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OS INGRESSANTES EM LICENCIATURA COMPARADOS COM OS DE

CAPÍTULO 4: ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1 OS INGRESSANTES EM LICENCIATURA COMPARADOS COM OS DE

Focalizando inicialmente as raízes e a situação atual dos alunos ingressantes, foram verificadas suas características socioeconômicas e culturais, tanto dos matriculados nos cursos de Licenciatura em Pedagogia e em Matemática, bem como comparadas às do grupo de estudantes ingressantes no curso de Direito.

Os questionários para levantamento do perfil socioeconômico e cultural dos alunos foram aplicados no mês de abril de 2011. Foram respondentes 176 (90,7% do universo) alunos do curso de Direito, 42 (65,6% do universo) de Matemática e 145 (78,3% do universo) de Pedagogia, totalizando 36 questionários. Os dados dos cursos de Matemática e de Pedagogia foram tratados em conjunto, por serem cursos de Licenciatura. No curso de Direito, os respondentes concentravam-se no período noturno (55,7%). Já nas licenciaturas, essa proporção era maior: 64,0% dos pesquisados estudavam à noite. À época da pesquisa, o curso de Matemática funcionava apenas nesse turno.

Quanto ao gênero, foi elevada a proporção de mulheres no curso de Pedagogia, conforme a expectativa de uma profissão amplamente feminina (GOUVEIA, 1970): 95,7% eram mulheres e apenas 4,3% eram homens. Já no curso de Matemática, ocorreu o contrário: o curso era majoritariamente composto por homens (65,8% de homens e 34,2% de mulheres). Ao agrupar os dois cursos, 82,7% eram mulheres. Quanto ao curso de Direito, 55,7% eram mulheres e 44,3%, homens, uma distribuição relativamente equilibrada. No total, 69,3% respondentes eram do gênero feminino e 30,7%, do gênero masculino.

Em relação à faixa etária dos participantes da pesquisa, a diferença entre os cursos foi de quase um ano. A média dos alunos de Licenciatura era de 26,0 anos (DP=7,4), enquanto para Direito, a média era de 27,0 anos (DP=8,9). No total, a média de idade foi de 26,4 anos (DP=8,2), variando de 16 a 57 anos, situada abaixo da média nacional para ingressantes, a qual foi de 25 anos para os cursos presenciais, de acordo com o Censo da Educação Superior de 2011, ano da

pesquisa (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2013b). Houve duas modas: 19 e 20 anos completos, com 35 respondentes para cada idade. A mediana foi 24, o que nos permite inferir que cerca de 50,0% estavam na faixa etária adequada para a educação superior.

Uma possível explicação para a mais alta média de idade dos estudantes de Direito e o correspondente desvio padrão é o fato de 19,9% dos respondentes desse curso já terem formação de nível superior. A tabela 7 apresenta os cursos superiores concluídos desses respondentes do curso de Direito.

Tabela 7 - Quantidade de ingressantes do curso de Direito, com graduação, por curso

Curso N Administração 4 Biologia 1 Comunicação Social 1 Educação Física 2 Gestão de Negócios 1 Letras 5 Pedagogia 4 Psicologia 3 Secretariado Executivo 1

Tecnologia em Segurança e Ordem Pública 1

TOTAL 23

Fonte: Pesquisa de campo (2011).

É interessante observar que quase a metade dos cursos listados na tabela 7 são de Licenciatura. Poderiam esses dados indicar o anseio dessas pessoas de abandonar a profissão docente? Estariam esses estudantes em busca de profissão mais rentável e mais prestigiosa? Entrevistas com oito desses ingressantes de Direito graduados em cursos de Licenciatura (um licenciado em Biologia; dois, em Educação Física; três, em Letras e dois, em Pedagogia, sendo três eram homens e cinco, mulheres) conduzem a respostas afirmativas a essas questões. A maioria já havia abandonado o magistério e ingressado em outras carreiras e o principal motivo era a remuneração. Apenas um ainda permanecia na profissão e estava cursando Direito como estratégia profissional, na intenção de exercer outra atividade ao se aposentar.

