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Os procedimentos de canonização entre os séculos XVI e XVIII e o controle

4 SURGIMENTO E BUROCRATIZAÇÃO DAS CANONIZAÇÕES: DO SÉCULO

4.3 Os procedimentos de canonização entre os séculos XVI e XVIII e o controle

Os reformadores protestantes repudiaram veemente as relíquias e rejeitaram os objetos de mediação entre os fiéis e Deus, tratando o culto como uma idolatria ligada mais a magia e superstição do que a fé cristã. O resultado foi um movimento de destruição contínua e em grande escala das relíquias (Cymbalista, 2006). Mas, os reformadores não tinham apenas como alvo as relíquias. As indulgências19, prática recorrente na cristandade desde o século XIII20, teve seu ápice em 1517, no papado de Leão X (1513-1521), quando este encarregou o frade dominicano Johann Tetzel de recolher indulgências para reconstrução da Basílica de São Pedro em Roma. Tetzel transformou a sua campanha numa verdadeira venda de indulgências, chamando a atenção de Martinho Lutero, que escreveu posteriormente as suas 95 teses dando início a Reforma Protestante. Na tese 86 Lutero diz: ―Do mesmo modo: Por que o papa, cuja fortuna hoje é maior do que a dos ricos mais crassos, não constrói com seu próprio dinheiro ao menos esta uma basílica de São Pedro, ao invés de fazê-lo com o dinheiro dos pobres fiéis?‖ (LUTERO, 2004, p. 29).

A Igreja Católica reagiu aos protestantes potencializando reformas com o intuito de retomar o controle sobre as partes da cristandade e adaptar a estrutura da Igreja aos desafios colocados pela nova situação política e espiritual por que passava o mundo cristão. A resposta mais sistematizada veio no Concílio de Trento (1545-1563). Como afirma Georges Suffert (2001),à extensão deste Concílio é tamanha que seu conjunto de regras serão utilizados pela igreja e católicos até o Vaticano II (1962-1965). Com relação às relíquias o Concílio de Trento por um lado ratificou

… o poder milagroso dos corpos dos santos, reafirmando a sua presença física e integral mesmo nos menores fragmentos, e condenando aqueles que desafiavam esse poder. […].

Por outro lado, o culto às relíquias não ficou imune à moralização dos costumes e à centralização do poder, promovidos pelo Concílio de Trento em tantos aspectos da fé católica. Dali em diante, os bispos e outras autoridades tornaram-se os responsáveis pela certificação das relíquias e por promover o decoro no seu culto, representando uma centralização de poderes e aumento de suas responsabilidades pedagógicas. O movimento centralizador foi além disso: a própria autonomia dos bispos era circunscrita, pois o Concílio estabelece também que ―nada de novo, e até o presente nunca usado se decrete, sem se consultar o Santíssimo Romano Pontífice (CYMBALISTA, 2006, p. 16).

19 ―Cân. 992— Indulgência é a remissão, perante Deus, da pena temporal, devi- da pelos pecados já perdoados quanto à culpa; remissão que o fiel, devidamente disposto e em certas e determinadas condições, alcança por meio da Igreja, a qual, como dispensadora da redenção, distribui e aplica autoritariamente o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos‖ (CÓDIGO DE DIREITO CANÓNICO, 1983, p. 176).

20 Em O Nascimento do Purgatório Jacques Le Goff (1981) indicou o século XII como o momento em que a crença no purgatório se instalou no interior da doutrina católica. A dupla função do purgatório justifica todo o sistema de distribuição de indulgências instaurado pela Igreja nos séculos posteriores.

Com a reiteração do poder das relíquias pelo Concílio de Trento (1545-1563), os católicos mostraram-se mais fervorosos do que nunca no seu culto. Este Concílio condenou ainda a simonia21 e a venda de indulgências. Contudo, os efeitos da Reforma Protestante marcaram profundamente o século XVI, e no que concerne as canonizações dos santos, Eric Suire (2001) conclui que este século não foi propício a eclosão da santidade. Basta dizer que entre 1535 e 1588 nenhum santo foi canonizado. As razões, além da Reforma Protestante, foram a sucessão de breves pontificados e o saque a Roma em 1527, que desorganizou as funções da Cúria Romana (SUIRE, 2001)

Após o Concílio de Trento (1545-1563), muitos papas prosseguiram com as reformas. Em relação ao escopo deste capítulo, – a burocratização dos procedimentos de canonização –, três papas desempenharam grande papel: Gregório XII (1572-1585), Sisto V (1585- 1590),Urbano VIII (1623-1644).

