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OS PROJETOS DE IRRIGAÇÃO CALIFÓRNIA, NOVA CALIFÓRNIA E JACARÉ-CURITUBA

3.4 – OS PROJETOS DE IRRIGAÇÃO DO ALTO SÃO FRANCISCO SERGIPANO

4. OS PROJETOS DE IRRIGAÇÃO CALIFÓRNIA, NOVA CALIFÓRNIA E JACARÉ-CURITUBA

De posse das evidências que estão postas nas políticas estatais criadas para o Território do Alto Sertão Sergipano considera-se que o desenvolvimento territorial é aquele que agrega a necessidade de conservação ambiental e une as preocupações e interesses da população envolvida, que é beneficiada com seus frutos de forma equilibrada, contrastando com a forma que praticamente tem dominado as políticas públicas que visam reduzir as diferenças locais e territoriais.

Sendo assim, os custos sociais e ambientais decorrentes dessas propostas históricas de desenvolvimento não foram adequadamente considerados e, ainda hoje, percebe-se que essas variáveis são freqüentemente negligenciadas pelas autoridades públicas. Os ônus decorrentes dessa flagrante e deliberada negligência são imputados à sociedade e à natureza. A primeira, que se vê submetida a crescentes níveis de miséria, ao desemprego e a desigual distribuição de renda, e a segunda pelos efeitos decorrentes da exploração irresponsável de recursos naturais, dos elevados níveis de degradação ambiental subjacentes aos diversos processos de produção e pelo imediatismo das ações produtivas (FONSECA, 1991).

Até hoje o conceito de desenvolvimento sustentável permanece muito ambíguo. Ele pode ser referido a domínios bem diferentes da realidade (físico-natural versus sócio- econômico) e aplicado em níveis de análise totalmente diferentes, tanto globais (como o aquecimento do clima do globo) como locais (preservação de uma área protegida). A noção pode também contemplar diferentes escalas de tempo, desde a da geração presente (por exemplo, pretendendo-se assegurar a viabilidade econômica e os impactos ambientais de um sistema de produção agrícola) até a da geração futura (RAYNAUT, 1994).

No tocante ao desenvolvimento territorial, Veiga (2003) deixa claro que para entendê-lo torna-se necessário separar a análise em três eixos interrelacionados visando contemplar as diferentes formas de expressão do desenvolvimento local.. Os referidos eixos se enquadram em todo o processo de organização da vida de suas populações e de suas ações, inclusive nas intervenções públicas no Território do Alto Sertão Sergipano e estão em sintonia com os objetivos dos territórios da cidadania instituídos pelo MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário). São eles:

 A recomposição dos territórios compreendendo as diferentes formas de articulações intermunicipais e microrregionais, a exemplo das associações, das cooperativas e dos consórcios municipais;

 Os Sistemas Produtivos Locais (SPL) que são definidos como um conjunto de unidades produtivas tecnicamente interdependentes, economicamente organizadas e territorialmente aglomeradas ou como uma rede de empresas de uma mesma atividade ou de uma mesma especialidade que cooperam em determinado território, ou até mesmo, como agrupamentos geográficos de empresas ligadas pelas mesmas atividades;

 A qualidade do meio ambiente que diz respeito à possibilidade da competitividade ser comprometida pela degradação ambiental. No entanto, o patrimônio natural que se encontra quase sempre associado a alguma forma de patrimônio histórico-cultural, pode representar o principal trunfo de desenvolvimento dos territórios rurais sendo este o caso do Bioma Caatinga, no Alto Sertão Sergipano, recobrindo as áreas englobadas pelos Projetos de Irrigação ora estudados. Além de paisagens, obras artísticas e sítios arqueológicos, esse tipo de patrimônio (natural e histórico-cultural), envolvendo bens imateriais, como as tradições locais, saberes artesanais e culinários ou a própria paisagem do território são incessantemente explorados para fins de garantia de melhoria das condições de vida das populações envolvidas. Nos assentamentos de Poço Redondo essa imaterialidade é mais fortemente explorada, enquanto em Canindé de São Francisco as paisagens (mata da caatinga, o rio São Francisco,etc.) são objetos de ganhos tanto para as instituições públicas quanto para as populações envolvidas no contexto da atividade turística. As atividades e as ações são consorciadas, envolvendo o poder público (federal, estadual e municipal), as populações (principalmente através das associações, das cooperativas e dos movimentos sociais organizados) e as empresas privadas.

No caso brasileiro e também sergipano, essas experiências de desenvolvimento territorial local foram estimuladas basicamente visando contemplar e disseminar as oportunidades de emprego e renda no âmbito da municipalidade, criar condições de investimentos àqueles interessados na região (oferta de incentivos fiscais) e propiciar a descentralização constitucional dos serviços públicos instituídos para os Territórios de

Desenvolvimento. No Território do Alto Sertão Sergipano, tido como centro das mais diversas intervenções do Estado, essas ações e intenções estão até os dias de hoje sendo experimentadas. Essas experiências abrangem os Arranjos Produtivos Locais, os projetos de irrigação, os Consórcios de Municípios, os Comitês de Bacias e os Eixos de Integração, instituídos no final dos anos 1990 e oficializados a partir de 2002, com a reorganização dos ministérios e anúncio público dos propósitos do Governo Lula, como alternativas de governança territorial que objetivam transformar a antiga noção do desenvolvimento regional em todo o país.

No contexto do desenvolvimento territorial local, como era esperado, os problemas a serem resolvidos tornam-se mais concretos, a demanda social faz-se mais precisa e exigente e os embates econômicos e políticos mais acirrados. Nos países industrializados e nos espaços mais bem sucedido dos países em desenvolvimento, os debates sobre a sustentabilidade territorial são fortemente influenciados por representações de uma natureza intocada, dispensadora de benefícios, testemunha da ordem original do mundo, hoje ameaçada pelas danosas atuações dos homens. No tocante à realidade estudada do Alto Sertão Sergipano essa realidade jamais poderia se enquadrar nesse contexto, pois as necessidades mais prementes são retiradas da natureza, como é o caso da flora e da fauna regional ligadas diretamente a Mata da Caatinga, típica das áreas onde estão localizados os Projetos Califórnia, Nova Califórnia e Jacaré-Curituba.

Considerando o exposto, neste capítulo objetiva-se refletir sobre a viabilidade do processo de sustentabilidade instituído pela ação estatal, responsável mais direta pelas condições estabelecidas no uso da terra e suas conseqüências, pela degradação ambiental derivada da própria irrigação, mas também pelo perfil do agricultor que se encontra assentado nos projetos de irrigação, pelo revestimento da propriedade da terra e pelas relações de trabalho, pelas técnicas de irrigação, pela nova configuração territorial assim como pelo modelo de gestão territorial presentes nos projetos de irrigação do Território do Alto Sertão Sergipano.Grosso modo, a análise crítica dos Projetos Califórnia, Nova Califórnia e Jacaré- Curituba estão aqui agrupados em três vertentes:

1. Propriedade, o uso da terra e a degradação ambiental provocada pela agricultura;

3. A governança territorial como novo modelo de gestão na permanente luta pela terra e pela sobrevivência.

4.1– ESPAÇO GEOGRÁFICO: PROPRIEDADE E USO DA TERRA, TÉCNICAS