No que tange ao estado civil dos respondentes, os resultados foram semelhantes nos dois grupos. Eram solteiros 66,1% dos estudantes de Direito e 65,1% dos licenciandos, o que explica o fato de pouco mais de 30,0% dos alunos em ambos os cursos não trabalharem ou terem seus gastos financiados pela família.

Os casados representavam 29,2% dos alunos de Direito e 28,5% dos estudantes de Pedagogia e Matemática. Quanto à cor, a maioria dos estudantes de licenciatura se declarou parda/mulata (46,2%) ou branca (37,1%). Os negros constituíam 11,8% do público pesquisado. No curso de Direito, os brancos prevaleciam (45,5%) e havia 40,3% de pardos/mulatos e 9,7% de negros.

Moravam com cônjuge e/ou filhos, respectivamente, 37,3% dos licenciandos e 36,0% dos respondentes de Direito. Residiam com os pais e(ou) outros parentes 56,2% dos ingressantes de Licenciatura e 56,6% dos futuros bacharéis. Em complemento a essa questão, verificou-se que 41,4% dos licenciandos e 38,5% dos alunos de Direito habitavam com três ou quatro membros da família, enquanto 28,2% do primeiro grupo e 29,0% do segundo moravam com um ou dois. Mais de 15,0% nos dois grupos domiciliavam-se com mais de cinco pessoas da família. Não tinham filhos 65,7% dos alunos de Direito e 67,2 dos de licenciatura.

Para classificar em faixas econômicas as famílias dos respondentes, foi utilizado o Critério de Classificação Econômica Brasil, da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP), que atribui pontos à posse e quantidade de determinados itens (televisão em cores, rádio, banheiro, automóvel, empregada mensalista, máquina de lavar, videocassete e/ou DVD, geladeira, freezer), bem como ao grau de instrução do chefe da família. Ao final, somam-se os pontos e classifica-se em oito estratos: A1, A2, B1, B2, C1, C2, D e E. O gráfico 4 apresenta a distribuição dos estudantes conforme a faixa econômica da família.

Observa-se que, tanto nos cursos de Licenciatura quanto no de Direito, a maioria dos alunos concentrava-se na faixa B2 (33,5% dos alunos de Direito e 32,8% dos de Licenciatura. Entretanto, a distribuição demonstra que as faixas B2 ou superiores eram ocupadas, em maior parte, por alunos do curso de Direito (74,9%), enquanto nas faixas inferiores a B2 se situavam os estudantes de Licenciaturas (50,0%).

Gráfico 4 - Distribuição dos ingressantes por estrato econômico, por curso, em 2011

Fonte: Pesquisa de campo (2011).

A análise de variância indicou diferença significativa entre os grupos quanto à classificação econômica (F[1,362]=36,652; p<0,0001), em favor dos alunos do curso de Direito (M=26,89; DP=7,068), quando comparados aos estudantes de licenciatura (M=22,63; DP=6,363). A média de pontuação dos alunos de Direito os classificou no estrato B2, que varia de 23 a 28 pontos. Os alunos de licenciatura, em média, estavam no estrato C1, que varia de 18 a 22 pontos.

No que concerne à renda bruta mensal do grupo familiar, 46,2% dos estudantes dos cursos de Licenciatura declararam renda familiar mensal de até 3 salários mínimos; 43,5% tinham renda acima de 3 até 10 salários mínimos, isto é, 89,7% dos estudantes desses cursos tinham grupos familiares cuja renda não ultrapassava R$5.300,00 (valor referente ao ano de 2010). Quanto aos alunos de Direito, 18,8% tinham renda familiar mensal de até 3 salários mínimos e 39,2%, mais de 3 até 10 salários mínimos. Os estudantes cuja família atingia renda mensal acima de 10 até 20 salários mínimos representavam 29,0% no curso de Direito e 7,0% nas licenciaturas, demonstrando uma grande desigualdade de renda entre os grupos pesquisados. A análise de variância revelou diferença significativa entre os grupos (F[1,356]=61,731; p<0,0001), de forma que os licenciandos se concentraram na faixa de até 3 salários mínimos (46,2%) e os estudantes de Direito na faixa de mais de 3 a 10 salários mínimos (39,2%). 1,1% 12,5% 27,8% 33,5% 17,0% 4,0% 2,8% 1,1% 0,0% 3,8% 13,4% 32,8% 29,6% 14,0% 5,9% 0,5% 0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0% 40,0% A1 A2 B1 B2 C1 C2 D E DIREITO LICENCIATURAS

