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Os princípios jurídicos e a proporcionalidade: compreendendo a redução da

CAPÍTULO 2 – CONCEITO E PRESSUPOSTOS DA REDUÇÃO DA

6. Os princípios jurídicos e a proporcionalidade: compreendendo a redução da

A mais importante ordem de vinculações jurídicas que limitam a discricionariedade administrativa e, assim, permitem identificá-la nos casos concretos é a que se refere aos princípios jurídicos e à proporcionalidade. Poderíamos incluir nesta categoria, mas não o faremos por razões que ficarão evidentes no correr da exposição, os direitos fundamentais e o postulado da razoabilidade, apesar de dedicarmos algumas páginas a eles no final43

. Nessa matéria há uma enorme variedade conceitual, de modo que se impõe uma clarificação detalhada. Embora não seja o tema específico desta investigação, a teoria dos princípios, que está na base do princípio da proporcionalidade, deve ser examinada com extrema atenção se quisermos entender o fenômeno da redução da discricionariedade em suas relações com a cláusula do devido processo legal.

Impende lembrar que podemos definir redução da discricionariedade como a

exclusão de pelo menos uma conseqüência jurídica abstratamente prevista numa

dada norma que outorga competência administrativa a um órgão (denominada

“norma habilitante”, que pode ser regra ou princípio) pela co-incidência de uma

segunda norma (regra ou princípio), que tem em sua hipótese de incidência uma

circunstância do caso concreto não prevista na norma habilitante. Essa definição,

equivalente às outras de que nos servimos neste trabalho, nos obriga num sentido especialmente forte a realizar demorada incursão no capítulo da teoria das normas jurídicas que trata dos princípios e das regras.

43 As realidades dos princípios, dos direitos fundamentais, da “razoabilidade” e da proporcionalidade são como faces de uma só moeda. Vamos tratar por isso primeiro dos princípios, que a nosso ver são os elementos mais importantes, e depois faremos brevíssimas referências aos direitos

fundamentais (que são direitos atribuídos por regras ou princípios de caráter jusfundamental) e ao

postulado normativo da razoabilidade. A proporcionalidade, em rigor, é uma decorrência lógica do conceito de princípios que adotaremos; a própria estrutura formal dos princípios implica no sentido forte a proporcionalidade e vice-versa.

Por fim, como se não bastasse, a Constituição Federal de 1988 positivou, pela primeira vez na história do direito constitucional brasileiro, uma relação de princípios a serem observados pela Administração Pública em sua atividade jurídica e material: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. A evidente importância desses princípios – e de outros, implícitos no texto constitucional – na identificação do âmbito legítimo de operação da discricionariedade administrativa reforça a necessidade de examinar com detalhe a questão dos princípios na teoria geral do direito e, sobretudo, no direito positivo brasileiro.

Afinal, o direito constitucional opera hoje, mais que nunca, com princípios, assim como princípios são algumas das mais importantes normas definidoras de direitos fundamentais e, para alguns, também a razoabilidade e a proporcionalidade. Se o direito constitucional, por força da estrutura hierárquica do ordenamento jurídico, contém necessariamente as têtes de chapitre do direito administrativo, a questão dos princípios não poderia ser evitada nem abreviada ainda que não tivesse relevância – e como tem! – para o tema específico da redução da discricionariedade.

6.1. As duas atitudes em relação aos princípios

Assumindo que os princípios são normas jurídico-positivas e não meras exortações morais, afirmações de valores, orientações políticas gerais, recomendações para um bom governo ou promessas sem valor jurídico algum, surge o problema de saber se eles formam ou não uma subclasse do conjunto das normas. Dito de outro modo, cumpre esclarecer se os princípios têm alguma

propriedade relevante que permite distingui-los de outras normas jurídicas.

Em geral se responde que os princípios são, de fato, uma espécie de normas distinta das classe das regras, o que leva à consideração das várias propostas de distinção entre regras e princípios, sobre as quais se tem, sobretudo nos últimos quarenta anos, uma farta produção teórica44

. Vamos assumir primeiramente, sem tomar partido de nenhuma formulação específica, que os princípios distinguem-se das regras por alguma propriedade intrínseca, relacionada à estrutura lógica e ao conteúdo normativo, ou extrínseca, relativa a uma suposta posição especial na ordem jurídica ou a uma função específica no processo de interpretação e aplicação de outras normas.