A contribuição de Gregório XII (1572-1585) refere-se à revisão e publicação em documento universal do Martirológio.22 Esta publicação específica incluiu apenas os mártires que foram autorizados pela comunidade eclesiástica, retirando, portanto, nomes duplicados ou que não tinham o aval da igreja. Ao longo dos séculos ele tem sido atualizado e reeditado devido aos novos acréscimos.

O segundo papa foi Sisto V (1585-1590), que criou em 1588 a Congregação dos Ritos, o qual regulava o exercício do culto divino e procedia com relação às causas dos santos.

À partir de l‘institution de la Sacrée Congrégation des Rites, le 22 janvier 1588, les causes de canonisation sont communiquées à un collège de consulteurs qui supplante progressivement les juges de la Rote23. Ces consulteurs on avant tout un rôle technique. Pour chaque cas étudié, un cardinal-ponent désigné par le pape fait office de rapporteur. Au fur et à mesure que les travaux avancent, les procès sont soumis à l‘approbation de congrégations de cardinaux qui se prononcent sur la poursuite, la suspension ou l‘arrêt définit de l‘examen. Si le dernier vote est favorable, signifiant qu‘aucun obstacle juridique ou théologique ne s‘oppose plus à la proclamation des mérites du serviteur de Dieu, le pape possède le pouvoir de décider de l‘opportunité de la canonisation (SUIRE, 2001, p. 352).24

21 ―SIMONIA (Simonia) — Compra e venda de realidades espirituais ou anexas às espirituais por um preço temporal‖ (CÓDIGO DE DIREITO CANÓNICO, 1983, p. 394).

22 O Martirológio pode ser consultado em: http://www.vatican.va/roman_curia/pontifical_academies/cult- martyrum/martiri/009.html Acesso: 16/01/13.

23 São os juízes que fazem parte do Tribunal da Rota Romana. ―Art. 126. Este Tribunal ordinariamente funciona como instância superior no grau de apelo junto da Sé Apostólica, para tutelar os direitos na Igreja; provê à unidade da jurisprudência e, mediante as próprias sentenças, serve de ajuda aos Tribunais de grau inferior.‖ Consultar: http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/apost_constitutions/documents/hf_jp- ii_apc_19886028_pastor-bonus_po.html Acesso: 17/01/13. Para maiores informações sobre a história e atribuições deste Tribunal e sua ligação com a causa dos santos, consultar: GNAVI (1994).

24 Tradução Livre: A partir da instituição da Sagrada Congregação dos Ritos, em 22 de janeiro de 1588, as causas de canonização são comunicadas a um colégio de consultores que suplanta progressivamente os juízes

O terceiro papa que elencamos anteriormente, como um dos responsáveis pela burocratização dos procedimentos de canonização, é Urbano VIII (1623-1644). Nascido com o nome de Maffeo Barberini, no ano de 1568, na cidade de Florença, foi eleito papa em 1623, morrendo em 1644. Urbano VIII (1623-1644), em seu longo papado, foi responsável pela fundação de vários colégios em nações dominadas pelo protestantismo, fundou e ergueu várias dioceses e vicariatos nas novas terras de missão, apoiou com recursos os missionários, alargou e desenvolveu a esfera de ação da Congregação de Propaganda da Fé25, que foi organizada definitivamente em 1622, pelo seu antecessor Gregório XV (1621-1623). No interesse pelas investigações de catacumbas e nas consequentes relíquias, Urbano VIII (1623- 1644) apoiou os trabalhos do arqueólogo Antonio Bosio, e é durante seu o pontificado que vemos a primeira abordagem sistemática destas escavações (URBANO, 2007).

Contudo, Urbano VIII (1623-1644) foi ainda mais longe em suas reformulações. Em tempos de reforma, como foram os séculos XVI e XVII, quando o culto aos santos e seu poder intercessor fora posto em causa por Lutero, quando a posição iconoclasta de Calvino acusou a devoção aos santos de idolatria e quando a própria canonização papal foi vista pelos reformistas protestantes como abuso de poder na igreja, assistimos a um duplo movimento: por um lado houve um considerável aumento da devoção espontânea por figuras contemporâneas, que viriam a ser reconhecidas como intérpretes dos novos ideais de santidade ou mesmo considerados como reformadores católicos (como Sta. Tereza de Ávila, Sto. Inácio de Loiola, Sto. Francisco Xavier); e, por outro, enquanto nasciam espontaneamente novas devoções, a hierarquia procurava disciplinar e tornar mais crítico e centralizado o controle do culto aos santos (URBANO, 2006).

