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Polihidroxialcanoatos (PHA): características e propriedades físicas

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3 PRODUÇÃO DE POLIHIDROXIALCANOATOS (PHA) A PARTIR DE SUBSTRATOS

2.3.2 Polihidroxialcanoatos (PHA): características e propriedades físicas

Os polihidroxialcanoatos (PHA) são uma família de poliésteres de ácidos alcanóicos (Figura 2-8) cujas propriedades variam da rigidez à elasticidade. Podem ser moldados através de processos de extrusão para manufacturar diversas utilidades, ou convertidos em filmes, fibras ou adesivos. Estes materiais apresentam boa resistência a líquidos quentes, gorduras e óleos, mas são completamente degradáveis em ambientes aquáticos e no solo, quer sob condições anaeróbias, quer aeróbias. As suas propriedades assemelham-se às de alguns plásticos convencionais tais como o polietileno (Punrattanasin, 2001).

Figura 2-8: Estrutura geral dos PHA

Os PHA de origem bacteriana resultam de um processo em que os microrganismos acumulam os substratos orgânicos sob a forma de polímeros intracelulares de reserva de carbono e energia. Quando em presença de excesso de fonte de carbono com a limitação de algum outro elemento essencial (oxigénio, fósforo ou azoto), a acumulação de PHA surge sob a forma de inclusões citoplasmáticas insolúveis com diâmetro até cerca de 0,5 µm (Figura 2-9), ocorrendo tanto em bactérias Gram-positivas como Gram-negativas e ainda arqueobactérias, e sem provocar qualquer efeito nocivo sobre a célula hospedeira (Anderson e Dawes, 1990; Laycock et al., 2013).

Tipicamente, os PHA são compostos por um número de monómeros de ácidos orgânicos que varia entre 1000 e 10000 (Suriyamongkol et al., 2007). A composição monomérica e a massa molecular do polímero são responsáveis pelas suas propriedades físicas e mecânicas, determinando assim a sua aplicabilidade comercial (Lemos et al., 2006). Até à data, mais de 150 monómeros foram identificados como possíveis constituintes destes polímeros, o que possibilita uma vasta diversidade de polímeros com diferentes propriedades, consoante a variação do substituinte R na cadeia representada na Figura 2-8 (Laycock et al., 2013). O dimensionamento de processos com condições de cultura e fontes de carbono adequadas permite que

O CH3 O H O O R O CH3 CH3 n R = hidrogénio → Poli(3-hidroxipropionato) R = metilo → Poli(3-hidroxibutirato) R = etilo → Poli(3-hidroxivalerato) R = propilo → Poli(3-hidroxihexanoato) R = pentilo → Poli(3-hidroxioctanoato) R = nonilo → Poli(3-hidroxidodecanoato)

actualmente sejam produzidos diversos PHA com a composição desejada (tailor-made PHA) (Hazer e Steinbüchel, 2007).

Os PHA são divididos em três grupos baseados no número de átomos de carbono nos seus monómeros unitários: polihidroxialcanoatos de cadeia curta (PHASCL) que contêm entre 3 e 5 átomos de carbono, polihidroxialcanoatos de cadeia

média (PHAMCL), contendo entre 6 e 14 átomos de carbono e polihidroxialcanoatos de

cadeia longa (PHALCL), estes últimos contendo mais de 14 átomos de carbono (Kessler

e Witholt, 2002; Philip et al., 2007). PHASCL típicos incluem o poli-3-hidroxibutirato,

PHB (doravante designado por polihidroxibutirato), o poli-3-hidroxivalerato, e o copolímero poli(3-hidroxibutirato-co-3-hidroxivalerato) P(HB-co-HV) [doravante designado por poli(hidroxibutirato-co-valerato)]. Os PHAMCL mais comuns incluem o

polihidroxioctanoato, o polihidroxinonanoato e o copolímero poli(hidroxihexanoato-co- hidroxiheptanoato) (Gross et al., 1989). Em geral os PHA de cadeia curta tendem a ser mais rígidos e quebradiços, apresentando um elevado grau de cristalinidade, enquanto os de cadeia longa são flexíveis e apresentam baixa cristalinidade (Philip et al., 2007). Por outras palavras, os PHASCL apresentam propriedades similares aos plásticos mais

comuns, ao passo que os PHA de cadeia média e longa são considerados borrachas e elastómeros (Suriyamongkol et al., 2007).

