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“Somos muitos Severinos

iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas, e iguais também porque o sangue que usamos tem pouca tinta. E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida). Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina: a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima, a de tentar despertar terra sempre mais extinta, a de querer arrancar algum roçado da cinza. Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias e melhor possam seguir a história de minha vida, passo a ser o Severino que em vossa presença emigra.”

Oziel é o nome do bairro e, Oziel Alves Pereira é o nome da escola que tem sua trajetória narrada nessa dissertação. Nome bíblico, Oziel significa “fortaleza do

Senhor”, e em sua matriz hebraica, esse nome aparece em vários personagens do

antigo testamento. É também o nome de um jovem que foi um líder do MST, morto em 17 de abril de 1996, em Eldorado dos Carajás, no estado brasileiro do Pará, em um trecho conhecido como a curva do S, rodovia PA 150, num conflito com a Polícia Militar do referido Estado.

Desde quando cheguei ao bairro Parque Oziel e a escola EMEF Oziel Alves Pereira, não pude deixar passar despercebido a vontade de saber quem era essa pessoa que se transformou em símbolo na ocupação urbana. Nas cidades, os nomes de ruas, avenidas, escolas, praças, são indicados por motivos diversos. Pelo reconhecimento ao trabalho prestado à sociedade, por simples nepotismo, por um número sem fim de condições arbitrárias e, por vezes, parece que não obedece a lógica nenhuma. Mas ali, naquela ocupação, o nome e o personagem histórico a que se referia carregava uma carga simbólica forte e percebi mobilizar tantos sentimentos contraditórios nas pessoas, que senti necessidade de saber mais sobre ele e o imaginário que se criava em torno de sua existência e suas lutas.

É necessário explicar melhor: há, na escola uma representação imagética da pessoa de Oziel Alves Pereira, que causava certo questionamento e estranhamento por parte dos professores. Não sendo um personagem representante da hegemonia vigente, pode-se dizer que a imagem de Oziel foge aos estereótipos da maioria das pessoas que geralmente dão seus nomes a lugares públicos. Sua representação é o oposto aos bons costumes, à ordem, a abnegação em sua condição social e econômica. Representada em um desenho, seria mesmo a imagem de Oziel? É uma imagem fidedigna? Abaixo a imagem que está na escola

Figura 1: Oziel Alves Pereira, que fica no corredor da área administrativa da escola. Fonte: Elaborada pela autora. Novembro/2011

Não se sabe quem é o autor de tal produção, não há nem mesmo uma assinatura no desenho. Mas, a figura é de um jovem rapaz, de traços fortes, bem demarcados, que lembra um bom desenho em um retrato falado. Seu boné virado para o lado mostra o cuidado em deixar seu rosto bem visível, ao mesmo tempo em que lhe confere um ar quase infantil, despojado.

Porque há a inscrição “Viva o MST” nessa imagem, infere-se que sua trajetória pessoal esteja vinculada a esse movimento, mas por que o escolheram, já que o MST tem várias lideranças, não ficava claro e, não há, fora dessa imagem, qualquer outra representação ou mesmo uma inscrição, que esclareça a homenagem.

Sua imagem, em um quadro simples, não possui uma legenda, mas sim uma frase do educador Paulo Freire, mostrando a importância daquela representação para adornar uma escola. Amplificando a curiosidade, a imagem e os dizeres me levavam a perguntar como um nome vinculado a um fato ocorrido tão distante ganhava

Essas e outras pequenas especulações movimentam a curiosidade acerca da história de uma pessoa, que faz parte do imaginário social do bairro, mas que na escola torna-se uma figura lendária, e sobre o qual pairava o desconhecimento tanto de sua luta como do indivíduo propriamente dito.

Considera-se importante levantar essas questões, pois elas servirão de estofo para a construção da história do sujeito que empresta seu nome ao bairro e à escola pesquisada.

Foi a partir da representação na imagem, sem referencial algum, que a presente pesquisa se iniciou para encontrar os primeiros vestígios da vida do jovem Oziel Alves Pereira.

