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Para além da conjugalidade: amores, amizades, pactos e parcerias

2. Trajetórias socioafetivas de mulheres negras em um bairro periférico em Natal/RN

2.3 Para além da conjugalidade: amores, amizades, pactos e parcerias

23 Disponível em: “Afetividade negra – por que beijar sua preta em praça pública é um ato de resistência” -

www.ceert.org.br/noticias/genero-mulher/3587/afetividade-negra-por-que-beijar-sua-preta-em-praca-publica- e-um-ato-de-resistencia.

Como dito anteriormente, a afetividade se apresenta de modo muito mais amplo do que encontrado em diversos trabalhos acadêmicos que dão enfoque ao aspecto da conjugalidade, indicando outros marcadores. Nesta fase de suas vidas, na terceira idade, as seis mulheres negras do grupo de interlocutoras apontam para aspectos que consideram muito mais significativos e importantes e que demonstram de fato a relevância do que consideram afeto, amor, carinho, parceria. Mas afinal, será que a projeção do desejo se concretiza e acompanha as trocas diárias? Como funcionam as negociações do que julgam ser afeto nessas trocas cotidianas?

Acompanhei durante um bom tempo vários discursos afetivos que aparecem emaranhados numa teia, como uma espécie de rede afetiva que se torna significativa para essas mulheres. Ouvi diversas falas sobre namoros, paqueras, estar junto ou não de homens em relacionamentos afetivos, mas nesta fase da vida, a busca afetiva se mostra de uma maneira diferente das desejadas anteriormente na juventude e na fase adulta. Estar ou não com parceiros é importante para algumas das mulheres, mas a necessidade de se ter pessoas numa troca mútua de cuidados se torna primordial para todas elas.

Dona Acotirene tem uma filha que, segundo ela, pegou para criar, já que é filha biológica do seu primeiro marido, hoje já falecido. Reclama frequentemente desta menina, que já tem por volta de trinta anos. Isso porque, segundo Acotirene, sua filha é o “mesmo que nada”, por não a auxiliar nos cuidados com a casa e com sua saúde. Aparentemente quem faz a tarefa de cuidar da saúde dos integrantes da família é Acotirene. Frases como “não tenho ninguém pra me ajudar” e “se eu me operar fico sozinha” já foram repetidas mais de uma vez ao longo do tempo em que conversamos.

Apesar de já ter tocado no tema da falta de libido várias vezes com seu companheiro, não teve nenhuma mudança no comportamento e atualmente tem desistido de falar, só tem vontade de “jogá-lo” para fora de casa, mas que não o faz por causa de sua companhia, da sua ajuda, do seu cuidado – outras formas de práticas afetivas que são mais importantes para ela no final das contas. Sente medo em “despachá-lo” e não conseguir encontrar um homem que faça as duas coisas: a ajude na casa e tenha tanto desejo sexual quanto ela. Como tratado por Nascimento (1990, apud RATTS, 2007) no capítulo anterior, tento aqui ampliar o conceito de parceria para além das mulheres negras que se especializam, ascendendo profissionalmente. A partir dos seus termos, a parceria serve para complementar todas as relações e, como dito anteriormente, até mesmo as relações materiais. É a partir disso que analiso o caso de Acotirene, pois sua fala demonstra que a prioridade para convivência passa a ser essa, não se permitindo

exigir um “parceiro ideal”, mas uma construção que ultrapassa o individualismo, “afrouxando” exigências e aceitando alternativas que sejam benéficas nesse momento de sua vida.

A mesma interlocutora relatou vários descontentamentos acerca do atual companheiro, mas o mais frequente foi o de cunho sexual e o quanto considera isso importante. A falta de desejo sexual e da procura do seu homem pela companheira, faz com que Dona Acotirene construa várias explicações. A maioria dessas explicações toca sua autoestima de modo negativo, algo que será tratado no próximo capítulo em que dou maior enfoque à relação do corpo e da afetividade. Quando pergunto o motivo dela não sair desta relação, fala que o fato dele ajudá-la nos afazeres domésticos, nas contas a pagar, e num caso dela adoecer ele continuar ali, fazem com que ela se mantenha neste relacionamento. Contudo, não nega que seria uma grande sorte ter um companheiro que pudesse suprir as duas coisas: ser parceiro nos cuidados e ter tanto desejo sexual quanto ela.

