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Os desafios / dilemas na condução do processo de ensino

No documento Relatório Final de Estágio Profissional (páginas 95-100)

3. Contextos de um epílogo – O Estágio Profissional

3.4. Acerca do ser professor – significados e sentidos

3.4.5. Os desafios / dilemas na condução do processo de ensino

―Há Homens que lutam um dia E são bons Há outros que lutam um ano E são melhores Há os que lutam muitos anos E são muito bons Mas há os que lutam toda a vida Esses, são os imprescindíveis‖

B. Brechl 3.4.5.1. Ser professor no século XXI

Presentemente, a profissão docente atravessa um cenário de descrença, desordem e de ameaça à própria profissão. A imagem do profissional da educação foi adulterada e hoje existe, por parte de algumas pessoas, uma descrença no professor. O professor deixou de ser visto como elemento fundamental ao futuro das crianças e é sistematicamente substituído pelas novas tecnologias. Assim, a sociedade alterou a ideia acerca da importância do Professor/Educador na educação dos seus filhos. O estatuto do professor

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alterou-se não apenas sob o ponto de vista do enquadramento legal (estatuto docente), mas também no contexto real do exercício, falta-lhe autoridade e organização.

Perante este cenário, importa que se procure percepcionar o que provocou a alteração, pois só assim haverá capacidade de intervenção. Contudo, mais do que saber quem são os responsáveis, importa saber quais são as causas e percebê-las.

No modelo de sociedade ocidental, todas as dimensões da vida humana se encontram subjugadas à economia. Esta é dominada pelo neoliberalismo capitalista, mais ou menos selvagem, onde impera a maximização do lucro em desfavor de outros valores e onde o homem é encarado como um factor de produção, como qualquer máquina. É este modelo que o ocidente quer estender a todo o mundo. Este é o grande responsável pelo actual estado de coisas na educação. Se o homem for considerado uma máquina, passa a ser mais um elemento numa cadeia de produção, que se usa enquanto tiver vida útil para ser usado, e depois se deita fora. Neste sentido, coloca-se a seguinte questão: será que ele precisa de saber mais além do que lhe é estritamente necessário para dar continuidade à cadeia de produção do sistema onde se insere? E para que precisa ele de um Professor/Educador? Para que precisa ele, sequer, de um professor? Para quê estar a “encher a cabeça” do “homem - factor produtivo”, com coisas “supérfluas”, que não acrescentam nada à sua produtividade?

Neste quadro, o professor pode, em última instância, ser substituído pelo computador e a sala de aula pela sua própria casa. Este poderá aprender à distância, à sua própria custa, o que o sistema lhe quiser “impingir”. Deste modo, fica mais barato, há menos possibilidade de discussão e, portanto, de subversão do sistema. Neste contexto, os Governos, reféns desta ideologia, criam as condições para que ela se perpetue, através das políticas de educação que instituem.

Paralelamente a esta realidade, a sociedade ocidental evidencia zonas cinzentas, geradoras de conflitos. As campanhas massivas, através dos média, de propaganda desta ideologia, em que os valores da competitividade e da

concorrência são exaltados ao extremo, em detrimento de valores como a seriedade, a honestidade, a solidariedade, a justiça, a igualdade, a ética, em muito contribui para que esta sociedade se encontre na situação actual: Uma sociedade sem valores, descrente, atordoada, amorfa, incapaz de pensar por si, virando-se contra si própria, numa luta fratricida, incapaz de focalizar correctamente as causas da situação anárquica em que se encontra. Os professores são, neste contexto, um alvo fácil e é contra eles que, não raras vezes, se vira a ira de muitos, culpabilizando-os pelas suas desgraças, sem perceber que, uns e outros, estão a ser vítimas do mesmo – dos que concebem o homem como um factor de produção e não como um ser humano com Razão e Sentimento.

Tomando como referência estes elementos, pode desprender-se que o estado a que a educação chegou é reflexo de uma política mais global, fruto da ideologia dominante, que abrange todos os aspectos da vida das sociedades. Se tivermos em conta que as alterações societais são cíclicas, é provável que a situação actual vivida pela classe docente reverta. Neste sentido, importa que o professor, independentemente dos constrangimentos que hoje enfrenta, não desista da sua missão de educar ainda que, como diz Paulo Freire, tenha que ser clandestino, ou subversivo.

Partilho do entendimento que, cada vez mais, se justifica então o Professor/Educador, o Professor/Libertador, o Professor/Emancipador, que terá como missão abalar os fundamentos do status - quo vigente e abrir caminho a um mundo novo de forma a que o futuro seja desenhado com jardins e flores.

Em Portugal, nos últimos anos, e de forma mais acentuada nos últimos quatro, assiste-se a uma guerra entre o governo e os professores, a qual tem contribuído, ainda mais, para a fragilização da profissão perante a opinião pública, bem como para o mal-estar dos profissionais da educação. O cenário tem, gradualmente, vindo a agravar-se. O professor tem visto a sua carreira cada vez mais em risco, com salários mais baixos e, consequentemente, a classe tem perdido estatuto social. Assiste-se, também, à invasão de pessoas de outras áreas na escola, designadamente nas áreas de gestão. Vive-se um

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clima de tensão e de alguma desorganização e revolta, sendo que o professor tem sido vítima de uma política de contenção, impedindo-o de desempenhar a profissão no auge das suas capacidades. Neste panorama, inúmeros docentes estão a abandonar a profissão, sendo que entre muitos dos que permanecem, se instalou o medo e o desânimo.

