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Origem e características do soro de queijo

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 SORO DE QUEIJO

2.1.1 Origem e características do soro de queijo

O soro é um subproduto da indústria de lacticínios. Tratando-se da principal corrente orgânica resultante do processo do fabrico de queijo, o soro é o líquido remanescente após a precipitação e remoção da caseína do leite, e apresenta cor turva amarelada devido à presença de riboflavina (vitamina B2). Apesar de existirem diversos tipos de soro (derivados dos diferentes tipos de queijo fabricados), estes podem agrupar-se em dois géneros principais, dependendo do processo utilizado para a precipitação da caseína: soro doce (com pH maior que 5), resultante da coagulação induzida por coalho, e soro ácido (com pH menor que 5), resultante da fermentação ou adição de ácidos orgânicos ou minerais para coagular a caseína (de Wit, 2001). A actual produção mundial é anualmente estimada em cerca de 180 – 190 Mt, das quais apenas 50% é processada para valorização dos componentes em produtos alimentares, sendo o excedente considerado como um resíduo (Mollea et al., 2013).

A obtenção do soro decorre das várias etapas do processo de fabrico de queijos. A título de exemplo, ilustra-se na Figura 2-1 o processo industrial de fabrico de queijo semi-duro. O leite fresco é inicialmente sujeito a um processo de padronização (1) do seu teor de gordura (ajuste a um teor entre 2,5 e 3,5% de lípidos, consoante as características desejadas), após o qual é sujeito a pasteurização (2) para inactivação de microrganismos contaminantes. Em seguida, o leite é arrefecido e inoculado com uma mistura contendo uma cultura de bactérias de ácido láctico e coalho (para conferir determinados sabores ao queijo), que é habitualmente constituído por enzimas naturalmente presentes no estômago de bezerros jovens. Esta etapa (3) destina-se a induzir a gelificação/coagulação da caseína. O gel de leite é formado em repouso (4) e posteriormente cortado em cubos (5). Estes cubos serão precipitados em coalhada, remanescendo um líquido sobrenadante (soro) que é removido em cerca de 30% do seu volume (6), e substituído pelo mesmo volume de água quente (7). Este processo promove a redução do tamanho das partículas da coalhada. Depois de agitada (8), a coalhada é comprimida em prensas e transferida para uma coluna de grandes dimensões, aonde é novamente comprimida por acção da gravidade, resultando numa nova separação e purga de soro (9). A coalhada com a consistência pretendida é então cortada nos tamanhos comerciais (10), moldada (11), e novamente comprimida (12). Seguem-se os processos sequenciais de pós-produção, nomeadamente os processos de repouso (para equilibrar a humidade do queijo) (13), salmoura (14) e

cura (15). Habitualmente, o soro obtido dos drenos processuais contém 0,2 a 0,5% de gordura que, após separação, é normalmente reutilizada na padronização do leite (de Wit, 2001).

Figura 2-1: Diagrama processual do fabrico de queijo semi-duro [adaptado de: de Wit ( 2001)]

De acordo com estimativas oficiais (INE, 1996-2011), a produção anual de soro em Portugal tem sido bastante variável, conforme se ilustra na Figura 2-2. Tal como acontece à escala mundial, um estudo de mercado realizado para a Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios refere que apenas 60% da quantidade de soro produzida em Portugal é passível de recolha para valorização directa (TECNINVEST, 2001). Entre as valorizações mais comuns para o soro, destacam-se, entre outros, o fabrico de queijos de soro (requeijão), manteigas, bebidas, iogurtes, gelados, doçarias, alimentos dietéticos, alimentos processados, pré-bióticos e pró-bióticos, ou ainda encaminhamento para alimentação pecuária (de Wit, 2001). Para além da elevada variabilidade na produção anual de soro, pode ainda constatar-se na Figura 2-2 a tendência de aumento da fracção exportada, assim como o aumento relativo da cotação de mercado, apenas travado no ano de 2008, que é certamente reflexo do início da recessão económica associada àquela data. O principal destinatário da produção nacional de soro são os Países Baixos que absorvem 55% da cota de exportações

Leite Padronização (1) Pasteurização (2) Mistura (3) Repouso (4) Corte (5) Drenagem (6) Escalda (7) Agitação (8) Drenagem (9) Moldagem (11) Cura (15) Salmoura (14) Repouso(13) Compressão (12) Separação Pasteurização Coalhada (10) Queijo

Soro

Soro

Nata de soro Nata Cultura/ coalho Água quente

(MADRP, 2007). O aumento de cotação reflecte, em parte, a importância que este subproduto tem vindo a adquirir na perspectiva da sua valorização.

Figura 2-2: Estimativas de produção, exportação e cotação anual de soro lácteo em Portugal [fonte: INE (1996-2011)]

O soro de queijo é constituído por lactose (45 - 80 g L-1), proteínas solúveis (1 -

10 g L-1), lípidos (1 - 8 g L-1) e sais minerais, apresentando um teor de sólidos totais de

cerca de 65 g L-1. Habitualmente, o soro de queijo apresenta-se de forma líquida ou

viscosa (93 – 94% de água). Adicionalmente, encontram-se ainda presentes quantidades significativas de outros componentes, tais como ácido cítrico, grupos azotados não-proteicos (ureia e ácido úrico), vitaminas do grupo B, e ainda β- lactoglobulina, -lactoglobulina, imunoglobulinas, albuminas e lactoferrina (de Wit, 2001; Prazeres et al., 2012).

Uma prática bastante comum nas indústrias de lacticínios é a desidratação e secagem do soro, por razões óbvias de redução de custos de armazenamento e transporte, e ainda por melhoria da qualidade do produto, retardando a sua degradação. Em Portugal continental, estimava-se, em 2001, uma produção anual de soro desidratado de apenas 6000 t, dado existirem apenas duas indústrias de queijo a efectuar a secagem do soro (TECNINVEST, 2001). Das diversas tecnologias disponíveis para a secagem, duas das mais comuns para a obtenção de soro em pó são designadas por drum drying (secagem em tambor) e por spray drying (secagem por aspersão), sendo a última a que se encontra mais disseminada (de Wit, 2001). A Figura 2-3 ilustra uma versão da tecnologia spray drying, realizada em três estágios. Este processo consiste numa câmara de secagem e dois leitos fluidizados (interno e externo). O soro concentrado (que contém a lactose parcialmente cristalizada) entra no topo do secador através de um atomizador. Discos rotativos de alta rotação dentro da

0 100 200 300 400 500 600 700 800 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 C o tação méd ia (€ /t) Prod ã o, e x por ta ç ã o (t ) x 1 0 3 produção exportação cotação

câmara ajudam a manter uma determinada gama de diâmetros de gotículas. É fornecida uma corrente de ar quente (225ºC) no topo da câmara, o que permite secar as gotículas de diferentes diâmetros até apresentarem um teor de humidade de 6%. O ar de saída contém ainda uma quantidade significativa de finos que são separados num ciclone e recolhidos para o secador, aonde participam na aglomeração. Posteriormente, uma corrente uniforme de pó é transportada do leito fluidizado interno para o externo. Este elemento externo consiste numa câmara perfurada onde se faz passar uma corrente de ar quente (100ºC), permitindo uma secagem adicional até um teor de humidade de 3 – 4%.

Figura 2-3: Processo de secagem de soro em três estágios [fonte: de Wit (2001)]