44 A produção sobre os princípios, no Brasil e no exterior, é muito vasta – e antiga. Há dezenas de monografias e centenas de artigos que elaboraram critérios – nem sempre consistentes – para diferenciar regras e princípios. As versões mais famosas entre nós são a de Ronald Dworkin e de Robert Alexy, aliás, com muitas semelhanças e importantíssimas diferenças que não podemos aprofundar aqui. Entre o final da década de 1990 e a primeira metade deste decênio, porém, era praticamente obrigatório, em trabalhos acadêmicos de direito constitucional no Brasil, fazer referência à distinção entre regras e princípios; o modelo preferencial era uma combinação acrítica de Dworkin e Alexy, quase sem ressalvas. Mas eles não são, por óbvio, os únicos modelos teóricos e há quem mesmo negue seriamente a possibilidade de distinção entre tais espécies de normas. Percebe-se uma inclinação dos autores brasileiros para incluir a teoria dos princípios numa espécie de “movimento” que se denomina “neopositivismo jurídico” ou, às vezes, “pós- positivismo”, expressões que, como demonstrou Dimitri Dimoulis em alentado estudo, não são usadas no debate internacional e, quando empregadas, têm um sentido muito diferente. A teoria dos princípios de Dworkin foi exposta em 1967, num artigo publicado na University of Chicago Law

Review, e depois aprofundada em outro artigo, de 1972, publicado na Yale Law Review. Ambos

foram reunidos em Ronald DWORKIN. Taking rights seriously, pp. 14-80. A teoria de Alexy tem muitas fontes em artigos e debates com outros autores publicados em diversas revistas especializadas. A mais extensa e completa exposição de sua teoria se acha em Robert ALEXY. Teoría de los derechos fundamentales. Sobre a impossibilidade de elaborar um conceito de princípios, ver Aulis AARNIO. “Taking rules seriously”. in: Archiv Für Rechts- und

Sozialphilosophie, Beheift (ARSP-B) 42 (1989), pp.180-192. No direito brasileiro, muito se

escreveu a respeito dos princípios. A mais destacada contribuição é de Humberto Ávila, que, por sua abrangência e inovação, deu um grande impulso ao debate nacional. Ver Humberto ÁVILA. Teoria dos princípios. A professora Ana Paula de Barcellos, da UERJ, tem uma obra muito original que resultou de sua tese de doutorado na mesma instituição. Embora não ofereça uma teoria dos princípios completa, ao concentrar-se no tema da ponderação, técnica que se aplica sem dúvida alguma aos princípios jurídicos (mas não só a eles), foi obrigada a elaborar vários aspectos de uma teoria dos princípios. Ver Ana Paula de BARCELLOS. Ponderação, racionalidade e atividade jurisdicional. Para a crítica ao “pós-positivismo”, ver Dimitri DIMOULIS. Positivismo jurídico.

Há pelo menos dois modos de aproximar-se do problema. Pode-se, de um lado, renunciar à elaboração de uma teoria geral que pretenda identificar as propriedades comuns aos princípios jurídicos em todos os ordenamentos jurídico- positivos. Restaria apenas buscar no material normativo (ou seja, na linguagem das fontes do direito), na jurisprudência dos tribunais e na dogmática jurídica subsídios para a elaboração de um critério distintivo entre as classes de normas. Essa abordagem parte da suposição de que se depositou um conteúdo significativo no vocábulo “princípio” pela tradição jurídica e pelo direito positivo, o que permitiria, no máximo, a descrição dos critérios de uso da palavra num dado sistema jurídico. Não haveria, portanto, uma qualidade interna, ou estrutural, que fizesse de uma norma jurídica um princípio. Os critérios definitórios dependeriam da interpretação do contexto normativo e por isso seriam variáveis conforme o sistema de que se trate.