Desta forma, no afã de disciplinar, o papa Urbano VIII é considerado o fundador do direito processual para a causa dos santos. Os seus decretos26 incidem no nascimento de novas regras e datam de 1625. Neles, Urbano VIII (1623-1644) proibia qualquer forma de culto do Tribunal da Rota Romana. A esses consultores é atribuído um encargo técnico. Para cada caso estudado, um cardeal designado pelo Papa atua como relator. À medida que os trabalhos avançam, os processos são submetidos à aprovação de congregações de cardeais que opinam sobre a continuação das pesquisas, a suspensão delas ou o encerramento do caso. Se o último voto for favorável, significando que não há mais obstáculo jurídico ou teológico que se oponha à proclamação dos méritos do servidor de Deus, o Papa é o detentor do poder de decidir se é oportuna a canonização.

25 Congregação de Propaganda da Fé tratava de tudo que estivesse relacionado ao interesse da fé católica nos países protestantes ou nas terras dos ‗infiéis‘. Hoje tem o nome de Congregação para a Evangelização dos Povos.

26 O nome do decreto é: ―Decreta seruanda in canonizatione, & beatificatione sanctorum : accedunt instructiones, & declarationes quas ... Cardinales praesulesque romanae curiae ad id muneris congregati ex eiusdem Summi Pontificis mandato condiderunt.‖

público daqueles que tivessem morrido com fama de santidade, mas não tivessem sido reconhecidos oficialmente como santos.

Além disso, interditava no mesmo decreto a impressão de livros sobre as suas vidas, milagres, revelações, graças, sem o prévio reconhecimento do Ordinário, que instruiria o processo a seguir na Santa Sé e aguardaria a sua resolução. Estas proibições, porém, não abrangiam aqueles cujo culto se perdia em tempos imemoráveis. No caso do culto atribuído 'voce populi' a um santo ab immemorabili, a igreja canonizava-o per uiam cuiius reconhecendo oficialmente a sua santidade, resultando daqui uma canonização equivalente. Segundo decreto de 1631, proibia-se inclusive dar início a um processo de beatificação e canonização que não tivesse respeitado as normas anteriores. Poucos anos mais tarde, em 1634, na Constituição Coelestis Hierusalem Cives, entre outras normas, estabelecia-se que não se podia proceder à beatificação antes de terem passado 50 anos sobre a morte do 'candidato'...[...]. O Papa reservava assim para a Santa Sé o controle do culto dos santos, procurando torná-lo mais centralizado e juridicamente mais rigoroso (URBANO, 2007, p. 168).

Na mesma constituição, Coelestis Hierusalem Cives, o papa Urbano VIII (1623- 1644)prescreveu que para que uma causa fosse aberta era preciso um nihil obstat (nada impede) da Santa Sé (Armogathe, 2003). Como na época de Urbano VII o controle sobre a santidade era centralizado na cúria romana, este papa atribuiu a Inquisição o papel de analisar os candidatos a santidade e proibir,negando o nihil obstat (nada impede), àqueles que nos quais o culto havia começado antes que do aval da Santa Sé, já que ―la riforma di Urbano VIII codificò un complesso sistema di procedure e di divieti, al cui centro stava il Tribunale dell‘Inquisizione, l‘autorità che di fatto selezionava i modelli della santità e interveniva nella sostanza dei processi di santificazione‖(CARPANETTO, 2006, p. 44).27

Portanto, nos decretos do papa Urbano VIII (1623-1644), vemos a primeira sistematização orgânica e segura de um complexo de normas para regulamentar o processo num aspecto jurídico.

Il en résulta trois changements notables: l‘institution d‘un procès super non cultu vérifiant l‘absence de culte local, la création d‘un office de promoteur général de la foi, et chargé de formuler les critiques sur les causes examinées, et l‘obligation de respecter un délai de cinquante ans entre la date du décès du serviteur de Dieu et l‘ouverture du procès apostolique. Le procès atteignit dès lors sa forme classique, et ne subit ensuite que des changements mineurs (SUIRE, 2001, p. 353).28

27 Tradução Livre: ―a reforma de Urbano VII codificou um complexo sistema de procedimento e de proibições, ao qual no centro estava o Tribunal da Inquisição, autoridade que de fato selecionava os modelos de santidade e intervinha na substância dos processos de santificação.‖

28

Tradução Livre: Isso resulta em três alterações notáveis: a instituição de um processo de ausência de culto, verificando a ausência de culto local, a criação de um cargo de promotor geral da fé, e encarregado de formular as críticas sobre as causas examinadas, e a obrigação de respeitar um prazo de cinquenta anos entre a data do falecimento do servidor de Deus e a abertura do processo apostólico. O processo alcança logo a forma clássica, e, na sequência, apenas se submete a pequenas alterações.

