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Os Indignados na Espanha

No documento As mídias sociais e o Occupy Wall Street (páginas 40-45)

3.2 A PRIMAVERA ÁRABE NO EGITO E OS INDIGNADOS NA ESPANHA

3.2.2 Os Indignados na Espanha

Na Primavera de 2011, com a crise econômica se alastrando pelo continente europeu, a população espanhola foi às ruas em busca de respostas e soluções. Um grupo de ativistas organizados e intitulados “Democracia Real Ya!” (DRY) –Democracia Real Agora- uniram todos os cantos do país para que, juntos, começassem uma revolução no dia 15 de Maio de 2011.

De acordo com Puig (2011, p.210, tradução nossa):

Em 2007 a palavra “crise” começou a dar os seus primeiros sinais de que iria aparecer, destruindo o “milagre Espanhol” de uma vez só. Em 2011, a economia baixou, orçamentos e salários foram cortados, o desemprego atingiu a marca de 22%, segundo a Organização para a Cooperação Econômica e dados do Desenvolvimento, e o emprego dos jovens atingiu uma marca de 47%. É claro que a Espanha não foi um caso isolado. Islândia, Irlanda, Grécia e Portugal também sofreram os efeitos da crise, e os seus cidadãos tomaram as ruas. Em Lisboa, no dia 12 de Março de 2011, trezentos mil jovens protestaram, utilizando o slogan “Geração à Rasca” – geração desesperada portuguesa11

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Segundo Castañeda (2012), o movimento espanhol mostrou que não apenas as pessoas no Norte da África tinham razões para tomar as ruas e fazer ações diretas, mas que muitos cidadãos nos países desenvolvidos tinham também suas razões para lutar e tomar as principais praças das cidades mostrando as suas insatisfações contra a economia e contra o status quo político.

Para Postill (apud LÓPEZ; RODRÍGUEZ, 2011b, tradução nossa):

Ativistas espanhóis e observadores igualmente concordam que os protestos de 15 de maio começaram com um grande atraso. O colapso do mercado imobiliário em 2008 havia deixado a economia espanhola em estado débil, com uma taxa de desemprego de cerca de 20% e um número impressionante de 45% entre os jovens, com milhões tendo que sobreviver com baixos salários ou empregos sazonais. A combinação de uma classe política desacreditada por uma série de casos de corrupção, uma lei eleitoral que perpetuava um sistema bipartidário, e o precedente de levantes

11In 2007 the Word “crisis” began to appear, destroying the “Spanish miracle” in one fell swoop. In 2011, the economy ground to a halt, budgets and salaries were cut, unemployment (according to Organization for Economic Co-operation and Development data) reached 22 percent, and youth unemployment rose over 47 percent. Of course, Spain was not an isolated case. Iceland, Ireland, Greece, and Portugal had suffered the effects of the crisis, and their citizens had taken to the streets. In Lisbon, on March 12, 2011, three hundred thousand young people protested, using the slogan Geração à Rasca – Portugal’s desperate generation.

pró-democracia na Tunísia e no Egito, resultaram em um cenário ideal para a primavera de descontentamento na Espanha.12

Dessa maneira, seguindo os vizinhos portugueses e os países do norte da África, os espanhóis decidiram tomar as ruas da capital Madrid em 15 de Maio de 2011. Esse dia ficou conhecido como “15M”, levando o título daqueles que estavam nas ruas de “os indignados”. A marca para o inicio dos protestos foi a apenas uma semana das eleições locais, mudando todo o curso daquilo que já era esperado: “com cinco meses de movimento, o jornal Guardian chamou o movimento 15M de o desenvolvimento político mais interessante desde a morte de Franco em 1975” (PUIG, 2011, p.211).

Para alguns estudiosos, as razões que levaram os manifestantes às ruas das principais cidades espanholas eram: “raiva dos bancos, corrupção, o sistema eleitoral corrupto e a frustração e desgosto com a mídia” (PUIG, 2011, p.213). Alguns dos grandes slogans que os manifestantes levaram por vários dias pelas ruas de Madrid eram (PUIG, 2011, p. 213, tradução nossa):

“Não tem mais pães suficientes para todo o nosso chorizo”. “Eles chamam isso de democracia, mas não é”. “Eu acho que vou ficar no seu caminho”. “O problema não é o dinheiro, e sim os ladrões.” “Se vocês não nos deixarem sonhar, nós não deixaremos vocês dormirem.” “A França e a Grécia brigam, a Espanha vence no futebol”. ‘Políticos e banqueiros, acordem!” “Eles estão focados em roubar você”. “Eu penso na Islândia.” “Sim, nós acampamos”13

