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Orientações curriculares e Metas de aprendizagem da Língua Portuguesa

CAPÍTULO 1- Enquadramento e fundamentação teórica

1.2. Orientações curriculares e Metas de aprendizagem da Língua Portuguesa

A aprendizagem, nos dias de hoje, está muito associada à construção de conhecimento e pode ser entendida como

um processo de transformação dos conhecimentos que temos (teóricos, práticos, emocionais), que podem ser parcelares ou mesmo erróneos, em outros que permitam compreender e agir sobre o mundo com que interagimos de forma adequada e eficaz (Santos et al., 2010, p. 82).

A aprendizagem é pois um processo complexo de (re)construção pessoal que implica uma relação com os outros através da utilização de objectos de mediação de natureza diversificada (por exemplo, esquemas de interpretação, sinais, símbolos) (Santos, et al. 2010). A linguagem é, por excelência, o objecto de mediação fundamental neste processo, pois é através dela que estabelecemos as interacções com os outros e lhes transmitimos os nossos pensamentos. Desta forma, como referem Santos et al. (2010), a linguagem “não só ajuda a estruturar o próprio pensamento como também nos permite o confronto do que pensamos com o que os outros pensam, alargando e enriquecendo o conhecimento de cada um” (p. 82). A acção que o professor desempenha neste processo desenvolve-se através da partilha de significados com o aluno e da orientação que proporciona, garantindo que a aprendizagem lhe seja acessível.

Os actuais Programas de Português do Ensino Básico atribuem ao professor de Português a função de “agente do desenvolvimento curricular” (Ministério da Educação [ME], 2009, p. 9) com a capacidade de “tomar as decisões de operacionalização [das propostas apresentadas pelo programa] (…) adaptando-as à realidade educativa da sua escola e da sala de aula” (p. 9). Esta função do professor é vista como uma “valorização do importante papel que lhe está destinado” (p. 9).

Os programas valorizam também o princípio da progressão das aprendizagens, isto é, a aprendizagem da língua apoia-se em aprendizagens anteriores, que vão gradualmente progredindo e se vão, também, alargando e complexificando.

Outro princípio igualmente em destaque é o princípio da transversalidade. Este princípio realça a importância da língua como factor que condiciona ou favorece quer a relação do aluno com o mundo e com aqueles que o rodeiam quer o seu processo de aprendizagem, pois o sucesso ou o insucesso escolar dependem do seu correcto domínio.

A noção de competência apresentada pelos programas retoma a definição proposta pelo Currículo Nacional do Ensino Básico (Departamento da Educação Básica [DEB], 2001), que define competência como noção que “integra conhecimentos, capacidades e atitudes e que pode ser entendida como saber em acção ou em uso” (p. 9) e se aproxima do conceito de literacia (conceito que tem vindo ao longo do tempo a sofrer algumas evoluções no seu significado e que iremos definir de acordo com a proposta de Gomes, Ávila, Sebastião e Costa (2000, p. 1) como “a capacidade de processamento, na vida diária – social, profissional e pessoal –, de informação escrita de uso corrente contida em materiais impressos vários – textos, documentos, gráficos –”). Esta noção de competência passa a ser enquadrada em quatro grandes eixos de actuação, articulados entre si:

- o eixo da experiência humana, onde se situa a tensão entre a individualidade e a comunidade;

- o eixo da comunicação linguística, dominado pela interacção do sujeito linguístico com os outros;

- o eixo do conhecimento linguístico, centrado na progressiva capacidade de descrição da língua e na sua utilização proficiente e continuada;

- o eixo do conhecimento metalinguístico, que remete para a relação da língua com a aquisição de outros saberes a que ela dá acesso e que por seu intermédio são representados (ME, 2009, p. 13).

