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Os acessos e usos das tecnologias digitais pelos jovens em Portugal

PARTE I ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2. Os jovens e a sua relação com as tecnologias digitais

2.3. Os acessos e usos das tecnologias digitais pelos jovens em Portugal

O acesso à Internet e outras tecnologias digitais se difundiu rapidamente também em Portugal, principalmente após os media móveis, como os laptops e os telemóveis. A partir de então novos estudos passaram a surgir e ter como temática as práticas e os usos que os indivíduos estabelecem em ambiente digital. Especificamente em relação às crianças e adolescentes, o EU Kids Online17, realizado desde 2006 com 33 países, e o Net Children Go Mobile18, desde 2010, em sete países, tornaram-se as redes de pesquisa referências na Europa acerca do que fazem, onde fazem, o que consomem de informação, entretenimento e comunicação, quais as oportunidades e os riscos das crianças e adolescentes enquanto estão online.

Portugal foi contemplado em ambas as pesquisas e, há cerca de uma década, conta com números atualizados sobre a relação dos jovens com as novas tecnologias da informação e da comunicação e suas práticas sociais de uso.

Em 2014, com o apoio da Fundação para a Ciência e Tecnologia e da Universidade Nova de Lisboa, foi publicado o relatório Crianças e meios digitais móveis em Portugal: resultados nacionais do Projeto Net Children Go Mobile. A pesquisa apresentou dados como: 70% das crianças e adolescentes de 9 a 16 anos se consideram mais entendidos sobre smartphones do que seus pais; raparigas costumam aceder à Internet por meios móveis mais que os rapazes, os acessos diários à Internet e às redes sociais crescem com a idade, jovens de famílias de baixa renda acedem com menos frequência. Entretanto, a escola em Portugal mostra-se um espaço que democratiza o uso da Internet. Dentre os participantes da pesquisa, 73% responderam ter wi-fi nas escolas, o maior número entre os países do estudo. As atividades preferidas dos jovens portugueses, realizadas diariamente, são ouvir música, estar nas redes sociais e trocar mensagens. Aparecem em destaque também, os jogos e a busca de informações do seu interesse.

17Disponível em: http://www.lse.ac.uk/media-and-communications/research/research-projects/eu-kids-online 18Disponível em: http://netchildrengomobile.eu/project/

Entre os 11 e os 12 anos é quando se regista um crescimento abrupto do interesse nas redes sociais. Entre nove e 10 anos, 26% responderam ter um perfil em rede social. Já entre os adolescentes de 11 e 12 anos, este número sobe drasticamente para 80%. Pereira et al. (2018), em sua pesquisa com jovens portugueses, espanhóis e italianos, apresentada no tópico anterior, identificaram o YouTube como a rede mais popular entre os jovens portugueses. Dado corroborado pelo Net Children Go Mobile, em que os participantes de Portugal, em comparação aos jovens dos outros seis países integrantes do projeto (Dinamarca, Itália, Roménia, Reino Unido, Irlanda e Bélgica) são os que mais possuem um perfil no YouTube, com um terço (32%) dos participantes. Contudo, também um terço deles demonstrou preocupação em relacionar-se apenas com pessoas que já conhece. Foi o maior índice entre os sete países onde o projeto é executado. Ainda sobre a noção dos riscos a que estão expostos com o uso dos media, bullying, conteúdos sexuais, conteúdos negativos como incentivo à anorexia, à mutilação ou mensagens racistas e discriminatórios, foram os mais citados pelos adolescentes. São também os jovens portugueses os que mais procuram ajuda diante de contextos de risco, como estes citados, e seus pais foram os que se apresentaram com os maiores índices de mediação ativa da Internet.

A mediação ativa mais reportada é conversar sobre o que a criança ou jovem faz na internet e as menos reportadas dizem respeito ao incentivo a explorar coisas na internet e a fazer coisas em conjunto. Os lares de nível socioeconómico mais baixo apresentam uma diferença de 15 pontos percentuais nesta forma de mediação. (Simões, Ponte, Ferreira, Doretto & Azevedo, 2014, p. 3).

Os jovens portugueses acreditam ser os que têm maior noção sobre a Literacia Mediática, ou seja, os conhecimentos e a compreensão crítica acerca dos media e das novas tecnologias. Eles forneceram dados como: 36% disseram ser “muito verdade” que sabem usar a Internet muito bem, e 54% deram a mesma resposta para o uso de smartphones. Também afirmaram saber fazer upload de imagens, vídeos ou músicas em redes sociais (66%). Além disto, mostraram ter conhecimento sobre o uso seguro da Internet, como identificar informações verdadeiras ou falsas por meio de comparações entre sites (52%), bloquear publicidade indesejada (58%) e estar atento às configurações de privacidade das redes sociais (63%), como pode ser visto na Tabela 2 abaixo.

Tabela 2: Conhecimentos e competências das crianças e adolescentes na Internet Fonte: Simões, et al., 2014, p. 23.

Para além da Literacia Mediática e Digital, consumidores críticos e atentos precisam ter em conta a educação e literacia para o consumo. Segundo Ana Jorge (2015), em Portugal, as discussões acerca da temática são propostas mais por associações da própria indústria do que de consumidores, como o Media Smart, programa internacional implementado, desde 2008, em Portugal, pela Associação Portuguesa de Anunciantes19 que fala sobre literacia da publicidade. O site do programa tem informações e materiais dedicados aos alunos e professores, bem como um blog com artigos sobre a temática, mas que está desatualizado há

cerca de um ano. Além do Media Smart, há também o DECO Jovem, promovido pela Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor20, que trata sobre a literacia de consumo. Ele também oferece material de apoio aos professores e informou ter atividades planeadas para as boas-vindas ao novo ano letivo.

Acredita-se, assim que o esclarecimento sobre as linguagens e técnicas da publicidade, bem como o incentivo à produção de peças publicitárias ou criativas, leve os mais novos a sentir e reflectir sobre o processo de consumo, incluindo a sua comunicação, bem como as suas implicações sociais, culturais e económicas. (Jorge, 2015, p. 137)

Além destes programas, o Referencial de Educação para os Media (Pereira, et al., 2014), que engloba a Educação Pré-escolar, o Ensino Básico e o Ensino Fundamental é um rico material que pode contribuir para a literacia do consumo entre crianças e adolescentes portugueses. O Referencial apresenta descritores de desempenho por tema, nível e ciclo de educação e ensino, sendo um deles para o tema “Publicidade e Marcas”. Para jovens do 2° ciclo, recomenda-se, por exemplo, “identificar alguns elementos que tornam sedutora uma mensagem publicitária” (Pereira, et al., 2014, p. 27). Já para aqueles que estão no secundário, há indicações de “perceber como se tenta, através do marketing viral, da moda, da publicidade, etc., influenciar o meio sociocultural, para promover consumos” (Pereira, et al., 2014, p. 27).

Como foi visto aqui, a noção de adolescência ou juventude, assim como a noção de infância, é uma construção cultural que acompanha as transformações de cada tempo. No contexto em que nos encontramos hoje, de profundas interações digitais e hiperconectividade, é esperado que a juventude sofra influências, bem como influencie as formas de estar e consumir as novas tecnologias. No próximo capítulo iremos focar as reflexões em torno da plataforma escolhida como campo empírico deste trabalho, o YouTube, além de discutir importantes conceitos como o de influenciadores digitais e de microcelebridades.

3. O YouTube e seus influenciadores digitais, as microcelebridades da