Os primeiros registros encontrados foram pesquisados na internet, mais precisamente na página oficial do MST4, em que foram encontrados alguns textos que

falavam sobre o dia da chacina, no qual ele foi morto; sobre os outros mortos e feridos, a respeito do julgamento de policiais e possíveis mandantes, a propósito das testemunhas, e sobre a memória dos sobreviventes depois de tantos anos passados. Em muitos desses textos o nome de Oziel era encontrado. Sempre dentro de um mesmo formato de escrita, a mesma descrição, jovem líder do MST morto brutalmente em Eldorado dos Carajás. Tentei algumas vezes estabelecer contato com a direção do MST por e-mail para encontrar mais registros sobre ele, mas não obtive retorno.

Entre tantas buscas foi encontrada uma poesia referindo-se a Oziel Alves Pereira como Zumbi dos Palmares, o autor é Azuir Ferreira Tavares Filho professor e morador de Campinas. Segue abaixo a poesia de 2009.

OZIEL ALVES PEREIRA O ZUMBI DO PARÁ 17-04-1996

Salve Oziel Alves Pereira, Salve Zumbi do Pará. Salve a Raça Brasileira, E a determinação do seu lutar. Salve o ideal trabalhador,

E a necessidade de plantar a terra. Salve o Oziel Agricultor,

Comandante e senhor da Guerra.

Salve o Zumbi destemido. Heroico e ameaçador. Sem medo e decidido. Merece todo louvor. Pelas massas consagrado. Não se deixou acovardar. Por Deus Abençoado. Pra sempre vamos lembrar.

Salve Oziel Pereira. Humilde mais lutador. Salve a alma Guerreira, O Homem pobre sem temor.

Traz a luz reveladora,

Enfrenta a repressão com pau. É a vida salvadora,

Sempre armado de ideal

Salve Oziel, és Brasil, És Justiça, és Dignidade. Dezessete anos tão varonil. Esperança no Campo e na Cidade. És força pra nossa união,

Pra Juventude és alento. És Boa Vontade e comunhão. És beleza todo momento.

Salve Oziel Alves Pereira Para salvar a nação. Tens a coragem primeira. Estás em cada cidadão. Redime a nossa gente, Defende a todos explorados. Ressurge Zumbi valente Santo Guerreiro Encarnado.

Salve Zumbi nascedor. Revive em seu povo.

Iluminado e cheio de amor. Anuncia um Brasil Novo. Vem resgatar a terra.

Vem escrever nossa História. Comanda os Anjos de Guerra, Traz a liberdade e glória. É Hora de organizar.

Não conter mais a expressão. Sabe incorporar no lutar. É hora de Transformação. Hora sagrada de consciência. Hora sagrada pra unir. Covarde vivo é indecência. Cada um de nós é Zumbi.

Salve Oziel Alves Pereira Salve o Zumbi do Pará Alma amiga Brasileira. Pra fazer nos irmanar

Por nossa terra e nossa gente. Em Eucaristia dando a mão. No Povo esta o Cristo presente A nossa Felicidade por união

Ainda na página do MST foi encontrada uma escola que fica em Eldorado dos Carajás- PA, homônima à escola que pesquiso. É uma escola municipal, que também tem um site, mandei uma carta, sem resposta. Prosseguiram-se então inúmeras tentativas de telefonemas, os quais foram todos infrutíferos. O próximo passo foi encaminhar alguns e-mails, mas estes voltaram para a caixa de entrada de meu correio eletrônico dizendo que seria impossível encaminhá-los. Depois dessas tentativas frustradas, houve uma tentativa de aproximação com a Secretaria de Educação do Pará, mas também não consegui contato, nem por telefone, nem por correio eletrônico.

A pesquisa por notícias do massacre em Eldorado dos Carajás prosseguiu e foi encontrado um artigo de Lucas Figueiredo, jornalista da Folha de São Paulo. O artigo é de 20 de abril de 1996, sob o título: “Líder foi morto com tiro à queima roupa”, na qual Lucas, correspondente do referido jornal, conta que foi até a cidade de Curionópolis, Pará5. Lá, conversou com várias testemunhas da chacina e com

pessoas que viram o corpo de Oziel, já no Instituto Médico Legal, inclusive com o deputado estadual, João Batista do Partido dos Trabalhadores, que era membro da Comissão de Direitos Humanos local. Segundo este deputado, o caso do massacre de Oziel teria sido o mais grave, pelo grau de violência empregado contra ele. Enfim, o jornalista escreveu sobre os fatos nos momentos que se seguiram e relatou sobre um possível líder morto de nome Oziel.

