos de conflito motivados pelas disputas do território, que a historiografia cunhou como “contestado”. Portanto, Brighenti realça que “antes de qualquer europeu aportar sobre essas paragens e impor qualquer limite já havia populações humanas que as habitavam, das quais descendem os atuais povos indígenas que aqui vivem”.

Sobre os Xokleng, o historiador e arqueólogo Rodrigo Lavina (1994, p. 49) ressalta que há inúmeros registros nos documentos oficiais que tratam do caráter nômade desse povo, que se caracteriza por “um ‘movimento pendular’27 entre o litoral e o planalto, com nítidas características estacionais”, o que significa dizer que os grupos circulavam entre o litoral e o planalto de acordo com as estações do ano e a disponibilidade de alimento, como frutas, raízes silvestres, sementes e a coleta do mel, além da caça. Dessa forma, viviam na floresta e da floresta, absorbendo dela todo o necessário para o sustento do grupo, como o pinhão, que constituía um importante recurso alimentar, sem a necessidade, por conseguinte, de construírem aldeamentos com habitações permanentes.

Importante reforçar que eles, como outros tantos povos originários, foram invisibilizados na literatura historiográfica; quando muito, são mencionados genericamente como “índios, indígenas, silvícolas, bugres, etc.”, ou lembrados como selvagens e agressivos, comparados às feras que habitavam as florestas da mesma mata Atlântica. No entanto, diversos pesquisadores buscaram escavar, nas entranhas desse amplo território, os elementos constitutivos da vida e do cotidiano desses grupos de pessoas que, por dependerem tanto da natureza, estabeleciam uma relação de comunhão, de reciprocidade e de respeito com ela.

26 Esse artigo está disponível em: https://leiaufsc.files.wordpress.com/2013/08/povos-indc3adgenas-em-santa-

catarina.pdf. Acessado em 21 de fevereiro de 2018.

27 Apropriamo-nos do termo “movimento pendular” extraído de: LAVINA, Rodrigo. Os Xokleng em Santa

Catarina: uma etnohistória e sugestões para os arqueólogos. São Leopoldo, 1994. Dissertação de Mestrado em História – UNISINOS.

Ruth Maria Fonini Montserrat, no texto em que aborda as línguas indígenas no Brasil contemporâneo, acrescenta que os Xokleng, do ponto de vista linguístico, pertencem ao tronco denominado macro-jê, da família jê, cuja língua não possui dialetos. Por se tratar de um povo que não utilizava qualquer tipo de escrita, os Xokleng transmitiam sua cultura unicamente por meio da oralidade, a exemplo dos demais povos originários do Brasil, o que torna o estudo da história dessas sociedades mais complexa e dependente de outras áreas do conhecimento, como a antropologia, a etnohistória e a arqueologia (MONTSERRAT, 1994).

Longe das generalizações muito comuns na literatura regional quando se trata dos povos nativos da terra, Silvio Coelho dos Santos é enfático ao assinalar que “os xokleng formavam um povo” cujas características os diferenciava dos demais, por terem uma língua e uma cultura própria, além de um território, embora esse não apresentasse limites e contornos tão bem definidos, vivendo em grupos pequenos que, muitas vezes, mantinham relações de disputas entre si. Desse modo, aspectos como “a família, o sexo, o nascimento de crianças, a vida em grupo, a parceria nas atividades de caça e coleta, a divisão dos alimentos entre todos, as festas, as disputas e a morte faziam parte do cotidiano” dos Xokleng (SANTOS, 2003, p. 435).