Dentre as mudanças significativas citadas acima por Eric Suire (2001), é importante salientar a função dos Promotores da Fé, comumente conhecidos como ―advogados do diabo‖. Este cargo era designado pelo Vaticano e tinha como objetivo primordial levantar objeções à santidade do candidato. Depois dos decretos de Urbano VIII (1623-1644), não há um caso no qual os Promotores da Fé não tenham levantado dificuldades sobre pontos principais dos casos analisados, segundo Jean-Robert Armogathe (2003).

Ao fim do século XVII, quase não houve alterações nos procedimento de canonização. O acréscimo fica por conta da discussão levantada pelo papa Inocêncio XI (1676-1689), que aprofundou a discussão sobre heroicidade das virtudes em contraste ao martírio. No século XVIII, a mais importante contribuição a causa dos santos, diz respeito à publicação do livro de Bento XIV (1740-1758) chamado ―Dei Servorum Dei beatificatione et Beatorum

canonizatione‖29. Neste livro são reunidas e aclaradas todas as normas sobre a canonização advindas desde a criação da Congregação dos Ritos pelo papa Sisto V (1585-1590). No capítulo 10§6, Bento XIV (1740-1758) reafirma que nenhum bispo pode proceder àscanonizações devido a sua jurisdição restrita, e que cabe somente ao papa canonizar devido o poder conferido a este sobre a igreja universal.

Além da publicação do conjunto de normas, Bento XIV(1740-1758), destinou o capítulo III de seu livro para discutir de forma mais aprofundada sobre as virtudes heroicas, tema ao qual, carecia de organicidade, precisão terminológica e uma doutrina (LEONI, 1992). A questão das virtudes heroicas, começaram a aparecer entre 1614-1616, com os Uditori di Rota. Se no pontificado de Urbano VIII ele não faz uso do termo virtudes heroicas, nem falava deste em suas cartas apostólicas, com Bento XIV (1740-1758),

... alla centralità della fama miracolorum si viene a sostituire così il concetto di fama sanctitatis, raggiunta attraverso l‘esercizio in grado eroico delle virtù, non solo nella procedura per le beatificazioni, ma anche come punto di riferimento nel più recenti disposizioni del Concilio Vaticano II… (LEONI, 1992, p. 83).30

Outra questão bastante importante no pontificado de Bento XIV (1740-1758) foi à estabilização da função dos médicos nas análises dos candidatos a santificação. Se nos séculos 29 O livro ―Benedicti papae XIV Doctrina de servorum Dei beatificatione et beatorum

canonizatione‖ pode ser consultado

em:http://books.google.com.br/books?id=MoYPAAAAQAAJ&printsec=frontcover&hl=pt- BR&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false

Acesso: 17/01/13.

30 Tradução Livre: ―... a centralidade da fama miracolorum é substituída pelo conceito de fama sanctitatis conseguida através do exercício das virtudes em grau heroico, não só no procedimento de beatificação, mas também como um ponto de referência nas recentes disposições do Vaticano II...‖

precedentes, os milagres eram balizados pela comunidade eclesiástica, advogados e testemunhas31, a partir do século XVI, os médicos começam a aparecer regularmente como peritos nos processos de canonização, como observa Joseph Ziegler (1999) em seu artigo sobre o papel dos médicos nos processos de canonização. O autor observa que a

…the apparent lack of an expert medical role in earlier canonization processes resulted from the poor state of medical knowledge which did not allow accurate diagnosis. Since the Middle Ages was a period when external rather than internal proofs were in demand and recognized, there was little need for the medical expert. Consequently sanctity was usually determined 'viva voce populi' (ZIEGLER, 1999, p. 192). 32

