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Capítulo 01 Fundamentação teórica

1.6. Pólos de desenvolvimento e complexos produtivos

Nas últimas décadas, o desenvolvimento regional, com a noção de espaço configurando-se como variável estratégica, ganha cada vez mais destaque nas agendas dos atores, públicos e privados, que promovem a gestão territorial.

Esse desenvolvimento, revisitado, objetivou aferir uma melhor articulação na abordagem territorial às novas dinâmicas socioeconômicas a partir da globalização e integração de mercados. Para Santos (2002, p. 220), o desenvolvimento só será alcançado pela mobilização integral dos recursos das diferentes regiões para a satisfação prioritária das necessidades das respectivas populações.

O eixo da teoria do desenvolvimento regional inspira-se na tradição keynesiana, e têm na “Teoria da Base de Exportações” (SANTOS, 2002) um de seus grandes elementos. A partir do momento em que a região começa a vender seus produtos fora de suas fronteiras ela passa a existir para o resto do mundo. Assim, o seu desenvolvimento será decorrência do dinamismo dessa base de exportação e da difusão desse dinamismo para o resto da economia regional.

O desenvolvimento regional, sobretudo na versão de Myrdal (1968), Perroux (1977) e North (1981), continua fornecendo um ponto de partida importante para as análises regionais recentes, sobretudo para as regiões novas, como as gestadas pela agroindústria. Dos autores citados anteriormente, os trabalhos de Perroux, em especial, merece uma maior atenção por ser a base a partir da qual foi desenvolvida a teoria da polarização.

A teoria dos “pólos de crescimento” foi desenvolvida por Perroux, em 1955, ao observar a concentração industrial na França, em torno de Paris, e na Alemanha, ao longo do Vale da Ruhr (PERROUX, 1977). Segundo Souza (1993, p. 32), os pólos industriais de crescimento surgem em torno de uma aglomeração urbana importante (Paris), ao longo das grandes fontes de matérias-primas (Vale da Ruhr), assim como

nos locais de passagem de fluxos comerciais significativos e em torno de uma grande área agrícola dependente (São Paulo).

O pólo de crescimento tem uma forte identificação geográfica, porque ele é produto das economias de aglomeração geradas pelos complexos industriais, que são liderados pelas indústrias motrizes. Um complexo industrial é um conjunto de atividades ligadas por relações de insumo-produto. Ele forma um pólo de crescimento quando for liderado por uma ou mais indústrias motrizes; e ele se tornará um pólo de desenvolvimento quando provocar transformações estruturais e expandir o produto e o emprego no meio em que está inserido (idem, p. 33)

A idéia de um pólo, motor do crescimento, e de uma periferia agrícola e subdesenvolvida, a ser polarizada, corresponde a uma simplificação errônea da teoria do crescimento polarizado de François Perroux. Na verdade, ele supôs a existência de alguns pólos principais, com porte semelhante, e de vários pólos secundários, de menor dimensão, hierarquizados, servindo de ponte e de filtragem aos efeitos de encadeamento emanados dos pólos superiores.

As noções de pólo e de “região polarizada” (PERROUX, 1977), estão intimamente associadas com as idéias de urbanização e de industrialização. A região polarizada contém vários centros urbanos e industriais secundários relacionando-se com o pólo central dinâmico.

A teoria dos pólos de crescimento, derivada da noção marshalliana de “complexos industriais” (MARSHALL, 1982), apresenta semelhanças com a teoria schumpeteriana de desenvolvimento econômico. Em primeiro lugar, ela se baseia no dinamismo da indústria motriz, atividade inovadora e de grande dimensão, que exerce importantes efeitos de encadeamento no interior do pólo.

Em Schumpeter (1982), a atividade inovadora rompe o fluxo circular estacionário e promove o crescimento de seu meio e leva outras empresas a inovarem em um processo de imitação. As empresas que não adaptam desaparecem (destruição criadora), liberando fatores produtivos a serem empregados pelas empresas inovadoras.

Em Perroux (1977), fica implícita a ação do empresário inovador, que conduz a atividade motriz rumo ao sucesso, desencadeando em seu meio a motricidade que impulsiona a economia ao crescimento econômico. Novas firmas são criadas para abastecer a unidade motriz, ou para aproveitar como insumos os produtos que ela lançou no mercado. Novos investimentos são realizados através das polarizações tecnológica, geográfica e pelas rendas.