A vida desse povo se desenrolava numa dinâmica intrinsecamente vinculada ao meio natural onde homens e mulheres produziam diversos artefatos como ferramentas e utensílios, os quais possibilitavam viver diante das adversidades impostas pela floresta, como os arcos, as flechas e as lanças, que eram necessários para a caça e a própria segurança do grupo. Por outro lado, também produziam agasalhos, que eram tecidos a partir de fibras vegetais, e que os protegiam nas noites frias de inverno, além de utensílios como panelas de barro e cestos trançados de taquara – revestidos com cera de abelha, impermeabilizando para o transporte de líquidos – e fibras de bambu - objetos que auxiliavam no cozimento, no armazenamento e/ou no transporte dos alimentos (frutas, grãos, raízes, etc.). Havia entre os Xokleng uma divisão do trabalho que transferia aos homens a incumbência da caça e a confecção dos artefatos inerentes a ela, e, às mulheres, praticamente todas as demais atividades, que iam desde a coleta, o preparo do resultado da caça e demais alimentos, o preparo de bebidas fermentadas, além do cuidado com as crianças, que, aos poucos, iam aprendendo a viver e a sobreviver naquele ambiente, o qual, em nada se parecia com um paraíso, como o que foi descrito no livro do Gênesis, onde, segundo a narrativa histórica, “jorrava leite e mel”, tendo sido, muitas vezes, retratado por viajantes e colonizadores como uma espécie de ‘jardim do Éden’.

Era um mundo de forte interdependência com a natureza. Os sucessos alcançados eram consequência do esforço individual e coletivo, e baseados nos saberes que diversas gerações haviam desenvolvido para aproveitar aquele espaço ecológico que elegeram como o seu habitat. As doenças eram raras. O frio do inverno e as chuvas eram enfrentados como fatos da natureza. Os acampamentos não passavam da construção de simples pára-ventos, aproveitando ramos de árvores que eram devidamente arqueados e cobertos de folhas de palmeira. Outras vezes, se o tempo era favorável, dormiam ao relento. O fogo, aceso toda a noite, a todos aquecia (SANTOS, 2003, p. 434 - 435).

Sobre os agrupamentos, a divisão do trabalho e as habitações praticadas pelos Xokleng, Jackson Alexsandro Peres e Ana Lúcia Vulfe Nötzold, no artigo intitulado “Os Indígenas no Século XIX: a selvageria nos (dos) discursos oficiais (1850-1880)”, destacam que a caça consistia em uma prática essencialmente destinada aos homens e que a coleta de plantas, de frutos, de raízes e de sementes era uma atividade praticada pelas mulheres, sendo que os agrupamentos eram, geralmente, formados por um grupo reduzido de pessoas (podiam variar entre cinquenta e trezentos indivíduos). Essa divisão do trabalho, que assegurava o abastecimento do grupo, não era tão rígida, pois, durante o período de coleta do pinhão, que se dá por volta do mês de abril, os homens juntavam-se às mulheres nessa atividade, “já que o pinhão era o alimento principal dos Xokleng, sendo em muitos casos armazenado em cestas enceradas. Quando a região fornecia alimentação suficiente, construíam um acampamento”, que podia durar por até três meses no mesmo local (PERES; NÖTZOLD, 2005, p. 9).

Outro aspecto importante acerca dos Xokleng está relacionado ao fato de que, por serem nômades, os grupos deveriam se subdividir para melhor explorar uma ampla extensão de terras, relativamente distantes e que circundavam os locais de maior concentração daquele povo. Talvez, por isso mesmo que “a presença dos Xokleng foi historicamente registrada num território bastante amplo, fazendo supor que a tribo deveria ter um contingente populacional muito maior do que o real” (SANTOS, 1973, p. 33)

Essas populações originárias foram, gradativamente, desde o século XVIII, sendo colocadas em uma condição de encurralamento pelo avanço do processo de ocupação europeia a partir do litoral, tendo os núcleos de Paranaguá, de São Francisco, de Desterro e de Laguna como pontos de apoio para a tomada do interior em direção à Serra Geral. O mesmo aconteceu com o processo de ocupação do planalto, com o estabelecimento de fazendas destinadas à criação de gado, principalmente, a partir da fundação da vila de Nossa Senhora dos Prazeres das Lages, entre os anos de 1766 e 1771, por Antônio Corrêa Pinto,28 que

28 Antônio Corrêa Pinto foi um rico senhor de escravos, oriundo da vila de Parnaíba na Capitania de São Paulo,

contribuiu para limitar a área de livre circulação das populações indígenas, especialmente os Kaingang e os Xokleng.