De outro lado, pode-se adotar uma orientação teórica geral com elementos básicos – um conceito de norma jurídica e critérios de classificação – e uma descrição exaustiva das relações sistemáticas entre os elementos, à luz da qual o direito positivo seria interpretado para verificar se uma norma qualquer exibe, ou não, as propriedades reconhecidas nos princípios pelo esquema teórico. Essa atitude pressupõe que se pode estabelecer uma distinção com base em critérios independentes do contexto normativo em que regras e princípios se inserem. A validade da classificação das normas não dependeria do sistema jurídico, mas de uma propriedade interna aos princípios e ausente nas regras, de modo que de uma norma jurídica qualquer – em qualquer ordenamento – seria possível afirmar se se trata de uma regra ou de um princípio.

As teorias – de grande prestígio no Brasil – segundo as quais os princípios constituem “normas fundamentais” em razão de sua posição no ordenamento, ou cumprem uma função específica de orientar a interpretação e aplicação de outras normas, são o produto, em geral, da primeira atitude. As teorias que se fixam na formulação lingüística, no conteúdo normativo ou na estrutura lógica dos princípios relacionam-se à segunda abordagem. Mas essa divisão não comporta excessiva rigidez. É possível, por exemplo, afirmar que os princípios são normas fundamentais porque seu conteúdo tem um forte caráter axiológico, mais até do que deontológico, e que isso se reflete tanto na formulação (maior vagueza, decorrente do reduzido consenso, nas sociedades contemporâneas, quanto ao significado dos valores comuns) quanto na estrutura lógica (a forma categórica do imperativo). Além disso, mesmo uma teoria geral, que ordene todo o campo das normas jurídicas, não pode abrir mão da análise do material normativo segundo o referencial de pelo menos um ordenamento concreto.

Logo, as atitudes descritas são, na verdade, disposições gerais que influenciam as teorias, mas não funcionam necessariamente como premissas incompatíveis entre si. As construções teóricas sobre os princípios jurídicos se edificam a partir de uma interação maior ou menor entre as duas abordagens básicas do problema. Isso explica a variedade quase infinita de propostas de definição dos princípios, bem como a ampla liberdade criativa dos juristas (sobretudo no direito constitucional), que pode resultar – e aí, sim, temos um problema grave – numa espécie de patologia que já se denominou entre nós “sincretismo metodológico”, com a adoção de teorias incompatíveis, como se compatíveis

fossem45.

6.2. Os princípios na Constituição Federal: um problema dogmático e teórico

Antes de expor nossa concepção dos princípios – se são normas distintas das regras e, em caso afirmativo, em que se distinguem – devemos voltar os olhos para a linguagem das fontes do direito para situar o contexto em que os princípios aparecem nomeados com tais. Não faltam exemplos de textos normativos que se referem a determinados enunciados como “princípios”. Apenas a Constituição Federal usa a palavra “princípio”, no singular ou no plural, em vinte e nove ocasiões: vinte e oito no corpo da Constituição (Título I; CF 4º, caput; CF 5º, § 2º; CF 21, XXI; CF 21, XXIII; CF 25, caput; CF 29, caput; CF 32, caput; CF 34, VII; CF 35, IV; CF 37,

caput; CF 46, caput; CF 93, caput; CF 125, caput; CF 127, § 1º; Título VI, Capítulo I,

Seção I; Título VII, Capítulo I; CF 170, caput; CF 173, § 1º, III; CF 178, caput; CF 206, caput; CF 207, caput; CF 221, caput; CF 222, § 3º; CF 223, caput; CF 226, § 7º; CF 227, § 3º, V; CF 238; CF 242, caput) e uma no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT 11, caput).

Em geral, a Constituição se vale da expressão para qualificar um dado conjunto de disposições (e as respectivas normas) como “princípios”. Por exemplo, o texto constitucional reúne sob a locução “Dos Princípios Fundamentais” (Título I) os quatro primeiros artigos, que prescrevem a estrutura federativa e os fundamentos da República Federativa do Brasil (CF 1º) – dentre os quais a soberania popular (CF 1º,

45 Para o “sincretismo metodológico” na distinção entre regras e princípios, ver Virgílio Afonso da SILVA. “Princípios e regras: mitos e equívocos acerca de uma distinção”. in: Revista Latino-