Em resumo, as inovações nos procedimentos de canonização e beatificação entre os séculos XVI e XVIII podem ser elencados da seguinte forma: (1) revisão do Martirológio; (2) criação da Congregação dos Ritos, que teve, entre outras funções, regular o culto aos santos; (3) criação de um Colégio de Consultores com a função técnica de analisar a proposições a santidade; (4) proibição do culto popular dos santos, e prescrição que se fosse comprovado que o culto existia antes do aval da Santa Sé, a causa em questão perderia sua nulidade de inscrição; (5) exigência nihil obstat (nada impede) da Santa Sé; (6) as causas apostólicas só poderiam ser abertas após 50 anos da morte do candidato; (7) interdição da impressão de livros sobre vidas, milagres, revelações, graças, sem o prévio reconhecimento do Ordinário; (8)organização das atribuições dos Promotores da Fé; (9)reafirmação a riserva pontificiale das canonizações; (10)inclusão dos médicos com peritos nos processos de canonização; (11)discussão sobre o Martírio em contraponto as virtudes heroicas.

Portanto, para concluir este tópico, iremos nos apoiar no artigo ―Evoluzione storica della Congregazione per le Cause dei Santi‖ do cardeal José Saraiva Martins (s/d). Segundo Martins, dos séculos XVI ao XVIII, a Santa Sé tomou para si a incumbência de disciplinar as canonizações e beatificações criando regras rígidas. Desta forma, de 1558 a 1634, houve a progressiva transição de um modelo tradicional para outro atualizado estabelecido por Urbano VIII, no qual este papa declara enfaticamente que nenhum Servo de Deus poderia ser adorado

31 Joseph Ziegler (1999:214) aponta que o caso mais antigo de um médico para atestar a santidade entre os examinadores nos processos de canonização data de 1208. Um certo Girardo Vitalis de Ripa declarou sob juramento que foi curado de uma hérnia intestinal dentro do período de um mês depois de uma peregrinação ao túmulo de Raimundo de Piacenza e orações para este santo. Girardo deu seu testemunho a uma comissão episcopal na qual um dos membros era o médico Magister Simone.

32 Tradução Livre: "… a aparente falta do cargo de um médico especialista nos primeiros processos de canonização resultam da situação de escassez de conhecimento médico a qual não permitia uma diagnose mais acurada. Visto que a Idade Média se caracterizou como um período em que se recorria mais a provas externas que provas internas, havia pouca demanda pelo expertise médico. Consequentemente a santidade era frequentemente determinada ‗viva voce populi'."

de forma pública até que a Santa Sé declarasse de forma solene a este respeito. O período de 1634 a 1740 se pauta pela reestruturação, ou seja, supressão progressiva das antigas tradições e, acima de tudo, pelo trabalho de codificação dos procedimentos de beatificação e canonização efetuados pelo papa Bento XIV (1740-1758).

Este conjunto de regras e procedimentos tiveram um impacto profundo nas canonizações. Com a racionalização imposta pelos papas deste período, os caminhos para santidade, necessariamente, teriam que passar pelo crivo da Congregação dos Ritos, que tinha ao seu lado um conjunto de regras e de pessoas destinadas a analisar os candidatos.

O resultado foi a consequente a diminuição das canonizações como informa os artigos de Eric Suire (1998) para o caso da França e o de Jean-Robert Armogathe (2003) para as causas espanholas. Obviamente, o decréscimo maior no número de causas corresponde ao século XVI devido às consequências da Reforma Protestante. Essa diminuição no número de santos canonizados já vinha ocorrendo desde as Decretais de Gregório IX (1227-1241),como pode ser conferido na tabela ―Processos de canonização ordenados e efetuados entre 1198 – 1431‖.As canonizações entre os séculos XVI e XVIII podem ser consultadas na tabela abaixo:

Tabela 2: Processos de canonização efetuados entre os séculos XVI e XVIII Papa Período do pontificado Canonizações efetuadas

Clemente VII 1592-1605 2 Paulo V 1605-1621 2 Gregório XV 1621-1623 5 Urbano VIII 1623-1644 2 Alessandro VII 1655-1667 2 Clemente IX 1677-1669 2 Clemente X 1670-1676 5 Alessandro VIII 1689-1691 5 Clemente XI 1700-1721 4 Bento XIII 1724-1730 10 Clemente XII 1730-1740 4 Bento XIV 1740-1758 5 Clemente XIII 1758-1769 6 Total de Canonizações 54

http://www.vatican.va/news_services/press/documentazione/documents/pontificato_gpii/pontificato_dati- statistici_it.html Acesso: 10/03/13.