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O movimento rapidamente se espalhou pelo País. As principais cidades que participaram do movimento foram: A Corunã, Albacete, Alcaá, Alicante, Almeria, Ávila, Avilés, Badajoz, Barcelona, Bernicarló, Bilbão, Burgos, Cáceres, Cádiz, Castellón, Chiclana, Cidade Real, Córdoba, Cuenca, Donostia, Elche, Gasteiz, Gijón, Girona, Granada, Guadalajara, Hellín, Huelva, Huesca, Ibiza, Jaén, Jerez, A

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Spanish activists and observers alike are agreed that the 15 May protests were long overdue. The collapse of the housing market in 2008 had left the Spanish economy in a feeble state, with an overall unemployment rate of around 20% and a staggering figure of 45% among young people, with millions more having to survive on low-paid or seasonal jobs. The combination of a political class discredited by a string of corruption cases, an electoral law that perpetuates a two-party system, and the precedent of pro-democracy uprisings in Tunisia and Egypt, set the scene for a spring of discontent in Spain.

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The principal motives of the protests were: anger at the banks, corruption, and the election system, and frustration and disgust with the press. There’s not enough Bread for all this chorizo. They call it democracy, but it isn’t. I think, therefore I get in the way. Money’s not the problem, it’s the thieves. If you don’t let us dream, we won’t let you sleep. France and Greece fight, Spain wins at football. Politicians and bankers, wake up! Focused on robbing you. I think of Iceland. Yes We Campo.

gomera, As Palmas, León, Lleida, Logronõ, Lugo, Madrid, Málaga, Manacor, Menorca, Mérida, Miranda Del Ebro, Murcia, Ourense, Oviedo, Palência, Palma de Mallorca, Pamplona, Ponteareas, Pontevedra, Ronda, Salamanca, Santander, Santiago, Segovia, Sevilla, Soria, Tarragona, Tenerife, Tenerife Norte, Tenerife Sul, Terrasa, Teruel, Toledo, Tui, Valencia, Valladolid, Vigo, Vilagarcía de Arousa, Zamora, Zaragoza. (TOMALAPLAZA, 2013). Na figura 2 é possível visualizar as ações no país Espanhol, bem como em Portugal.

Figura 2 – Mapa das ações na Espanha e em Portugal.

Fonte: SQUARE Debate. Squares database. Disponível em: <

https://squaresdatabase.crowdmap.com/ > Acesso em: 27 maio 2013.

Miguel Yarza, um dos ativistas e organizadores da Democracia Real Ya, relata que o chamado para uma ação veio da DRY, entretanto os acampamentos que foram montados na Puerta del Sol, principal praça de Madrid, onde os manifestantes se reuniram, não foi uma iniciativa deles, e sim, um ato espontâneo das milhares de pessoas ali presentes (YARZA, 2011). Além desses acampamentos,

os manifestantes se organizaram em grupos de trabalho e formaram Assembleias Gerais para tomar decisões baseadas em consenso: estratégia que foi adotada pelo OWS alguns meses depois (BAUER et al, 2011, p.07). Com princípios descentralizados e sem lideres, cada cidade possuía suas próprias prioridades e demandas (PUIG, 2011, p.214).

Para Postill (APUD CARLES FEIXA ET AL, 2012b, tradução nossa):

O acampamento foi configurado como uma pequena cidade. Desde o início ruas foram estabelecidas, onde as pessoas podiam andar. Diferentes áreas foram marcadas por fitas coloridas, incluindo espaços para caminhar, dormir, comer, e lazer. Diversas comissões foram criadas para organizar o acampamento. No canto do amor você poderia conversar sobre assuntos metafóricos e meditar; havia lugares onde você podia obter uma massagem depois de um dia cansativo no campo, e havia até uma biblioteca infantil com um pequeno viveiro. Todo mundo estava vivendo para o movimento, por sua crença de que tudo iria dar certo. Tem sido dito muitas vezes que somos a geração Erasmus: tivemos contatos com outras culturas, a nossa formação nos permitiu assumir papéis mais complexos e arquiteturas. Mas nós não éramos apenas um movimento de jovens: pessoas da área e os sem-teto também nos ajudaram. Eles empreenderam tarefas logísticas, fizeram mesas e cadeiras para nós, e colocaram lonas quando chovia. Foi um movimento muito heterogêneo, você poderia encontrar qualquer um: estudantes, trabalhadores precários, trabalhadores regulares. Havia muitas pessoas de muitos lugares. Era como um pequeno mundo dentro de um mundo, mas fantástico. Tão espontâneo e tão bem organizado.14

Segundo Willie Osterweil, ativista envolvido no planejamento do Occupy Wall Street (BAUER et al, 2011, p.07), “os acampamentos se tornaram centros de informação, protesto e de vida revolucionária”. Além de montar cozinhas, eles distribuíam as comidas de forma gratuita, faziam sessões de terapia, reuniões com diferentes tópicos, workshops e discussões publicas. Era uma “democracia diferente”: trabalho, recursos e decisões eram todos compartilhados e para proteger