I, e parágrafo único) e a dignidade da pessoa humana (CF 1º, III) –, o princípio da separação de poderes (CF 2º), os objetivos da República Federativa do Brasil (CF 3º) e os princípios que regem a República Federativa do Brasil nas suas relações internacionais (CF 4º). É razoável presumir que, para a Constituição, todas as normas jurídicas estatuídas no Título I sejam princípios e, mais que isso, fundamentais. Do mesmo modo, a Seção I do Capítulo I do Título VI cuida dos “princípios gerais” do Sistema Tributário Nacional e o Capítulo I do Título VII trata dos “princípios gerais da atividade econômica” (não obstante, nesse mesmo Capítulo, no CF 170, reapareça a locução “princípios” para designar um conjunto mais restrito de pautas normativas).

A Constituição também se refere a “princípios” como uma classe de normas, sem proceder a uma enunciação posterior. Ela impõe aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a observância de “princípios” no exercício de sua capacidade de auto-organização (CF 25; CF 29; CF 32; CF 125; ADCT 11) e esses princípios, embora sejam descritos pela doutrina e manejados pelo Supremo Tribunal Federal no controle de constitucionalidade, não foram enunciados de forma expressa pela Constituição. Além disso, a Constituição permite a ampliação do rol de direitos fundamentais – dotados de especial força normativa – mediante referência aos “princípios” por ela adotados. Parece também razoável sustentar que a Constituição tinha presente, nesses casos, um determinado conceito de “princípios”.

De outro lado, a Constituição nomeia individualmente alguns “princípios” referidos a âmbitos materiais restritos: os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência na Administração Pública (CF 37); o princípio da

complementariedade dos sistemas privado, público e estatal do serviço público de radiodifusão sonora e de sons e imagens (CF 223); os princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável no planejamento familiar (CF 226, § 7º); princípios da brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento na aplicação de medida privativa de liberdade a crianças e adolescentes (CF 227, § 3º, V). Nesses casos – e em outros semelhantes que podem ser facilmente colhidos no texto constitucional – há uma expressa qualificação de normas jurídicas individuais (não de um um grupo de normas) como princípios jurídicos.

Numa ocasião a Constituição usou “princípio” como sinônimo de “sistema” ou “método” de atribuição de cadeiras no parlamento. Dispôs que os senadores, representantes dos Estados e do Distrito Federal, serão eleitos segundo o “princípio” majoritário (CF 46), mas, quando tratou dos deputados, disse apenas que são representantes do povo, eleitos pelo “sistema” proporcional (CF 45), de onde se pode inferir a identidade, para o texto constitucional, entre “princípio” e “sistema” no que diz respeito às normas de transformação de votos em cadeiras. Noutra passagem, o texto constitucional refere-se claramente a “princípio” como elemento central de um “sistema”: o CF 21, XXI, prescreve que compete à União estabelecer “princípios” e diretrizes para o sistema nacional de viação.

A variabilidade de significados e funções da palavra “princípio” na Constituição cria um problema dogmático relevante. Para aplicar a Constituição em assuntos cruciais – direitos fundamentais, federalismo, organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, ordem econômica, ensino, planejamento familiar

etc. – é preciso saber o que significa “princípio” em cada um dos usos do texto constitucional, o que se resolve com interpretação. Mas surge ao mesmo tempo um problema teórico, na medida em que a Constituição, ao qualificar determinadas disposições (e as normas correspondentes) como princípios, adota implicitamente um conceito de princípios que pode ser derivado da análise mesma dessas disposições e normas. É possível então assumir e defender no direito brasileiro uma teoria dos princípios que ignore essa riqueza semântica – e também pragmática – do texto constitucional?

Não se quer dar uma resposta definitiva à indagação. Em nossa opinião, as teorias sobre os princípios que pretendem ter aplicação no sistema jurídico brasileiro ignoram o problema na suposição (quase nunca declarada) de que podem afastar- se do uso constitucional sem causar prejuízos à formulação e aplicação prática de seus conceitos. É possível que estejam certas, e uma boa razão para isso é a dificuldade de encontrar uma conseqüência jurídica específica, atribuída pela Constituição, para a circunstância de uma norma ser qualificada constitucionalmente como princípio.

