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4.2 Da Rouanet ao Procultura: Espaços e vozes envolvidos no debate

4.2.3 O papel da Câmara de Deputados

Os debates não se encerraram com a consulta pública. Após a finalização do anteprojeto, esse material foi encaminhado à Câmara de Deputados e, desde então, o projeto saiu do âmbito do Ministério42 e passou a ser administrado pelo Congresso. Antes da sanção

da Presidência da República, o projeto precisa passar por três comissões na Câmara: a Comissão de Educação e Cultura - CEC; Comissão de Finanças e Tributação - CFT; e, por fim, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania - CCJC, sendo submetida, em seguida, à apreciação do Senado. Até o presente momento (fevereiro de 2014), o projeto foi aprovado na CEC, sob a relatoria da deputada Alice Portugal (PCdoB/ BA), e na CFT, tendo como relator o Deputado Pedro Eugênio (PT/PE), chegando, em 2013, à sua última comissão antes de seguir para o Senado.

Em 2010, o projeto de Lei nº 6.722/2010 era apresentado à Câmara dos Deputados, com texto que se baseava nas demandas sociais coletadas ao longo dos anos e ordenadas na consulta pública online. Subsidiada pelas informações do Ministério da Cultura, a deputada Alice Portugal elaborou um requerimento para realização de audiências públicas para avaliar o projeto de Lei antes do envio à próxima comissão. Assim, foram realizadas 9 audiências ao longo de 2010 nos estados de São Paulo, Bahia, Paraná, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Rio de Janeiro, Pará, Minas Gerais e no Distrito Federal.

Para fechar o ciclo de discussões, foi realizado o Encontro Nacional Procultura, em Brasília, onde, segundo discurso da parlamentar no evento, era nesta audiência que poderiam ser sanados equívocos e surgir novas colaborações. Esses debates, de acordo com relatório de Alice Portugal, levaram à elaboração do primeiro substitutivo, que condensou as contribuições resultantes das discussões e foi aprovado no final de 2010 na Comissão de Educação e Cultura.

O relator seguinte foi o deputado Pedro Eugênio, na Comissão de Finanças e

42 Apesar do projeto ser assumido pela Câmara, o Ministério da Cultura continuou contribuindo diretamente para

o debate, tendo em vista que o órgão possui as informações e dados fundamentais para a efetivação dessa reforma.

Tributação, que esteve à frente do debate entre 2011 e 2012. No final de 2012 lançou um texto substitutivo com novas modificações, o qual ressaltava principalmente a desconcentração de recursos e a questão da democratização cultural.

Uma das grandes polêmicas na elaboração do texto do projeto da nova lei dizia respeito às faixas de renúncia fiscal. Para Alice Portugal, a faixa de 100% de renúncia deveria ser extinta da Lei, levando as empresas patrocinadoras a investirem recursos diretos em projetos culturais. No entanto, após a inserção de empresas privadas no debate do projeto, houve a revisão do texto e a estruturação de critérios para realização da renúncia fiscal. Já no substitutivo de Pedro Eugênio, há a possibilidade de a empresa ou instituição obter os 100% de isenção fiscal, contanto que ela atenda às novas diretrizes estabelecidas, que destacam, por exemplo, a questão da acessibilidade física e social.

O sistema de classificação não é aplicado a produtores independentes e de pequeno porte, de forma a possibilitar, de acordo com o que ressalta o deputado, a captação de recursos e consequente viabilização desses projetos com menor apelo comercial.

O novo substitutivo aprovado sob a relatoria de Pedro Eugênio destaca, ainda, os chamados territórios certificados, ou seja, áreas e regiões que necessitam do investimento em cultura para alcançar desenvolvimento social. Essas e outras iniciativas foram destacadas pelo deputado como sendo "uma série de ações desconcentradoras, que vão se juntando e possibilitando que os recursos sejam melhor distribuídos pelo país, com conceitos que não são de mercado, mas de políticas públicas, de acordo com o Plano Nacional da Cultura”, disse o relator.

Dentre as modificações propostas no relatório, apresentava-se, principalmente, um detalhamento de algumas questões indeterminadas ou vagas no projeto de origem. Assim, os critérios para a análise dos projetos culturais, antes bastante subjetivos (contribuição para a preservação, memória e tradição; contribuição à pesquisa, etc.) foram reformulados para critérios mais objetivos (análise se a produção cultural era independente, se o acesso ao evento era gratuito, etc.), a faixa-limite de dedução do imposto para pessoa física passou de 6% para 8%, o limite de dedução para pessoas jurídicas passou de 4% para 8% no caso de faturamento acima de R$ 300 milhões. Além dessas mudanças, outras medidas foram propostas no relatório, como a possibilidade de inscrição de projetos culturais em qualquer período, sem a necessidade do lançamento de editais.

A Comissão Nacional de Incentivo e Fomento à Cultura (CNIC) também sofreu mudanças estruturais, fundamentais para a análise de projetos em diálogo com a sociedade. Assim, o colegiado foi recomposto com a presença de um representante dos artistas, um do

empresariado e seis entidades da sociedade civil, além dos representantes do Ministério da Cultura e suas secretarias. Ainda assim, a estruturação da CNIC foi alvo de críticas diante do fato da comissão não ter poder deliberativo.

Mas as discussões na CFT voltavam-se principalmente para a polêmica dos 100% de renúncia e para as possibilidades de operacionalização das mudanças propostas pela primeira Comissão, tendo em vista a necessidade de avaliação da viabilidade por outras instâncias de governo como o Ministério da Fazenda, por exemplo.

Para compreender de modo mais detalhado o processo de composição do Procultura, são analisados a seguir os debates nacionais que encerraram as discussões em cada Comissão, expondo as principais falas e atores sociopolíticos envolvidos, além das demandas expressas pelos participantes, cuja incorporação ao projeto de lei será analisada nas subseções que tratam dos substitutivos ao projeto.