• Nenhum resultado encontrado

2 O ÂMBITO DE ABRANGÊNCIA DA COMPETÊNCIA INVESTIGATÓRIA

2.2 Poderes da competência investigatória

2.2.3 Ouvir investigados e inquirir testemunhas

Esse poder das CPIs é o mais notório dentre todos, pois é o mínimo que a CPI deve ter, tendo em vista a concessão constitucional de “poderes de investigação próprios de autoridade judiciais”.

Referido poder assegura a eficácia da investigação parlamentar, pois lhe confere claramente autonomia, implicando em celeridade dos trabalhos de apuração dos fatos, imprescindível para a satisfação das diligências.

Além disso, à semelhança dos poderes de investigação das autoridades judiciais, o poder de ouvir testemunhas abrange, inclusive, o de conduzi-las coercitivamente, caso necessário.

Coaduna-se com o acima esposado o entendimento do Supremo Tribunal Federal, como se pode observar das palavras do Ministro Sepúlveda

Pertence, segundo quem “a Constituição explicitou dispor a Comissão Parlamentar de Inquérito dos ‘poderes de investigação próprios das autoridades judiciais’, entre os quais avulta de importância o de intimar, fazer comparecer, se for o caso, e tomar o depoimento de qualquer pessoa sobre o fato determinado a cuja apuração se destinar: the power to send for persons”9

Assim entendem outros ministros do mesmo tribunal, in verbis:

Ao contrário do que sucede com as convocações emanadas de comissões parlamentares de inquérito, em que as pessoas — além de intimadas a comparecer, sob pena de condução coercitiva — estão obrigadas a depor, quando arroladas como testemunhas

(ressalvado, sempre, em seu benefício, o exercício do privilégio constitucional contra a auto-incriminação), cumpre observar que tais conseqüências não se registram, no plano jurídico, se se tratar, como na espécie, de mero convite formulado por Comissão Permanente do Senado Federal, que não dispõe dos poderes de coerção atribuídos a uma CPI.10

O Código de Processo Penal assegura à testemunha o direito de ser inquirida pelo juiz do lugar de sua residência. Em caso de residir em outra localidade, a inquirição deve ser feita por carta precatória, mediante intimação das partes (Art. 222). Para tanto, o juiz deve fixar um prazo razoável para o cumprimento da precatória. (...) O Paciente pretende ser ouvido em Campinas/SP (fl. 9). O pedido encontra amparo legal (CPP, Art. 222). As comissões parlamentares de inquérito têm ‘poderes de investigação próprios das autoridades judiciais’ (CF, Art. 58, § 3º). Tais poderes exercer-se-ão nos moldes dos procedimentos a que se submetem os juízes. É garantia constitucional (CF, Art. 5º, LIV).11

Ademais, importante questão relacionada à oitiva tanto de testemunhas como de investigados é o direito que todos possuem à não se auto- incriminar, tendo como representante mais conhecido o direito ao silêncio, consagrado em vários ordenamentos jurídicos estrangeiros, como na Constituição norte-americana, com a cláusula privilege against self-incrimination e no Pacto de

9 STF – pleno HC nº 79.244-8/DF – medida liminar – Rel. Min. Sepúlveda Pertence.

10 HC 88.189-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 7-3-06, DJ de

14-3-06

11 HC 80.152-MC, Rel. Min. Nelson Jobim, decisão monocrática, julgamento em 2-5-00, DJ de 8-5-

São José da Costa Rica – Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que prevê, no Art. 8º, § 2º, g, “o direito a toda pessoa acusada de delito não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada”, e do qual a Constituição Brasileira também não se afastou, inclusive nas CPIs.

