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Os discursos divergentes sobre a inovação do ProEM

SUMÁRIO AGRADECIMENTOS

ALUNO SÉRIE DEPOIMENTO

4.7 Os discursos divergentes sobre a inovação do ProEM

Ao observar a atuação dos atores no contexto recente, percebemos o envolvimento de cada um deles em diversas atividades propostas pela escola. Foram os fatos atuais que nos levaram a realizar um paralelo com aqueles apontados pelos documentos analisados, entre os quais, relatórios, fotos, vídeos, jornais e a própria fala dos atores, obtida em entrevistas e conversas informais, tendo em vista os aspectos inovadores do programa previstos pelos documentos orientadores do programa (BRASIL, 2009, 2013 e 2014).

Quando analisamos os documentos orientadores do ProEMI, elaborado pelo Governo Federal, encontramos neles subsídios que apontam para a inovação, que se postos em prática representariam um salto qualitativo no processo de aprendizagem. A respeito disso, citamos como exemplo a Metodologia da Problematização expressa no Arco de Maguerez (BERBEL, 1998), cujo objetivo é levar os alunos a identificarem alguns problemas da sua realidade e, através de um trabalho de pesquisa, encontrar as possíveis causas destes para tentar resolvê- los, demonstrando o compromisso dos alunos com seu meio.

No entanto, ao analisarmos os discursos, não somente dos documentos oficiais, mas também os produzidos pelos sujeitos implicados na realidade estudada, percebemos uma série de paradoxos. É principalmente na fala, e não apenas em materiais escritos, que estas pessoas manifestaram uma realidade controvertida, que não é expressa pelo discurso oficial, mas pelo discurso cotidiano, o não oficial.

Assim, durante a pesquisa, recebemos vários depoimentos a respeito do ProEMI, que refletem as contradições do programa. Se por um lado alguns sujeitos questionaram e

criticaram o desenvolvimento das oficinas, apontando suas dificuldades, por outro, há aqueles que se sentiram contemplados com o trabalho.

Quando foi questionada sobre o que havia de “inovador” no programa, a atual gestora falou: “Ampliou a carga horária do professor, trouxe recursos financeiros. A inovação veio facilitar o que a escola já fazia” (diário de campo). No entanto, contestamos essa opinião: esses aspectos são inovadores ou apenas demonstram uma visão tecnicista a respeito do programa e do conceito de aprendizagem inovadora?

Para a gestora da escola, o programa veio facilitar o que a escola já fazia em termos de inovação, ou seja, a concepção dela está fundamentada no documento base do ProEMI, que projetava a ampliação da carga horária do professor e melhorias técnico-metodológicas através de recursos financiados pelo MEC para compras de materiais didáticos e atividades extracurriculares, como passeios e viagens.

No entanto, a opinião dos professores sobre o desenvolvimento do programa é bem diferente da gestora. Através dos relatos obtidos, percebemos a insatisfação dos professores de Letramento, que inclusive se negaram a falar em entrevista semiestruturada, mas deixaram transparecer nas conversas informais os motivos dos dissabores. Para eles o programa foi muito empolgante no início da sua implantação, mas no final, tudo acabou por se resumir na produção de cartazes, relatório, ou seja, tudo girava em torno de produção textual, já desenvolvida durante as aulas de Português.

Os professores alegaram que faltou investimento, os recursos recebidos já tinham destino certo, “o dinheiro vinha carimbado e pronto” (diário de campo), ou seja, não tinham como redirecionar a verba para outra finalidade que não fosse aquela designada pelos empenhos recebidos (capital e custeio). Diante desse problema, as viagens e os passeios iniciais ficaram escassos e as aulas, antes muito dinâmicas e com muitas atividades práticas se tornaram a “mesmice” que os alunos tanto questionaram na entrevista coletiva. Como resultado deste descontentamento, os estudantes acabaram por desistir, deixando de frequentar as oficinas.

Na concepção dos professores não houve nenhuma inovação com o programa e quando perguntamos o que significa “ensino inovador” para eles, a professora Catarina resumiu: “Que trabalhe a habilidade do aluno prazerosamente. O prazer de fazer, de construir” (diário de campo).

Em depoimento, o aluno X deixa claro a necessidade de alguma oficina sem muito custo: “[...] não precisaria ser aquela coisa, ah! vamos gastar. Até mesmo um simples artesanato, uma oficina de reciclagem seria o suficiente porque distrai de qualquer forma”

(entrevista coletiva). Por esse discurso o aluno demonstra como são cansativas as aulas do dia a dia, principalmente num sistema integral como é o caso desta escola.