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The camp was configured like a small city. From the beginning streets were established where people could walk. Different areas were marked by colored tape, including spaces for walking, sleeping, eating, and leisure. Diverse commissions were created to organize the camp. In the corner of love you could chat about metaphorical matters and meditate; there were places where you could get a massage after a tiring day at the camp; and there was even a children’s library with a small nursery. Everyone was living for the movement, for their belief that it would all work out. It has been said many times that we are the Erasmus generation: we had contacts with other cultures, our training enabled us to assume more complex roles and architectures. But we were not just a youth movement—the people from the area and the homeless also helped. They undertook logistical tasks, they made tables and chairs for us, and put up canvases when it rained. It was a very heterogeneous movement, you could find anyone: students, precarious workers, regular workers. There were many people from many places. It was like a small world inside a world, but fantastic. So spontaneous, and yet so well organized.

os acampamentos, eles utilizam cartazes os quais exibiam slogans revolucionários (BAUER et al, 2011, p.07).

Como na Primavera Árabe, a disseminação das informações dos acampamentos e manifestações era repassada via internet pelo Facebook, Twitter e YouTube. A maioria dos participantes eram estudantes universitários, chamados de “nativos digitais”. Pesquisas mostraram que 65.3% dos participantes souberam dos protestos via Facebook e 9.9% via Twitter (PUIG, 2011, p.214). Segundo Postill, (2011a) os participantes do 15M rejeitavam qualquer separação entre o online e off- line ou entre o digital e o analógico. Os manifestantes viam essas duas esferas como “mutuamente construtivas e enfatizavam o caráter “horizontal” dos fluxos de comunicação através da internet e dos espaços presentes”. Os manifestantes mostravam a importância do Twitter na participação democrática através de “um terreno midiático achatado em que a polarização é onipresente” (POSTILL, 2011a).

No dia dezessete de Maio de 2011 o site da Democracia Real Ya! não estava disponível devido ao grande número de acessos, fazendo com que os manifestantes encontrassem outras maneiras de se organizarem, usando para isso o Facebook, Twitter e YouTube (REGO, 2011c). Segundo Rego (2011c), “alguns usuários têm chamado o movimento de a “revolução espanhola”, em referencia à Primavera Árabe”.

No Twitter, hashtags como #worlrevolution (revolução mundial) e #globalcamp (acampamento global) eram dois dos mais procurados entre aqueles dias de Maio e outros como #15m, #15mani e #democraciarealya eram também muito utilizados pelos usuários para compartilharem vídeos e fotos dos protestos nas mais diversas cidades do país espanhol (REGO, 2011c). De acordo com Rego (2011c), uma das mensagens mais repassadas no dia dezesseis de Maio foi: “primeiro eles te ignoram. Depois, eles riem de você. Aí eles te atacam. E então você ganha > Gandhi #acampadasol #spanishrevolution”.

Com a rápida disseminação das informações via mídias sociais, quando os usuários souberam que a polícia espanhola viria para tirar os manifestantes das praças e acabar com os protestos, a solidariedade de países vizinhos e do restante do país se mostrou maior do que qualquer um poderia imaginar (REGO, 2011b).

Na figura 3 é possível verificar mais de 600 “Revoluções Mundiais” em apoio aos Indignados. todas organizadas via mídias sociais.

Figura 3 - Revoluções Mundiais em apoio aos Indignados pelo mundo.

Fonte: REGO, Leila Nachawati. Global Voices: da revolução espanhola à revolução mundial. 2011 . Disponível em: <http://pt.globalvoicesonline.org/2011/05/27/espanha-da-revolucao-espanhola-a- revolucao-mundial/>. Acesso em: 08 abr. 2013.

Segundo Rego (2011a), líderes políticos e alguns meios de comunicação “acusaram o movimento de uma falta de estrutura definida”. Entretanto, os manifestantes alegavam que ocupar espaços públicos, ruas e a internet era uma forma inovadora e diferente de protestar, e que iriam continuar “tirando partido de ferramentas digitais para organizarem, partilharem e construírem suas próprias histórias”. Já para Postill (2011a), “os ativistas do 15M habitavam uma mídia dinâmica em que os seus caminhos digitais, frequentemente atravessavam os caminhos de jornalistas, políticos e intelectuais através do Facebook ou Twitter”.

Atualmente, a situação na Espanha continua a mesma: altos níveis de desemprego e cidadãos migrando para outros países na tentativa de recomeçar a vida com melhores condições. Os protestos continuam.

No documento As mídias sociais e o Occupy Wall Street (páginas 40-45)

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