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Antecedentes históricos...469 O processo de criação da Defensoria Pública do Estado de São Paulo...479

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS...505

CONSIDERAÇÕES FINAIS...507 REFERÊNCIAS...512

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APRESENTAÇÃO

Toda obra humana diz muito sobre o seu criador. É sempre uma expressão de seus anseios, sonhos, angústias e inquietações. A presente tese não é diferente. Ela resulta da paixão de seu autor pela Geografia e de sua angústia e inquietação com as desigualdades existentes no mundo. Desde muito tempo, intrigava-me o fato de haver tanta pobreza e injustiças quando, ao mesmo tempo, há tantas leis prevendo justamente o contrário. Por que a realidade é tão diferente daquilo que os homens propuseram para si mesmos como ideais de justiça?

Embora estes questionamentos me incomodassem, não havia ainda a ideia de transformá-los numa pesquisa acadêmica. Ao final do ano de 2007, após ter concluído um curso de licenciatura em Geografia na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), senti a necessidade de continuar estudando e decidi me candidatar ao mestrado. Procurei o professor Cláudio Castilho, com quem havia trabalhado na graduação, e pedi orientação sobre um possível tema para desenvolver uma dissertação. Ele me sugeriu investigar os serviços relativos ao sistema de justiça. Aceitei de imediato, comecei a pesquisar e acabei me dedicando a aprofundar os estudos sobre a Defensoria Pública. Submeti-me ao processo de seleção para o mestrado e, em março de 2008, dava início também na UFPE a uma pesquisa sobre a oferta de serviços da Defensoria Pública de Pernambuco na cidade de Recife. Importantes descobertas foram feitas com aquele trabalho, ao menos em minha opinião à época. As 05 unidades de atendimento da Defensoria localizavam-se nas áreas mais centrais da cidade, enquanto as populações mais pobres habitavam as áreas mais periféricas. O acesso era mais difícil justamente para aqueles que mais necessitavam dos serviços.

Concluído o mestrado, ainda havia perguntas a serem respondidas. A principal delas talvez fosse: o problema do acesso à justiça aos mais pobres será resolvido simplesmente levando defensorias públicas a todos os lugares pobres deste país? A pesquisa precisava ser aprofundada e o doutorado era o caminho natural. Poderia tê-lo feito em Pernambuco, caso não tivesse conhecido uma paulista que viria a ser minha esposa. Mudei-me para a cidade de São Paulo e decidi tentar o doutorado na Universidade de São Paulo (USP) com a professora Maria Adélia de Souza, que eu conhecera anteriormente num evento na UFPE. Pedi-lhe uma oportunidade e ela generosamente concedeu. Decidi que continuaria estudando a Defensoria Pública, mas que agora pesquisaria a situação no estado de São Paulo. Em se tratando do estado “mais rico” da federação, as coisas poderiam ser diferentes e haveria mais recursos

2 públicos destinados a promover assistência jurídica gratuita aos pobres. Bem, acredito que os dados e argumentos apresentados na tese mostram que as coisas não são bem assim...

Fui admitido no Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana da USP em 2011 e não foi sem dificuldades que cheguei à redação desta versão da tese, que certamente ainda não é o trabalho que gostaria de ter realizado. As mais variadas circunstâncias contribuíram para que este tenha sido o resultado possível de por mim ser alcançado. Diante de minhas condições existenciais, fiz o que me foi possível.

Esta é uma pesquisa que busca resposta para a pergunta que me incomoda desde muito tempo: por que as leis não são capazes de promover a igualdade entre os homens, ainda que seja isso o que elas proclamam? A investigação parte da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, mas alcança estruturas mais profundas da sociedade na tentativa de compreender a relação entre a justiça e as desigualdades. Esperamos ter podido contribuir para iluminar um pouco mais o problema.