Como dito anteriormente, acompanhei alguns “paqueras” de Dona Acotirene e o quanto as conversas e flertes com homens, mesmo que não os visse pessoalmente, eram significativos para seu humor do dia-a-dia, inclusive interferindo nos seus cuidados com o corpo e autoestima. Percebe que homens mais jovens a desejam e passa a ter um olhar diferente sobre si, que durante anos vinha se desvalorizando. No decorrer de uma dessas relações de “paqueras”, me dizia acordar sorrindo, que vivia feliz com tanto carinho. Afinal, acordar com uma mensagem bonita de bom dia mudava totalmente o andamento do dia e de suas emoções:

Ele tinha 31 anos quando a gente se conheceu e ele se encantou por mim assim que me viu e investiu mesmo sabendo que eu era casada. Eu dizia que não queria saber por que já sou uma coroa e ele tinha idade para ser até mesmo meu filho. Em resposta ele falava que eu não repetisse mais isso e que ele tinha 15 anos e ela 20. E completava: “pra amor não tem idade”.

Aí ele me levantou muito, ele me levantou muito. Eu era uma pessoa assim tão acabada e hoje eu me sinto no auge e eu devo isso a ele. Eu não esqueço ele nunca, nunca, nunca (Entrevista com Dona Acotirene – grifos meus).

Dona Edenice possui muitos problemas de saúde e trago isto à tona neste tópico por ela sempre se orgulhar do quanto se vira bem sozinha, com várias práticas de autocuidado, mas não nega o quanto deseja a ajuda de mais alguém nesses processos, pois isso demonstra o nível de afeto construído e recebido. Quando isso ocorre sempre faz questão de reafirmar a importância. Explico. No tópico anterior falei do quanto Edenice salienta o fato de seu genro cuidar não só de sua filha, mas também dela. O “cuidar”, neste caso, significa dar caronas, montar móveis, auxiliar em reformas na casa, acompanhar em idas ao médico, entre outras coisas que considera

significativas. Há dois anos ela vivia com sua filha e seu neto, que já é adolescente, mas no decorrer desse tempo a guarda dele passou a ser do pai, que mora a poucos metros dali (mais precisamente na casa vizinha, com seu pai e sua outra avó). Dona Edenice diz sentir falta da companhia, mas que na verdade não fazia muita diferença, já que ele não a ajudava muito nos afazeres da casa, o que se assemelha ao que Dona Anastácia também coloca como algo de importância no convívio. Edenice tem mais um filho, mas esse mora em outro Estado e ela praticamente não tem notícias dele. Justifica as vezes pelo fato dele ser homem, mas o fato dele não se importar em nem mesmo ligar ou dizer como está é algo doloroso para a mãe:

Manda nem saber se eu tô morta ou tô viva ou se tô doente ou se tô boa. Por isso que eu tiro Natalcap24 toda semana, mas a única que eu vou ajudar é minha filha e meu

genro que é a minha família, é quem chega perto de mim, Amanda. Porque Amanda, eu num preciso de um comer, de um remédio, eu sou carente, Amanda, de uma palavra amiga. Óia Amanda, esses diálogos que eu tô tendo com você é comprimido, é coisa boa porque ruim pra mim é a solidão.

Costuma falar também da sorte que possui em ainda ter suas irmãs vivas. Tanto a que mora próximo há muitos anos e uma outra que mora no interior e que frequentemente a visita. Ambas buscam médicos quando Edenice está doente, indo em busca de consultas e remédios. Essas atitudes são frequentemente lembradas como importantes e, para mim, significa fatores de parceria e irmandade.