Estes dados foram similares ao salário bruto mensal declarado pelos respondentes, diferenciando-se por considerar apenas a sua própria renda, em vez da renda familiar. As análises indicaram diferença significativa entre os grupos comparados (F[1, 224]=39,265; p<0,0001), de modo que o salário médio dos estudantes de Direito foi R$3.208,80 (DP=R$3.389,31) e o dos alunos de Licenciatura foi R$1.073,21 (DP=R$1.301,49), mais de três vezes inferior àquele grupo. De qualquer modo, é preciso analisar estes dados com cautela, pois, como o questionário era identificado a fim de possibilitar o acompanhamento dos estudantes ao longo da sua trajetória, é possível que nem todos tenham respondido conforme a realidade.

De qualquer forma, esses resultados são corroborados pelos estudos de Gatti e Barreto (2009) e Diniz-Pereira (2011). Os autores constataram que a maioria dos alunos de cursos de formação de professores estava concentrada nas faixas de renda familiar média, com intervalo de três a dez salários mínimos. Ademais, concluíram que é inexpressiva a frequência de estudantes em faixas mais elevadas de renda. O estudo da UNESCO (2004) no Brasil também inferiu que a maioria dos professores pesquisados apresentava renda familiar entre dois e dez salários mínimos. A investigação de Brito (2007) mostrou que 39,8% das famílias dos docentes pesquisados ganhavam até três salários mínimos.

Esse retrato da renda média dos estudantes do curso de Direito provavelmente os seguirá durante toda a sua vida profissional, o que sugere, neste caso, a possibilidade de baixo ou nulo retorno dos cursos em tela. Com efeito, Neri (2008), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2007, calculou os salários médios de 289 ocupações. O primeiro lugar era ocupado por juízes e desembargadores (R$13.956,00 – equivalente a 36,73 vezes o salário mínimo), seguido por diretores gerais (R$7.371,40 – 19,4 vezes o salário mínimo), médicos (R$7.029,00 – 18,5 vezes o salário mínimo) e engenheiros (R$4.266,70 – 11,23 vezes o salário mínimo). Os professores de ensino médio com formação de nível superior ocupavam a posição 55 no ranking (R$1.639,20 – 4,31 vezes o salário mínimo). Entretanto, docentes da educação infantil estavam em 101o lugar

(R$1.145,20 – 3,01 vezes o salário mínimo).

Esses dados confirmam a supremacia das "profissões imperiais" (Direito, Engenharia e Medicina) no Brasil, associadas ao recebimento dos mais altos

salários, sendo, também por isso, as profissões mais valorizadas socialmente. Por sua vez, a profissão docente, cujo salário médio, se comparado ao dos juízes e desembargadores, representa apenas 8,1% destes, figura entre as profissões de nível superior com os menores salários no país.

Acerca da situação econômica dos ingressantes (tabela 8), a maior concentração de respostas para os dois grupos foi de pessoas que não trabalhavam e tinham os gastos financiados pela família (31,9% do Direito e 32,6% dos licenciandos). Também era expressivo o percentual de estudantes que trabalhavam e recebiam ajuda da família (21,1% dos alunos de Direito e 24,0% dos de Licenciatura). Proporcionalmente, a quantidade de alunos que trabalhava e contribuía com o sustento da família ou era o principal responsável foi muito semelhante: 28,3% dos ingressantes de Direito e 28,6% dos licenciandos.

Tabela 8 - Situação econômica dos ingressantes

Situação econômica Frequência Percentual Direito Licenciaturas válido Frequência Percentual válido Não trabalha e tem os gastos financiados

pela família 53 31,9 57 32,6

Trabalha e recebe ajuda da família 35 21,1 42 24,0

Trabalha e se sustenta 31 18,7 26 14,9

Trabalha e contribui com o sustento da

família 30 18,1 43 24,6

Trabalha e é o principal responsável pelo

sustento da família 17 10,2 7 4,0

Total 166 100,0 175 100,0

Fonte: Pesquisa de campo (2011).

