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Outras estratégias de desconstrução do loc 01: a ironia

5.2 Construção prosódica e discursiva de Fernando Pimentel

5.2.2 Outras estratégias de desconstrução do loc 01: a ironia

As discussões apresentadas até aqui nos mostram que a crítica foi principal atitude expressa pelo loc. 01 nos momentos em que ele ataca seus adversários políticos. Vimos que os confrontos acontecem, sobretudo, nos momentos em que a desqualificação de seus oponentes é marcada por manifestações desfavoráveis que depreciam seus adversários, por parte do loc. 01. Além da crítica, encontramos a expressão de outra atitude, a ironia, quando o candidato se dirigia a um de seus oponentes no debate da Globo Minas. Trata-se de um momento em que

Pimentel respondia a uma pergunta de Fidélis Alcântara sobre privatização de estradas em Minas Gerais. Abaixo, transcrevemos esse momento.

FP: /…/ fidélis vamo conversá sobre estradas em minas gerais (+) é:: vamo começa dizendo o seguinte (+) o o governo do estado (+) fez um esforço se não me engano no início do do primeiro mandato ((tosse)) do governador aécio neves (+) criou um programa chamado pró acesso = um bom programa (+) é: asfaltou’ cinco mil quilômetros de estradas nos municípios (+) com dinheiro (+) é:: tomado no exterior com AVAL do governo federal porque sempre é assim = o governo federal é que avaliza = todo dinheiro que vem pra Minas (+) é avalizado pelo governo federal (+) depois dizem que o governo federal num ajuda minas gerais /…/ (Globo Minas, 30 de setembro de 2014)

A construção discursiva do candidato, inicialmente, visa a mostrar ao auditório que foram realizadas melhorias nas rodovias mineiras durante os anos de governo do PSDB e que todas essas reformas nas estradas tiveram apoio do governo. De acordo com Pimentel, 5 mil quilômetros de estradas foram asfaltados com dinheiro tomado no exterior, avalizado pelo governo Federal. A quebra de expectativa acontece justamente na última frase dita pelo loc. 01, quando ele menciona que, apesar do subsídio prestado, dizem que o governo não ajuda o estado. Essa frase passou por análise acústica e descreveremos o resultado a seguir.

Quando analisamos a crítica para o loc. 01, as principais características encontradas foram aumento de F0 nos pontos analisados, uma velocidade de fala mais lenta, a presença de pausas com duração média de 262ms e sílabas pretônicas e tônicas finais com maior duração, em relação às mesmas medidas nos enunciados neutros. Diferentemente do que encontramos para a crítica, o enunciado irônico do loc. 01 tende a apresentar valores mais baixos de F0, quando o comparamos às expressões neutras. Antes de procedermos às análises, veja-se a figura 9.

Figura 9: onda sonora, curva de F0, intensidade, segmentação e transcrição fonética das sílabas

do enunciado “depois dizem que o governo federal não ajuda Minas Gerais”, dito pelo loc. 02, no debate realizado pela Globo Minas, em 30 setembro de 2014.

Após realizarmos as medições nos pontos de F0, encontramos registros de frequência mais baixos para a expressão desse enunciado irônico. A fim de compararmos essa expressão atitudinal, tomamos os resultados encontrados para o neutro (cf. tabela 5). Os valores foram os seguintes: - 0,16 st/100Hz, no ponto inicial; - 2,9 st/100Hz, nos pontos final e mínimo; 4,25 st/100Hz, no ponto máximo; 2,09 st/100Hz, para a média de F0; e 7,15 st/100Hz para a tessitura. Não acreditamos ser possível generalizar os resultados, pois apenas uma sentença com ironia foi encontrada, mas podemos notar que nessa sentença o locutor utilizou um registro diferente (mais baixo) na expressão irônica.

Calculamos também as taxas de articulação e de elocução desse enunciado. Os resultados nos mostraram que a frase irônica foi dita numa velocidade de fala bem mais acelerada em relação ao enunciado neutro. Enquanto essas taxas foram de 7,89 síl/s nas expressões neutras, na fala irônica encontramos 9,08 síl/s. Nessa expressão, assim como no neutro, não encontramos pausas. Quanto às sílabas pretônica e tônica finais, a primeira tende a ser mais longa no neutro (144ms, quando, na ironia, a mesma sílaba mediu 109ms) e a segunda tem maior duração na expressão irônica (225ms, quando, no neutro, essa sílaba tem duração média de 175ms).

Na figura 9, podemos ver a intensidade representada pela linha verde. Nesse enunciado, o valor médio desse parâmetro foi de 62,33dB. No neutro, a média foi de 63,77dB, o que nos permite dizer que não houve uma variação expressiva de volume quando o candidato expressou a ironia, uma vez que os valores estão bem próximos.

Quando tratamos da crítica expressa pelo loc. 01, ponderamos que alguns movimentos circunflexos corroboraram a construção prosódica dessa atitude, enfatizando alguns elementos do discurso. Além disso, observamos que o locutor fez alguns prolongamentos silábicos propositalmente, na tentativa de colaborar com a construção de sentido crítico. No entanto, assim como para os enunciados neutros, não encontramos esses movimentos enfáticos, tampouco prolongamentos silábicos, na fala desse locutor quando ele expressou ironia.

Outra observação a ser feita é que, ainda que nosso objetivo nesse trabalho não seja discutir as contribuições da prosódia gestual na expressão das atitudes, julgamos importante sinalizar que, na expressão irônica do loc. 01, o riso parece ser uma pista importante para a caracterização dessa atitude. Vejamos, então, a imagem capturada do vídeo do debate realizado pela Globo Minas.

Figura 10: Imagem de Fernando Pimentel, capturada do vídeo do debate transmitido pela

Globo Minas, no momento em que enuncia “depois dizem que o governo federal não ajuda Minas Gerais”.

Na imagem apresentada acima, podemos notar que o candidato sorri no momento em que expressa ironia no enunciado “depois dizem que o governo federal não ajuda Minas Gerais”. Esse tipo de expressão facial não acontece nos demais momentos em que ele expressa crítica e nos enunciados neutros analisados neste trabalho. Embora o número reduzido de dados analisados não nos permita generalizar esse resultado, acreditamos que o riso pode ser uma característica da ironia na fala desse locutor.