Sobre parceiros afetivos-sexuais, Dona Edenice tem um “paquera”, como eu disse em tópico anterior. Para falar do grau de proximidade que teve com ele, me relata como a família dele a apreciava, visitando, dando presentes, perguntando sempre como ela estava etc. Outro fator sempre presente ao falar sobre Cléber seria a maneira como ele cuidava dela, principalmente ao dar presentes para sua casa:

Olhe, tudo que tenho em casa de coisa boa foi ele quem deu. Amanda, ele me deu essa rede, me deu esse jarro, me deu essa santa, me deu o gela água, me deu o micro- ondas… ele me dá Amanda, eu num peço não. E não é só ele que dá. É ele, a filha, a irmã e a mãe. Aí eu tô dando o castigo. Pode até eu querer, porque foi uma história de 13 anos, 3 meses e 3 dias… Meu neto tinha um ano quando ele veio a primeira vez. Ele veio porque disse que gostava muito de conversar comigo, que meu anjo de guarda bateu com o anjo de guarda dele… (Diálogo com Dona Edenice).

A saudade que sente de Cléber não é tanto de cunho sexual, apesar de revelar algumas vezes que faz tempo que ninguém a toca, mas ao relatar alguns sentimentos que aparecem

diariamente, me revela os de solidão. Seu desejo de fato é uma palavra amiga, alguém para conversar sobre o seu dia etc.:

Eu precisava de uma pessoa assim né, pra conversar, pra num sei o quê… e ele era muito prestativo, telefonava todo dia, todo dia, todo dia… quer dizer, isso eu perdi sabe, mas eu tenho que dar valor a mim. Eu tenho que mostrar a ele que eu não sou aquela pessoa dele estralar o dedo e dizer: venha, venha. Eu vou não. Amanda, se eu gostar, eu gosto, agora se eu desgostar até a família dele esse ano eu num dei NADA.

Dona Zeferina, Dona Sueli, Dona Anastácia e Dona Dandara dão maior importância neste momento de suas vidas a relação com as filhas e filhos e os cuidados deles para com elas, mas também dos cuidados ainda possíveis delas com relação a eles, mesmo apesar das idades mais “avançadas”. Todas as seis mulheres que contribuíram com essa pesquisa afirmam o quanto os filhos representaram mudanças bruscas em suas vidas e até hoje significam, apesar de nem sempre as valorizarem como elas gostariam.

Dona Zeferina já relatou diversas vezes que outras mulheres “mais velhas” sentem inveja de não ter filhas para ajudá-las, assim como ela as tem, ainda mais sendo três em casa. Quando Romualdo faleceu, as irmãs dele foram até sua casa exigir que duas das filhas fossem com elas, para auxiliar nos afazeres e cuidados, mas nem Zeferina e nem suas filhas aceitaram as tentativas de imposição. Ela sempre elogia toda ajuda que duas de suas filhas tem para com ela e com a casa, ao fazer comida, manter tudo limpo, auxiliar no cuidado com as plantas etc. Por vezes desabafa sobre a terceira filha que mora na casa, que por uma doença psicológica tem crises em que briga com todos, fala palavrões, quebra móveis e, o que Zeferina sempre trata com maior tristeza, destrói suas plantas.

Certa ocasião, volta a lembrar Romualdo, mais uma vez, como em tantas outras conversas (ou todas). Me falava o quanto o amou. Sentiu um amor que era inexplicável, um amor tão grande que nem sabia ser possível sentir algo assim. O amou tanto, mas tanto, que quando ele a beijava arrepiava-se inteira, sentia-se flutuar. Contudo, no final de sua vida ela já o odiava por ter sofrido muito com o passar dos anos. Fala da dor que sente por vezes, da tristeza que a acomete e das lembranças que tem da companhia. Pergunto se é saudade e ela diz que sim. O odiava, mas sente saudade, nunca o abandonou. Poderia ter separado, aguentou humilhações e traições demais, mas nunca o deixou. A parceria mais uma vez, como trata Beatriz Nascimento e o jogo de negociações, onde se perde e se ganha, afinal, ela o amava, apesar de também odiá-lo.