Dessa forma, observamos que, desde a segunda metade do século XVIII – tendo Laguna como referência de polo comercial, político e cultural da região sul catarinense –, deu-se início a um processo lento e esparso de ocupação dos vales dos rios Tubarão, Araranguá, Capivari e seus respectivos afluentes, por pessoas de origem europeia, sobretudo, portugueses ou luso-brasileiros, além de escravos de origem africana, vinculados aos proprietários de terras (sesmarias) ou fugitivos destes. Essas pessoas foram, aos poucos, se estabelecendo nos vales de toda a região e constituindo caminhos que faziam a ligação entre os núcleos urbanos do litoral com o interior e o Planalto Serrano. Mas foi, principalmente entre a segunda metade do século XIX e o início do século XX, que os Xokleng, os quais já não eram os únicos habitantes dessa região, sofreram um acelerado processo de encurralamento, de afugentamento e de morte diante do avanço do projeto colonizador.

No século XIX, durante o período de colonização, havia ao menos três grupos Xokleng habitando a região sul do Brasil. Um desses grupos ocupava a área central do território catarinense e se espalhava pelo médio e alto Vale do rio Itajaí. Outro grupo vivia na região de fronteira entre os estados do Paraná e de Santa Catariana, circulando nas cabeceiras do rio Negro, enquanto que o terceiro grupo estava baseado nos vales dos rios Tubarão e Capivari, com seus respectivos afluentes no sul catarinense. Essa distribuição espacial nos foi apresentada por Silvio Coelho dos Santos, a qual leva em conta a configuração territorial atual do Estado (SANTOS, 1973).

A região sul catarinense, muitas vezes associada ao “Éden”, foi, sobremaneira a partir da segunda metade do século XIX, sendo ocupada pela colonização que fixou sucessivas levas de imigrantes europeus. Essa ocupação provocou uma intensa transformação da paisagem com a significativa redução do espaço geográfico que abrigava, alimentava e permitia a livre circulação do povo Xokleng.

Para o historiador Maurício da Silva Selau,

A implantação de colônias e o combate aos botocudos eram feitos de modo concomitante no império brasileiro. No sul catarinense, mesmo sabendo-se que os Xokleng habitavam as florestas, o governo imperial decidiu dar início à implantação de colônias e dentro de 15 anos uma grande área de florestas fora derrubada para dar lugar às colônias de Azambuja, Grão Pará e Nova Veneza. A chegada dos imigrantes contribuiu para uma mudança na paisagem e as florestas densas de mata atlântica foram, aos poucos, sendo derrubadas para o aumento da área de plantio dos colonos.

por Corrêa Pinto se tornou importante no contexto do abastecimento da região Sudeste, especialmente para a região de Minas Gerais, com gado bovino e seus derivados.

A cada nova geração ou leva de imigrantes, maiores porções destas eram derrubadas. Os Xokleng que da floresta retiravam o necessário à sobrevivência do grupo, procuraram reagir a invasão do seu território (SELAU, 2010. p. 24).

O autor evidencia que a instalação das colônias e dos núcleos coloniais na região sul de Santa Catarina provocou uma profunda transformação na paisagem dessas localidades, ocasionando um processo de exploração que desencadeou uma ação de destruição do meio natural, principalmente com o desmatamento, cujo objetivo era abrir espaços para as lavouras e todas as demais estruturas necessárias ao empreendimento colonizador – casas de moradia, estradas, pastagens, etc. Por outro lado, esse mesmo processo colonizador promoveu, além da expropriação das terras antes ocupadas pelo povo Xokleng, o maior massacre já havido em toda a região sul catarinense, fazendo emergir a figura dos “bugreiros”, que, de acordo com Selau,

Geralmente eram luso-brasileiros ou mesmo colonos com fama de destemidos e corajosos que entravam na mata em perseguição aos indígenas, até encontrá-los em seus acampamentos e promoverem verdadeiras chacinas. Essa ação era justificada pela necessidade que os colonos sentiam de terem garantida a posse de sua propriedade e da segurança que pretendiam para sua família. Assim, o bugreiro tornou-se um herói das últimas décadas do século XIX e primeiras do século XX (SELAU, 2010. p. 24 - 25).

