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Parte II: Ação farmacológica dos andrógenos na bexiga urinária e uretra de ratas ovariectomizadas (OVX)

SUMÁRIO

PERI-MENOPAUSA

4. MATERIAIS E MÉTODOS

5.2. Parte II: Ação farmacológica dos andrógenos na bexiga urinária e uretra de ratas ovariectomizadas (OVX)

5.2.1. Caracterização morfométrica do modelo de OVX

Resultados anteriores do nosso grupo mostraram que a OVX bilateral reduz em 65% (P <0,05) os níveis séricos de testosterona e em 82% os níveis séricos de estrógeno (P < 0,05) (Tabela 3).

Tabela 3. Níveis séricos de estrógeno e testosterona em ratas Sham e ovariectomizadas

(OVX)

Parâmetros Sham OVX

Estrógeno (pg/mL) 78,70 ± 14,30 19,20 ± 11,80*

Testosterona (ng/dL) 16,80 ± 0,80 5,90± 0,30*

Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 5-8 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham (teste t de Student); adaptado de Ramos-Filho et al., 2013 e Bonilla-Becerra

A densitometria nos permitiu observar que a OVX aumentou significativamente a massa total, área corporal do animal, massa de gordura e porcentagem de gordura, e reduz significativamente a massa magra (P < 0,05). Não houve diferença significativa na densidade mineral óssea entre o grupo Sham e OVX (Figura 18A-G).

Em seguida, em experimentos separados, avaliamos se a OVX teve efeito no peso dos órgãos de estudo e aqueles considerados hormônio-dependentes como é o caso do útero. A OVX diminuiu marcantemente o peso do útero, ao passo que a gordura perigonadal (gordura ao redor do útero e ovários) aumentou de modo significativo (P < 0,05) comparado com o grupo Sham (Figura 19A, B). Os pesos da bexiga e uretra não sofreram alterações significativas pela OVX (Figura 19C, D).

Figura 18. Caracterização morfométrica do modelo de ovariectomia (OVX) bilateral com absortometria de raio-X de dupla energia (DEXA). A) Imagem representativa da absortometria por raio-X em comparação com o grupo Sham, B) massa total (g), C) Área do animal (cm2), D) massa de gordura (g), E) porcentagem de gordura (%), F) massa magra, e G) Densidade mineral óssea (g/cm2) de ratas Sham e ovariectomizadas. Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 4 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham.

A)

Figura 19. Pesos do útero (A), gordura perigonadal (B), bexiga (C) e uretra (D) de ratas Sham e ovariectomizadas (OVX). Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 4 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham.

5.2.2. Resposta contrátil de bexigas isoladas de ratas OVX

Realizamos curvas concentração-resposta de contração ao carbacol e curvas frequência- resposta (1 – 32 Hz). A figura 20A mostra que a OVX produziu alterações na reatividade da musculatura lisa vesical caracterizada pela redução significativa da contração para o carbacol (P < 0,05). Note-se, entretanto, que os valores de potência não se alteraram entre os grupos (6,13 ± 0,14 vs. 6,05 ± 0,13 para Sham e OVX, respectivamente).

De modo semelhante, as respostas contráteis induzidas por estimulação elétrica no grupo OVX (EFS) foram menores do que no Sham (P < 0,05), particularmente nas frequências 4 a 32 Hz (Figura 20B.)

Figura 20. Respostas contráteis ao carbacol e EFS em bexigas isoladas de ratas ovariectomizadas (OVX). A) Curvas concentração-resposta ao carbacol, e B) curvas frequência-resposta à estimulação elétrica de campo (EFS). Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 5-10 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham.

Na sequência, incubamos as bexigas isoladas com testosterona (100 nM) ou 5α-DHT (100 nM) durante 30 minutos, após a qual avaliamos a resposta contrátil ao carbacol e EFS. Em contraste com a condição saudável, a incubação prévia de testosterona aumentou a significativamente a contração máxima ao carbacol (P < 0,05), trazendo-a próximo do grupo Sham. A incubação com 5α-DHT apresentou padrão de resposta similar à testosterona, ou seja, aumentou significativamente a Emax ao carbacol (Figura 21A, C). Em ambos os casos

(testosterona e 5α-DHT) não notamos diferença significativa nos valores de potência do carbacol entre os grupos (T: 6,24 ± 0,05 vs. 6,11 ± 0,07 para OVX + V e OVX + T, respectivamente; 5α-DHT: 6,02 ± 0,10 vs. 6,16 ± 0,11 para OVX + V e OVX + 5α-DHT, respectivamente).

