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3. REVISÃO DA LITERATURA

3.5. Padronização

Relações de franquia são caracterizadas por uma tensa dualidade entre a necessidade de padronização no nível de rede e a conveniência da adaptação a mercados locais (COX; MASON, 2007). Por um lado, produtos e serviços padronizados estão no cerne da proposta de valor de redes franqueadas. Por outro, a autonomia de franqueados é um importante apelo à proposta de “ser o seu próprio patrão” oferecida pelas redes de franquia (DANT; GUNDLACH, 1999). De fato, a análise empírica indica que franqueadores não são tão propensos a tolerar desvios dos padrões estipulados em seus contratos, o que significa que os franqueados não lidam com muita margem para iniciativas próprias (MICHAEL, 1996a).

Normalização e uniformidade são pilares do conceito franquias. Há três razões para isso, segundo Kaufmann e Eroglu (1999). Em primeiro lugar, a padronização é um meio de alcançar a minimização de custos para o franqueador e franqueados, notadamente em termos economias de escala obtidas em compras de insumos e promoção da marca. Além disso, a padronização reduz custos do monitoramento de franqueados.

Em segundo lugar, a padronização permite que o conceito possa ser comunicado de forma consistente ao longo da rede, a fim de construir e manter uma imagem distinta entre os clientes. Esta imagem uniforme proporciona um modelo de identidade que faz com que os clientes da rede esperem receber o mesmo produto em todas as unidades (FALBE; DANDRIDGE, 1992; MICHAEL, 2002). Uniformidade

e consistência são, portanto, imperativos para atrair e reter clientes e manter a integridade da proposta de valor da marca (DANDRIDGE; FALBE, 1994; MICHAEL, 1996; PRICE, 1997). Isso cria interdependência entre as unidades do sistema (COX; MASON, 2007). Construir e manter uma imagem uniforme do conceito ao longo do sistema é, portanto, fundamental, pois cada franqueado tem um impacto potencial sobre os demais (KAUFMANN; DANT, 1999). Se franqueados desviam-se do modelo padrão em busca de seu próprio interesse, aumenta a probabilidade de erosão e deterioração da qualidade da marca.

Por fim, as práticas de adaptação local podem reduzir a capacidade do sistema de inovar. O conhecimento gerado por franqueados individuais pode ser de pouco valor para outros franqueados que operam em ambientes diferentes. Mais importante, se os franqueados se adaptam excessivamente às condições locais, ocorre um descasamento entre suas rotinas operacionais em relação ao do restante do sistema, o que reduz o potencial de geração de ideias de valor para a rede como um todo (KAUFMANN; EROGLU, 1999; SORENSON; SØRENSEN, 2001).

Kaufmann e Eroglu (1999) argumentam que a padronização é fundamental nas fases iniciais da rede a fim de projetar um conjunto relativamente grande de elementos comuns a todas as lojas. Mesmo pequenas diferenças poderiam interferir na capacidade dos consumidores generalizarem sua expectativa de consumo.

Na medida em que as redes amadurecem, a necessidade de padronização pode diminuir. Não só a rede amadurece, mas também o setor em que atua. O ambiente de negócios provavelmente se torna mais competitivo, de forma que, para se manter neste ambiente, a rede precisa de uma postura mais empreendedora por parte de franqueados sob a forma de experimentação e inovação (TUUNANEN; HYRSKY, 2001).

O termo padronização remete (e algumas vezes se funde) ao conceito de replicação, e ambos são recorrentes na análise do arranjo de franchising. Replicação implica em criação e operação de um grande número de estabelecimentos similares entregando um produto com alto grau de padronização. Este arranjo, inicialmente disseminado a partir do ramo de redes de restaurantes em sido aplicado por empresas em inúmeras indústrias. No início dos anos 2000 cerca

de 1/3 das vendas no varejo dos EUA ocorriam em organizações em rede (WINTER; SZULANSKI, 1995; SZULANSKI; JENSEN, 2008).