Essa reportagem levou-me a procurar por Lucas Figueiredo, e pela internet constatei que ele atualmente é escritor de livros-reportagem e biográficos, pela Companhia das Letras. Encontrei seu blog e seu contato de e-mail. Resolvi tentar contatá-lo, ao que ele prontamente e tão generosamente respondeu. Mandou-me mais alguns artigos e um ensaio que fora publicado no livro “Jornadas Literárias de Passo Fundo” de 2001.

5Curionópolis, Pará, é uma cidade a 753 Km de Belém, na região de Parauapebas. Seu nome, dado em 1981, homenageia a

Sebastião Rodrigues de Moura, o “Sebastião Curió”, um militar do exército, hoje reformado na condição de coronel, que destacou-se pela perseguição e massacre de militantes da Guerrilha do Araguaia na década de 60 e 70. É município limítrofe ao de eldorado de Carajás e, como se sabe, histórica região de conflito na luta pela terra e reforma agrária.

O ensaio intitulado: “O cheiro de um país”, começa descrevendo o velório de um homem conhecido sob a alcunha de “o Irmão”, por outros como Antônio, em que autor descreve:

Nunca tinha ido a um velório tão cheio e triste, apesar de ninguém ali conhecer direito o Irmão. Esse fato, aliás, havia se transformado num dos problemas do velório. Era preciso escrever alguma coisa na cruz branca de madeira que ficaria à cabeceira da sepultura dele, mas escrever o quê, se ninguém sabia o sobrenome ou a data de nascimento do Irmão. (FIGUEIREDO, 2001,163)

O falecido e seu velório causaram comoção, por tudo o que aquele corpo ali representava: a miséria, a falta de oportunidades de trabalho e estudo, descaso do Estado com seus cidadãos, a negação do sujeito histórico, sem nome nem sobrenome, sem certidão de nascimento.

Figueiredo (2001) seguiu descrevendo quando e como o Irmão e outros sem-terra foram parar em Eldorado dos Carajás, descreve o cenário onde mais tarde aconteceria uma das maiores tragédias de nossa história recente na luta pela reforma agrária. Foi em 1995 que Irmão e cerca de mil famílias que estavam atrás de um pedaço de chão se encontraram e, juntos, eles foram ocupar uma fazenda, chamada Macaxeira.

Estimava-se que quatro mil pessoas acampavam nas matas dessa fazenda, caminhando cerca de dez quilômetros para chegar à cidade mais próxima que era Eldorado dos Carajás. O desespero da fome levava famílias a saquearem os armazéns da cidade, a esconderem-se no mato, a portarem-se como animais famintos.

No dia 17 de abril de 1996, Irmão e mais de mil sem-terra bloquearam a rodovia PA-150, na altura do km 100, tentando pressionar o governo federal, sob a presidência da república de Fernando Henrique Cardoso, membro do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), para desapropriar as terras da fazenda Macaxeira. Os sem-terra entre eles, crianças, impediriam o trânsito e exigiam um ônibus para que uma comissão fosse até Marabá para a negociação sobre a desapropriação (mas também reivindicavam comida), para, posteriormente, saírem de lá.

O que se seguiu foi à chegada de 150 militares, que cercaram Irmão e seus companheiros. Os sem-terra não arredaram o pé e o massacre teve início. Foram algumas poucas horas descritas por várias testemunhas como sendo de tremenda barbárie, em que podia se ouvir claramente dos policias, ‘acabem com essa raça’.

Figueiredo (2001) diz que com exceção de Irmão, todos os outros dezoito companheiros assassinados tinham seus nomes e sobrenomes conhecidos na região.