No que tange à carga horária das atividades exercidas pelos participantes da pesquisa (tabela 9), a maior frequência de respostas foi para o trabalho em tempo integral, isto é, acima de 40 horas, alternativa marcada por 57,5% dos ingressantes de Direito e 35,0% dos licenciandos, caracterizando-os como trabalhadores- estudantes, cujas dificuldades de conciliação entre as atividades laborais e acadêmicas devem ser consideradas. Na visão de Vargas e Paula (2013), o sistema brasileiro de educação superior está estruturado de modo a privilegiar os estudantes de tempo integral e não a condição de trabalhadores de grande parte dos estudantes, embora os documentos legais promulguem a democratização e a igualdade. A perspectiva das autoras, no entanto, refere-se apenas à educação

presencial, visto que as características da Educação a Distância possibilitam que os alunos estudem nos dias e horários que mais lhes forem convenientes. Inclusive, quase metade dos cursos a distância eram da área de Educação (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2012).

Tabela 9 - Carga horária da atividade exercida pelos ingressantes Carga horária da atividade exercida

Direito Licenciaturas Frequência Percentual válido Frequência Percentual válido

Não trabalha 10 7,9 58 32,8

Trabalha eventualmente 3 2,4 3 1,7

Trabalha até 20 horas semanais 6 4,7 11 6,2

Trabalha mais de 20 e menos de 40 horas

semanais 35 27,6 43 24,3

Trabalha em tempo integral – 40 horas ou

mais 73 57,5 62 35,0

Total 127 100,0 100,0

Fonte: Pesquisa de campo (2011).

Esses resultados são semelhantes aos encontrados por Ristoff (2013), que, com base nas respostas ao questionário socioeconômico do ENADE, comparou os cursos de graduação, segundo determinadas variáveis, durante dois ciclos do Exame. O autor constatou que, dos 47 cursos analisados, em 18 deles, quase todos de licenciatura, pelo menos dois terços dos alunos eram trabalhadores. Em contraposição, nos cursos de Medicina e Odontologia, havia, respectivamente, 8% e 15% de estudantes que trabalhavam, ressaltando, assim, a hierarquização e a seletividade dos cursos superiores.

Outra diferença verificada entre os grupos pesquisados estava na escolaridade dos genitores. Os dados da tabela 10 permitem inferir que, em uma proporção média (pai e mãe) de 76,0%, os alunos de Direito superaram a escolaridade dos pais. Já entre os estudantes dos cursos de formação de professores, esse percentual foi de 90,0%, caracterizando, dessa forma, a mobilidade educacional intergeracional e confirmando dados brasileiros, segundo os quais havia um alto percentual de estudantes que eram a primeira geração universitária da família (RISTOFF, 2013). Este fato pode também estar associado à grande expansão da educação superior nos últimos anos, isto é, a geração anterior

não tinha as mesmas oportunidades (e, por que, não dizer exigências ocupacionais?) de fazer um curso superior como a geração atual.

Tabela 10 - Escolaridade dos pais dos estudantes ingressantes, por curso (em %) Escolaridade Pais Direito Mães Pais Licenciaturas Mães

Nenhuma escolaridade 6,9 5,7 9,9 7,0

Ensino Fundamental (1a a 4a série) 18,4 19,0 38,5 30,8 Ensino Fundamental (5a a 8a série) 19,0 13,8 15,9 18,9

Ensino Médio 33,3 41,4 25,8 34,6

Ensino Superior 16,1 10,3 7,7 7,6

Pós-graduação 6,3 9,8 2,2 1,1

Total 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: Pesquisa de campo (2011).

Quanto ao financiamento, 45,7% dos estudantes de licenciatura e 72,2% dos de Direito não contavam com bolsa ou ajuda. Coerente com o seu perfil socioeconômico, 36,0% dos primeiros contavam com bolsa externa, exceto o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e o Prouni (Programa Universidade para Todos), e 11,8% recebiam bolsa integral ou parcial da própria IES, apesar de as mensalidades serem bem menores. No caso de Direito, apenas 4,5% recebiam bolsa externa e 15,3%, bolsa da IES. A proporção de beneficiados pelo Fies e Prouni foi pequena e semelhante entre os dois grupos: 3,3% dos estudantes de licenciaturas e 4,5% dos discentes de Direito.

