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PAINEL SOBRE CONSEQÜÊNCIAS BIOLÓGICAS

No documento carlsaganeoutros-oinvernonuclear (páginas 176-200)

DR. GEORGE M. WOODWELL (presidente do Painel sobre Efeitos Biológicos): Em se tratando de problemas complexos como estes, que afetam a Terra inteira, e em que a experimentação e a própria coleta de dados são difíceis, requerem-se equipes de especialistas e equipamentos complicados para incrementos aparentemente insignificantes de progresso. Num mundo cada vez mais complicado, cada vez mais intensivamente explorado, é essencial que haja muitas dessas equipes realizando pesquisas redundantes. É esse o custo do uso intensificado da biosfera: pesquisa e análise constantes de modo a assegurar que as informações fundamentais,

as idéias, os fluxos de perguntas e respostas se mantenham, e a evitar surpresas, como estamos fazendo no momento. A matéria é tão nova para os biólogos quanto para os meteorologistas. A comunidade científica está criando um começo, uma nova partida para um Grande Problema.

Nós congregamos um grupo de cientistas ilustres para iniciar esse processo.

DR. JOHN HARTE (membro do painel): Todos nós dependemos dos ecossistemas que nos cercam como um doente em tratamento intensivo depende de frascos de soro e equipamentos médicos de sustentação de vida. Empreender uma guerra nuclear seria como atirar uma banana de dinamite acesa numa unidade de tratamento intensivo, rompendo as ligações vitais que garantem a sobrevivência. Entre as funções essenciais de sustentação de vida exercidas por um meio ambiente natural normal e saudável está a regulação do ciclo hidrológico, que minimiza a ocorrência de chuvas excessivas e secas prolongadas; um exemplo são as encostas revestidas de vegetação, que moderam as enxurradas e abrandam a correnteza dos rios. Outra dessas funções é a minoração da poluição do ar e das águas e o tratamento de resíduos sólidos por processos naturais atmosféricos e microbiais. Uma terceira é a moderação do clima, de novo exemplificada pelo papel das grandes reservas de vegetação viva, capazes de criar um micro-clima essencial à sua própria existência.

Nos primeiros três a seis meses após uma guerra nuclear, estas e outras funções ecológicas seriam virtualmente suspensas. A perda de um ano de produção agrícola será discutida por outros oradores. Quanto a mim, quero abordar vários aspectos relacionados à água e em seguida tecer alguns comentários gerais sobre as

perspectivas de restabelecimento à longo prazo de funções ecológicas prejudicadas.

Ao tomar conhecimento, ano passado, dos resultados do estudo TTAPS com respeito às baixas violentas de temperatura superficial, ocorreu-me que os reservatórios de água doce que abastecem as populações humanas e os animais de criação ficariam congelados. Meus cálculos mostraram que haveria a formação de uma camada de gelo de aproximadamente um metro nas águas superficiais de regiões interiores. Sem combustível nem eletricidade para derreter o gelo ou bombear água de poços para a superfície, muitas pessoas e animais de criação morreriam de sede. Os níveis reduzidos de precipitação pluviométrica previstos agravariam o problema. Nesse contexto é oportuno observar que os sinergismos parecem trabalhar a nosso favor nas situações normais, e voltar-se contra nós quando nós e a natureza sofremos uma debilitação. Outro exemplo disto: com as canalizações congeladas, não haveria o escoamento dos dejetos, exacerbando o problema das epidemias, já agravado pela redução das resistências às moléstias e infecções induzida pela radiação.

O efeito de um período de escuridão prolongada em organismos aquáticos foi estimado através de experiências em meu laboratório e de modelos matemáticos elaborados pelos Drs. Chris McKay e Dave Milne. Os dois tipos de pesquisa produziram resultados semelhantes. Cadeias alimentares compostas de fitoplâncton, zooplâncton e peixes devem sofrer grandemente com a extinção da luz. Com apenas alguns dias de escuridão, o fitoplâncton - base da cadeia alimentar - morreria ou entraria em estado de vida latente. Na zona temperada, em cerca de uns dois meses no fim da primavera ou no verão, e em três a seis meses no inverno, os animais aquáticos mostrariam drásticos