A ação colonizadora instalada na região sul catarinense, a exemplo do que ocorreu em todo o continente americano desde o final do século XV, foi extremamente violenta do ponto de vista ambiental e humano, com o avanço contínuo e sistemático sobre as terras ocupadas desde tempos remotos pelo povo Xokleng - primeiro, pelos sesmeiros e posseiros e, depois, pelos imigrantes europeus. Isso gerou a reação dos povos originários diante da expropriação gradual e permanente de seu espaço territorial.

Esses constantes conflitos aparecem com certa frequência nos relatórios que os presidentes da Província – a partir de 1890, os governadores do Estado catarinense – comunicavam anualmente à Assembleia na abertura dos respectivos anos legislativos, ou em ocasiões de transmissão do cargo, desde a primeira legislatura, instalada no ano de 1835. Essa prática demonstra como essa temática era constantemente pautada e mobilizava as preocupações e o empenho dos diversos grupos e agentes sociais, bem como das instituições políticas e econômicas, cujo interesse maior era o de assegurar o processo de ocupação e de exploração das terras situadas no interior, sem o empecilho imposto pelas “hordas de índios selvagens”, como comumente se referiam aos grupos indígenas.

No relatório apresentado à segunda Legislatura, em 1º de março de 1839, o então Presidente provincial, Brigadeiro João Carlos Pardal, fazia menção às contínuas solicitações de concessão de terras que chegavam a ele, nas margens do caminho recém-aberto e que perfazia a ligação entre o Distrito de Imaruí e os campos de Lages. Em seus argumentos, Pardal sugere que o meio mais assertivo e seguro de se manter permanentemente aberta aquela via de comunicação entre o litoral e o planalto seria o de povoar as margens daquele mesmo caminho com a concessão de terras a famílias que desejassem nelas produzir e, ao mesmo tempo, “afugentar d'aquelles certões o gentio indomito, que o infesta”. Ele segue argumentando que essas duas ações assegurariam o “emprego a braços menos occupados, e que muito ganhará a prosperidade da Província sendo aproveitados na cultura, e na criação de gados, tão vastos e férteis terrenos, ora improductivos, por incultos”. Os escritos do Presidente Pardal demonstram que, desde as primeiras décadas do século XIX, já havia em curso o desejo de povoar e de explorar as terras do interior catarinense, especialmente aquelas situadas ao Sul e em direção ao planalto, como ele mesmo demonstra com a ordem de criação de dois Distritos Coloniais no braço do Norte do rio Capivari, nas proximidades do caminho Imaruí-Lages (SANTA CATHARINA, 1839, p. 10 - 11).

Por fim, lamenta, diante do atraso e das dificuldades na execução dessa ordem, porque,

em primeiro lugar nos mezes de verão não só ha a temer os ataques do gentio, como que não se pode penetrar naquellas matas por causa de insectos que atormentão os trabalhadores, impedem o trabalho; e em segundo, por fallecerem meios para occorrer ás despesas que a Medição e Demarcação ha-de occasionar; porquanto he mister pagar avantajadamente ao Demarcador, a quem o ajude, e também a quem o proteja (SANTA CATHARINA, 1839, p. 10 - 11) [Grifo nosso].

É perceptível que havia uma constante preocupação por parte do Estado em assegurar a implementação de uma política mais efetiva de ocupação do território catarinense que estava se desenhando aquele momento, e que, para isso, seria necessário empregar medidas que consistiam em “afugentar” os indígenas para lugares cada vez mais distantes em direção às encostas do Planalto Serrano, ou mesmo, promover o seu aldeamento, tirando-os da condição de “selvagens sanguinários” e trazendo-os, dessa forma, para o “mundo civilizado”, ação que se daria por meio da catequização dos indígenas aldeados, como ressaltou o Brigadeiro Antero Jozé Ferreira de Brito, quando presidiu a Província em 1841.

As providencias que se podem dar contra suas sanguinárias e sempre imprevistas incursões, estão pois dadas; o remedio efficaz contra este hum asylo, ora

impenetrável, ferem crusados de estradas, e subjugados pela cultura: então sera talvez possível redusi-los, cathequisa-los, e torna-los de ferozes e implacaveis inimigos, membros uteis da sociedade (SANTA CATHARINA, 1841, p. 1 - 2) [Grifo nosso].

Ainda, em seus relatos, ao abordar o tema “obras públicas”, Ferreira de Brito