Padrões transmitem mais facilmente a informação sobre o conjunto de atributos que caracterizam o produto transacionado, independentemente do arranjo empregado para realizar a transação. Consequentemente, quanto maior o grau de padronização presente, menores serão os custos de mensuração destes atributos.

Por exemplo, Brownell e Merchant (1990) verificam a relação entre automação e padronização de produto com o controle orçamentário. Pesquisando empresas do setor de componentes eletrônicos, os autores concluem elevados níveis de automação em processos e padronização de produtos o processo de orçamentação é mais preciso.

A dinâmica da replicação normalmente é concebida como a aplicação repetida de uma fórmula ou receita simples, porém inovadora e encaixada em uma necessidade específica de um grupo de consumidores. O pressuposto é que a fórmula é perfeitamente conhecida pelo replicador e reproduzida com precisão cada vez que a replicação ocorre.

No entanto, apesar da concepção relativamente simples, o empreendimento de modelos baseados em replicação apresenta aspectos de relativa complexidade (WINTER; SZULANSKI, 1995). A criação de valor pela replicação inicia-se através da descoberta e refinamento de um modelo de negócios baseado em um produto ou processo inovador, com posterior seleção dos componentes necessários para replicar esse modelo em diferentes localizações geográficas e diferentes contextos mercadológicos. Cria-se valor ainda desenvolvendo-se capacidades para “rotinizar” a transferência de conhecimento e manter o modelo em funcionamento. Longe de ser um pacote de informações instantaneamente absorvidas e processadas, normalmente trata-se de um complexo conjunto de rotinas interdependentes, o qual é identificado, ajustado e afinado pela experiência à frente da rede.

A expansão através da replicação de uma fórmula deriva da capacidade de recriar processos produtivos complexos, muitas vezes não totalmente compreendidos e em parte tácitos, com diferentes recursos humanos e enfrentando por vezes a resistência de agentes com relativa autonomia, dado o potencial de

assimetria de informação gerado pela própria dinâmica de expansão do negócio (SZULANSKI; JENSEN, 2008).

Este raciocínio se aproxima do próprio conceito de franchising enquanto formato de negócios, o qual apresenta entre suas características mais notáveis o desenvolvimento de um modelo diferenciado de prestação de serviço que ocorre muito próximo ao consumidor final. Redes com maior êxito conseguem replicar tal serviço em um grande número de unidades geograficamente dispersas (COMBS et

al., 2004a).

O presente estudo entende que o nível máximo de replicação que pode ser obtido por uma rede ocorre quando suas unidades meramente comercializam produtos acabados. A razão alegada para este pressuposto é a não ocorrência de processos de transformação no nível de loja.

Do ponto de vista de uma rede varejista com múltiplas unidades, espera-se que redes cujas unidades simplesmente repassam ao consumidor final um produto já totalmente acabado tendam a lidar com maiores níveis de padronização, potencializando monitoramento e mensuração de resultados. Para estas redes a atenção sobre as unidades está mais centrada em questões relativas ao atendimento, layout de loja, etc.

Por fim, mesmo em redes com alto grau de processamento de produtos ocorrendo no interior das unidades, a questão da padronização é alavancada por maiores níveis de automação. Com a ação humana sendo substituída por equipamentos e sistemas computadorizados o produto tende a ser gerado de forma mais uniforme e parametrizada. Ou seja, com maior grau de padronização (BROWNELL; MERCHANT, 1990).

No nível de loja, a presença de processos mais automatizados e/ou sistematizados potencialmente eleva a capacidade de monitorar a distância. Como colocado por Norton (1988), máquinas não tentam ‘fugir’ do trabalho. No entanto, pessoas podem ser tentadas a ludibriar, entregando menos esforço do que foi contratado. Para um determinado nível de produção, custos de monitoramento se elevarão com o aumento da intensidade do trabalho.