declínios de população, que para muitas espécies poderiam ser irreversíveis. Essas estimativas (baseadas na redução da luz) provavelmente subestimam as conseqüências para a vida marinha das condições de pós-guerra nuclear, pois não levam em conta os efeitos térmicos, nem os do aumento de turbidez das águas provocado pela erosão das costas e pela deposição de fuligem e poeira. A sensibilidade da vida marinha à escuridão prolongada seria provavelmente maior nos trópicos do que na zona temperada, porque nos trópicos as reservas nutritivas são menores e as necessidades metabólicas maiores. Nas regiões polares, onde a adaptação a invernos escuros é uma condição de vida, a sensibilidade seria reduzida. Os lagos de água doce tornar-se-iam altamente anóxicos depois que a poeira assentasse e a temperatura subisse. Grandes quantidades de resíduos orgânicos, inclusive cadáveres em decomposição, tornariam letal a água de abastecimento. Há poucas razões para pensar que as principais formas de vida aquática que hoje nos servem como fontes de alimento viessem a sobreviver a uma guerra nuclear de primavera ou de verão em número suficiente para serem de proveito para o homem, pelo menos nos primeiros anos do pós-guerra.

Anos depois da guerra, a capacidade de sustentação de vida do meio terrestre estará ainda grandemente reduzida, ainda que os níveis de luz e temperatura estejam próximos das condições de antes da guerra. A favorabilidade do clima local, a arabilidade do solo, a constância e qualidade da água e a disponibilidade de recursos gênicos seriam seriamente degradadas pelos meses de condições extremas que se seguiriam à guerra. A destruição de extensas áreas de vegetação pelo fogo ou pela escuridão resultaria em condições locais alteradas de clima e de solo que muito dificilmente seriam propícias

ao replantio. Com muitos de seus inimigos naturais exterminados, pragas de insetos frustrariam as tentativas de retomada da produção agrícola, como o faria a erosão do solo nas terras escalvadas e desprotegidas. A radiação ultravioleta provavelmente persistiria como agressão ecológica por bem mais de um ano.

Seriam os poucos sobreviventes restantes capazes de restabelecer com os ecossistemas sustentadores de vida as ligações vitais necessárias à sobrevivência? Esse restabelecimento só poderia ocorrer depois de recuperados os ecossistemas, e somente se os remanescentes da sociedade fossem capazes de mobilizar a organização social e a tecnologia requeridas para a exploração dos ecossistemas restaurados. O tempo necessário para que ocorresse a segunda condição é difícil de estimar, mas certamente seria no mínimo tão longo quanto para a primeira, pois sem ecossistemas que assegurem as necessidades básicas da vida, é impossível uma sociedade tecnológica organizada. Provavelmente a restauração dos ecossistemas devastados exigiria não menos de um decênio - estimativa baseada na experiência de ecologistas com dados tirados de exemplos históricos de ecossistemas muito combalidos. Sendo a recuperação tão demorada, o mais provável é que a pequena população humana remanescente continuaria a minguar, aumentando assim as probabilidades de extinguir-se por completo.

DR. OWEN CHAMBERLAIN (Universidade da Califórnia em Berkeley): O senhor sabe se existem planos para testar a sensibilidade do fitoplâncton às mudanças de temperatura?

HARTE: Os únicos planos de que tenho conhecimento, pelo menos para o futuro próximo, são planos de examinar os efeitos da escuridão prolongada. Os efeitos das mudanças de temperatura na vida marinha não são de tão grande interesse em vista da grande capacidade térmica dos oceanos, que impediria oscilações maiores na temperatura das águas oceânicas.

INTERPELANTE NÃO IDENTIFICADO: Os senhores examinaram a possível proliferação de bactérias, fungos e organismos inferiores, bem como de insetos?

HARTE: Isso deverá ser feito. Muitos ecologistas estão hoje interessados em estudar essas questões experimentalmente. Pelo menos com respeito a pequenos organismos, como o plâncton e os fungos, pode-se iniciar esse estudo no laboratório. Espero que isso venha a acontecer futuramente, mas por ora não posso anunciar resultados sobre efeitos de escuridão prolongada em organismos do solo.