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INTRODUÇÃO

Os primeiros anos do século XXI são marcados pela intensificação do debate a respeito da necessidade de melhorar a eficiência das instituições do sistema de justiça. Foi neste contexto que em 2003 foi criada a Secretaria de Reforma do Judiciário (SRJ), cujo objetivo principal era “(...) ser um órgão de articulação entre o Executivo, o Judiciário, o Legislativo, o Ministério Público, governos estaduais, entidades da sociedade civil e organismos internacionais com o objetivo de propor e difundir ações e projetos de aperfeiçoamento do Poder Judiciário” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2003). Ao mesmo tempo em que expressa preocupação em solucionar problemas, esta ação evidencia que muitas coisas não vêm funcionando bem há muito tempo. Ora, à época da criação da SRJ, o Brasil já contava mais de 500 anos de existência, 181 de independência e 114 de república. Séculos de história e transformações importantes e, ainda assim, a justiça ainda enfrenta graves problemas. Num país em que desigualdades agudas foram historicamente constituídas, preocupa-nos a situação das pessoas pobres – que constituem a maior parte da população brasileira – diante de um sistema de justiça falho. Que função desempenha a justiça em nossa sociedade quando se trata de oferecer respostas às demandas dos pobres?

Uma importante evidência de que as necessidades dos pobres são negligenciadas é o fato de as defensorias públicas terem sido constitucionalmente criadas apenas recentemente, em 1988, após uma série de difíceis negociações políticas. Além disso, apesar da previsão constitucional, muitos estados federativos só vieram a criar suas defensorias nos anos 2000, após várias manifestações de movimentos organizados com o objetivo de reivindicar o cumprimento da lei. Este é o caso do estado de São Paulo, cuja defensoria foi criada em 2006. Uma vez que as defensorias foram criadas para atender quase que exclusivamente aquelas pessoas carentes de recursos para pagar os honorários de um advogado, escolhemos esta instituição como base empírica para tentar compreender as dificuldades enfrentadas pelos pobres quanto ao acesso à justiça. A hipótese deste trabalho é a de que o uso do território paulista pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPESP) é expressão de como o sistema de justiça brasileiro não tem como prioridade a garantia constitucional do direito de defesa, principalmente das pessoas pobres.

Pode-se afirmar que a escolha do estado de São Paulo se deve a três critérios principais. Em primeiro lugar, tem importância a conveniência do autor. Morando, trabalhando e cursando o doutorado na cidade de São Paulo, a opção mais prática e que traria resultados mais efetivos seria adotar este estado como empiria. Entretanto, é necessário

4 considerar que tal escolha está em sintonia com outros critérios, reveladores de que o caso da DPESP é representativo da situação vivida pelas demais defensorias estaduais, não se tratando de uma exceção, de um caso totalmente distinto da realidade nacional. Isso ficou claro quando, por ocasião de um estudo anterior (ALCÂNTARA, 2010), verificamos que as defensorias estaduais padecem praticamente com as mesmas mazelas. Sendo assim, é possível dizer que a situação de qualquer das defensorias estaduais é expressão de um mesmo processo que faz com que o acesso à justiça seja mais difícil para os pobres. Escolher o estado de São Paulo ou qualquer outro não traria grandes diferenças para a compreensão do problema em questão. Todavia, há um fator que torna o caso de São Paulo particularmente mais interessante que os demais. O economista Antônio Delfim Netto, quando ministro da Fazenda dos governos ditatoriais no Brasil, afirmava que era preciso “fazer o bolo crescer, para depois dividi-lo” (FOLHA DE SÃO PAULO, 2008), numa ideia controversa de que o desenvolvimento econômico necessariamente traria com o tempo o bem-estar para todos. Na verdade, o que se viu foi a concentração de renda se intensificar. Contudo, como não se trata de uma ideia totalmente desmistificada, e ainda há muitos políticos e empresários que defendem a bandeira do desenvolvimento econômico, é significativo tentar compreender em que medida os benefícios de ter o maior Produto Interno Bruto (PIB) entre todos os estados da federação são convertidos pelo governo paulista na promoção de maior igualdade para seus governados. Desse modo, a promoção do acesso à justiça aos pobres nos é apresentada como uma importante chave interpretativa destas relações.