Em relação à estimulação elétrica, tanto a testosterona como 5α-DHT aumentaram significativamente a resposta contrátil no grupo OVX (Figura 21B, D).

Figura 21. Efeito da testosterona (T) e 5α-dihidrotestosterona (5α-DHT) nas respostas contráteis ao carbacol e estimulação elétrica (EFS) em bexigas isoladas de ratas OVX. Curvas concentração- resposta em bexiga ao carbacol (CCh; painéis A e C) e curvas frequência-resposta (painéis B e D), na presença de veículo (álcool: 1 µL, 30 min), testosterona (T: 100 nM, 30 min) ou 5α-dihidrotestosterona (5α-DHT: 100 nM, 30 min). Os dados são apresentados como média ± erro padrão da média (n = 5-9 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com OVX + V.

Posteriormente, realizamos o protocolo experimental de incubação com flutamida (1 µM, 30 min), na presença e ausência de testosterona. Este hormônio reverteu a hipocontratilidade vesical do grupo OVX; no entanto, a pré-incubação de flutamida reverteu este efeito da testosterona, retornando o valor de Emax similar ao grupo OVX (P < 0,05; Figura

22A). Os valores de potência ao carbacol não diferiram entre os grupos (6,27 ± 0,10, 6,01 ± 0,12, 6,01 ± 0,15, 6.20 ± 0,06 e 6,05 ± 0,21 para Sham, OVX, OVX + T, OVX + flu e OVX + T + flu, respectivamente).

Em relação à EFS, notamos no grupo OVX redução significativa da contração nas frequências de 4 até 32 Hz. A pré-incubação de testosterona preveniu a hipocontratilidade vesical de maneira significativa nas maiores frequências. A flutamida per se não afetou de forma significativa a resposta contrátil, mas reverteu o efeito da testosterona (Figura 22B).

Figura 22. Respostas contráteis ao carbacol (A) e estimulação elétrica (B) em bexiga isolada de ratas OVX na presença de flutamida (1 µM) e/ou testosterona. A) Curvas concentração-resposta em bexiga ao carbacol (CCh) e B) curva frequência-resposta na presença de veículo (álcool 1µL, 30 min), testosterona (T: 100 nM, 30 min), flutamida (flu: 1 µM, 30 min) e testosterona + flutamida (T + flu). Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 5 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham. #P < 0,05 comparado com OVX.

5.2.3. Efeito da testosterona na resposta contrátil da bexiga induzida pelo CaCl2

A OVX não modificou a resposta contrátil ao CaCl2 comparado com o grupo Sham. A

pré-incubação com testosterona aumentou significativamente a resposta contrátil ao CaCl2

(Figura 23) quando comparado ao grupo Sham e OVX. Não foi observada diferença significativa nos valores de potência do CaCl2 (2,34 ± 0,09, 2,27 ± 0,11 e 2,42 ± 0,08 para

Figura 23. Efeito da testosterona (30 min) na resposta contrátil da bexiga isolada de ratas ovariectomizadas (OVX) induzida pelo cloreto de cálcio (CaCl2). Curvas concentração-resposta do

CaCl2 na presença de veículo (álcool: 1 µL) ou de testosterona (T: 100 nM). Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 6 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham. #P < 0,05 comparado com OVX.

5.2.4. Efeito da testosterona na resposta relaxante da bexiga em ratas OVX

A fim de se avaliar os efeitos da privação hormonal na resposta relaxante da bexiga mediada pelos receptores β-adrenérgicos, construímos curvas concentração-resposta ao mirabegron e isoproterenol em tecidos pré-contraídos com carbacol (1 µM). Os valores de pré- contração dos tecidos não foram diferentes entre os grupos (Mirabegron: 0,90 ± 0,08 e 0,67 ± 0,15, mN/mg. Isoproterenol: 0,75 ± 1.88 e 0.62 ±1.20 mN/mg para Sham e OVX).

