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1. Da finalidade, das opções e do percurso da pesquisa

1.5. Opções teórico-metodológicas

A exploração teórico-conceptual de ideias e de assuntos relativos à problemática em análise levou-nos a adoptar uma atitude crítica e reflexiva sobre os dados empíricos recolhidos a partir dos instrumentos criados: questionários, entrevistas individuais e por focus

group, observação e notas de campo. Pretendemos, deste modo, estabelecer alguns quadros

metodológicos que nos permitam compreender os factores empíricos da perspectiva mais individualizada da cultura profissional docente. Assim, e numa primeira abordagem aos conceitos e significados que desde logo constituíam os objectivos do estudo, tivemos em conta a natureza dos fenómenos que aconteciam no quotidiano escolar, tendo verificado que eram, na sua grande maioria, de interacção social, nomeadamente os aspectos referentes ao relacionamento entre os professores, à relação professor-aluno, aos contactos e às relações com os serviços de secretaria, da reprografia, da biblioteca, entre outros. Neste âmbito, decidimos utilizar as perspectivas, os métodos, e os instrumentos de análise de carácter essencialmente qualitativo, onde se privilegiasse, também, um registo etnográfico dos acontecimentos presenciados e observados in loco. Destacamos a abordagem teórico- conceptual aos modos de actuação dos professores no quadro do trabalho cooperativo a partir de um registo sumário sobre os aspectos que julgamos caracterizar a cultura profissional docente, tendo em atenção os arquétipos metodológicos que estruturam as relações de trabalho na sua génese, a partir da clarificação conceptual e semântica de alguns vocábulos. Seguindo este percurso metodológico, os dados empíricos sobre a problemática em estudo versam sobre o processo biográfico e relacional dos professores, o seu quotidiano escolar, a relação inter-pares e com os alunos, entre outras categorias de análise que nos permitem compreender o fenómeno do individualismo e da cooperação na docência. Valorizamos, neste caso, as vivências socioprofissionais dos professores, bem como outras experiências que marcaram o seu percurso profissional no ensino. Trata-se de compreender os fenómenos que assinalam as representações sociais entre si, nomeadamente, as relações de trabalho inter- pares, os processos de solidariedade e autonomia profissional e a convivência didáctico- pedagógica estabelecida com os alunos na escola.

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Como foi sendo dito, esta investigação define os princípios e os objectivos gerais e específicos centrados num estudo de caso de natureza qualitativa, integrando, neste âmbito, uma vertente etnográfica sobre os aspectos da prática profissional dos professores. Para isso, foi feita uma caracterização sumária do trabalho docente e das suas vivências profissionais na escola, as dificuldades e as resistências associadas ao contexto sócio-educativo. Desde logo, queríamos compreender o sentido e o significado que este grupo de professores atribui às variadíssimas situações da sua vida profissional na escola, nomeadamente nos grupos disciplinares e nos conselhos de turma. Em síntese, e de acordo com Albano Estrela (1986), pretende-se, sobretudo, que a recolha de dados de opinião forneça pistas para a concretização do processo em estudo, assim como o conhecimento dos seus intervenientes. Isabel Guerra (2006:8) considera que “os resultados das pesquisas, mesmo as mais localizadas, exigem geralmente a situação dos acontecimentos num conjunto global, permitindo assim uma melhor compreensão dos contextos nos quais se inserem as múltiplas interacções individuais”. Assim, considerámos oportuno um olhar retrospectivo sobre a problemática em estudo através da fundamentação da metodologia, constituindo-se como objecto de análise a reavaliação do modelo téorico-conceptual na sua extensão e complexidade científica, bem como a concepção teórico-metodológica dos dados recolhidos. Neste sentido, ocupámo-nos de uma interpretação heurística com base numa metodologia que integra e traduz os comportamentos e as vivências dos professores em contexto escolar, sobretudo os aspectos que dizem respeito ao seu trabalho com os pares no quadro das ocupações profissionais. Procurámos analisar ponderadamente todos os dados empíricos de modo a obter resultados que nos permitiram inferir sobre a importância do trabalho cooperativo na profissão docente, ou a sua negação, ou seja, o isolamento profissional. Situámos o questionamento empírico sobre a concepção tradicional da docência, tendo em conta que ela é marcadamente individualista, segundo a opinião expressa de alguns autores referidos na revisão da literatura. Nas páginas que se seguem apresentamos os procedimentos e os resultados do esforço feito para conhecer mais extensivamente o pensamento e a prática dos professores intervenientes no estudo entre outros aspectos da situação contextual em análise.