Cabe explicar que o Prouni é um programa do Governo Federal que concede bolsas parciais e integrais de cursos de graduação em instituições privadas de ensino superior a estudantes que atendam a determinados critérios. Para receber a bolsa, o estudante precisa realizar o Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM) e, ao se inscrever, deve indicar até cinco alternativas de instituição, curso, habilitação e turno. Depois, o sistema do Prouni classifica os candidatos conforme as médias obtidas e suas escolhas. Para concorrer à bolsa, é preciso comprovar renda familiar

per capita mensal de até três salários mínimos, visto que o objetivo do Programa é

incluir as pessoas de baixa renda na educação superior. Assim, na presente pesquisa, por terem menor renda, os futuros licenciados, devido às dificuldades de arcar com custos bem menores, fizeram jus a um volume maior de ajuda financeira que os seus colegas.

A partir da segunda metade do século XX, na “era de ouro”, referente ao grande crescimento econômico experimentado pelo país e a ampliação das classes médias urbanas, começava a ser difundida a "promessa da escola como entidade integradora" (GENTILI, 2008). Assim, os pais acreditavam que a educação seria um poderoso instrumento para a ascensão social e, por isso, incentivavam seus descendentes a obter mais credenciais. Desse modo, a igualdade de acesso e a igualdade de oportunidades foram transformadas em expressões sinônimas (OLIVEIRA, 2005). A tradição de associar diploma de educação superior a uma profissão regulamentada e a posições ocupacionais privilegiadas é uma tradição antiga na sociedade brasileira (DURHAM, 2005). Como afirma Carvalho (2004), para aquela geração, a educação era uma espécie de “passaporte” para cargos mais valorizados e melhor remunerados.

Outra característica relevante para a composição do perfil dos pesquisados foi referente à conclusão do ensino médio. Representavam 86,0% dos licenciandos e 73,3% dos estudantes de Direito aqueles que cursaram todo o ensino médio (ou a maior parte) em escola pública. Em escola privada, também completamente ou em sua maior parte, 22,2% dos alunos de Direito e 9,7% dos estudantes de Licenciatura. Esta informação demonstra que a seletividade escolar tem início antes mesmo do ingresso na educação superior. A proporção de estudantes de Direito que haviam concluído o ensino médio em escolas particulares era superior ao dobro da dos estudantes de Licenciaturas. Não se considera a qualidade de uma em detrimento da outra, mas as avaliações da educação básica no país demonstram que a média de desempenho discente é mais alta nas instituições particulares, enquanto o grupo familiar do aluno oriundo de escola particular tende a possuir renda superior à do aluno da escola pública (GOMES, 2005).

Em relação à modalidade, cursaram o ensino médio regular 74,7% dos alunos de Licenciatura e 62,5% dos de Direito. Concluíram o ensino médio em educação de jovens e adultos ou ensino supletivo 16,1% dos estudantes de Licenciatura e 19,3% dos alunos do curso de Direito. Apenas 5,9% dos licenciandos fez o Curso Normal. No que concerne à época em que concluíram os estudos de ensino médio, apenas 16,7% dos alunos de Licenciatura e 20,5% dos de Direito terminaram no ano anterior ao ano de ingresso na IES. Quase metade dos pesquisados de Direito (49,4%) concluiu o ensino médio mais de cinco anos antes do ingresso na educação

superior. Entre os licenciandos, esta representação foi de 39,2%. É possível supor que esses alunos pararam seus estudos em virtude de trabalho, ou, no caso do Direito, devido à grande quantidade de pesquisados que declararam já ter curso superior.

