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3. Ecologia Industrial: conceitos, instrumentos e experiências

4.1 Parques Industriais Ecológicos clássicos: metodologia de implantação

4.1.3 Operação

Na fase de operação, os gestores do PIE são responsáveis por gerir e operacionalizar todos os serviços e áreas comuns do PIE, atuando de forma a manter a integração entre as indústrias instaladas no PIE, operacionalizar as sinergias existentes entre as mesmas, identificar novas sinergias e estimular a sua operacionalização, bem como manter a atratividade do PIE para novas empresas. Alguns elementos-chave relacionados à operação dos PIE são discutidos a seguir.

a) Gestão do PIE

A gestão de um PIE envolve o gerenciamento das partes e interesses comuns a todas as indústrias instaladas no mesmo. A equipe responsável pela gestão do PIE deve gerenciar os serviços e áreas comuns direta ou indiretamente, isto é, por meio de seu quadro de profissionais ou através da contratação de empresas especializadas em tais serviços.

Deve ainda assegurar que as empresas instaladas no PIE conheçam e cumpram um conjunto de regras e regulamentos referentes à conduta a ser seguida no PIE, às regras de uso de serviços e áreas comuns, aos direitos individuais e coletivos, bem como às contribuições das indústrias para as despesas de custeio comum, de forma a assegurar o bom funcionamento do PIE e o alcance dos objetivos econômicos, ambientais e sociais almejados (VEIGA, 2007). Para tal, pode ser definida uma convenção, agrupando as regras mencionadas e ainda os mecanismos para eleição dos gestores do PIE e de sua equipe, suas atribuições, o funcionamento das assembleias gerais e as regras para alteração da convenção do PIE.

Caso o PIE possua um sistema de gestão ambiental, caberá ainda à equipe gestora do PIE assegurar que todas as empresas localizadas no mesmo conheçam o sistema implementado, sua política, objetivos e metas, bem como os procedimentos a serem seguidos. Cabe destacar que as empresas instaladas em um PIE podem se beneficiar de simplificações administrativas como, por exemplo, a existência de licença ambiental para

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o PIE, abrangendo a operação de toda a infraestrutura comum do PIE, o que elimina a necessidade de que cada empresa possua tal infraestrutura e licencie a mesma junto aos órgãos ambientais (TADDEO, 2016).

b) Serviços comuns

A provisão centralizada de serviços para as empresas instaladas em um PIE consiste em uma das tipologias de SI identificadas na literatura (CHERTOW, 2007; BOONS et al., 2016), incluindo desde serviços básicos como segurança, jardinagem, limpeza e transporte (TADDEO, 2016), até serviços mais complexos como gestão de resíduos e consultoria técnica especializada relacionada, por exemplo, à conformidade legal (BELLANTUONO, 2017).

Com relação à gestão de resíduos, a provisão centralizada de serviços de coleta e transporte de resíduos é apontado como uma forma de reduzir o tráfego de veículos e melhorar a logística relacionada à destinação dos resíduos, por meio da elaboração de programações de coleta e o uso de rotas otimizadas (TSENG e BUI, 2017). Além disso, a contratação de uma empresa externa especializada em gestão de resíduos foi identificada como uma estratégia capaz de reduzir custos operacionais, contribuir para a destinação de resíduos prioritariamente para reuso e reciclagem (por meio da inserção de cláusulas contratuais específicas) e fortalecer a parceria entre as empresas geradoras de resíduos envolvidas (TSENG e BUI, 2017).

c) Intercâmbio de sub-produtos e resíduos

O processo de intercâmbio de sub-produtos e resíduos em um PIE envolve negociações entre empresas e elaboração de contratos para estabelecer os termos das relações comerciais como qualidade e quantidade dos sub-produtos/resíduos fornecidos, forma de entrega e valores envolvidos. A atuação de um agente central para gerenciar ou intermediar o processo de intercâmbio de resíduos pode impulsionar a participação das indústrias nesse processo, por meio: (i) do fornecimento de apoio para a formalização dos contratos necessários para operacionalizar a troca de resíduos, (ii) da análise dos dados das indústrias co-localizadas no PIE visando identificar potenciais oportunidades de troca de resíduos, (iii) do desenvolvimento de uma estratégia que permita expandir a troca de

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resíduos do PIE para a região em que ele se encontra, (iv) da criação e manutenção de um mix de indústrias que ofereça diversas oportunidades de troca de resíduos (LOWE, 2005). Em um modelo ideal, todos os subprodutos e resíduos gerados no PIE seriam aproveitados em processos produtivos presentes no mesmo, enquanto em situações comumente observadas nos PIE apenas parte dos subprodutos e resíduos são aproveitados internamente e o restante é destinado externamente (FELICIO et al., 2016).

