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3 O ACESSO À INFORMAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

3.3 OUVIDORIAS UNIVERSITÁRIAS

A Constituição Federal estabelece que a Administração Pública deve pautar seu agir na moralidade e eficiência, conferindo publicidade a seus atos para que a sociedade não só tome conhecimento, mas também os fiscalize. Nesses moldes, a Constituição prevê a participação popular dentro da Administração Pública como requisito de controle e legitimação, uma vez que a sociedade tem interesse direto ou indireto em tudo que é feito no serviço público (MASCARENHAS DOS SANTOS, 2017, p. 50).

Essa atmosfera de propagação e luta por participação social é ambiente necessário para se consolidar a democracia, principalmente quando se trata de um ambiente democrático ainda em seus primeiros passos, como é o caso do Brasil (MELO, 2016, p. 33). O texto constitucional então prevê a existência de uma democracia que combina a representatividade com a participação, legitimando a intervenção direta e indireta de cada indivíduo dentro do Poder Público (ALVES, p. 5).

É no contexto de fortalecimento de uma democracia participativa, respaldada na própria Constituição, que a atuação popular ganha força e eleva a sociedade como guardiã última do interesse público e da busca ativa por uma Administração Pública que foque seu agir à representação do verdadeiro interesse social, sendo os serviços públicos espelho do que a sociedade busca (ALVES, p. 25).

A participação social, no entanto, não se resume ao controle dos atos públicos e dos serviços ofertados pelos órgãos e entidades públicas, mas sim na possibilidade da população atuar ativamente nas atividades e tomada de decisões da Administração Pública, contribuindo para uma melhoria nos serviços ofertados por esta e um novo olhar na busca pelo interesse público. É por isso que dentre as manifestações dos cidadãos tem-se a espécie de sugestão, sendo esta forma de contribuição direta para com o Poder Público, fazendo este enxergar pontos e realidades até então desconhecidas, porém vividas pela sociedade (MASCARENHAS DOS SANTOS, 2017, p. 51).

Para se efetivar o direito à informação e fazer com que o acesso aos dados públicos repercuta em análise que chegue até a Administração, é que se faz necessária a existência de mecanismos de ligação entre sociedade e Poder Público que seja capaz de receber e processar as demandas de cada indivíduo, sendo meio hábil para apresentação de uma resposta.

É nesse contexto que surge a ouvidoria como esse espaço de diálogo entre os órgãos e entidades pública e as mais diversas camadas da sociedade, estabelecendo um relacionamento entre esses atores que visa a persecução do valor público (GLUER, 2005, p. 2). Embora a Constituição Federal não cite em seu texto de forma expressa a ouvidoria, sem dúvidas essa tem respaldo constitucional para atuar na tentativa de ser meio de efetivação do diálogo cidadão e Administração Pública (MASCARENHAS DOS SANTOS, 2017, p. 52). Nessa conjetura, as informações públicas são a base do argumento crítico da população e a ouvidoria é o autofalante que propaga a voz da sociedade.

Nesse sentido, as ouvidorias abrem espaço para participação do cidadão (ALVES, p. 25), sendo instrumento relevante de atuação e fiscalização popular (COMPARATO, 2016, p. 44). Desta feita, as ouvidorias permitem, de igual modo, que se faça uma análise da efetividade da prestação dos serviços públicos e qualidade de atuação dos agentes públicos, permitindo ser mecanismo de verificação do cumprimento da lei e das diretrizes constitucionais (COMPARATO, 2016, p. 45).

A ouvidoria, contudo, não se resume a canal de repasse de informações pelo cidadão, como o Fale Conosco disponibilizado pelas empresas. Aquela atua com mais intensidade e precisão, analisando as demandas, identificando pontos de problemas e possíveis soluções. A ouvidoria, portanto, é mais que canal de comunicação, é espaço de análise crítica e ponto a ponto do serviço público e respeito aos direitos dos cidadãos (ALVES, p. 27), reforçando o papel ético e de transparência que deve reger a Administração Pública e buscando melhorar os serviços prestados por esta (BIAGINI, 2016, p. 10). Assim, a ouvidoria é palco da cidadania e intervenção na gestão pública, levando a voz da sociedade ao conhecimento da administração.