Essas ações, nos “países em desenvolvimento” (AYDALOT, 1985), geralmente são induzidas pelo Estado, com o objetivo de evitar a concentração no pólo principal e provocar a despolarização. Porém, como salientou Aydalot, essa tentativa pode resultar em fracasso, tendo em vista que as novas empresas implantadas podem não encontrar no local os “trabalhadores qualificados, fontes de abastecimento fácil, contatos técnicos e matérias-primas baratas” (AYDALOT, 1985, p. 177).

Assim, a criação de novos pólos na periferia gera a necessidade de, simultaneamente, melhorar a rede de transportes e comunicações, desenvolver a educação técnica e profissional, criando uma força de trabalho mais bem qualificada.

Muitas vezes essas ações não bastam para atrair indústrias motrizes, levando os formuladores de política regional à conclusão de que os recursos seriam mais eficientemente alocados se fossem destinados à melhoria da competitividade das empresas locais existentes, através da pesquisa tecnológica visando novos produtos e processos, ou ao treinamento de executivos e trabalhadores.

Nesse contexto, surgiram os programas de apoio às pequenas e médias empresas e a criação de incubadoras empresariais, tendo na formação de ovos empresários a preocupação essencial.

Grande parte da literatura sobre os complexos produtivos, foi influenciada por Marshall (1982), Perroux (1977) e Schumpeter (1982). Os sistemas agroindustriais não fogem a essa realidade.

Nos últimos anos, diversos estudos vêm analisando os sistemas agroindustriais por diferentes enfoques. Duas metodologias de maior destaque são: a análise de cadeias de produção e a dos sistemas dos complexos agroindustriais.

A cadeia de produção é um conjunto de relações comerciais e financeiras que estabelecem, entre todos os estados de transformação, um fluxo de troca, situado de montante à jusante, entre fornecedores e clientes. A cadeia de produção é um conjunto de ações econômicas que presidem à valorização dos meios de produção e asseguram a articulação das operações (MORVAN, 1988, p. 03).

O estudo dos estadunidenses Davis e Goldberg (1957) foi pioneiro nessa linha de trabalho. Utilizando a matriz insumo-produto, os autores cunham o termo agrobusiness, ou agronegócio, como sendo “a soma total das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas; das operações de produção na fazenda; do armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos a partir deles”. (DAVID e GOLDBERG, 1957, p. 02)

Nesse mesmo contexto, o complexo agroindustrial é entendido pelos autores como a soma total das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas; as operações de produção nas unidades agrícolas; e o armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos com eles (idem, p. 23).

O conceito de complexo agroindustrial surgiu na década de 1950 nos “países centrais” (Guimarães, 1979), como resultado de estudos sobre a participação das atividades agrícolas nas relações inter-setoriais, a partir de teorias a respeito destas relações formuladas por Leontief (1971).

A existência dos complexos agroindustriais pressupõe, a presença no mínimo de dois setores integrados - agricultura (industrializada) e o industrial (ALVARENGA, 2000). Este representada pelas indústrias de insumos e processadoras, sendo as últimas possuidoras de maior ascendência sobre a agricultura.

Segundo Bruneau e Imbernon (1980, p. 213), o sistema agroindustrial se desenvolve, acentuando o processo de internacionalização do capital social, sob todas as formas: capital produtivo (implantações industriais e migração de mão-de-obra), capital financeiro (movimento internacional do capital bancário e industrial), mercadorias/transferência de tecnologia, importação e exportação de diversos bens e serviços.

Embora a modernização-industrialização da agricultura brasileira, tenha se intensificado em escala crescente a partir da década de 1950, esse processo não se deu de forma homogênea em todos os setores agrários e no espaço nacional. Ainda existem muitos espaços, tipos de cultura e criação, fragilmente ou, ainda, não atingidos pela modernização.

A introdução das relações capitalistas no campo faz-se de maneira seletiva, principalmente em função dos objetivos do sistema que, em última análise, é o da reprodução ampliada do capital. Assim, a modernização e a tecnificação da agricultura brasileira, principalmente a partir do advento dos complexos agroindustriais, não é sinônimo de desenvolvimento, sustentável. A última discussão desse capítulo discorre sobre esse ponto.