Nesse contexto, a expansão da troca de sub-produtos e resíduos para toda a região em que o PIE está instalado pode contribuir para o aumento da reinserção dos mesmos nos processos produtivos. As redes eco-industriais formadas pelas indústrias envolvidas na troca de sub-produtos e resíduos podem, dessa forma, não estar limitadas às fronteiras do PIE. Comumente, essas redes são analisadas a partir de seus nós (indústrias participantes) e de suas cordas (conexões entre as indústrias envolvidas) (ASHTON, 2008; SCHILLER et al., 2014).

Trabalhos recentes (ZENG et al., 2013, LI et al., 2017) tem investigado a vulnerabilidade das redes de SI, tendo-se observado que as mesmas são suscetíveis a: (i) variações eventuais de processos resultantes de falhas de equipamentos ou erros operacionais que impactam o fluxo de sub-produtos gerados, (ii) mudanças definitivas nos processos operacionais de uma empresa alterando os sub-produtos gerados, (iii) alterações nas características ou quantidades dos sub-produtos gerados, (iv) colapso de empresas que participavam da rede (LI e SHI, 2015).

Perturbações em apenas uma das empresas envolvidas (nó da rede) podem apresentar um efeito em cascata, impactando todo o restante da rede (ALLENBY e FINK, 2005; BOONS e SPEKKINK, 2012). LI et al. (2017) avaliaram a influência de diferentes empresas sobre a rede de SI do PIE de Qijiang na China, a partir de simulações que envolveram a remoção de nós da rede (empresas) e de cordas (relações entre empresas). Os autores verificaram que empresas localizadas no início (montante) da sequência de relações de simbiose formada apresentam maior influência sobre a rede como um todo. Os autores propõem três medidas para reduzir a vulnerabilidade da rede: (i) assim como em outras relações de fornecimento, é importante buscar-se mais de um fornecedor para um dado resíduo ou sub-produto empregado como insumo nos processos produtivos das principais empresas do PIE, seja ele um fornecedor interno ou externo, de modo a evitar que flutuações de um fornecedor impactem negativamente a rede de SI como um todo;

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(ii) assegurar que a infraestrutura do PIE esteja sempre adequada à operacionalização das trocas de resíduos, sub-produtos, água e energia, promovendo reformas, ampliações e modificações, sempre que necessário, para contribuir para a manutenção das relações (iii) monitorar continuamente a qualidade e a quantidade dos principais sub-produtos e resíduos envolvidos nas relações de simbiose presentes nos PIE.

A partir do exposto, torna-se evidente que a operacionalização das relações de troca de sub-produtos e resíduos nos PIEs apresenta uma complexidade que se estende além da identificação de oportunidades de troca de resíduos entre empresas, envolvendo a dinâmica de mercado na qual essas empresas estão inseridas.

d) Outras práticas inter-organizacionais

Além das práticas já mencionadas, outras práticas inter-organizacionais propiciadas pela co-localização entre as empresas que compõem um PIE podem ser adotadas como, por exemplo, a realização de programas de treinamento conjuntos entre as empresas, ao menos, no que diz respeito a questões relacionadas à sustentabilidade e demais assuntos de interesse comum.

Dentre as práticas inter-organizacionais que podem ser adotadas em PIEs, a gestão ambiental das cadeias de suprimentos merece destaque. Em uma visão convencional, cadeias de suprimentos são estruturas lineares em que bens são conduzidos de fornecedores para transformadores, atacadistas, varejistas e aos consumidores finais (LAMBERT et al., 1996). Definições mais recentes incorporam, além do fluxo de materiais, os fluxos de serviços, de recursos financeiros e de informações (MENTZER et al., 2001), além da possibilidade de o relacionamento entre as organizações se dar não apenas de maneira sequencial, mas também na forma de redes (PIRES, 2004).

As cadeias de suprimentos são, portanto, redes de organizações conectadas e interdependentes, por meio das quais matéria flui nos sistemas industriais. A EI tem por objetivo otimizar o fluxo de matéria e energia nos sistemas industriais. Assim, a gestão das cadeias de suprimentos torna-se relevante no contexto dos PIEs, conforme mencionado por BELLANTUONO (2017).