Quanto ao conhecimento de línguas, em uma escala de um a cinco, em que um significava conhecimento nulo e cinco, o domínio das habilidades de leitura, escrita e fala da língua, os estudantes de Direito obtiveram média superior (M=2,30; DP=1,34) aos licenciandos (M=1,92; DP=1,24) para o conhecimento de inglês. O teste t de Student revelou diferença significativa (t[355]=2,762; p=0,006) entre os grupos. Para o conhecimento de língua espanhola (t[360]=3,475; p=0,001), a média dos alunos de Direito (M=1,95; DP=1,177) também foi superior à dos estudantes de Pedagogia e Matemática (M=1,56; DP=0,935), com diferença significativa entre os grupos. Ainda que tenha havido diferença significativa em favor dos estudantes de Direito, os dois grupos apresentaram médias muito baixas para conhecimento de línguas.

Estes resultados vão ao encontro daqueles encontrados por Brito (2007), que concluiu, a partir da análise dos dados dos estudantes de Licenciatura que realizaram o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) no ano de 2005, que os estudantes tinham conhecimento praticamente nulo de língua inglesa (46,4%) e de língua espanhola (42,8%). Estes dados podem indicar um baixo capital cultural por parte dos estudantes de cursos de formação de professores. Como os cursos de línguas tendem a ser pagos fora da escola (GOMES et al., 2010), a seletividade socioeconômica e cultural está provavelmente relacionada ao conhecimento de idiomas estrangeiros.

Em relação ao conhecimento de informática (t[359]=3,409; p=0,001), também houve diferença significativa entre os grupos em favor dos estudantes de Direito (M=3,17; DP=0,529) em relação aos licenciandos (M=2,97; DP=0,598), na escala de um a quatro. Quando as variáveis de conhecimento de informática e de línguas foram agrupadas, o nível de significância foi ainda maior (t[354]=4,413; p<0,0001), também em favor dos alunos de Direito (M=2,47; DP=0,74).

Quanto à frequência do uso do computador, os resultados revelaram diferenças significativas entre os grupos (F[1, 358]=6,331; p=0,012), em favor dos

estudantes de Direito (M=4,53; DP=0,650). A média dos licenciandos foi de 4,33 (DP=0,807). Os baixos desvios-padrões indicam homogeneidade entre ambos os grupos. Este dado merece destaque, visto que, em uma escala de um a cinco, pode- se inferir que ambos os grupos utilizam bastante o computador. Declararam utilizar sempre o computador 60,8% dos alunos de Direito e 49,7% dos de Licenciatura.

Afirmaram ter acesso à internet 95,2% dos licenciandos e 97,2% dos alunos de Direito, de modo que utilizavam conexão por banda larga 81,2% daqueles e 86,9% destes. Nesse contexto, Castells (2003) aborda o conceito de “divisão digital”, isto é, as desigualdades de acesso à internet, separando e excluindo socialmente aqueles que têm dos que não têm acesso a ela. O autor acrescenta que, à medida que se democratiza o acesso, surgem as desigualdades da utilização da banda larga. Desse modo, “é possível que, quando as grandes massas tiverem finalmente acesso à Internet por linha telefônica, as elites globais já tenham fugido para uma esfera mais elevada do ciberespaço” (p. 210). Os dados deste estudo confirmam essa tendência, já que quase 20,0% dos alunos de Licenciatura e quase 15,0% dos estudantes de Direito afirmaram não utilizar esse serviço.

Ademais, estes percentuais confirmam as constatações do estudo de Olinto (2007). Com base nos dados da PNAD de 2005, a autora pesquisou sobre as desigualdades no acesso e uso da internet pelos brasileiros e concluiu que apenas os indivíduos que já possuíam curso superior ou de pós-graduação, bem como os estudantes desses níveis, alcançaram níveis de pelo menos 50,0% de uso e acesso. A pesquisadora ressalta, ainda, que as diferenças regionais contribuem para as desigualdades, de forma que o Distrito Federal era a Unidade da Federação com maior índice de uso e acesso.

A tabela 11 exibe os locais onde os computadores eram utilizados pelos ingressantes. A residência foi a opção mais frequente, tanto entre os alunos de Direito (94,9%) quanto entre os de Licenciatura (89,8%). Estudo desenvolvido por Spiezia (2010), com base em dados do PISA, verificou que o uso de computadores, especialmente em casa, teve efeito positivo e significativo nos resultados de Ciências. O autor constatou, ainda, que os resultados são maiores quando os computadores são usados com mais frequência em casa do que na escola. Apesar