Tendo em conta a complexidade que envolve a natureza desta investigação temos plena consciência de que fica para além do nosso propósito o discutir pormenorizadamente as várias perspectivas que concerne o pensamento dos professores acerca do problema em questão. Assim, e do ponto de vista metodológico, um dos pontos centrais para a abordagem da problemática em estudo passou pela observação directa do trabalho realizado pelos

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professores no quadro do seu desempenho profissional na escola, nos grupos disciplinares e nos conselhos de turma, sob diversas perspectivas, nomeadamente, a nível da partilha de recursos e de materiais didácticos, troca de saberes e de experiências dentro e fora da sala de aula, entre outras interacções ocasionais na sala dos professores, nos corredores, nos trabalhos de projectos, nas oficinas de formação, etc. Interessava-nos saber se estas experiências partiam de motivações intrínsecas, espontâneas e informais, envolvendo os professores dos grupos disciplinares e dos conselhos de turma ou se elas diziam respeito a uma colegialidade imposta. Neste quadro de análise, foi possível questionar em que medida as práticas docentes e as experiências profissionais contribuíam ou não para o incremento e desenvolvimento de processos de socialização pacífica entre os docentes, sob forma de grupos de pares ou de equipas pedagógicas e educativas. Pretendíamos saber se, no quadro das vivências quotidianas nos grupos disciplinares e de pertença (ou de docência) e nos conselhos de turma, os professores levam a cabo as rotinas de trabalho, as regras e os princípios didáctico- pedagógicos criados em prol das “boas práticas” ou se ignoram literalmente. Questionámo- nos sobre o quotidiano socioprofissional dos docentes na escola, tendo em apreço o espaço temporal (que decorre ao longo de um ano lectivo), o tempo de trabalho individual e em grupo, entre outras ocupações inerentes ao trabalho didáctico-pegadógico na escola.

No decurso da investigação, considerámos que a interpretação do conceito “cultura” tornar-se-ia importante no quadro do desenvolvimento da pesquisa empírica, tendo em atenção a possibilidade de mudança de atitudes e de comportamentos dos docentes em relação ao trabalho realizado no campo social e escolar. Assim, a abordagem metodológica sobre os modelos didáctico-pedagógicos utilizados pelos professores teve em linha de conta as grelhas de observação, a troca de materiais e recursos, as planificações, a elaboração das fichas de apoio, entre outras experiências pessoais e profissionais vividas no espaço escolar. A ajuizar pelas declarações de Caria (2000), seria interessante conhecer as rotinas de trabalho dos grupos disciplinares e de docência cientes de que existe uma proliferação de estilos mais individualizados de ser e de estar na profissão, não imediatamente integráveis nos padrões de conduta do grupo. Esta postura mais individual não deve ser ignorada; pelo contrário, o grupo de pertença deve encará-la como uma forma de cultura com objectivo de trazer o docente para o espaço social e de pertença onde poderá partilhar as suas experiências, saberes e conhecimentos com os pares.