Nos últimos anos, a gestão de cadeias de suprimentos teve seus principais processos revistos sob a ótica ambiental. A incorporação de ações voltadas à redução dos impactos ambientais ao longo das cadeias de suprimentos deu origem à chamada gestão ambiental

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da cadeia de suprimentos. As definições para gestão ambiental da cadeia de suprimentos apresentam diferentes enfoques, conforme compilado por AHI e SEARCY (2013). Há desde definições de caráter geral como, por exemplo, a integração de preocupações ambientais nas práticas inter-organizacionais adotadas na gestão de cadeia de suprimentos (SARKIS et al., 2011) até definições que dão enfoque à gestão de fornecedores (LEE e KLASSEN, 2008; GAVRONSKI et al., 2011), enquanto outras apresentam uma perspectiva focada no produto (SRIVASTA, 2007; H’MIDA e LAKHAL, 2007; WEE et al., 2011).

A partir das definições identificadas na literatura, depreende-se que a gestão ambiental da cadeia de suprimentos envolve uma ampla faixa de atividades. Não há na literatura um consenso quanto às atividades e processos que compõem a gestão ambiental da cadeia de suprimentos. Entretanto, seis processos são comumente citados (ELTAYEB et al., 2011; CHUN et al., 2015; LEIGH e LI, 2015; SCUR e BARBOSA, 2017). A Tabela 9 apresenta resumidamente tais processos.

Pode-se observar que vários desses processos baseiam-se em premissas alinhadas à EI, de forma que a sua implementação em PIE pode contribuir para o alcance dos objetivos ambientais dos mesmos, transcendendo, inclusive, as suas fronteiras, uma vez que as cadeias de suprimentos das empresas localizadas em um PIE não se encontram totalmente contidas no interior de suas fronteiras.

87 Tabela 9. Principais atividades contempladas em cada um dos processos.

Processo Descrição

Eco-design Eco-design refere-se à busca pelo desenvolvimento de produtos que gerem menor impacto ambiental. Atividades de eco-design contemplam a eliminação do uso de substâncias tóxicas nos produtos desenvolvidos, a redução do uso de matéria-prima e energia durante o uso dos produtos e ao desenvolvimento de projetos que facilitem o reuso, a reciclagem e a remanufatura ao final do ciclo de vida dos produtos desenvolvidos.

Gestão ambiental de

suprimentos

A gestão ambiental de suprimentos refere-se à iniciativas que buscam assegurar que os produtos adquiridos estejam de acordo com certos critérios ambientais definidos pela empresa. Inclui atividades como o desenvolvimento de especificações técnicas de compra que considerem atributos ambientais (ausência de substâncias tóxicas, composição baseada em materiais reciclados ou recicláveis, dentre outros).

Gestão ambiental da

manufatura

A gestão ambiental da manufatura refere-se à aplicação de princípios, técnicas e operações sustentáveis no processo de manufatura de um produto. Abrange a maximização da eficiência no uso de energia e de matérias- primas, assim como, a minimização da geração de resíduos perigosos nos processos produtivos.

Logística reversa

Logística reversa é o processo relacionado à implementação do fluxo reverso na cadeia de suprimentos, visando o melhor aproveitamento dos materiais ou produtos retornados pelos consumidores, por meio da recuperação, remanufatura ou reciclagem dos mesmos.

Gestão ambiental de fornecedores

A gestão ambiental dos fornecedores compreende práticas de controle e de colaboração ambiental com fornecedores. Práticas de controle incluem a seleção de fornecedores baseada em critérios ambientais e a realização de auditorias em fornecedores, visando a avaliação de seu desempenho ambiental. Práticas de colaboração referem-se às atividades realizadas pela empresa com o objetivo de contribuir para a melhoria do desempenho ambiental de seus fornecedores. Incluem atividades de treinamento, suporte técnico, investimento em programas ambientais dos fornecedores, disseminação de boas práticas e realização de programas ou atividades em conjunto.

Gestão ambiental de

clientes

De forma similar à gestão ambiental de fornecedores, a gestão ambiental de clientes refere-se às ações tomadas por uma determinada empresa visando contribuir para a melhoria do desempenho ambiental de seus clientes. Inclui práticas de intercâmbio de informações técnicas com clientes, treinamentos, suporte técnico e realização de atividades conjuntas. Pode ser interpretada também como a gestão focada na identificação dos requisitos ambientais exigidos pelos clientes e no seu pleno atendimento.

Fonte: Elaborado com base em SEURING e MUELLER, 2008; ELTAYEB et al., 2011; ANDIÇ et al., 2012; CHUN et al., 2015; LEIGH e LI, 2015; LUZZINI et al., 2015; PIMENTA

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