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2 O CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS: HISTÓRICO E

4.1 OS NEORREALISTAS E AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS ENQUANTO

Há de se concordar que, de fato, da forma como a ONU se encontra organizada hoje em dia, ela se encaixa na crítica dos/as neorrealistas quando estes/as consideram as organizações internacionais enquanto nada além que instrumentos dos quais os Estados mais poderosos se utilizam para alcançarem seus objetivos nacionais. Entretanto, é possível realizar o contraponto de que está situação só se faz possível exatamente pelo fato de que a ONU encontra-se hoje organizada de uma maneira extremamente verticalizada que possibilita a existência de hierarquias dentro da instituição - e que reverbera, obviamente, no Conselho de Segurança, órgão que ocupa o topo desta pirâmide hierárquica.

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Porém, por mais que nos pareça claro que o óbvio a fazer seria "simplesmente" alterar esta estrutura, Weiss nos coloca que é necessário ter em mente que a própria maneira como a organização da estrutura da ONU centra todos os poderes de decisão no Conselho de Segurança é um impedimento para debates reais acerca de uma possibilidade de reforma, já que aqueles que possuem os grandes poderes dentro da ONU, caracterizados pelo veto, não possuem interesse em mudar essa situação, passando a não mais ocupar um local de privilégio. Este é um problema estrutural real e deve ser encarado com importância, já que em última instância as grandes decisões da ONU passam pelo CS, ou seja, bastaria que um dos P-586 exercesse seu poder de veto e as possibilidades de reforma estariam novamente emperradas:

Na conferência de São Francisco onde a Carta da ONU foi elaborada, delegados que estavam insatisfeitos com o reestabelecimento de algo nos moldes do Concerto da Europa do século XIX - onde os Estados mais poderosos foram incumbidos de funções especiais - mas que também não queriam impedir a criação efetiva deste novo sistema internacional, esperavam que uma conferência de revisão para todos os membros da ONU seria realizada relativamente rápido para discutirem-se mudanças na carta e nas organizações estruturais. Apesar de o Artigo 109 reservar a possibilidade de realização de uma Conferência Geral "para os propósitos de revisão da presente Carta", os P-5 preferiram por alocar grandes barreiras contra as mudanças. Eles não apenas resistiram aos esforços de realização de tal conferência, como também deixaram claras as suas intenções de continuar com seus direitos de veto.87

Com o Conselho de Segurança seguindo este modelo organizacional previamente explanado que permite a verticalização, é possível torná-lo uma grande marionete político de países poderosos. Se o CS da ONU fosse reformado de modo a extinguir - ou ao menos apaziguar - estas permutações de hierarquias de poder, talvez a função exercida pela ONU no sistema internacional fosse mais relevante e perceptível mesmo para partidários/as de teorias vinculadas ao realismo. Entretanto, a questão colocada por estes/as

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Permanent 5, ou em "5 Permanentes", como são conhecido França, Reino Unido, Estados Unidos, China e Rússia dentro do Conselho de Segurança.

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No original: "At the San Francisco conference where the UN Charter was drafted, delegates who were dissatisfied with a revival of a kind of nineteenth-century Concert of Europe - with more powerful states given special roles - but also did not wish to impede the effective creation of the new world body expected that a review conference for all UN member states would be convened relatively quickly to discuss changes in the charter and organizational structures. Although Article 109 reserved the possibility of a General Conference "for the purpose of reviewing the present Charter", the P-5 preferred setting the bar high for any changes. They not only resisted efforts to convene such a conference but also clearly communicated theis intention to safeguard their veto rights". In: WEISS, Thomas G. The Illusion of UN Security Council

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teóricos/as de como fazer com que essa reforma seja possível ainda paira no ar. Dessa forma, os/as neorrealistas auxiliam na compreensão do por que haver este impasse acerca da reforma do CS, que seria basicamente pelo fato de que os atores que detém o poder não possuírem interesse em abrir mão do mesmo. Em outras palavras, a teoria Neorrealista pode auxiliar no entendimento dos entraves frente à reforma, que gera o referido impasse da mesma.

