• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 2 – METODOLOGIA

2.1 Orientação metodológica adota na pesquisa

Esta pesquisa é qualitativa e a metodologia adotada nela é a abordagem hermenêutico- fenomenológica, desenvolvida por Freire (2007, 2010, 2012), sendo uma evolução da proposta apresentada por van Manen (1990). Essa abordagem busca compreender os significados das experiências vividas, porque […] a vida mesma contém saber” (GADAMER, 1999, p. 359).

As experiências acontecem no fluxo temporal e, uma vez que só podemos ter experiências do momento presente, não é possível vivê-las e pensar sobre elas simultaneamente. Ao sucederem umas às outras, elas se articulam, podendo ser percebidas como memória e, assim se constituem em experiências na medida que temos uma consciência reflexiva delas, já que “[...] a interiorização (Innesein), que caracteriza a vivência, contém uma espécie de retorno da vida sobre si mesma” (Gadamer, 1999, p. 359). Segundo Freire (2012, p. 183), “O relacionamento entre as experiências passadas e as mais recentes origina uma corrente de conexões e continuidades que […] é objetivamente capturada pela reflexão.”

Partindo dessa concepção de experiência, a abordagem hermenêutico-fenomenlológica é uma metodologia de pesquisa igualmente hermenêutica e fenomenológica. A ênfase para a igualdade de ambas a vertentes sestá formalmente marcada no hífen que, ao unir duas palavras conceitualmente diferentes em um único substantivo, constitui um conceito novo, em que nenhum dos significados relacionados às palavras primitivas tem preponderância sobre o outro. Essa é uma diferença entre as propostas de Freire (2007, 2010, 2012) e van Manen (1990): a proposta hermenêutica fenomenológica desse autor deu mais ênfase ao componente fenomenológico do par, enquanto a proposta hermenêutico-fenomenológica da autora coloca- os em pé de igualdade. Isso tem consequências para a abordagem hermenêutico- fenomenlógica, como proposta por Freire, cuja pesquisa resulta substancialmente diferente da proposta por van Manen.

flertavam, sem se darem conta, nos pensamentos de Dilthey e Husserl (BIEMEL, 1957) e, finalmente se encontram na obra de Heidegger (2008), em cujo Ser e tempo são articuladas numa única metodologia de investigação filosófica. O que van Manen (1990) e Freire (2007, 2010, 2012) fazem é pensá-las na constituição de uma metodologia de pesquisa, de orientação pedagógica, nas ciências humanas.

Embora conceituar as duas filosofias em alguns parágrafos seja tarefa impossível, é necessário fazê-lo, pelo menos parcialmente, para uma correta compreensão da abordagem hemenêutico-fenomenológica. Segundo Freire (2012, p. 185):

[…] a fenomenologia contempla as experiências vividas de um ponto de vista retrospectivo e descritivo, buscando desvendar a essência e as qualidades de um certo fenômeno, sob a perspectiva de quem o vivencia, percebe, intuitivamente interpreta e a ele se refere. A fenomenologia, portanto, procura um entendimento mais profundo das experiências cotidianas, preocupando-se com a forma como são imediatamente percebidas, ao invés de defini-las e/ou categorizá-las previamente.

A hermenêutica é interpretação e a compreensão hermenêutica é um processo linguístico, estando sujeita à negociação dos sentidos, mas “São as situações em que se conturba e se dificulta o por-se de acordo, nas que com mais facilidade se tornam conscientes as condições sob as quais se realiza qualquer entendimento” (Gadamer, 1999, p. 560). Por ser uma atividade eminentemente de linguagem, a interpretação hermenêutica tem uma historicidade e está sujeita às determinações do ser de linguagem que interpreta, por isso a hermenêutica não tem a pretensão da verdade absoluta, já que “[...] por mais que tendamos à verdade incondicional, somos remetidos ao nosso mundo histórico, que é o espaço em que se abre para nós a verdade” (CORETH, 1973, p. 192.

O texto é o objeto ao qual a hermenêutica dedica sua compreensão, uma vez que, segundo Gadamer (1999, p. 568, 569):

Na escrita se engendra a libertação da linguagem com relação a sua realização. Sobre a forma de escrita, todo o transmitido está simultaneamente aí para qualquer presente. Nela se dá uma coexistência de presente e passado única em seu gênero, pois a consciência presente tem a possibilidade de um acesso livre a tudo quanto se haja transmitido por escrito.

[…]

É assim que se coloca a verdadeira tarefa hermenêutica. Escrita é autoalheamento. Sua superação, a leitura do texto, é pois a mais elevada tarefa da compreensão.

mesmo movimento de compreensão, em que a primeira apresenta as coisas mesmas para serem interpretadas pela segunda. Já para van Manen (1990, p. 4) a fenomenologia descreve a orientação para a experiência vivida e a hermenêutica descreve a interpretação dos textos da vida. O conceito de Van Manen deve-se à sua proposta de uma abordagem de pesquisa com padrões pedagógicos, cujo “modelo fundamental é a reflexão textual sobre as experiências vividas e ações práticas da vida do dia a dia, com o objetivo do desenvolvimento do cuidado e das habilidades práticas”. Para o autor, o que há de novo em sua proposta é que a pesquisa e a escrita são atividades pedagógicas quase inseparáveis. Para o autor a reflexão exigida pela escrita hermenêutica sobre os significados dos fenômenos da experiência é essencial para a pesquisa pedagógica.

Assim, tendo em vista as perspectivas teórico-metodológicas e sociais da abordagem, que partem da vida e retornam para a vida, me atenho ao que dizem van Manen e Freire, para expressar o significado, mesmo que incompleto, de uma pesquisa que procura unir as vertentes filosóficas em questão:

[…] é uma metodologia descritiva (fenomenológica) porque quer estar atenta para como as coisas aparecem e quer deixar as coisas falarem por si mesmas; é uma metodologia interpretativa (hermenêutica) porque reivindica que não há nada que não seja fenômeno interpretado (van MANEN,1990, p.180).

[…] a pesquisa hermenêutico-fenomenológica […] visa compreender, de forma mais aprofundada, uma experiência de vida, um fenômeno, sob a perspectiva de quem o vivencia, num determinado momento social e histórico, e, portanto, simultaneamente revela significado e importância pessoal e social, na medida em que revela fatores qualitativos dos indivíduos, suas histórias, seus comportamentos e suas experiências situadas em uma determinada dimensão espaço-temporal. (FREIRE, 2012, p. 196)

Descrever e interpretar para compreender, compreender para viver mais profundamente e agir mais humanamente. Os textos da experiência vivida, uma carta, uma entrevista, um depoimento, um diálogo reflexivo, etc... sob o olhar investigativo hermenêutico-fenomenológico, revelam fenômenos que dão sentido e relevância às vivências e nos proporcionam a disposição para vivências e experiências mais significativas

Documentos relacionados