Corroborando o exposto, o entendimento da jurisprudência máxima pátria, no acórdão HC - 79244/DF, in verbis:

Ementa: I. CPI: nemo tenetur se detegere: direito ao silêncio. Se, conforme o Art. 58, § 3.º, da Constituição, as comissões parlamentares de inquérito, detêm o poder instrutório das autoridades judiciais – e não maior que o dessas – a elas se poderão opor os mesmos limites formais e substanciais oponíveis aos juízes, dentre os quais os derivados das garantias constitucionais contra a auto-incriminação, que tem sua manifestação mais eloqüente no direito ao silêncio dos acusados. Não importa que, na CPI – a qual tem poderes de instrução, mas nenhum poder de processar nem de julgar – a rigor não haja acusados: a garantia contra a auto-incriminação se estende a qualquer indagação por autoridade pública de cuja resposta possa advir à imputação ao declarante da prática de crime, ainda que em procedimento e foro diversos. Se o objeto da CPI é mais amplo do que os fatos em relação aos quais o cidadão intimado a depor tem sido objeto de suspeitas, do direito ao silêncio não decorre o de recusar-se de logo a depor, mas sim o de não responder às perguntas cujas repostas entenda possam vir a incriminá-lo: liminar deferida para que, comparecendo à CPI, nesses termos, possa o paciente exercê-lo, sem novamente ser preso ou ameaçado de prisão. II. Habeas corpus prejudicado, uma vez observada a liminar na volta do paciente à CPI e já encerrados os trabalhos dessa12.

Não se pode esquecer também de que, decorrente do direito ao silêncio, assim como ocorre perante as autoridades judiciais, os depoimentos nas CPIs tem de respeitar possível sigilo profissional, que, no entendimento do Supremo Excelso, “tem alcance geral e se aplica a qualquer juízo, cível, criminal, administrativo ou parlamentar”13. Vejamos, ipsis litteris:

A intimação do paciente, que é advogado, para prestar depoimento à CPI, não representa violência ao disposto no Art. 133 da Constituição

12 STF, HC n. 79.244/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 23.2.2000, DJU de 24.3.2000, p. 38. 13 STF – HC nº 71.039/RJ – Rel. Min. Paulo Brossard, decisão: 7 de abril de 1994.

nem às normas dos artigos 87 e 89 da Lei 4.215, de 1963; 406, CPC; 154, Cód. Penal; e 207, CPP. O paciente, se for o caso, invocará, perante a CPI, sempre com possibilidade de ser requerido o controle judicial, os direitos decorrentes do seu status profissional, sujeitos os que se excederem ao crime de abuso de autoridade.14

Consubstancia direito do advogado recusar-se a depor, como testemunha, em processo no qual haja funcionado ou deva funcionar ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que caracterize sigilo profissional. A partir da premissa constante, repita-se, da justificativa do requerimento de convocação — o paciente atuou como advogado, na prestação de serviços a certo cliente —, não se tem como placitar o ato da Comissão Parlamentar de Inquérito. Defiro a liminar pleiteada, desobrigando o paciente, ante a convocação, tal como formalizada, de comparecer à Comissão Parlamentar de Inquérito aludida para ser ouvido.15

Ninguém pode recusar-se a depor. Contudo, a testemunha pode escusar-se a prestar depoimento se este colidir com o dever de guardar sigilo. O sigilo profissional tem alcance geral e se aplica a qualquer juízo cível, criminal, administrativo ou parlamentar. Não basta invocar sigilo profissional para que a pessoa fique isenta de prestar depoimento. É preciso haver um mínimo de credibilidade na alegação e só a posteriori pode ser apreciado caso a caso. A testemunha não pode prever todas as perguntas que lhe serão feitas. O Judiciário deve ser prudente nessa matéria, para evitar que a pessoa venha a obter HC para calar a verdade, o que é modalidade de falso testemunho.16

Dessa forma, as CPIs devem respeitar o sigilo profissional, prerrogativa do profissional da advocacia, que, sem dúvidas, aplica-se à esfera parlamentar. Evidentemente, esse direito tem seus limites, que devem ser respeitados por quem o invoca a seu favor.

Documentos relacionados