Neste caso, e segundo o plano das interacções individual e social, Caria (obra citada:197-198) valoriza o papel mediador da cultura referindo-se, a propósito que ela “vive

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da necessidade de gerir a heterogeneidade (histórica e inter-individual), garantindo simultaneamente que os indivíduos nas suas diversidades (histórica e biológica) se continuem a reconhecer subjectivamente como parte de um mesmo «nós», continuem a pensar-se na acção e a pensar sobre a acção, dentro dos mesmos princípios estruturantes da interacção, como todo único, uma cultura”. Do ponto de vista profissional interessava-nos compreender o quotidiano do professor na sua tarefa escolar, os seus conhecimentos e experiências profissionais, bem como os constrangimentos e problemas associados à profissão docente. Por ora, e no quadro desta problemática, propomo-nos interpretar o espírito e as competências relacionais dos professores no desempenho da sua actividade profissional no seio do grupo e nos conselhos de turma. Começámos por valorizar a dinâmica auto-reguladora dos grupos disciplinares e dos conselhos de turma a partir das várias tipologias de trabalho existentes na escola e nos grupos disciplinares. Importa referir novamente que os professores intervenientes na pesquisa são colegas de profissão atentos à problemática do processo de ensino e de aprendizagem que, desde logo, anuiram a sua disponibilidade e prestimosa colaboração. Realçamos, deste modo, a elevada correcção moral e profissional dos professores respondentes, bem como a percepção e o conhecimento que eles têm uns dos outros, apesar das contingências e dos constrangimentos socioprofissionais. Situando-nos sobre a problemática da cultura profissional docente, diríamos que, apesar do debate teórico levado a cabo nas páginas anteriores, fica-nos a sensação que conhecemos ainda muito pouco acerca do que os professores pensam das suas próprias experiências, saberes e práticas pedagógicas e profissionais.

Apesar destas limitações entendemos que seria mais sensato interrogar este grupo de professores sobre o assunto em debate – o individualismo e o trabalho cooperativo na profissão docente – confrontando-os com um conjunto vasto de questões que julgámos serem pertinentes para a clarificação das suas respostas. A natureza dos saberes e das experiências profissionais docentes que trazem consigo constitui, agora, um ponto de reflexão comum sobre as suas perspectivas filosóficas, psicossociais e pedagógicas, tendo em conta a riqueza e a variabilidade individual dos seus discursos e opiniões. Esta diversidade de perspectivas pessoais e profissionais dos professores levou-nos a compreender melhor os fenómenos como o isolamento e o individualismo na profissão docente, nomeadamente alguns factores circunstanciais como a origem, as causas e a evolução contextual desses conceitos no panorama educacional da escola onde decorre a pesquisa. As estratégias metodológicas que adoptamos adiante consistem em contextualizar, de forma sumária, o conteúdo das histórias

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narradas pelos professores intervenientes no estudo, os relatos produzidos pelos mesmos, a partir das entrevistas e dos questionários exploratórios aplicados, cujas respostas constituem fontes enriquecedoras para uma melhor compreensão e conhecimento da problemática em estudo. Assim sendo, procurámos garantir a consubstancialidade científica ao enquadramento teórico-conceptual traçado para o estudo. Os dados empíricos recolhidos ajudar-nos-ão a entender melhor o percurso profissional de cada professor no desempenho das suas tarefas e funções pedagógicas nesta escola em concreto. Os documentos empíricos utilizados tiveram como referência prioritária a pessoa do professor interveniente no estudo numa perspectiva sociológica, ou seja, a partir do próprio discurso oral implementado (entrevistas) e dos registos escritos (questionários). Deste modo, os resultados da análise, o enquadramento metodológico das opiniões dos professores respondentes constituem um suporte heurístico do percurso efectuado ao longo do estudo. Em certa medida, valorizámos outros olhares diferentes sobre a problemática em análise, que, neste momento, poderão ajudar-nos a compreender melhor as situações complexas inerentes à vida dos professores em contexto de trabalho escolar. Assim, cremos ser coerente pensar que a investigação sistemática dos dados empíricos que vamos apresentar adiante requer imparcialidade, rigor e coerência científica, tendo em conta o conhecimento e a percepção empírica que temos da situação em análise.