Face a estes constrangimentos, a função de educador tem sido relegada para segundo plano, em detrimento de funções burocráticas e administrativas. Assim, o professor tem que ser capaz de parar para pensar e questionar-se acerca do futuro que quer. Para si, enquanto cidadão, para si, enquanto professor, para a própria profissão, para os alunos, ou seja, que futuro quer para o futuro.

No contexto actual, o professor tem que ser mais flexível, mais aberto. Deve valorizar o diálogo com os outros profissionais da educação, reunir-se e discutir os problemas que actualmente se abatem sobre a classe e sobre a educação. Acresce que o professor deve ter um percurso de permanente estudo. ―Um médico que só sabe de medicina nem de medicina sabe‖ dizia-nos a professora Olga Vasconcelos, no decorrer do primeiro semestre do terceiro ano da Licenciatura, citando Abel Salazar. O professor deve ser um eterno estudante, para poder ser um educador no verdadeiro sentido da palavra, ou seja, estabelecer relações com os alunos, envolver-se com eles, para que eles consigam adquirir conhecimentos, porque é nesta transmissão de conhecimentos que a humanidade se educa e se desenvolve, passando conhecimentos de geração em geração. O professor deve insistir na cidadania, nos valores éticos e morais, ter uma atitude de permanente auxílio, presença na vida e no desenvolvimento do conhecimento das crianças. Importa, assim, que o professor seja humilde, flexível e crie relações com os alunos de modo a que a educação aconteça de uma forma fluida, onde o sentido de educar esteja presente. Já os alunos devem estar motivados e envolvidos no processo, conscientes de que estão a aprender e do porquê de estarem a aprender aqueles conteúdos.

Já Luís de Camões dizia que: ―mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. Porém, estar diferente não significa, necessariamente, estar melhor.

Neste sentido, o professor tem que reflectir acerca do modo como se deve adaptar às novas exigências, sendo que só os apaixonados, os amantes da educação estarão predispostos para encarar esta luta. Assim, considero que o professor do futuro tem que ser capaz de continuar a ser, mais do que nunca, um apaixonado pelo acto de educar e saber envolver o aluno durante a aula. O bom professor será aquele que conseguir demonstrar ao aluno a importância de aprender. O professor é, e será sempre, fundamental no sucesso do aluno. É a atitude do professor que vai fazer com que a prestação do aluno seja boa ou má. O professor terá que encontrar estratégias para integrar e incluir todos os elementos das turmas, não deverá perder sem preocupação algum aluno por desinteresse ou falta de motivação. É papel fundamental do professor estar em sintonia com os alunos e com aquilo que eles pensam.

Os desafios que se avizinham à profissão de professor não serão fáceis de enfrentar. Requerem empenho e, sobretudo, querer. O caminho vislumbra- se árduo e sinuoso, com obstáculos diversos, designadamente a necessidade de tornar as novas tecnologias aliadas e não obstáculos no acto educativo. Outro aspecto importante é o entendimento de que as crianças de hoje não são as mesmas de ontem, nem serão as mesmas de amanhã. Assim, é necessária uma adaptação e compreensão por parte do professor. Já na Educação Física, as questões que se colocam também são distintas. Menciono, a título de exemplo, os casos de obesidade que não param de aumentar, que, frequentemente, levam a problemas de saúde; o sedentarismo que também não para de aumentar; o facto de hoje as crianças já não brincarem nas ruas, não apanharem chuva, não caírem, não correrem livremente, não jogarem “à bola”. Podemos dizer que hoje temos crianças criadas entre quatro paredes que preferem a internet e os vídeo-jogos, ao relacionamento com os seus pares.

Bem diferente de outros tempos, quantos de nós, quando éramos crianças, não chorávamos e riamos depois de uma pelada de Futebol, depois de uma noite de verão a jogar jogos que inventávamos na hora? E era aí, na rua, no relacionamento com as adversidades que se ganhava querer, força de

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vontade, carácter. Alguns valores morais fortaleceram-se aí, no respeito pelo colega.

Mas hoje a realidade é outra e cabe aos profissionais da educação estarem atentos e preparados para encararem estes problemas que, neste início do século XXI, tomam conta do dia-a-dia.

Independentemente dos constrangimentos e do status social fragilizado do docente, quero ser professor, sinto que quero ser um educador no sentido enunciado por Paulo Freire. Recuso-me a olhar o exercício da função docente no sentido mecanicista e de formação de robots, pretendo ser capaz de contribuir para o atenuar destes problemas, pois se cada um fizer a sua parte, com certeza que teremos algum sucesso. E ser professor é isto mesmo, é ter recompensas que nem sempre são visíveis.

No documento Relatório Final de Estágio Profissional (páginas 95-100)