A ouvidoria pública se estabelece como meio de flexibilização da gestão pública, incluindo o cidadão como porta voz direto dos anseios sociais por intermediar a relação entre o Poder Público e a sociedade, permitindo que a Administração Pública, de posse dessas manifestações, entenda o que está acontecendo, o que precisa melhorar, o que está de acordo, e pense em novas formas de atuação. As informações colhidas pela ouvidoria servem como norte para a estratégia de desempenho da atividade estatal, auxiliando o gestor público na tomada de decisões (LOMBARDI, 2018, p. 24).

Desta feita, a ouvidoria universitária atua no mesmo sentido, objetivando ser elo que une a comunidade universitária e a instituição de ensino na busca de uma gestão transparente e plural (BIAGINI, 2016, p. 9). A ouvidoria universitária se insere no âmbito acadêmico como instrumento de participação social e mecanismo de accountability, fortalecendo uma gestão universitária democrática e que seja reflexo da complexidade das relações existentes nas universidades públicas9 (PEREIRA, 2014, p. 1).

O surgimento das ouvidorias universitárias remonta ao ano de 1965 com a criação da ouvidoria da Universidad Simón Froser, no Canadá, e, posteriormente, no ano de 1967, na Universidade Estadual de Nova York e na Universidade de Berkeley (LYRA, 2000, p. 85). No Brasil, a proposta de uma ouvidoria universitária esteve em pauta na imprensa do Estado da Paraíba do ano de 1990 (ALVES, p.36), entretanto a primeira ouvidoria universitária foi criada apenas em 1992, na Universidade Federal do Espírito Santo, sendo posteriormente instaladas as ouvidorias das Universidade de Brasília (1993) e Estadual de Londrina (1994) (LYRA, 2000, p. 87).

Nos anos de 1995 a 1997 a instalação de ouvidorias nas universidades foi muito tímida (ALVES, p. 37), de modo que, no nordeste do país, a primeira ouvidoria universitária foi a da Universidade Estadual do Ceará, no ano de 1997. Contudo, no ano de 1998, houve um crescimento exponencial na implantação de ouvidorias nas instituições de ensino superior, tendo sido implantadas 15 ouvidorias universitárias no citado ano (LYRA, 2000, p. 87).

É com a Portaria nº 1.264 de 2008 do Ministério da Educação que adveio a obrigatoriedade na implantação de ouvidorias nas IES, sendo a ouvidoria entendida como referência na avaliação da qualidade das universidades, sejam elas públicas ou privadas (PEREIRA, 2014, p. 9).

9 As ouvidorias universitárias não se encontram restritas as instituições de ensino superior públicas, estando

presentes, igualmente, nas universidades privadas. Contudo, como o foco desse estudo é a ouvidoria da UFRN, trata-se aqui apenas das ouvidorias universitárias públicas.

Desse modo, as ouvidorias no âmbito das universidades auxiliam na implementação de uma nova forma de relacionamento entre o público interno e externo e a administração da instituição, cooperando para uma nova modalidade de gestão, mais participativa e pautada no diálogo (MELO, 2016, pp. 82/83).

O ambiente universitário é muito plural, convivendo uma diversidade de pensamentos e um grande número de atividades e serviços prestados, muitos dos quais englobam também o público externo, ou seja, a sociedade. Imerso nesse sistema de complexidade, a administração da IES não consegue, sozinha, detectar e tratar de modo ordenado todos os problemas que surgem. Dessa forma, a ouvidoria universitária é ambiente estratégico que auxilia a administração da universidade, pois aproxima os discentes, docentes, comunidade externa e servidores como atores de controle para indicar o que precisa ser feito e apoiar as melhorias já implementadas.

A ouvidoria universitária, portanto, se torna palco da democracia e de transparência na gestão das universidades, democratizando o acesso a informações, fiscalizando o que é feito e abrindo espaço para disseminação de conhecimentos, posto que a ouvidoria não é apenas setor de reclamações, mas sim de proposição de mudanças.

Nesse sentido, a ouvidoria nas IES atua como controle de qualidade dos serviços prestados pela universidade, detectando problemas e propondo soluções, promovendo uma análise mais criterioso das atividades desenvolvidas pelas IES, primando sempre pelo melhor uso dos recursos públicos em prol da função social da instituição (PEREIRA, 2014, p. 8).