Figura 2-9: Micrografias electrónicas de cortes de Cupriavidus necator DSM545, cultivada em glucose, contendo grânulos de PHB (estruturas brancas). Ampliações: (a) 20000×; (b) 72000×; (c) 70000×; (d) 150000×. Acumulação de

Um dos PHA mais estudados é o PHB, que foi o primeiro a suscitar interesse científico e industrial. Este homopolímero é um poliéster completamente estereo- regular, com uma distribuição assimétrica de todos os átomos de carbono na cadeia do substituinte R, o que o torna num homopolímero altamente cristalino (60-80%), rígido e quebradiço. Este polímero apresenta excelente resistência aos raios UV e impermeabilidade ao oxigénio (Lee, 1996). A sua temperatura de transição vítrea (Tg),

que indica o limite térmico abaixo do qual o material se torna quebradiço ao arrefecer, situa-se entre 5 e 9ºC, e a temperatura de fusão entre 173 e 180ºC, este último intervalo muito próximo da temperatura de degradação molecular (200ºC). A maioria das suas propriedades mecânicas, incluindo o módulo de Young, que mede a rigidez, é similar às do polipropileno. No entanto, o polipropileno apresenta uma resistência à ruptura quatro vezes superior (Kessler e Witholt, 2002).

Os PHA caracterizados mais recentemente têm demonstrado ser mais versáteis na sua aplicabilidade. Alguns copolímeros têm sido especificamente “desenhados” para reduzir ou eliminar as propriedades quebradiças e a instabilidade térmica do PHB (Keshavarz e Roy, 2010). Neste sentido, é comum a introdução de diferentes monómeros de hidroxialcanos na cadeia do PHB, tais como o hidroxivalerato (HV) e o hidroxihexanoato, o que permite melhorar as suas propriedades, resultando numa diminuição do módulo de Young em 80% (Kessler e Witholt, 2002). Outra estratégia para melhorar a aplicabilidade do PHB é a introdução de cadeias halogenadas insaturadas, permitindo uma mudança funcional das suas propriedades (Suriyamongkol et al., 2007).

Entre todos os copolímeros, o P(HB-co-HV) tem sido proposto como um dos melhores candidatos para substituir os termoplásticos sintéticos devido a possuir melhores propriedades físicas e mecânicas (menor cristalinidade e maior flexibilidade) quando comparado com o PHB. Além disso, este é o copolímero mais comum na natureza (Lee et al., 2008). A introdução de monómeros HV na cadeia polimérica permite reduzir significativamente a temperatura de fusão, sem alterar a temperatura de degradação. Esta propriedade possibilita diferentes processamentos térmicos, uma vez que a fusão do material deixa de implicar a sua degradação molecular (Kessler e Witholt, 2002). No entanto, o facto de este copolímero apresentar menor grau de cristalização implica maiores tempos de processamento durante a moldagem térmica (Punrattanasin, 2001). A massa molecular relativa dos PHA varia

entre 2×105 e 3×106, e aqueles que apresentam os maiores valores são os mais

solicitados para aplicações industriais, como a produção de filmes e fibras fortes (Lee, 1996; Reddy et al., 2003). A Tabela 2-7 mostra a comparação entre as propriedades físicas de alguns dos PHA mais comuns com as de alguns polímeros de origem petroquímica.

Tabela 2-7: Propriedades físicas de alguns polímeros [fonte: Dalcanton (2006)]

Polímero Temperatura de fusão (ºC) Young (GPA) Módulo de cisalhamento Tensão de (MPa) Resitência à ruptura (%) PHB 179 3,5 40 5 P(HB-co-HV) 3% HV (mol/mol) 170 2,9 38 - 9% HV (mol/mol) 162 1,9 37 - 14% HV (mol/mol) 150 1,5 35 - 20% HV (mol/mol) 145 1,2 32 - 25% HV (mol/mol) 137 0,7 30 - P(HB-co-4HV) 3% 4HV (mol/mol) 166 - 28 45 10% 4HV (mol/mol) 159 - 24 242 16% 4HV (mol/mol) - - 26 444 64% 4HV (mol/mol) 50 30 17 591 90% 4HV (mol/mol) 50 100 65 1080 P(4HB) 53 149 104 1000 P(HHx-co-HO) 61 - 10 300 Polipropilenoa 170 1,7 34,5 400 Polietileno-tereftalatoa 262 2,2 56 7300 Poliestirenoa 110 3,1 50 -

aPolímeros de origem petroquímica