DAVID MCGRATH (diretor-adjunto da Global Tomorrow Coalition em Washington, D.C.): Até aqui ninguém mencionou especificamente a questão de se a ausência de fotossíntese por um período longo reduziria de forma apreciável a quantidade de oxigênio na atmosfera, e quais as conseqüências disso.

HARTE: Isso não nos preocupa muito. Os números sugerem que as variações do oxigênio, bem como do dióxido de carbono (C02), seriam insignificantes. São efeitos de importância terciária, por isso não nos empenhamos muito em analisá-los.

DR. JOSEPH A. BERRY (membro do painel): Minha incumbência aqui hoje é examinar algumas das bases técnicas da previsão de que a fotossíntese seria fortemente inibida em escala global pelas condições da atmosfera do pós-guerra. E eu gostaria de lembrar-lhes que, como foi salientado repetidamente nas exposições, a fotossíntese constitui o principal suprimento de energia química à biosfera e a principal força motriz para a operação dos ecossistemas naturais e cultivados.

Para que se dê a fotos síntese, duas coisas são basicamente necessárias. Primeiro, a luz tem de penetrar até a superfície da Terra, onde as plantas estão localizadas. E, segundo, a luz deve ser absorvida pelos pigmentos fotossintéticos das plantas em condições, sob outros aspectos, favoráveis. Vejamos a pergunta: de que modo a redução da luz que penetra a atmosfera afetaria a fotossíntese? Muitas experiências demonstraram que a fotossíntese total de florestas e culturas é proporcional à intensidade da luz recebida (Fig. 1). Mesmo em dias normais, a fotossíntese varia com a luz, atingindo o seu máximo ao meio-dia com céu limpo e decrescendo em períodos nublados e de manhã ou de noite. A soma total de fotossíntese num dado intervalo de tempo é proporcional à soma total de luz recebida. Segue-se que uma redução de luz causaria uma redução proporcional do total de fotossíntese. Essa relação não leva em conta o fato de que as plantas têm de manter-se a si mesmas e produzir excedentes que sirvam de alimento para o homem ou forragem para os animais.

Figura 1: A fotossíntese total de plantas cultivadas

(expressa sob a forma de energia equivalente dos produtos formados, em watts por metro quadrado) é proporcional à energia luminosa absorvida. Estes dados são de algodoais, medidos em condições de campo num dia típico de verão sem nuvens. (Reproduzido de Baker e outros, Crop Science 12: 431 [1972].)

Em geral, requerem-se pelo menos 15 a 20% da fotossíntese total diária para suprir a demanda respiratória das plantas. Em ecossistemas complexos, que compreendem grandes quantidades de biomassa permanente e muitos consumidores neles encerrados, como é o caso das florestas tropicais úmidas, essa fração ainda é maior, correspondendo quase à fotossíntese total.

Sendo a fotossíntese total proporcional à luz, se a intensidade da luz se reduz a 15 ou 20% da normalmente recebida, a produtividade liquida das plantas cultivadas cessará. E em florestas úmidas cessará mesmo antes disso. Naturalmente, isso importa na interrupção do crescimento de brotos, frutos e sementes, que são as partes mais nutritivas e comestíveis das plantas. Sendo as plantas consumidas pelos animais, a biomassa vegetal poderia ser drasticamente reduzida por um período extenso de escassez de luz. Quando os níveis de iluminação voltassem ao normal, haveria menos biomassa para absorver a luz e portanto menos fotossíntese até que a cobertura vegetal fosse restabelecida.

Outro fator a influenciar a densidade da biomassa vegetal é o frio extremo que segundo as previsões se seguiria a um conflito nuclear, já que as baixas temperaturas podem lesar ou mesmo matar as plantas (Quadro 1). Existem no mundo regiões térmicas muito diferentes, e as plantas dessas regiões têm sensibilidades correspondentes a baixas temperaturas. As plantas tropicais, por exemplo, vivem em áreas onde raramente ou nunca ocorrem temperaturas de congelamento, e estas podem matá-las. Em áreas de invernos rigorosos, os gomos dormentes das plantas, quando convenientemente pré-condicionados, toleram temperaturas de até -80ºC. Em qualquer habitat, a tolerância das plantas à temperatura corresponde de modo geral às temperaturas mais baixas passíveis de ocorrerem neste habitat (ver Fig. 2). É provável que as temperaturas no ambiente de pós-guerra cairiam abaixo das mínimas normais. E é provável que as baixas temperaturas matassem as plantas, especialmente nas áreas em que o frio não é um fator ecológico normal.