A fundamentação teórica deste trabalho é essencialmente marxista. Se não utilizamos diretamente a obra de Karl Marx, recorremos a estudiosos que têm na dialética materialista o método para o desenvolvimento de suas teorias e que consideram a luta de classes o motor da história. É o caso de nossa principal referência em relação à teoria geográfica que se tentou operacionalizar nesta tese. O professor Milton Santos, ao longo de toda sua carreira, buscou a formulação de conceitos e teorias baseados numa compreensão dialética do espaço geográfico. Compreendia o espaço enquanto totalidade social, conjunto indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações e, neste sentido, também buscava formular uma teoria geográfica que fosse capaz de oferecer uma compreensão a respeito das desigualdades espaciais nos países subdesenvolvidos. Suas ideias foram fundamentais para a compreensão das desigualdades espaciais nos municípios estudados e as implicações para a atuação da DPESP. Importantes também foram as ideias do geógrafo francês Michel Rochefort para a compreensão das dinâmicas de localização dos diferentes tipos de serviços nas cidades e sua

5 distribuição territorial dependente de seu grau de raridade. Isso permitiu trazer luz à questão das localizações das unidades de atendimento da DPESP.

Para compreender as questões estruturais que envolvem a atuação das defensorias, a contribuição de outro autor marxista sobre a função do Estado nas sociedades capitalistas foi essencial. Ralph Miliband oferece uma interpretação precisa das relações estatais com os mais diversos agentes sociais, revelando como há uma convergência entre os interesses burgueses e as ações que o Estado, considerando benéficas para toda a sociedade, põe em prática. Neste sentido, serão antes os interesses capitalistas que serão defendidos pelas instituições estatais, enquanto que as reivindicações de outros grupos sociais ficam em segundo plano. A abordagem de Miliband nos ajuda a compreender, por exemplo, a relutância do governo paulista em criar uma defensoria pública e também os insuficientes recursos a ela destinados.

Se a DPESP é ainda uma instituição a dar seus primeiros passos, e neste sentido ainda pode fazer muito pouco em comparação à demanda representada pelas populações pobres, é preciso analisar o que têm feito o restante do sistema de justiça. A investigação nos levou ao trabalho de Leonardo Avritzer que, baseado em dados do Ministério da Justiça (MJ), evidenciou que a justiça no estado de São Paulo trata, em primeiro lugar, dos interesses do Estado (execuções fiscais) e depois dos interesses empresariais. Sendo este o diagnóstico para a justiça cível, cabe investigar a justiça criminal. Para isso, de fundamental importância teórica foram os trabalhos dos pesquisadores da corrente conhecida como Criminologia Crítica. Suas teorias revelam como a justiça criminal é seletiva e se dirige prioritariamente a punir as ilegalidades cometidas pelos pobres. Os dados empíricos para o estado de São Paulo confirmam tais teses e nos levam a questionar como pode ser verdadeiramente efetiva a DPESP quando o sistema de justiça criminal concentra seus esforços sobre os pobres. É uma luta injusta e perdida a priori, dadas as gritantes diferenças de recursos que o estado dedica a cada uma dessas suas funções. O empenho estatal é muito maior no sentido de punir do que de defender os pobres.

Outro importante ponto para a compreensão dos problemas enfrentados pelas defensorias públicas tem a ver com o próprio desenvolvimento do Direito na sociedade capitalista. A contribuição de Michael Tigar e Madeleine Levy revela como o direito atual se desenvolveu de acordo com os desígnios burgueses e, embora declarem valores ligados à garantia de direitos universais do homem, primam, sobretudo, pela inviolabilidade da propriedade privada e pelo cumprimento dos contratos. Com este conteúdo, o Direito cumpre a função de garantir as relações capitalistas de exploração e extração de mais-valia. A questão que se apresenta então é como podem as defensorias assegurar os interesses dos mais pobres

6 se o próprio Direito existe como instrumento para garantir a espoliação. A investigação histórica revela a existência de um problema que põe em xeque a crença de que o acesso à justiça aos pobres pode ser promovido apenas com a expansão do alcance das defensorias. A história das origens da criação da Defensoria Pública como instituição constitucionalmente definida como essencial ao sistema de justiça, assim como a história da criação da DPESP ratificam a teoria de que o Direito não existe com a função de garantir os direitos de todos os homens. Se assim fosse, ou viveríamos numa sociedade sem pobres, na qual fosse inconcebível a ideia da existência de defensorias, ou então elas já teriam, assim como o Direito burguês, ao menos alguns séculos de existência.

