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3 O DIREITO

6.1 Origens da Diplomática

A Diplomática surgiu no século XVII, a partir da necessidade de algumas ordens religiosas em provar a autenticidade de pergaminhos antigos e passou a se constituir como uma ferramenta para avaliar a validade de documentos medievais pelos historiadores (RONDINELLI, 2005). A palavra “diplomática” deriva do termo latino

diploma, que corresponde a um escrito dobrado em dois, diplous (duplo), assim,

etimologicamente, Diplomática é a “ciência dos diplomas”.

O termo foi empregado primeiramente por Mabillon, em 1681, para designar a ciência que estuda “o conjunto de documentos de arquivo que possam constituir fontes históricas: cartas, atos, tratados, contratos, registros judiciais e outros documentos oficiais”. Permite “distinguir os documentos autênticos dos falsos ou falsificados e a analisar sua tipologia” e “tem como objetivos precípuos julgar a autenticidade dos documentos bem como interpretar o seu conteúdo” (BERWANGER; LEAL, 2008, p. 25). Segundo Skemer (1989), o marco do surgimento da Diplomática foi a obra “De re diplomática libri VI”, publicada em 1681, pelo francês Monge beneditino Dom Jean Mabillon (1632-1707). O autor se concentrou originalmente em estabelecer a autenticidade de cartas ou diplomas (motivo do nome) e outros documentos legais medievais armazenados em arquivos, através do estudo de sua forma.

De acordo com Bellotto (2006, p.47), “a Diplomática como ciência documentária nasceu da reação do espírito crítico dos homens do século XVII à fidedignidade de certos 'diplomas' medievais”, ou seja, da necessidade de se investigar a veracidade de documentos. Na época, a questão da distinção de documentos falsos de verdadeiros tornou-se importante, em função da “cobiça de privilégios, bens e propriedades eclesiásticas”. A princípio, a nova técnica documentária serviu ao Direito Eclesiástico, posteriormente beneficiando historiadores e arquivistas.

Duranti (1989) afirma que a publicação da obra de Mabillon marcou não apenas o nascimento da Diplomática, mas, também, da Paleografia. Cinco partes da obra

93 tratam da crítica diplomática e uma parte é dedicada à análise da escrita, sendo considerada o primeiro tratado sobre Paleografia. Mabillon subdivididiu um grupo de cerca de 200 documentos em grandes categorias e examinou aspectos como material, tinta, linguagem, roteiro, pontuação, abreviaturas, fórmulas, assinaturas, selos, sinais especiais, notas de chancelaria, entre outros.

A principal contribuição desta obra foi a de estabelecer regras para distinguir cartas autênticas de falsificações ou de documentos suspeitos. Para Skemer (1989), Mabillon foi capaz de criar critérios para uma análise cuidadosa do documento que incluía evidências internas e externas. Foi incluído entre os critérios a escrita, estilos, linguagem, pontuação estereotipada, expressões, assinaturas, monogramas, materiais (pergaminho, tinta e selos) e cronologia, tendo sido dada especial atenção para variações na forma do registro e para o contexto histórico e cultural em que os documentos foram preparados. Skemer (1989) ressalta que gerações de estudiosos abraçaram o método crítico criado por Mabillon e a Diplomática foi se expandindo geográfica e cronologicamente, incluindo documentos de origem privada, real e religiosa. Tornou-se uma importante ferramenta pedagógica na formação de historiadores, arquivistas e bibliotecários europeus.

Segundo Skemer (1989, p. 377), a Diplomática foi recentemente definida como "a ciência que lida com os tipos e os elementos dos documentos". Berwanger e Leal (2008, p. 31) afirmam que a gênese ou elaboração dos documentos compreende o “estudo de como os documentos surgem na sociedade”, que tem grande importância na análise diplomática, pois facilita a identificação de documentos autênticos, falsos ou falsificados. Para Duranti (1989), quem se compromete a fazer a análise diplomática de documentos precisa para investigar o significado das suas formas, entendê-lo não apenas no contexto do criador, mas no contexto mais amplo constituído pelo sistema jurídico de sociedade em que foi criado.