O principal problema enxergado pelos/as neorrealistas que sugeriria uma necessidade de reforma do CS é a questão de a configuração de poder presente no Conselho não refletir mais a atual configuração do mesmo em um plano internacional, mas sim aquele do pós-45:

É verdade que o conselho não reflete a atual distribuição do poder no século XXI, contudo, as propostas de reforma provenientes de diplomatas e analistas nunca fazem referência o verdadeiro desequilíbrio entre assentos no conselho e a real capacidade militar fora da sala do Conselho de Segurança. Ao invés disso, eles procuraram abordar o desequilíbrio entre o número de países no mundo e o de membros do Conselho de Segurança, assim como a disputa pelo direito absoluto ao veto por parte destes cinco países.88

Esta visão neorrealista expressa acima por Weiss de que as organizações internacionais só possuem alguma eficácia quando a elas expressam a mesma configuração do poder nas relações internacionais e ainda, de que o poder é necessariamente e exclusivamente relacionado ao poderio militar de um Estado, pode ser encarada enquanto limitada justamente porque a definição neorrealista de poder é excludente e não aplicável ao contexto do século XXI.

A crença na imutabilidade dos atores e das próprias RI gera limitações ao pensamento neorrealista em conceber uma nova ordem caracterizada pela busca de estabilidade e paz ao invés de um cenário no qual o interesse dos atores se caracteriza apenas na acumulação de poder. Para que uma organização internacional possa gerar efeitos positivos, necessita-se perder a desconfiança contínua entre os Estados conforme pregado pelos neorrealistas.

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No original: "True, the council does not reflect the actual distribution of twenty-first-century power, yet reform proposals emanating from diplomats and analysts have never addressed the true imbalance between seats at the table and actual military capacity outside of the Security Council chamber. They have sought to address, instead, the imbalance between the total number of countries in the world and Security Council membership as well as to dispute the absolute veto right held by five countries". In: WEISS, Thomas G. The Illusion of UN Security

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As relações internacionais do século XXI se encontram em um período histórico no qual a cooperação entre as nações já possui exemplos concretos de sucesso. Prender-se aos casos negativos sugere uma visão enviesada e unilateral do mundo, algo que jamais caracterizará um ambiente aberto a mudanças, e a visão realista é, sem dúvidas, extremamente pessimista, fazendo-se possível perceber isso através de Waltz:

Diz-se muitas vezes, que o estado entre estados conduz os seus assuntos envolto na sombra da violência. Porque alguns estados podem em qualquer altura usar a força, todos os estados têm de estar preparados para o fazer - ou então viver à mercê dos seus vizinhos militarmente mais vigorosos. Entre estados, o estado da natureza é um estado de guerra.89

Concluindo então com o principal limite, ideia realista de fazer com que o Conselho de Segurança reflita o panorama da distribuição de poder do cenário atual não caracteriza uma mudança que efetivaria todas as alterações que o CS necessita para se tornar de fato justo e representativo:

Alguns estudiosos e analistas de vertente realista têm argumentado que a reforma deve se curvar ao "realismo" e que o Conselho deve refletir a real distribuição de riqueza e poder no mundo, e não ideias abstratas da equidade e justiça. Esta linha de argumentação mostra um dilema importante na reforma do Conselho. Como a democracia pode funcionar em um sistema estatal com disparidades tão grandes de riqueza e poder? Claramente, a resposta não pode ser um Conselho composto em grande parte ou totalmente de grandes potências. Tal corpo jamais alcançaria legitimidade suficiente e muito menos chegaria a decisões justas e eficazes. Reformas que hoje parecem "realistas" em breve se provariam completamente irrealistas, levando a uma maior situação de dominação, amargura, desestabilização e violência. Uma reforma eficaz pode e precisa resolver este problema. Um pensamento "realista" superficial e o interesse estatal de aspirantes a um assento permanente não produzirão a inovação necessária.90

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WALTZ, Kenneth N. Teoria das Relações Internacionais. Lisboa: Gradiva, 2002. p. 143- 144.

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No original: "Some scholars and think-tank analysts have argued that reform must bow to “realism” and that the Council must reflect the actual distribution of wealth and power in the world, not abstract ideas of fairness and justice. This line of argument shows an important conundrum in Council reform. How can democracy operate in a state system with such huge global disparities of wealth and power? Clearly, the answer cannot be a Council composed largely or entirely of major powers. Such a body could never command sufficient legitimacy much less arrive at fair and effective decisions. Reforms that appear “realistic” today would soon prove thoroughly un-realistic, leading to further domination, bitterness, destabilization and violence. Effective reform can and must solve this problem. Shallow “realist” thinking and the narrow state-interest of aspirants to permanency will not produce the needed innovation". In: NAHORY, Céline; PAUL, James. Theses towards a Democratic Reform of the UN Security

Council. Global Policy Forum, julho 2005. Disponível em: <http://www.globalpolicy.org/security- council/security-council-reform/41131.html?itemid=916>. Acessado em: 24/09/2013.

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