A validade destas teorias foi colocada à prova por meio de sua confrontação com os dados empíricos. Dados obtidos da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Fundação Sistema Estadual de Análise de dados (SEADE) foram importantes para compreender a organização espacial do estado de São Paulo, assim como a distribuição da população por classes de renda em cada um dos municípios atendidos pela DPESP. A pesquisa REGIC (Regiões de Influência das Cidades) do IBGE e a pesquisa Rede Urbana e Regionalização do Estado de São Paulo, realizada pela SEADE, contribuíram para compreender a hierarquia urbana paulista, assim como a regionalização adotada pelo poder público. Tais dados permitiram a elaboração dos mapas e tabelas constantes da primeira parte da tese e contribuíram para a compreensão dos usos do território. A partir deles é possível evidenciar que as localizações das unidades da DPESP não privilegiam os mais pobres. Outras fontes de dados importantes foram os diagnósticos produzidos pelo Ministério da Justiça e pela Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP) a respeito das defensorias estaduais. Eles permitiram constatar a semelhança de situações vividas nos diversos estados da federação e forneceram os dados para a elaboração dos mapas da terceira parte da tese. Não menos importantes foram os dados fornecidos pela Pesquisa de Satisfação realizada pela Ouvidoria da DPESP em 2012. O perfil socioeconômico dos atendidos pela DPESP traçado pela pesquisa, assim como a informação sobre os locais de residência, ainda que apenas para alguns municípios, permitiu a confirmação da relação entre a origem dos atendidos e os lugares de mais baixa renda. Relação que já confirmáramos em nossa pesquisa de 2010. Assim, foi possível evitar a realização de trabalhos de campo para entrevistar os atendidos nas diversas unidades de atendimento e elaborar os mapas apenas com base nas faixas de renda, considerando que o público-alvo da DPESP tem origem nas áreas mais pobres. No que diz respeito aos gastos do governo estadual, os relatórios fornecidos pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) foram reveladores das prioridades estatais. Ainda que

7 estas tenham sido as fontes de dados mais importantes do trabalho, muitas outras subsidiaram a realização da pesquisa, como os documentos produzidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e da Pastoral Carcerária a respeito da situação dos presos paulistas, as estatísticas fornecidas pela Secretaria de Segurança Pública, os dados disponibilizados pela DPESP em seu sítio na internet, as dissertações e teses consultadas, entre outros. Para a organização dos dados e informações empíricos que são apresentados na tese, recorremos à elaboração de tabelas, quadro e gráficos por meio do programa computacional Microsoft Excel e à elaboração de mapas temáticos com o programa Mapinfo. Tentou-se, ao longo da pesquisa, seguir uma metodologia que todo o tempo confrontasse teoria e empiria e melhor contribuísse para a compreensão dos obstáculos à oferta irrestrita do acesso à justiça aos pobres.

O objetivo principal do trabalho é investigar a tese de que o uso do território paulista pela DPESP é expressão dos limites impostos à garantia constitucional do direito de defesa. Para alcançá-lo, uma série de investigações subsidiárias se fez necessária. Dessa maneira, alguns objetivos específicos foram estabelecidos e cada um deles deu origem a um capítulo da tese. Por sua vez, estes capítulos foram distribuídos entre as três partes, de acordo com o contexto mais geral no qual cada um se enquadra.