O mirabegron e o isoproterenol produziram relaxamento dependente da concentração, observando-se uma resposta similar em ambos os grupos, Sham e OVX (Figura 24A, B). Os valores de potência do mirabegron e do isoproterenol não foram diferentes entre os grupos (Mirabegron: 5,76 ± 0,18 vs. 6,61 ± 0,13 para Sham e OVX, respectivamente. Isoproterenol: 6,79 ± 0,79 vs. 6,60 ± 0,07, respectivamente). Investigamos em seguida os efeitos da testosterona ou 5a-DHT sobre o relaxamento da bexiga induzido pelo mirabegron e isoproterenol. A pré-incubação de testosterona e/ou 5a-DHT (30 minutos) não modificou a resposta relaxante nem ao mirabegron nem para o isoproterenol (Figura 24C, D). Os valores de

potência do mirabegron não foram diferentes entre os grupos (6,12 ± 0,13, 6,22 ± 0,04 e 5,60 ± 0,06 para OVX, OVX + testosterona e OVX + 5a-DHT, respectivamente). Da mesma maneira, os valores do isoproterenol não foram diferentes entre os grupos veículo e testosterona (6,60 ± 0,07 vs. 6,91 ± 0,15, respectivamente).

Em seguida, construímos curvas concentração-resposta à testosterona em tecidos pré- contraídos com carbacol (1 µM). Os valores de pré-contração dos tecidos utilizados não foram diferentes entre os grupos veículo e testosterona (0,78 ± 0,27 vs. 0,79 ± 0,14 mN/mg, respectivamente). A testosterona individualmente não promoveu relaxamento significativo na bexiga do grupo OVX comparado com o grupo Sham (Figura 24B).

Figura 24. Respostas relaxantes à testosterona, mirabegron e isoproterenol em bexigas de ratas Sham e ovariectomizadas (OVX). (A e B) Curvas concentração-resposta em bexiga de ratas Sham e OVX ao mirabegron e isoproterenol; C) Curvas concentração-resposta ao mirabegron na presença de veículo (álcool: 1 µL, 30 min), testosterona (T: 100 nM, 30 min) e/ou 5α-DHT (100 nM, 30 min); D) Curvas concentração-resposta ao isoproterenol (ISO) na presença de veículo e testosterona; E) Curvas concentração-resposta em bexigas de ratas OVX à testosterona. Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 4- 5 animais/grupo).

5.2.5. Efeito da ovariectomia em parâmetros moleculares na bexiga urinária (expressão gênica)

Em bexigas isoladas de animais Sham e OVX avaliamos e expressão do mRNA dos receptores muscarínicos (M2 e M3), L-VOCC e o receptor β3-adrenérgico, usando o RPL37a

como gene endógeno. Adicionalmente, investigamos a expressão do receptor de andrógeno (AR) e a enzima 5α-redutase. Por último, a fim de investigar uma possível via não genômica ativada pelos andrógenos através de receptor de membrana, avaliamos a expressão do receptor de membrana acoplado à proteína G, sensível à toxina pertussis e ao cálcio, referido como GPRC6A.

Após 4 meses de OVX, não observamos diferença significativa na expressão do mRNA dos receptores M2, M3 e canal de cálcio voltagem-dependente tipo L entre os grupos Sham e

OVX (Figura 25 A, B, C). Por outro lado, a OVX reduziu significativamente a expressão do receptor β3-adrenérgico (P < 0,05; Figura 25D). Além disso, a OVX não provocou mudanças

na expressão de AR e 5a-redutase (Figura 25E, F). Em relação ao receptor β2, GPRC6A e

Figura 25. Expressão gênica (mRNA) dos receptores muscarínicos do subtipo M2 (A), M3 (B),

canal de cálcio voltagem-dependente tipo L (L-VOCC; C), receptor β3-adrenergico (D), receptor

de andrógeno (E), enzima 5α-redutase e o gene endógeno RPL37a (G) na bexiga urinária de ratas Sham e OVX. Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 5-7 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com grupo Sham.

5.2.5. Respostas contráteis de uretra isolada de ratas OVX

A OVX aumentou significativamente a contratilidade uretral à fenilefrina e estimulação elétrica comparado com o grupo Sham (P < 0,05; Figura 26 A, B). Os valores de potência para fenilefrina não foram diferentes entre os grupos (4,40 ± 0,64 vs. 4,79 ± 0,17 para Sham e OVX, respectivamente).