Para Mak (2012, p.4, tradução nossa), a Diplomática “é a análise sistemática da prova documental”, que oferece um método de interpretação fundado sobre o estudo íntimo das fontes de arquivo, incluindo o seu material, forma e as condições da sua produção. Parte do trabalho da Diplomática envolve o exame de documentos supostamente de origens comuns, com o objetivo de compilar uma lista de características comuns, incluindo material, estrutura física, estilo de escrita, sistema de datação e ortografia. A partir da investigação cuidadosa das fontes, tipologias documentais podem ser desenvolvidas para registros gerados por uma organização, durante um determinado período de tempo.

Segundo Delmas (1996), a Diplomatica clássica pode ser definida como a disciplina que estabelece, através da crítica de documentos de arquivo, um conjunto de

94 fontes científicas para a pesquisa medieval. Já a Diplomatica contemporânea, é a disciplina que estuda e permite a designação, por uma crítica que emana de arquivos, de fontes para constituir a memória de toda a pesquisa científica. A diferença entre as duas definições não traduz uma diferença de abordagem, mas o reconhecimento da evolução das condições em que poderá desenvolver a história de um lado e da generalização do perspectiva histórica para todas as disciplinas científicas e todas as técnicas.

Schellenberg (citado por SKEMER, 1989), afirma que a Diplomática tem pouca aplicação na contemporaneidade e que continua sendo estudada na Europa, para que os arquivistas sejam capazes de interpretar documentos antigos e medievais. Contrários a essa ideia, diversos autores argumentam que a Diplomática se constitui em ferramenta valiosa para lidar com documentos de todos os tipos e épocas, contribuindo para o desenvolvimento de uma maior compreensão crítica das formas da documentação contemporânea.

Segundo Duranti (1989), a formação do arquivista europeu é fundada principalmente na Diplomática e Paleografia, a formação dos arquivistas norte- americanos se baseia no conhecimento da história e da história da adminitração. No entanto, os princípios, conceitos e métodos diplomáticos são universalmente válidos, embora sua utilização deva considerar que, em virtude da pluralidade e fragmentação de fontes, o formalismo das burocracias antigas foi atrofiado.

Joyce (1988) pontua que a Diplomática pode resgatar a importância teórica do registro em seu contexto histórico, possibilitando o redirecionamento do interesse para a compreensão das fontes, em especial para explicar como a forma e a função de determinados tipos de documentos tem evoluído ao longo do tempo. Rondinelli (2005) afirma que no século XX a Diplomática foi redescoberta, sendo considerado um método seguro, para o bom gerenciamento arquivístico de documentos contemporâneos, inclusive de documentos digitais. Com o que corroboram Guimarães e Nascimento (2007), ao afirmarem que a Diplomática apresenta-se como um meio viável de análise de todo documento escrito, inclusive no ambiente digital. Pois, os elementos caracterizadores dos documentos convencionais submetidos à análise diplomática (suporte, conteúdo, finalidade e estrutura formal), continuam presentes também nos documentos digitais.

Skemer (1989) ressalta que poderia se desenvolver, a partir Diplomática, uma variedade de métodos para aplicação em documentos de diferentes épocas, inclusive nos registros contemporâneos automatizados. O resultado seria um valioso método de educação documental e útil ferramenta de curadoria para os arquivistas modernos, concentrando a atenção dos arquivistas nas formas e idade da documentação como

95 fontes compreensíveis e utilizáveis de evidências e não como conteúdos amorfos em volumosos registros em prateleiras e caixas arquivo.

A utilização de registros eletrônicos tem proporcionado forte impulso de mudança na Arquivologia, já que enfrenta os desafios de utilizar e gerenciar por longo prazo a utilização desses documentos. Tendo a Arquivologia surgido como uma extensão da Diplomática no século XIX, após a II Conferência Europeia de Arquivos, realizada em 1989, houve um resgate do interesse pela Diplomática por parte da comunidade arquivística internacional. O interesse se deve à possibilidade de aplicação de seus princípios aos documentos contemporâneos, sobretudo aos documentos eletrônicos.