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3.1 Métodos de Projetação Arquitetônica

3.1.2 Os complexificadores de projeto

Para Lawson (2011), o processo de projeto envolve encontrar problemas e as suas respectivas soluções. A análise da estrutura dos problemas de projeto baseia-se na ideia de que estes podem receber influência de diversos autores (ou complexificadores), como clientes, usuários, projetistas e legisladores.

29No original: Parler de l'usage de l'architecture, c'est la poser comme une réalité déjà là, comme un support pour des pratiques sociales, même si ces pratiques reconstruisent l´espace praticable [...].

30No original: L'idée de bâtiment est doublement liée à celle de système. D´une part, tout édifice articule une multiplicité d´éléments dont la réunion vaut plus que la somme de ses parties [...].

31No original: D'un point de vue pratique, le discours doctrinal est au service de l´object architectural. Il le représente, le valorise, le rend compétitif. Mais le discours doctrinal a également pour vocation de sécuriser le concepteur, de lui fournir des certitudes, de le guider dans son cheminement creátif.

Neste momento, parece-nos apropriado traçarmos um paralelo entre os geradores de problemas identificados por Lawson (2011) e a contribuição de Muñoz Viñas (2000) ao abordar a noção de “intersubjetividade”, ou seja, a participação de diferentes atores envolvidos no processo de conservação.

Normalmente, o problema de um projeto inicia-se na mente do cliente que possui uma necessidade, mas não consegue resolvê-la sozinha. Esse cliente terá uma participação fundamental no processo de projeto e não deve ser visto “apenas como fonte de informações, mas também como parceiro criativo no processo” (LAWSON, 2011, p.87-88).

Lawson (2005, p.89) também aponta os próprios projetistas como geradores de problemas, sendo “difícil separar projeto e arte”. Na verdade, é comum que o público espere que a produção arquitetônica abrolhe algum tipo de arte. No entanto, o projetista normalmente sofre mais restrições do que o artista, pois o primeiro não deve abordar os problemas de uma forma intrínseca e pessoal, procurando satisfazer apenas seus anseios artísticos.

O cliente do arquiteto espera bem mais do que apenas uma casa com cômodos de tamanho adequado e boas relações entre si. A expectativa óbvia é que o arquiteto leve em conta, por exemplo, questões de forma, espaço e luz e, com isso, crie não só uma edificação, mas aquilo que chamamos de arquitetura (LAWSON, 2011, p.90).

Ao analisarmos os projetistas como geradores de problemas, podemos colocar em pauta uma discussão bastante difundida nos projetos de intervenção em bens culturais: a criatividade. Na verdade, para muitos, projetar nestes casos extingue por completo a criatividade do arquiteto. Entretanto, entendemos que o projeto de intervenção é algo que pode envolver, sim (e muita), criatividade. Existe espaço de diálogo entre o novo e a preexistência. Na realidade, esse tipo de projeto não deve ser entendido como uma mera operação técnica de levantamentos métricos, pesquisas históricas, identificação do estado de conservação e de patologias, análises de materiais e técnicas construtivas, além da adequação a um novo uso. Como articular o antigo, visto como ultrapassado por muitos, e trazê-lo ao cotidiano de uma população, senão com um imenso trabalho criativo durante o processo de projeto de intervenção (KÜHL, 2006)? 32

Ao falarmos sobre criatividade no projeto de arquitetura, podemos nos remeter à contribuição de Mahfuz (1995, p.45) ao questionar: “como se dá a criação de formas em

32 Destacamos também, que existem níveis de criatividade diferentes para tipos diferentes de intervenção; seja ela de conservação, consolidação, estabilização, restauração; conforme o tipo, as exigências se diferenciam.

arquitetura?”. Para responder a este questionamento, o autor expõe quatro métodos de geração formal: inovativo, tipológico, mimético e normativo.

Diante das diversas possibilidades de intervir no patrimônio edificado, como relatado no capítulo anterior, discutiremos apenas os métodos inovativo e mimético. Entretanto, esta análise será realizada de forma mais interpretativa do que literal. Entendemos que as principais correntes de atuação na atualidade estão dialogando com, pelo menos, um desses dois métodos. O método inovativo “pode ser definido como um procedimento através do qual se tenta resolver um problema sem precedentes ou um problema bem conhecido de maneira diferente” (MAHFUZ, 1995, p.46).

Como nos projetos de intervenção a criação das formas vai interferir ou interagir com algo que já está construído, quando nos referimos à inovação, não ponderamos apenas a criação de novas formas, novos elementos arquitetônicos, mas a essência está em inovar, ou seja, poder conceder novas relações ao bem patrimonial, tanto no âmbito da arquitetura em si, quanto nas relações sociais e culturais.

Partimos da premissa básica:

[...] que a atividade de criação exercida por arquitetos e designers não parte de uma tábula rasa nem da consideração exclusiva de aspectos estruturais e programáticos, e pode ser definida como uma atividade que se baseia em grande parte na interpretação e adaptação de precedentes (MAHFUZ, 1995, p.45).

No caso do método inovativo, quando tratamos de precedentes nos referimos ao seu sentido mais amplo, não por analogia arquitetônica com cópia pura e simples de um estilo arquitetônico ou retorno a um estado “original”, mas como qualquer modo de reflexão em referenciais teóricos, metodológicos e práticos.

O método mimético pode ser interpretado de duas maneiras. Primeiramente, está relacionado à palavra grega mímeses, ou imitação. Também pode ser aplicado no sentido de que o existente não é copiado fielmente, mas é interpretado e adaptado, valendo-se principalmente de analogias (MAHFUZ, 1995, p.57).

Para nossa abordagem, o processo projetual que emprega o método mimético gera novos artefatos arquitetônicos através da imitação/cópia de modelos existentes ou resgatados – a repristinação.

Nesta mesma linha de pensamento, Boudon et al (2000, p.19) introduzem a noção da ideia intimamente ligada à criação. Para eles, a ideia implica na criação artística como um modo

de conhecimento. Assim, podemos distinguir duas formas de criação: a imitação, em que se reproduz o que é visto; e a imaginação, que (re) produz o que não é visto33.

Com relação aos legisladores como geradores de problemas, Lawson (2011, p.91) aponta que estes sejam, provavelmente, os que estão mais distante do projetista. Embora “não costumem se envolver no projeto real propriamente dito, os legisladores criam restrições dentro das quais os projetistas têm de trabalhar”, como, por exemplo, a aprovação do Corpo de Bombeiros e a obediência aos índices urbanísticos, causando uma certa tensão entre projetista e legislador, pois a legislação gera uma série de obstáculos que podem ir de encontro às ideias dos projetistas.

No caso do projeto de intervenção, essa tensão é bem mais delicada, pois a avaliação dos legisladores incide sobre o projeto não apenas em percentuais fixos, como taxa de permeabilidade e potencial construtivo, mas também outras questões mais subjetivas como autenticidade, integridade e o reconhecimento de valores artísticos, históricos e culturais serão avaliadas. Além disso, como atender às necessidades básicas de uso, como o programa de necessidades, a acessibilidade e proteção contra incêndio, por exemplo, sem prejudicar os aspectos que se desejam conservar no bem patrimonial?