A pré-incubação de testosterona (100 nM, 30 min) ou 5α-DHT (100 nM, 30 min) reduziu significativamente a contratilidade uretral (P < 0,05) induzida pela fenilefrina,

trazendo-a próxima do grupo Sham (Figura 26 C, D). Não houve diferença significativa nos valores de potência à fenilefrina entre os grupos seja na presença de testosterona ou de 5α-DHT (Testosterona: 4,82 ± 0,12 vs. 4,64 ± 0,13 para OVX e OVX + testosterona, respectivamente; 5α-DHT: 5,26 ± 0,17 vs. 4,77 ± 0,40 para OVX e OVX + 5α-DHT, respectivamente).

Figura 26. Respostas contráteis à fenilefrina e estimulação elétrica em uretra isolada de ratas Sham e ovariectomizadas (OVX). Curvas concentração-resposta (A, C, D) à fenilefrina em uretras de Sham e OVX na presença de veículo (álcool: 0,5 µL, 30 min), testosterona (T: 100 nM, 30 min) ou 5α- DHT (100 nM, 30 min). (B) Curvas frequência-resposta em ratas Sham e OVX. Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 5-7 animais/grupo). Painel A e B: *P < 0,05 comparado com Sham. Painel C e D: *P < 0,05 comparado com OVX.

Em seguida, realizamos o protocolo experimental de incubação com flutamida (1 µM, 30 min), na presença e ausência de testosterona. Como descrito anteriormente, a testosterona reverteu a hipercontratilidade uretral (Figura 26C). A pré-incubação de flutamida individualmente não modificou a resposta contrátil no grupo OVX; entretanto, reverteu o efeito

da testosterona na resposta contrátil à fenilefrina (P < 0,05; Figura 27). Não houve diferença significativa nos valores de potência entre os grupos (5,27 ± 0,14, 5,30 ± 0,11, 4,93 ± 0,29, 5,10 ± 0,06 e 4,78 ± 0.06 para Sham, OVX, OVX + T, OVX + flu e OVX + T + flu, respectivamente).

Figura 27. Respostas contráteis à fenilefrina em uretra isolada de ratas ovariectomizadas (OVX) na presença de testosterona e flutamida (1 µM). Curvas concentração-resposta em uretra à fenilefrina (FE) na presença de veículo (álcool: 0,5 µL, 30 min), testosterona (T: 100 nM, 30 min), flutamida (1 µM, 30 min) e flutamida + testosterona (T + flu). Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 4-6 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham. #P < 0,05 comparado com OVX.

5.2.6. Efeito da testosterona na resposta contrátil pelo CaCl2 em uretra isolada de rata OVX

Em uretras isoladas de ratas OVX, a OVX aumentou significativamente a contração induzida pelo CaCl2 comparado com o grupo Sham (P < 0,05), sendo este efeito reduzido pela

pré-incubação de testosterona (Figura 28A). Não houve diferença significativa nos valores de potência entre os grupos (2,26 ± 0,12, 2,23 ± 0,12 e 2,14 ± 0,10 para Sham, OVX e OVX + testosterona, respectivamente).

Em separado, realizamos curvas concentração-resposta ao CaCl2 na presença de

nifedipina, na concentração de 3 nM (30 min). Note-se que esta baixa concentração de nifedipina não modifica a resposta contrátil da uretra no grupo controle (ver figura 16B, página 61). A nifedipina reduziu significativamente a resposta contrátil, trazendo-a a níveis similares

do grupo Sham (P < 0,05, figura 28B). Além disso, observamos que a OVX causou um aumento significativo da potência ao CaCl2 comparado com o grupo Sham (P < 0,05); no entanto, a

potência do CaCl2 na presença de nifedipina mostrou-se similar ao grupo Sham (Figura 28C).

Figura 28. Efeito da testosterona e nifedipina na resposta contrátil da uretra de ratas ovariectomizadas (OVX) ao cloreto de cálcio (CaCl2). A) Curvas concentração-resposta do CaCl2 na

presença de testosterona (T: 100 nM, 30 min) ou veículo (álcool: 0,5 µL, 30 min). B) Curvas concentração-resposta do CaCl2 na presença de nifedipina (3 nM, 30 min), C) Potência do CaCl2 na presença de nifedipina 3 nM. Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 5 animais/grupo). * P < 0,05 comparado com Sham. #P < 0,05 comparado com OVX.

