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Ficha 4 – Ficha lexicográfico-toponímica adaptada e preenchida

3 TOPONÍMIA: princípios teóricos

3.4 O topônimo

3.4.2 Origem e importância

Os nomes de lugares, ou topônimos, surgem pela necessidade que o homem tem de identificar o espaço de que toma posse, para indicar sua identidade e a de seu grupo e garantir sua fixação local. A nomeação do lugar torna-se, portanto, uma questão de sobrevivência, já que auxilia a organização entre os grupos e a sua adaptação a um determinado espaço geográfico.

Embora o ato denominativo remonte aos tempos primórdios da civilização humana ele não é aleatório, pois cada povo tem características próprias e distintas que motivam a nomeação. Uma constatação dessa hipótese verifica-se na nomeação de lugares em tempos remotos, quando o lugar recebia o nome de seus possuidores, como forma de identificar o grupo que primeiro se apropriou do território, como, por exemplo, “Hispânia”, “terra dos hispânicos” ou “Itália”, “terra dos ítalos” (DICK, 1992, p. 5).

A partir da época feudal, ocorre uma inversão deste processo, motivados pelo sentimento feudal do homem ligado à terra este passou a ser identificado com o nome do lugar a que pertencia (DICK, 1992, p. 5).

Nesta perspectiva, o topônimo identifica-se não apenas como expressão de um único denominador, mas como projeção de todo o grupo social a que pertence, como afirma Dick (1992, p. 7), “[...] outros grupos humanos apresentam variáveis culturais definidas, com certeza, pela cosmovisão que os anima, a qual, porém, só pode ser apreendida, na totalidade, através de estudos mais aprofundados de seu contexto histórico-social e psicológico.”

Os topônimos inicialmente nomeiam aspectos da realidade espacial. Nessa fase, o nome ainda guarda um aspecto comum, a partir do momento que o nome particulariza indivíduos ou regiões ele se torna onoma, nome próprio, emerge-se, assim; “cria-se, portanto,

um novo dizer funcional e semântico (ex: saudade/caminho da saudade (topônimo), pela transformação terminológica da palavra que ainda é semântico-funcional”, segundo Dick (1998b, s/p.).

De acordo com Nieto Ballester (1997, p. 11), os topônimos têm possivelmente duas origens:

[...] ou bem se trata de antigos nomes próprios de pessoas (antropônimos) ou de termos derivados deles, (b) ou se trata de antigos nomes comuns (também chamados denominativos) que, com o decorrer do tempo e em função dos perigos da história linguística do território em questão, deixaram de ser entendidos como tais. (Tradução nossa)12.

Atualmente, os estudos em Toponímia têm mostrado que o designativo de lugar supera a simples função identificadora, podendo revelar pistas de fatores extralinguísticos que influenciaram o ato de nomeação. Através dos topônimos, que integram o acervo lexical de uma língua, é possível resgatar elementos da cultura e da história de um povo, são verdadeiros testemunhos de uma sociedade.

De acordo com Salazar-Quijada (1985), os topônimos têm sua importância em diversos segmentos do conhecimento humano, dos quais podemos citar: importância cartográfica, jurídica, geográfica, histórica, político-administrativa, linguística, social etc.

A importância cartográfica advém da necessidade de uma normalização da nomenclatura geográfica, cujo processo necessita de um toponimista a fim de que se evite qualquer erro na disposição dos nomes de lugares em mapas.

A importância jurídica consiste nos problemas que poderiam ser evitados no que diz respeito à imprecisão de nomes geográficos públicos ou privados e no seu registro em documentos oficiais.

No que diz respeito à importância geográfica, os topônimos identificam diferentes acidentes geográficos, físicos ou antrópicos, necessários à identificação pelos pesquisadores dos mais diversos tipos de ocupação espacial.

Quanto à importância histórica, os topônimos funcionam como verdadeiros testemunhos da história de um povo, que resistem ao tempo, e por meio dos quais é possível recuperar a história e as tradições de grupos humanos que ocuparam determinado lugar.

Já em relação à importância político-administrativa, os topônimos revelam-se como referenciais dos limites de um município, distrito, estado ou até de um país. Eles

12[...] (a) o bien se trata de antiguos nombres propios de persona (antropónimos) o de términos derivados de

ellos, (b) o bien se trata de antiguos nombres comunes (también llamados apelativos) que, com el discurrir del tiempo y en función de los azares de la historia lingüística del território en cuestión, a menudo han dejado de ser entendidos como tales. (NIETO BALLESTER, 1997, p. 11).

contribuem para a organização governamental de arrecadação de impostos e de diferentes cadastros, já que consistem numa informação primária para situar as propriedades públicas e privadas.

No que diz respeito à importância linguística, por meio de pesquisa etimológica e descritiva dos topônimos é possível identificar estratos linguísticos que constituíram uma língua e, a partir deles, reconstituir dados valiosos do passado de uma sociedade.

Há também uma importância social dos topônimos, a qual está relacionada ao fato de estes constituírem dados da memória humana que muitas vezes têm um significado afetivo para os habitantes de uma comunidade, pois através dos topônimos são feitas homenagens a pessoas ilustres e em memória de fatos históricos.

Além dessas importâncias já mencionadas, acrescentamos ainda a importância dos topônimos para a padronização dos nomes geográficos. Sabemos que no Brasil não existe um órgão público oficial de Toponímia. O que existe é o Centro de Referência em Nomes Geográficos (CRNG), setor ligado à Coordenação de Cartografia do IBGE.

Segundo o CRNG, a padronização dos nomes geográficos visa, entre outros aspectos, “propiciar aos usuários meios de conhecer as denominações dos lugares, em uma grafia oficial; aumentar a eficiência operacional em todos os níveis do governo; viabilizar operações de censo; facilitar a comunicação terrestre, aérea e marítima” (IBGE, 2011)13.

Além disso, com o Decreto-Lei 6.666, de 27 de novembro de 2008, que cria a instituição de Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (INDE), a padronização de nomes geográficos torna-se imprescindível para a regularização de dados de referência para essa almejada infraestrutura.

Nesta mesma perspectiva, encontra-se em desenvolvimento o Banco de Nomes Geográficos do Brasil (BNGB), sob a responsabilidade do IBGE. A finalidade do BNGB é reunir mais de 50 mil topônimos de municípios, baías, rios que aparecem na Carta Internacional ao Milionésimo (CIM) do Brasil.

Dessa forma, percebemos que tais iniciativas apontam para a relevância dos estudos toponímicos não apenas no âmbito da Linguística, como das mais diversas áreas do conhecimento que se interessam pelo fenômeno.