Composta por cinco capítulos, a primeira parte da tese aborda mais especificamente os problemas dos critérios utilizados pela DPESP, da distribuição no território estadual de suas unidades de atendimento e das respectivas localizações em cada um dos municípios. O primeiro capítulo apresenta a DPESP e discute os problemas relativos aos critérios adotados para a definição dos necessitados. Para isso, recorremos a uma discussão crítica sobre o conceito de pobreza. O segundo capítulo é dedicado a uma abordagem conceitual da relação entre acesso à justiça, uso do território e desigualdades socioespaciais. No terceiro capítulo, apresentamos o território paulista partindo de uma discussão a respeito dos aspectos conceituais relacionados aos serviços, à rede urbana e à regionalização. A seguir, o quarto capítulo aborda a importância da proximidade para as pessoas que necessitam dos serviços da DPESP. Por fim, o quinto capítulo, recorrendo a uma vasta coleção de mapas, aborda de maneira mais estrita os problemas relativos às localizações das unidades de atendimento nos municípios. O objetivo desta primeira parte é revelar que o problema do acesso à justiça tem um componente ligado às localizações. Todavia, acreditamos ser este apenas um dos vários componentes. Assim, o problema exige soluções que ultrapassem a demanda tão somente da instalação de mais unidades de atendimento da DPESP.

A segunda parte trata dos problemas estruturais responsáveis pelas dificuldades enfrentadas pela DPESP e por outras defensorias do Brasil. Neste sentido, são abordadas

8 questões relativas ao capitalismo, ao Estado e ao sistema de justiça. O sexto capítulo estabelece as relações entre o capitalismo, em sua atual fase da globalização, e a produção de pobreza, ao mesmo tempo em que expõe a ligação entre os objetivos estatais e os interesses empresariais. A ascensão do Estado penal em detrimento do Estado social é o tema do capítulo sete. Nele, tenta-se demonstrar como os recursos do governo paulista têm se destinado cada vez mais ao sistema policial-prisional, à economia e menos para a solução dos problemas sociais. O oitavo capítulo dedica-se a discutir de que maneira o sistema de justiça é usado para o tratamento dos interesses estatais e empresariais, restando aos pobres à perseguição seletiva da justiça criminal. O objetivo desta segunda parte é demonstrar que é insuficiente crer na efetividade de uma instituição estatal responsável pela defesa dos pobres diante de uma estrutura social produtora de pobreza, na qual o Estado defende antes aos interesses econômicos e a justiça criminal persegue quase que exclusivamente as pessoas pobres. Tudo isso torna mais complexa a discussão sobre a necessidade de fortalecimento das defensorias.

O objetivo da terceira parte é revelar – por meio de uma discussão histórica das origens do Direito e das defensorias públicas – como o sistema de justiça nas sociedades capitalistas nunca teve como objetivo principal a promoção de justiça para todos. O nono capítulo dedica-se a evidenciar a íntima relação entre o desenvolvimento do Direito atual e as necessidades de consolidação do capitalismo. Desse modo, a defesa da propriedade privada e a garantia do cumprimento dos contratos são as preocupações centrais do Direito. O capítulo 10 relata as origens da Defensoria Pública no Brasil, enquanto que o capítulo 11 trata do processo de criação da DPESP. Em ambos os casos, fica claro que as defensorias são conquistas que resultam de difíceis embates e negociações políticas entre agentes sociais. O acesso à justiça aos mais pobres nunca foi algo com que o Direito e os sistemas de justiça dos países capitalistas tenham se preocupado naturalmente. Muitas das atuais dificuldades enfrentadas pelas defensorias resultam do fato de que a justiça é historicamente organizada para o atendimento de interesses específicos.

A conclusão a que chegamos é que a universalização do acesso à justiça depende de transformações estruturais profundas no modo como nossa sociedade e suas instituições estão organizadas. Não se trata de apenas demandar a criação de defensorias ou a instalação de unidades nos lugares onde elas inexistem, pois esta não passa de uma solução reformista que deixa intactas as relações de exploração, responsáveis pela produção de pobreza. As defensorias podem contribuir para desvelar tais relações e conscientizar as pessoas sobre a necessidade de mudanças nas relações de produção, por exemplo. Mas este é apenas um passo

9 na direção da constituição de um mundo no qual não precisaremos de defensores para os