As orientações curriculares estão assim organizadas por competências, entendidas como “o conjunto dos conhecimentos e das capacidades que permitem a realização de acções, bem como a compreensão dos comportamentos de outrem” (ME, 2009, p. 15) que, por sua vez, aparecem compartimentadas em três grupos: as competências gerais, as competências linguístico-comunicativas e as competências específicas.

As competências gerais são as que “permitem realizar actividades de todos os tipos, incluindo as actividades linguísticas” (p. 15) e incluem a competência de realização, entendida como “capacidade para articular o saber e o fazer” (p. 15); a competência existencial, que é definida como “capacidade para afirmar modos de ser e modos de estar” (p. 15); a competência de aprendizagem, apresentada como “capacidade para apreender o saber” (p. 15); o conhecimento declarativo, que é entendido como “capacidade para explicitar os resultados da aprendizagem formal, articulada com o conhecimento implícito decorrente da experiência” (p. 15).

As competências linguístico-comunicativas são as que “permitem a um indivíduo agir, utilizando instrumentos linguísticos, para efeitos de relacionamento com os outros e com o mundo” (p. 15).

As competências específicas estão implicadas nas actividades linguísticas e são as seguintes:

- a compreensão do oral, que é entendida como “a capacidade para atribuir significado a discursos orais em diferentes variedades do português” envolvendo “a recepção e a descodificação de mensagens por acesso a conhecimento organizado na memória” (p. 16);

- a expressão oral, que é a “capacidade para produzir sequências fónicas dotadas de significado e conformes à gramática da língua” implicando “a mobilização de saberes linguísticos e sociais” e pressupondo “uma atitude cooperativa na

interacção comunicativa, bem como o conhecimento dos papéis desempenhados pelos falantes em cada tipo de situação” (p. 16);

- a leitura, entendida como o “processo interactivo que se estabelece entre o leitor e o texto, em que o primeiro apreende e reconstrói o significado ou os significados do segundo” (p. 16). Esta competência remete para diversos processos de actuação interligados (decifração de sequências grafemáticas, acesso a informação semântica, construção de conhecimento, etc.), podendo também ser compreendida como “actividade que incide sobre textos em diversos suportes e linguagens, para além da escrita verbal” (p.16);

- a escrita, referida como “o resultado, dotado de significado e conforme à gramática da língua, de um processo de fixação linguística que convoca o conhecimento do sistema de representação gráfica adoptado, bem como processos cognitivos e translinguísticos complexos (planeamento, textualização, revisão, correcção e reformulação do texto)” (p. 16);

- o conhecimento explícito da língua, que é entendido como “a reflectida capacidade para sistematizar unidades, regras e processos gramaticais do idioma, levando à identificação e à correcção do erro”. Esta competência apoia-se na “instrução formal e implica o desenvolvimento de processos metacognitivos” (p. 16).

A noção de competência, associada aos conceitos de descritor de desempenho, definido como “um enunciado sintético, preciso e objectivo, indicando o que se espera que o aluno seja capaz de fazer” (p. 17) e de indicador de desempenho, “associado às operações de controlo, de regulação ou de avaliação” e “passível de quantificação e idealmente parametrizável” (p. 17), aparece assim como elemento central do trabalho do professor e é valorizada relativamente aos conteúdos que, juntamente com os seus respectivos processos de operacionalização, eram, contrariamente, as noções nucleares em destaque nos programas anteriores.

Inserido na Estratégia Global de Desenvolvimento do Currículo Nacional delineada pelo Ministério da Educação em Dezembro de 2009 foi divulgado, no sítio web da Direcção Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular, como referencial de aprendizagem de cada ciclo do ensino básico, o Projecto “Metas de Aprendizagem”. A