Eram eles:

Oziel Alves Pereira, 18 anos;

Raimundo Lopes Pereira, 20 anos;

José Ribamar, 22 anos;

Lourival da Costa Santana, 25 anos;

Robson Vitor Sobrinho, 25 anos;

Antônio Costa Dias, 27 anos;

Joaquim Pereira Veras, 32 anos;

Altamiro Ricardo da Silva, 42 anos;

Amâncio dos Santos Silva, 42 anos;

Graciano Olimpo de Souza, 46;

Leonardo Batista de Almeida, 46 anos;

Manoel Gomes de Souza, 49 anos;

Abílio Alves Rabelo, 57 anos;

Antônio Alves da Cruz, 59 anos;

José Alves de Silva, 65 anos;

João Rodrigues de Araújo, idade desconhecida;

Valdemar Ferreira da Silva, idade desconhecida.

Essa ordem é a que aparece no ensaio de Figueiredo, 2001, uma ordem cronológica de idade, e nela, destaca-se Oziel como o mais jovem do massacre.

Os outros artigos enviados pelo referido jornalista, também tratavam da morte de Oziel, do julgamento dos acusados, do tratamento que as testemunhas recebiam. Do medo, de como as autoridades estavam se portando frente a um caso que ganhou repercussão internacional à época.

Perguntei a ele se estivera com Oziel, se o vira mesmo que morto. Ele disse que nunca esteve com Oziel, que tudo mais que sabia sobre ele vinha de pessoas que conheceram a vítima. Acrescentou que os trabalhadores estavam num estado de extrema pobreza, que muitos não possuíam documentos e dificilmente encontraria uma fotografia dele. O jornalista mandou algumas reportagens que fiz depois do massacre, nas quais ele tratava sobre o julgamento dos policiais, sobre a importância das testemunhas nos depoimentos para a acusação dos executores e possíveis mandantes. Dentro dessa perspectiva ele conversou com uma testemunha que dizia ter visto Oziel ser espancado e morto a tiros posteriormente.

Para finalizar nossa conversa Figueiredo escreveu-me que achava importante que alguém, depois de tanto tempo, passados quase vinte anos do massacre, pudesse pesquisar sobre a vida do Oziel e não só falasse desse ‘cabra

marcado para morrer’, como se referiu ao jovem Oziel, mas que pudesse

minimamente construir uma história de sua trajetória, já que ela não se encerrava em sua morte.

Assim, as reportagens de Figueiredo apontavam e reforçavam a ideia de que Oziel fora mesmo, reconhecidamente, encarado como um líder dentro do movimento e, sua história acabou por mostrar um jovem não apenas sacrificado, mas também martirizado. Todavia, continuava ainda a procurar por evidências de sua vida, uma vez que a imagem da escola repercutia no ambiente escolar.

Foi quando busquei como fonte o livro do jornalista Eric Nepomuceno, “O Massacre: Eldorado dos Carajás: uma história de impunidade” (2007). O livro é um belo trabalho de jornalismo investigativo, resultado de algumas viagens, trinta e duas entrevistas, cerca de cinquenta e quatro horas de gravações, leitura de dois inquéritos

com cerca de vinte mil páginas, análises de documentos acadêmicos, ensaios e materiais jornalísticos, conversas com políticos paraenses, tudo isso recheado com fotografias do renomado Sebastião Salgado, que estivera no local do massacre e registrou com toda sua identidade a dor, a desolação do povo sem-terra.

Nepomuceno viajou para o Pará em 2005, visitou acampamentos do MST, passando por Parauapebas, Curionópolis e Eldorado dos Carajás. Uma parte da história de Oziel é descrita assim Nepomuceno (2001):

Oziel Alves Pereira, 17 anos, um dos dirigentes do MST mais procurados pelas milícias dos fazendeiros e pela própria Polícia Militar, que o considerava um agitador perigoso, levou quatro tiros. Um atravessou sua cabeça, de trás para diante. Outro acertou sua testa pelo lado direito. Essa bala saiu pelo lado esquerdo da nuca. O terceiro foi no pescoço, de trás para frente, também pelo lado esquerdo. O quarto e derradeiro foi disparado no lado direito de seu peito. (NEPOMUCENO, 2001, p. 114-115)

Em um parágrafo o escritor-jornalista resume sua conclusão, de que tudo o que aconteceu na tarde de uma quarta feira do ano de 1996 a poucos quilômetros de Eldorado dos Carajás foi:

(...) uma das mais frias e emblemáticas matanças da história contemporânea do país. Ninguém deveria sequer se atrever a usar a palavra como “confronto”, “incidente” ou “choque” para descrever o que aconteceu na curva do S” (...) “Aquilo foi uma carnificina brutal, um massacre que permanece impune. Dezenove pessoas foram mortas, e estou convencido de que pelo menos cinco delas foram alvos previamente escolhidos. (NEPOMUCENO, 2007,16)

Um desses alvos previamente escolhidos, como mais a frente ele deixa claro com o relato de várias testemunhas, foi Oziel Alves Pereira.

