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Papel do juiz na revisão e resolução dos contratos, de acordo com os arts

6. CONCORRÊNCIA NA APLICAÇÃO DA REGRA DOS ARTS 317 (REVISÃO

6.1 Papel do juiz na revisão e resolução dos contratos, de acordo com os arts

O art. 317 e as previsões dos arts. 478 e seguintes, de forma mais tímida, foram os primeiros dispositivos inseridos no ordenamento jurídico nacional que permitem a intervenção do juiz com a finalidade de reequilibrar uma contratação estritamente civil.229

Contudo, é razoável deduzir que a parte que se encontrar em situação contratual desfavorável, antes de recorrer do judiciário ou arbitragem, procurará a outra parte para negociar, de boa-fé, o restabelecimento do equilíbrio contratual.230

O juiz ou tribunal arbitral, ao admitir a revisão ou modificação do contrato, deve integrar o negócio jurídico, e não substituir a vontade das partes; tanto é verdade que sua sentença é determinativa.231

Nesse sentido é a lição de Álvaro Villaça de Azevedo de que “a decisão é arbitral, porque não pode o juiz atuar como contratante, sem a anuência dos próprios contratantes”.

Assim, como a decisão de alterar o contrato é arbitral, nos moldes dos arts. 317, 479 e 480 do Código Civil, aparentemente, salvo melhor juízo, ainda há a possibilidade de qualquer das partes considerar insuportável o cumprimento obrigacional após a intervenção judicial.

229 BORGES, Nelson. Aspectos positivos e negativos da revisão contratual no novo Código Civil. Revista

dos Tribunais, São Paulo, v. 95, n. 849, p. 80-110, jul. 2006. p. 90.

230 SCHUNCK, Giuliana Bonanno. A onerosidade excessiva superveniente no Código Civil, p. 126. “De fato,

em razão do princípio da boa-fé objetiva, parece que, cada vez mais, a cooperação entre as partes deve se estreitar, de modo que, nesse caso específico, elas possam chegar a bom termo para modificar o contrato ou, sendo isso desvantajoso para qualquer parte, resolvê-lo amigavelmente”. Nesse prisma da boa-fé, destaca a autora a previsão do art. 6.1.1.1. do Principles of European Contract Law que autoriza o juiz a condenar a parte que se recusar a negociar ao pagamento de indenização pelos danos daí decorrentes: “(...) In either case, the court may award damages for the loss suffered thought a party refusing to negotiate or breaking off negotiations contrary to good faith and fair dealing”. Tradução livre: Em qualquer caso, o judiciário poderá condenar a parte que se recusou a negociar ou que encerrou as negociações, sem observar a boa-fé e a justa negociação, a indenizar a parte que sofreu danos daí decorrentes.

Logo, mesmo após decisão judicial ou arbitral determinando alterações no contrato e sua consequente continuidade, acreditamos ser viável que uma das partes entenda que seu cumprimento é inviável e prefira resolver o contrato.

Na hipótese de decretação de resolução fundada no art. 478, o juiz ou tribunal arbitral deve confrontar os fatos com cada um dos requisitos presentes no referido artigo. Os critérios valorativos, apesar de muitas vezes dependerem de interpretação e investigação dos fatos, estão delimitados no Código Civil, e o juiz ou tribunal arbitral, ainda que tenha certa margem de interpretação e investigação no caso concreto, tende a uma atuação mais objetiva. Portanto, nessas hipóteses, a tendência é que o juiz ou tribunal arbitral não decida com base na equidade.232

Com relação à hipótese do art. 317 do Código Civil, que trata de revisão judicial do valor de prestação pecuniária, referido artigo fornece um critério objetivo para auxiliar o juiz e o tribunal arbitral acerca da modificação contratual, ao expressamente estabelecer que “poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”. Portanto, nessa hipótese, o aplicador do direito não poderia recorrer apenas à equidade para elaborar nova cláusula contratual. Pelo contrário, deve o juiz ou tribunal arbitral partir do valor real da prestação para reestabelecer o equilíbrio econômico do contrato.

Ainda com relação às hipóteses de revisão contratual com a consequente modificação de cláusulas contratuais, na hipótese do art. 479 do Código Civil, a situação é mais complexa, pois não há critérios objetivos para orientar o juiz ou tribunal arbitral na modificação das cláusulas contratuais, restando aos aplicadores do direito recorrer à equidade.233 Isso porque

referido artigo apenas estabelece, de forma genérica, que “a resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato”. Contudo, necessário ressaltar que o juiz ou o tribunal arbitral, ao aplicar a equidade na modificação de cláusulas contratuais, pode alterar o modo de execução da prestação, bem como seu valor, sem, contudo, desnaturar o que as partes contrataram. Logo, o aplicador do direito deve observar a limitação estabelecida pelo art. 313 do Código Civil brasileiro, que estabelece

232 Nesse sentido: KHOURI, Paulo Roberto Roque Antonio. A revisão judicial dos contratos no novo Código

Civil, Código do Consumidor e Lei n. 8.666/93: a onerosidade excessiva superveniente, p. 126;

ASCENSÃO, Oliveira. O direito: introdução e teoria geral. Uma perspectiva luso-brasileira. 11 ed. Coimbra: Almedina, 2001. p. 214. Em sentido contrário: VARELLA, Antunes. Código Civil anotado. Coimbra: Editora Coimbra, 1982. p. 388.

233 KHOURI, Paulo Roberto Roque Antonio. A revisão judicial dos contratos no novo Código Civil, Código

que “o credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa”.

Com relação à possibilidade de revisão judicial de contratos unilaterais, a parte final do art. 480 estabelece limites para a aplicação da equidade. Isso porque o art. 480 trata especificamente de modificação qualitativa. Portanto, a decisão judicial ou arbitral de modificação da cláusula contratual não pode implicar modificação da natureza ou objeto do contrato.234

Nessas hipóteses legais, caberá ao juiz ou ao tribunal arbitral, além da verificação dos requisitos específicos para cada caso, a definição do conteúdo de nova(s) cláusula(s) contratual(is), que, em muitos casos, passa pelo recurso à equidade.235 Portanto, nos casos

de revisão judicial, é exigido do juiz ou tribunal arbitral um esforço maior com a finalidade de restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro da cláusula atingida pela onerosidade excessiva.

Portanto, o papel do juiz ou árbitros, ao analisar os casos de revisão contratual, sob a régia dos arts. 317, 479 e 480, é de extrema importância, levando em consideração os fatos, informações do contrato e sua execução, bem como a intenção das partes no momento da celebração do contrato.

Diante do exposto, conclui-se que a aplicação dos arts. 317 e 478 a 480 do Código Civil, seja pelas próprias partes em razão de renegociações, seja pelo juiz ou tribunais arbitrais, deve ser a mais estrita possível, observando, quando possível, a vontade das partes e os requisitos exigidos para a aplicação dos mencionados artigos, sob pena de alterar em demasia a relação contratual, os interesses envolvidos e as razões que levaram as partes a celebrar o contrato.