Ao se deparar com a análise das demandas encaminhadas para a ouvidoria, esta poderá traçar um panorama macro do desempenho e efetividade dos serviços da universidade, sendo capaz de identificar quais os serviços estão sendo mais demandados e o porquê. Isso auxilia na elaboração de um plano estratégico de gestão, que propicia uma administração universitária condizente com o que a academia espera dela (GLÜER, 2005, p. 3; ALVES, p. 37).

A ouvidoria universitária possui um público alvo bem extenso e que possui anseios distintos. Dessa forma, tem-se os próprios servidores da instituição (técnicos e professores), o alunado e a comunidade. Ao trabalhar as manifestações que lhe são enviadas, uma ouvidoria bem estruturada e atuante é capaz de identificar qual o setor mais demandado, o tipo de requerimento mais frequente e os períodos de maior demanda, sendo verdadeiro avaliador institucional (MARQUES, 2015, p. 42).

O intuito é estabelecer comunicação, atuando a ouvidoria como ligação que proporciona uma gestão administrativa democrática, transparente, ativa e dialógica (PEREIRA, 2014, p. 1). A ouvidoria universitária além de tratar da accountability dentro do ambiente universitário,

aborda o diálogo como peça fundamental para uma gestão educacional aprimorada e positiva. Um gestor precisa conhecer bem o ambiente em que atua e o público com o qual trabalha, somente assim sua atuação poderá render frutos positivos. A melhor forma de conhecer o seu ambiente de trabalho, os anseios do seu público, suas falhas e acertos, é possuir um meio que lhe possibilite estar em contato, ainda que indireto, com todas as informações que se necessita. A ouvidoria é esse espaço que fomenta uma gestão participativa possuindo como seu pilar de sustentação o diálogo.

Por intermédio da ouvidoria universitária, a administração das IES deixa de ser um ambiente superior e a parte do ambiente acadêmico para se tornar uma comunidade integrativa. A ouvidoria na universidade é meio de luta pelos direitos e pelo zelo com o modo de gerir um dos espaços de maior produção de conhecimento e serviço em prol de toda a sociedade (PEREIRA, 2014, p. 3).

Como canal de comunicação entre a administração da instituição e a comunidade acadêmica, a ouvidoria universitária permite que uma demanda individual se transforme em solução coletiva. Quando um indivíduo se dirige a ouvidoria e apresenta seu problema, indicando qual serviço está em falha, a solução dessa manifestação é de interesse de todos. Isso porque, ao receber uma demanda, a ouvidoria possui a capacidade de verificar quais as possíveis falhas que desencadearam o problema e sugerir, ao setor responsável, qual a solução passível de ser tomada para que aquela situação não volte a se repetir, evitando novas demandas idênticas. Ademais, a partir de diversos requerimentos individualizados pode-se encontrar um problema coletivo que precisa de uma atuação macro e não pontual (GLÜER, 2005, p. 4).

À vista disso, a ouvidoria universitária serve como atestado de efetividade e qualidade dos serviços prestados pela universidade, aferindo-se o que está em perfeito funcionamento e o que necessita de uma reanálise para que produza as atividades adequadas após os ajustes necessários (BIAGINI, 2016, p. 10). A ouvidoria universitária contribui para um fortalecimento da própria instituição, pois o público externo e interno se sente partícipe, ouvido, e isso proporciona um trabalho de cooperação, uma construção coletiva na melhoria da qualidade da gestão e dos serviços.

A ouvidoria universitária é agente de mudança que confere visibilidade aos procedimentos administrativos e transparência as condutas dos gestores, instaurando um novo modelo de gestão (MARQUES, 2015, p.12). Ela é palco de democratização no ambiente universitário e promotor de soluções (BIAGINI, 2016, p. 18).

Diante do exposto, a ouvidoria universitária permite a análise de múltiplas demandas que possibilitam a detecção de falhas e a proposição de soluções que nascem individuais, mas

repercutem em toda a universidade e os serviços prestados por estas. Auxilia, assim, na implementação de uma melhor gestão e termômetro de qualidade das atividades desenvolvidas no seio das instituições de ensino superior. A ouvidoria universitária ainda é mecanismo estratégico que conecta a administração da universidade com todo o público que esta atende, entregando aos gestores informações valiosas para a tomada de decisões e adoção de novas posturas. Desse modo, a ouvidoria transforma a demanda pública em informação coletiva que serve para melhorar os serviços públicos que impactam diretamente a sociedade (MELO, 2016, p. 81).

4. ESTUDO DE CASO DA OUVIDORIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO

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