primeira fase teve início em Janeiro de 2010 e centrou-se na elaboração das Metas de Aprendizagem para a Educação Pré-Escolar e para o Ensino Básico. Como se indica na “Introdução 2.º Ciclo – Língua Portuguesa” (Sim-Sim (Coord.), Duarte, Duarte, Barbeiro & Pereira, n.d.), as Metas de Aprendizagem de Língua Portuguesa para este ciclo de ensino têm como objectivo “melhorar desempenhos escolares” e “definir os conhecimentos que todos os alunos devem atingir na língua de escolarização como resultado de actividades formais de ensino” (p. 1). Desta forma, os referenciais de aprendizagem da Língua Portuguesa foram organizados em domínios de referência, correspondendo às áreas de convergência dos saberes das competências do Currículo Nacional do Ensino Básico. Por sua vez, as metas de cada domínio de referência foram organizadas em subdomínios, os organizadores da aprendizagem, de forma a permitir “uma leitura sectorial de todos os referenciais de aprendizagem por organizador ou uma leitura mais abrangente por domínio de referência” (p. 2). De acordo com este documento, os domínios de referência são os seguintes:

i) Compreender discursos orais e cooperar em situação de interacção; ii) Exprimir oralmente ideias e conhecimentos;

Estes domínios consubstanciam a importância de aprender a interagir oralmente em situações formais, utilizando um discurso fluente e adequado.

iii) Decifrar e escrever palavras;

iv) Compreender e interpretar textos escritos; v) Tornar-se leitor;

vi) Elaborar e divulgar textos;

vii) Reconhecer e produzir diferentes géneros e tipos de textos.

Estes domínios consubstanciam as aprendizagens específicas referentes ao acesso e ao domínio da linguagem escrita.

viii) Conhecer as propriedades das palavras e alargar o capital lexical; ix) Estruturar e analisar unidades sintácticas.

Estes domínios consubstanciam o domínio dos processos sintácticos que determinam a estruturação de frases e as aprendizagens específicas sobre o conhecimento das propriedades das palavras, sendo conhecimentos estruturantes necessários a um uso produtivo e criativo da língua em situações orais e escritas (p. 2).

Em cada domínio existem entre seis a oito sub-domínios, os organizadores da aprendizagem, que têm uma função de grande importância no desenvolvimento da cada meta de aprendizagem e estabelecem, ao mesmo tempo, pontes entre os domínios. O princípio da progressão entre os três ciclos do ensino básico, atrás referenciado, determina uma leitura horizontal que permita reconhecer os “pontos de referência para os docentes na sua prática lectiva, localizar o marco de aprendizagem anterior e o marco de aprendizagem seguinte e construir itens de avaliação referenciados a critério” (p. 2), fundamentais na avaliação interna ou externa das aprendizagens dos alunos. Devido a este princípio de progressão, as metas de final de ciclo são sempre assumidas como metas intermédias no ciclo seguinte, podendo, nalguns casos, repetir-se, com um maior grau de complexidade, no ciclo imediato. A supressão na sequência descritiva da explicitação de uma meta num determinado ciclo de escolaridade significa que ou a aprendizagem já está consolidada ou que está ainda em processo de desenvolvimento, sendo, por isso, consolidada no ciclo seguinte. Importa, desta forma, que o professor continue a mobilizar conhecimentos, processos e estratégias relacionados com a meta suprimida, de maneira a que estes continuem activos ao longo do percurso escolar dos alunos.

Estas metas de aprendizagem foram elaboradas como “um todo (…) tendo como vectores a articulação entre os diversos Domínios de Referência dentro de cada ciclo de escolaridade e a progressão horizontal em cada Domínio, permitindo relacionar diversas aprendizagens simultaneamente entre si e com o nível de escolaridade a que dizem respeito” (p. 2).

Em nosso entender, as metas de aprendizagem apresentam dois aspectos positivos, são úteis para o professor poder gerir de forma mais adequada e mais consistente o currículo da disciplina, pois assim sabe que objectivos os seus alunos deverão atingir no final de cada ciclo e, ao identificarem os resultados esperados da aprendizagem, podem apresentar-se como recursos indispensáveis para a avaliação das aprendizagens dos alunos.

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