Há, no entanto, pelo menos uma conseqüência expressamente imputada à auto-qualificação constitucional de disposições como “princípios”: o reconhecimento de um direito fundamental, não constante do “catálogo”, em decorrência do regime e dos “princípios” adotados pela Constituição (CF 5º, § 2º). Agora, mesmo nesse caso, pode-se argumentar que a menção aos “princípios” no CF 5º, § 2º, parece não excluir a possibilidade de que um direito fundamental não expresso na Constituição decorra também de uma regra de direito fundamental diretamente estatuída, se

aceita a distinção entre “regra” e “princípio” como uma distinção entre classes de normas jurídicas. De qualquer modo, apesar de sua provável irrelevância para uma teoria dos princípios constitucionalmente adequada, a qualificação constitucional de determinadas disposições como “princípios” precisa ser enfrentada pela doutrina brasileira – nem que seja para desconsiderá-la, por inútil, incorreta ou inoportuna.

6.3. Normas, princípios e regras: a teoria dos princípios de Alexy

Agora vamos enunciar nossa concepção sobre os princípios. Adotamos, por motivos que ficarão claros no decorrer da exposição, a teoria dos princípios de Robert Alexy46

. Há muitas propostas de classificação das normas jurídicas e, dentre elas, várias que se fixam na distinção entre regras e princípios. Riccardo Guastini, em breve inventário, encontrou cinco modos de traçar essa distinção, com subdivisões que elevam o número de teorias a onze, para demonstrar sua tese de que “não está claro, em absoluto, que propriedades uma norma deve ter para merecer o nome de 'princípio'”47. Na opinião do próprio Robert Alexy,

“apesar de sua antigüidade e de sua freqüente utilização, impera a respeito [da distinção entre regras e princípios] confusão e polêmica. Existe uma desconcertante variedade de critérios de distinção. A delimitação com respeito a outras coisas tais como os

46 Em rigor o procedimento mais adequado seria o de justificar a posição adotada com mais detalhes e, sobretudo, fundamentar a exclusão de teorias rivais mediante um confronto direto das proposições relativas a cada um dos temas relevantes para a teoria dos princípios. Essa tarefa, no entanto, consumiria muito espaço e tempo, quando, para os fins deste trabalho, basta-nos a referência a que teoria dos princípios se adotou e a consistência na aplicação. Ao proceder dessa maneira, todo o desenvolvimento anterior e posterior em que se tenha pressuposta uma teoria dos princípios expõe-se naturalmente: (1) a todas as objeções que se possa fazer à teoria de Alexy; (2) à crítica por representações equivocadas da teoria de Alexy; (3) à crítica pela aplicação inconsistente ou incorreta da teoria de Alexy.

47 Riccardo GUASTINI. “Los princípios em el derecho positivo”. In: Distinguiendo. Estudios de teoría y metateoría del derecho, p. 144.

valores é obscura; a terminologia, vacilante.”48

Essa variedade referida por Alexy, que resulta a nosso ver das praticamente infinitas possibilidades de combinação das duas atitudes teóricas básicas diante dos princípios, dificulta – e muito – a exposição clara e sistemática de uma teoria das normas jurídicas. Às vezes o significado de “princípio” varia num mesmo universo de discurso, o que requer adicionais clarificações, nem sempre levadas a cabo, com evidente incremento da dificuldade de compreensão e discussão racional.

Embora as classificações não sejam verdadeiras nem falsas, vale para elas o critério da funcionalidade ou da utilidade em relação com um fim, que no caso da dogmática jurídica seria o de fornecer critérios para a decidibilidade dos conflitos mediante a redução das complexidades do sistema49. Por conseguinte, a ciência do direito deve elaborar conceitos com aptidão para ordenar, segundo essa finalidade, o material normativo e assim explicar os fenômenos que se verificam sobretudo no plano da aplicação do direito.

Nosso modelo teórico orienta-se e precisa justificar-se pela necessidade de fornecer critérios para a decidibilidade dos conflitos; se não passar por esse teste, deve ser abandonado. Deve ficar claro, porém, que a análise comparativa das muitas teorias dos princípios não pode ser realizada aqui. A intenção é a de precisar