Nos habitats mais frios, o efeito das baixas temperaturas dependeria de estarem as plantas em hibernação ou em seu estado ativo de verão. As folhas ativas das plantas de

qualquer região são muito sensíveis às baixas temperaturas. Temperaturas de 4 ou 5ºC já podem afetar seriamente o desempenho de plantas tropicais. Espécies de coníferas nativas em regiões alpinas podem ser prejudicadas no verão, quando estão crescendo ativamente, por temperaturas de -10ºC. Assim, numa guerra de verão, em que essas espécies experimentariam um rápido declínio de temperatura, é provável que suas folhas fossem lesadas, deixando menos biomassa disponível para continuar a fotossíntese quando a luz voltasse ao normal.

O que aconteceria com a fotossíntese em base mundial nos anos seguintes a um conflito nuclear? A produtividade fotossintética do mundo tem sido provavelmente muito constante ao longo do tempo geológico, mais ou menos 5% do valor de 100%. No primeiro ano, em razão da forte redução da luz que alcança a superfície da Terra, é de prever que a produtividade fotossintética do Hemisfério Norte cairia para uns 10-20% da normal. Muito provavelmente, a que restasse ocorreria nos trópicos. No segundo ano, embora a luz, a força motriz essencial da fotossíntese, tivesse re tomado, a biomassa - as folhas das plantas, as algas do oceano - seria menos densa, donde absorveria menos luz e operaria menos fotossíntese. Com isso, tenho a impressão de que a fotossíntese não se restabeleceria tão depressa quanto a luz. A continuação de baixas temperaturas e a presença de luz ultravioleta (UV-B) também retardaria o desenvolvimento de folhas e algas. Imagino que a cobertura vegetal e a fotossíntese acabariam por voltar aos níveis normais de antes da guerra, levando talvez entre uma e algumas décadas. É muito difícil prever como se apresentariam finalmente os ecossistemas contendo essa biomassa.

DR. THOMAS C. HUTCHlNSON (Universidade de Toronto): Supõe-se que todas as plantas que existem no momento estariam no lugar, prontas para recuperar-se? BERRY: Não é o que se supõe. É claro que se todas as plantas estivessem aí e prontas para recuperar-se, a perspectiva seria de que a fotossíntese retornaria em pouco tempo aos níveis anteriores, já que a previsão é de que a luz se restabeleceria bastante rapidamente no segundo ano. Acho que basicamente a demora na recuperação do potencial fotossintético é na verdade a demora na restauração da cobertura vegetal na superfície da terra.

HUTCHINSON: O senhor sugere então que haveria uma demora de uns quatro anos no restabelecimento de uma cobertura vegetal?

BERRY: Sim, mas isto é uma simples conjetura. Depende do grau em que as plantas fossem afetadas no primeiro ano.

MARK A. HARWELL (membro do painel): Esta Conferência concentrou-se nas conseqüências de médio e longo prazos de uma guerra nuclear, com atenção especial para as novas e surpreendentes análises das alterações climáticas previstas para o caso de uma guerra nuclear em grande escala e para as óbvias e inevitáveis catástrofes biológicas que adviriam de tais agressões à biosfera global. Uma vez percebidas a natureza e a magnitude das conseqüências atmosféricas, foi fácil para o grande grupo de ecologistas e biólogos que se reuniu em Cambridge em abril de 1983, para uma discussão preliminar dessas questões, concordar com o

que diz respeito às conseqüências biológicas correspondentes. Esse consenso foi apresentado aqui por Paul Ehrlich e detalhado no artigo composto por um comitê biológico, que trata das conseqüências retardadas e indiretas em particular. Minha intenção aqui não é repetir esses relatos, mas enfatizar alguns pontos referentes à interação homem-ecossistema e apresentar uma breve descrição geral dos impactos totais sobre o homem, pelos efeitos imediatos de detonações nucleares e no período mais longo subseqüente a uma guerra nuclear, com base numa série de análises a que procedi nos últimos meses.