O referido autor segue descrevendo que havia visto cenas de tamanha barbárie tão somente quando cobriu a guerra civil em El Salvador, América Central, entre os anos de 1979 e 1983, as cenas vistas por ele dos cadáveres, do massacre através das fotos, mostravam corpos mutilados e cabeças destroçadas. Percebeu que o que havia acontecido naquele lugar fora mais que a manutenção da ordem pública, era a representação de uma fúria descontrolada, e mais que isso uma fúria a serviço de interesses privados. “A inexistência, enfim, de uma linha clara que separa o que é

público do que é privado: recorre-se à força policial como quem recorre a uma milícia particular. ” (NEPOMUCENO, 2007, p.18).

Ele descreve o cenário em pormenores, com detalhes de números que como ele mesmo disse, não tinha a intenção apenas de fazer revelações drásticas,

mas de querer tentar “mais que do que revelar, quer recordar- soprar as brasas da memória para impedir que se tornem cinzas mortas”. (NEPOMUCENO, 2007, p 19).

Ele cruza a geografia de um Estado e de um país inteiro com a geografia de personagens mortos e sobreviventes. Ele cruza a história do país com as histórias de vida, mostra o contexto em que cada sujeito está inserido. Trata de trazer à tona a discussão sobre a origem da miséria, da vida nômade, do desenraizamento que trabalhadores do campo vivem, trata da fronteira, da linha tênue que separa os camponeses dos grandes latifundiários. E a tensão que existe entre esses dois fios da mesma meada. Se por um lado os integrantes do MST querem a reforma agrária, de outro os grileiros e latifundiários querem a manutenção de suas hegemonias e seus

status quo.

Traz a luz a discussão o que parece ser escamoteado das discussões, o que parece não fazer parte dos livros de história. Faz questão de lançar mão de dados, números, para que possamos construir melhor nossos discursos sobre a origem da pobreza e possamos refutar os argumentos de quem ache isso natural e como coisa dada.

Ele também escreve que alguns dirigentes do MST admitiram que não tiveram a real dimensão da fúria que suas ações estariam submetidas posteriormente.

Conta com detalhes o percurso que o movimento do MST realizou até chegar a Eldorado dos Carajás, na fazenda Macaxeira, suas reivindicações e os desdobramentos dessa estratégia. Enfim, faz questão de deixar claro o estado do Pará como o maior em número de mortes de trabalhadores rurais, segundo dados da Pastoral da Terra.

O autor cita ainda que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta que há no país um regime de escravidão e, que no Pará esses números são alarmantes, já que a mão de obra barata vinda basicamente dos estados paupérrimos do Maranhão e do Piauí ajudam a crescer esses números. Os trabalhadores em regime de escravidão concentram-se nas grandes propriedades de terra. Muitos que conseguem escapar desse regime acabam sendo mortos pelos fazendeiros e justiceiros. Outros tantos que conseguem escapar da armadilha encontram no

Movimento dos Sem Terra a chance de conseguirem seu pedaço de chão, seu sustento e de suas famílias.

Como escreve Nepomuceno (2001):

Nessa atmosfera em que a lei mais eficaz é a de quem tem armas, é mais fácil entender que haja pessoas vagando pelo interior do Brasil - ativistas, líderes de movimentos de reivindicação- transformados em mortos ambulantes. Seus nomes estão em listas de condenados conhecidos por todos (NEPOMUCENO, 2007, p.37).

Não foi diferente com Oziel Alves Pereira. Seu nome estava na lista dos que precisavam ser mortos, liquidado. No dia do confronto, segundo esta fonte, Oziel estava encima de um carro de som, pedindo que ninguém arredasse o pé dali. No