Mas, nem tudo foi uma desventura, pelo menos em relação à Robótica, que segundo as falas, tanto dos professores quanto dos alunos, representou um diferencial dentro do ProEMI. Em entrevista, o professor Anthony nos disse que “se sentiu agraciado” com este macrocampo, pois a escola recebeu material específico, ou seja, 10 kits da LEGO para trabalhar nas oficinas e, além disso, ele só tinha de dez a quinze alunos, o que favorecia uma assistência mais individualizada.

No entanto, ele também reconhece as dificuldades apresentadas durante o programa para todos os macrocampos. Ele nos disse que faltou capacitação, pois o programa foi implantado sem nenhum preparo dos professores, inclusive da sua área, e deixou bem claro que aprendeu Robótica com os alunos. Pelo seu depoimento, a LEGO foi à escola apenas uma vez para orientá-los e depois disso nunca mais apareceu, ou seja, em sua opinião o trabalho da empresa se traduziu em “se vire professor” (entrevista).

Mesmo diante desse contratempo inicial, esta oficina foi muito elogiada por todos, alunos e professores, tendo em vista o protagonismo dos estudantes nas atividades. Mas como vimos, o professor teve que “se virar”, pois como ele mesmo afirma, não tinha domínio da Robótica e teve que aprender essa área com o auxílio dos alunos.

Quando foi questionado sobre o sentido da inovação, o professor fez um desabafo ao dizer que a inovação está intrinsecamente ligada ao respeito pelo professor: “Todo dia o professor é um herói, então eu acho que só vai inovar quando tiver realmente respeito para com o professor, pode colocar em letras garrafais: SÓ IRÁ INOVAR QUANDO REALMENTE TIVER RESPEITO PARA COM O PROFESSOR” (professor Anthony).

Mais adiante ele transparece a questão da falta de tempo como um empecilho à inovação:

[...] eu acho que a minha maior inovação não é trazer robótica, que é bom, não é levar o menino pro teatro, que é maravilhoso, não é levar o menino para o cinema, que é uma coisa linda, isso aí já deveria ter acontecido há muito tempo, né? Mas inovação não é essa, é no dia a dia ver essas crianças assim: “Poxa a aula do professor foi maravilhosa”, aí eu falo assim pro meu aluno: “Sabe por que foi maravilhosa? Porque eu tive tempo, aí eu posso ir de cadeira em cadeira dar assistência, preparar uma aula show, uma coisa diferente”. Aí sim é inovar (professor Anthony).

Pelo que percebemos no discurso do professor, o fator tempo interfere diretamente na preparação das aulas inovadoras, pois os mestres se encontram tão atarefados em preencher

planilhas e relatórios, ou seja, tão presos à burocracia, que isso acaba por prejudicar na elaboração de aulas mais interessantes. Aliado a este problema vamos encontrar salas de aulas numerosas que dificultam um atendimento mais personalizado.

Os alunos também deram opinião a respeito do que seria um ensino inovador e apontam a necessidade de se conciliar a teoria com a prática, resumida desta forma pelo aluno A: “Nisso você inova o ensino e faz com que ele não fique uma coisa chata, faz com ele não fique com mesmice, onde você vê teoria, teoria, teoria e você nunca tem uma prática, uma coisa divertida, que você vai se descontrair” (entrevista coletiva).

Essa queixa dos alunos se fundamenta na dificuldade apresentada pelos professores em utilizar os laboratórios da escola. Conforme observamos, o laboratório de informática é usado em pesquisas esporádicas passadas pelo professor ou para dar aulas aos alunos na sua área.

Apesar de a escola possuir Laboratório de Ciências (Física, Química e Biologia) e Laboratório de Robótica (que ainda funciona independente do término do programa, segundo a fala da gestora), observamos que todos eles estavam trancados quando visitamos os espaços da escola, durante o Sarau Poético no dia 08 de abril de 2016. Registramos, inclusive, na entrada destas salas, algumas carteiras que foram descartadas e quando questionamos alguns alunos se elas estavam sempre naquele local, eles confirmaram. Esse fato que nos leva a inferir que não são ambientes usados com frequência.

Quando perguntamos à gestora se poderíamos fotografar a sala de Robótica, ela disse que não era viável, porque no momento o ambiente estava servindo de depósito com material de construção para uma reforma na escola. Ela também não demonstrou interesse que registrássemos imagens do Laboratório de Ciências, pois esta sala também estava ocupada com outro fim. Então realmente, a queixa do aluno G faz sentido ao comentar: “[...] a gente tem um laboratório na escola, inclusive, avaliado em muito, é... em milhares de reais, não sei quanto é, vinte mil me parece, uma coisa assim, e a gente não utiliza, não tem profissionais pra dar essa aula pra gente” (entrevista coletiva).

Finalmente, apresentamos um quadro-síntese com as falas dos sujeitos, evidenciando os pontos positivos e negativos do ProEMI.

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