Primeiro, quero assinalar as íntimas vinculações que existem entre o homem e o meio. Praticamente toda a vida da Terra depende em última análise da luz solar para obter a energia que passa através dos sistemas ecológicos e impulsiona a multiplicidade de fluxos de matéria necessários à manutenção dos organismos vivos. As plantas e os animais são essencialmente máquinas movidas à energia solar, inclusive a espécie que mais nos interessa, o Homo sapiens.

O homem depende dos sistemas ecológicos para a maior parte das suas funções de conservação. Em primeiro lugar, é claro, estão o alimento e a água incontaminada. Também são essenciais abrigo, energia, melhoramento do clima, purificação do ar, controle de pragas e doenças e uma série de outros serviços.

Há que fazer distinção entre dois tipos de ecos sistemas - naturais e manipulados. Estes são principalmente os sistemas agrícolas, mas também compreendem outros sistemas de manipulação de recursos como as florestas e os minerais. Em geral, esta classe pode ser definida de modo aproximado como sistemas de base biológica que são diretamente controlados pelo homem e pelos sistemas societários. Eu faço essa distinção pelo

seguinte: hoje a população do mundo é de mais de 4,5 bilhões. Embora possa não haver consenso entre os ecologistas e outros quanto à capacidade de carga da Terra para sustentar a espécie humana mediante ecossistemas naturais e manipulados, uma coisa é certa: a capacidade de carga dos ecossistemas naturais, por si sós, é muito inferior à população humana atual. Quer dizer, os ecossistemas naturais simplesmente não podem sustentar 4,5 bilhões de caçadores-colhedores; não há o que caçar ou colher em quantidade bastante para alimentar tantos indivíduos - mesmo com ecossistemas sadios.

Os sistemas biológicos manipulados que sustentam os seres humanos dependem totalmente da sociedade humana organizada para manutenção e reforço. Obviamente, um sistema não produzirá alimentos se o homem não suprir as sementes, o cultivo, os adubos e em muitos casos a água, além de várias outras atividades que mantêm produtivos os ecos sistemas manipulados. Além disso, mesmo com produção adequada de alimentos, a população humana não poderia ser abastecida sem uma extensa rede de sistemas de transporte e distribuição. O problema é que esse apoio humano aos sistemas manipulados deixaria de ser operativo após uma guerra nuclear da escala considerada nesta Conferência.

Assim, após uma guerra nuclear, o homem perderia o sustento dos sistemas manipulados mesmo sem as agressões climáticas e outras até aqui mencionadas. Os sobreviventes humanos seriam obrigados a recorrer ao mundo natural em busca de um nível de sustento que a Terra não poderia fornecer mesmo em condições saudáveis, justamente quando os sistemas naturais estariam padecendo distúrbios sem precedentes. Em suma, os sistemas naturais hoje só poderiam sustentar

uma pequena fração da população do mundo; depois de uma guerra nuclear, esses sistemas não estariam em boa forma, e sua capacidade de prover às necessidades humanas estaria drasticamente reduzida.

Um tópico relacionado diz respeito às vinculações entre o homem e o meio depois de passado o pior, isto é, nos anos subseqüentes ao inverno nuclear do que falamos. Dependendo de quanto se tenha reduzido o nível de população humana, e de até que pontos os sistemas ecológicos tenham regredido, é provável que a recuperação humana não possa operar-se mais depressa que o ritmo de recuperação dos sistemas naturais, e a dependência acrescida do homem em relação a esses sistemas naturais pode levar a um retardamento dos processos de recuperação. Para dar apenas um exemplo, um grupo de sobreviventes famintos poderia despojar sistemas ecológicos da sua energia excedente a custo captada para crescimento, reprodução, reservas nutritivas, etc., dessa forma retardando os processos naturais requeridos para o restabelecimento e recuperação dos ecossistemas.

Já foram mencionados os problemas que seriam encontrados pelos sobreviventes que tentassem recorrer aos ecossistemas costeiros para sustento. Foi dito que as regiões costeiras seriam batidas por tempestades de grande violência, produzidas pelo acentuado gradiente de temperatura entre as massas de ar continentais e marítimas; elas receberiam um quinhão desigual de radionuclídeos e destruição de habitats por várias razões,

No documento carlsaganeoutros-oinvernonuclear (páginas 176-200)

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