Após ter ficado viúva, um homem apareceu como “pretendente”, mas ela não quis esse relacionamento. Tal senhor é bastante rico, também viúvo, tem casa própria, por volta dos seus 90 anos e estava em busca de uma companhia para dividir seus dias. Dona Zeferina fala que ele foi insistente, mas que queria casar e ela não faria isso, pois não sairia de sua casa, onde está com suas três filhas que não casaram e que hoje ficam todas juntas. Me fala que não as deixaria. Frequentemente me dá detalhes das características, personalidades, aparências de cada uma delas, mesmo da filha que mora em outro país. Obviamente, não são só elogios, mas também muitos desabafos e desafios de agora criá-las sem Romualdo, gerenciando pela primeira vez o próprio dinheiro e as contas.

Sobre a rede de afetos e cuidados que ela possui, me disse que não tem amigas, não assim para conversar sobre a vida como estava fazendo comigo ao falar de coisas mais íntimas, e isso não ocorre com outras pessoas. De acordo com ela, desde seu casamento Romualdo não permitia que ela ficasse nas calçadas para conversar, pois isso seria coisa de mulher fofoqueira. O porquê de não trazer as amigas para dentro de casa não entendi, mas disserta como se acostumou a isso. Já teve amigas ali por perto, na rua, mas algumas se mudaram, outras morreram e me conta isso normalmente, sem alterações no tom de voz.

Me diz ainda que seus netos não costumam visitá-la. Diz que trabalham muito, mas que só vão lá uma vez ao ano. Somente o neto que agora terá sua casa no fundo do quintal é que sempre se fez presente. Os demais não são como eu que sempre vou lá conversar com ela. Acho interessante ela me colocar nessa posição, além de me emocionar não só por fazer parte dessa sua rede afetiva, mas pela solidão que essas mulheres dizem sentir, dos abandonos que vão se tornando mais corriqueiros com o passar dos anos.

Por exemplo, um dos seus filhos mora com uma mulher branca, “galega”, segundo ela. Eles residem em um outro bairro considerado periférico e ele é bastante trabalhador, mas que ainda assim talvez nem consiga se manter, só que isso me fala sem certeza. Conta que a namorada dele (que não sabe se já casaram ou não escondido dela) trabalha e fala que pode sustentar os dois, que cuida e gosta muito dele. Dona Zeferina ri em tom debochado: “ela quem quer, né?” Pergunto meio que afirmando se ela não gosta dessa “galega” e ela diz que tanto faz, não convive, já que eles ficam lá no canto deles. Contudo, isso se mostra bastante significativo, pois aparentemente o distanciamento do filho se deu depois dessa relação, o que não vem isento de desgostos, mas a “aceita”, pois com isso pode ter a presença do filho, mesmo que raramente.

Dona Anastácia sente-se bem e feliz estando agora com sua filha e por isso não deseja mais nada, só estar lá, ajudando-a, suas netas e agora seu netinho. Não sente vontade de sair

para festas, para dançar, coisas que amava no passado, mas os passeios que faz são somente para visitar sua irmã e conversar, apesar de não negar a preguiça que tem de sair de casa. A cada diálogo que tivemos ela foi se mostrando mais relaxada, dando também mais detalhes de aspectos que considerava importantes.

Em alguns momentos, ao falar do falecido marido, relata que ele era um homem muito bom e por isso seus pais gostavam dele. Fala que ele cuidava bem dela porque dava presentes, mas não a permitia sair ou ter amizades e seus ciúmes se estendiam até para os próprios filhos, por possuírem a mesma faixa etária que sua nova esposa. Conta que nunca gostou de homens novos, contudo não pretendia se relacionar com um tão mais velho que ela, mas precisou. Sentia vergonha das humilhações que faziam por isso. Contudo, afirma que seu falecido marido nunca a traiu, justamente por ser velho, coisa que se tivesse casado com um “rapazinho”, como ela diz, provavelmente teria acontecido.

Dona Anastácia o considerava bom marido por ele lhe dar presentes e tentar protegê-la das perseguições dos filhos, motivo maior de seu sofrimento. Fala o quanto sentiam ciúmes e inveja dela, roubavam os presentes dados por ele e não entendiam por que ele havia casado com ela. Após morte desse seu marido e companheiro, Anastácia namorou dois anos com um rapaz, mas a experiência foi traumática pelo fato dele ter problemas com bebida e ser violento:

Dona Anastácia: Arrumei um rapaz véi que vivia bebendo, só faltava morrer na cana. Bebia e queria dar em mim.

Amanda: Quando? Recente?

Dona Anastácia: Ele era novo esse cara... Ele já morreu, faz tempo... Amanda: Depois que a senhora ficou viúva não namorou mais? Dona Anastácia: Namorei com esse cara só. Foi o último. Amanda: Aí não gostou?

Dona Anastácia.: Num gostei. Ele era ruim demais. Bebia e queria dar em mim, tu acha?

Amanda: Mas se juntou?

Dona Anastácia: Não, se ajuntei não. Ele morava perto de mim, aí ia lá em casa, eu ia as vezes lá na casa dele.

Quando pergunto se deseja voltar a namorar ela diz que não, se sente velha para isso e não faz mais falta, já que está satisfeita vivendo com sua filha e suas netas, algo que nenhuma das partes abre mão:

Amanda: Aí hoje em dia não quer namorar mais? Dona Anastácia: Hoje não, mulher. Deus me livre. Amanda: Por quê?

Dona Anastácia: Por que não, mulher. Eu já véia vou namorar?! Amanda: Quê que tem? Eu vejo tantos...

Dona Anastácia: Eu sei, mas eu num gosto. Se a pessoa fosse quente iria, mas eu num sou quente... Eu sou essa pessoa que eu disse a você, tímida.

Dona Anastácia: Ah, mulher, é tempo demais... Faz muitos anos já. Amanda: Num quis mais saber?

Dona Anastácia: Quis nada, mulher, quis mais nada. Amanda: Num se sente sozinha, não?

Dona Anastácia: Não. Sinto nada. Tô aqui com a minha filha, aí tudo bem.

Assim como vemos com Dona Zeferina e Anastácia, também encontro nas falas de Dona Sueli a constante frequência em falar dos seus filhos, como algo mais importante a ser dito.

Na obra “Família, fofoca e honra”, Claúdia Fonseca (2000) ao abordar as temáticas da família, violência e relações de gênero em grupos populares, mostra que três quartos das mulheres com mais de 45 anos estão sem marido. Pergunta-se então se essa tão surpreendente proporção seria consequência da carência de homens nessa faixa de idade, devido à migração ou ao índice alto de mortalidade entre homens adultos? Contudo, no estudo o leve desequilíbrio entre o número de velhos e o de velhas sem esposos não é suficiente para justificar essa hipótese. Com isso, acreditam que o fator demográfico não chega a explicar bem o problema das idosas solitárias. Mas afinal, isto seria mesmo um problema? Revela então que as mulheres sós de todas as idades frisaram a opção de morarem sem companheiro não por falta de oportunidades matrimoniais, mas porque assim desejavam. Chegando numa idade mais avançada, a mulher não mais se apresenta como um desafio à virilidade do homem: sendo-lhe concedida uma moratória na rinha dos sexos, ela pode afinal exercer sua liberdade de escolha sobre a companhia masculina. E não é raro que, em vez do marido, ela escolha o filho (FONSECA, 2000, p. 43/45).

Diferentemente de outras interlocutoras, o foco das conversas com Dona Sueli não foi necessariamente seus relacionamentos afetivo-sexuais, mas constituíam uma base da afetividade familiar, essa rede de afetos que mantém, mesmo que nem sempre possa contar. Explico. Na maioria dos nossos encontros, sejam no posto ou em sua casa, me fala como estão seus filhos e seu neto que agora também adotou, pelo apego que construiu enquanto a ex esposa do seu filho ainda morava lá, mas que com o divórcio voltou a morar na sua cidade de origem. Além do afeto construído pelo neto, Sueli não aguentava ver os maus tratos que seu filho tinha