5.2.7. Resposta relaxantes das uretras isoladas de ratas OVX

Curvas concentração-resposta ao SNP em tecidos pré-contraídos com KCl (40 mN) foram construídas em uretras isoladas de animais Sham e OVX. Os valores de pré-contração dos tecidos utilizados não foram diferentes entre os grupos Sham e OVX (0,93 ± 0,21 vs. 0,79 ± 0,24 mN/mg para Sham e OVX, respectivamente).

O SNP produziu relaxamento dependente da concentração em ambos os grupos, mas a OVX não mudou a resposta máxima a este agente comparado com o grupo Sham (Figura 29 A). Entretanto, a pré-incubação de testosterona (100 nM, 30 min) potencializou o efeito relaxante do SNP na OVX, atingindo uma resposta máxima em torno de 56% e potência de 5,87 ± 0,16 (P < 0,05; Figura 29B).

Observamos ainda que a testosterona per se não produz efeito relaxante significativo no tecido uretral das ratas OVX (Figura 29 D).

Figura 29. Respostas relaxantes da uretra de ratas OVX à testosterona individualmente e ao nitroprussiato de sódio (SNP). A) Curvas concentração-resposta em uretra de ratas Sham e OVX ao SNP, B) curvas concentração-resposta ao SNP na presença de veículo (álcool: 0,5 µL) e testosterona (100 nM) e C) Curvas concentração-resposta somente à testosterona em uretra OVX (100 nM- 300 mM). Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n= 5-6 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com Sham. #P < 0,05 comparado com OVX.

5.2.8. Efeito da OVX em parâmetros moleculares na uretra de ratas Sham e OVX (expressão gênica)

Em uretras isoladas de animais Sham e OVX avaliamos e expressão do mRNA dos receptores α1-adrenérgico (subtipo α1a, α1b, α1d), L-VOCC, PDE5, AR, 5α-redutase, aromatase,

Nossos dados mostram que a expressão de mRNA do AR, 5α-redutase, canal de cálcio voltagem-dependente tipo L e a nNOS no tecido uretral é significativamente maior no grupo OVX comparado com o grupo Sham (P < 0,05; Figura 30 A-D). Não houve diferença significativa na expressão gênica da PDE5 entre os grupos (Figura 30 C). Referente ao receptor α1a, α1b, α1d, GPRC6A e aromatase, não foi possível detectar expressão gênica dos mesmos na

uretra.

Figura 30. Expressão gênica (mRNA) do receptor de andrógeno (A), 5α-redutase (B), óxido nítrico sintase neuronal (nNOS) (C), canal de cálcio tipo L (D), fosfodiesterase 5 (PDE5; E) e o gene endógeno RPL37a (F) na uretra de ratas Sham e OVX. Os dados foram apresentados como média ± erro padrão da média (n = 4-7 animais/grupo). *P < 0,05 comparado com grupo Sham.

6. DISCUSÃO

É sabidamente conhecido que os sistemas reprodutivo e urinário na mulher se desenvolvem a partir do sinus urogenital (10). Apesar de a bexiga e uretra não serem tecidos reprodutivos, são órgãos altamente sensíveis aos hormônios sexuais femininos, incluindo os andrógenos (9, 109). Assim, é possível que os andrógenos possam regular fisiologicamente a continência urinária, pois estudos prévios mostram a presença de AR na bexiga e colo vesical (110, 111). Na mulher, a testosterona é o esteroide mais importante do grupo dos andrógenos. A 5α-DHT, metabólito ativo da testosterona, não sofre aromatização a estradiol, permitindo distinguir seus efeitos androgênicos através da ligação ao receptor de andrógeno (AR). O AR pertence à superfamília de receptores nucleares, localizados no citoplasma, e quando ativados interagem com elementos de resposta a andrógenos (ERA) na região regulatória do DNA para ativar o reprimir a transcrição gênica (67). No geral, os efeitos genômicos clássicos caracterizam-se por aparecer após a exposição do tecido ao hormônio por longos períodos de tempo (horas), provavelmente pela ativação de toda a maquinaria de transcrição, resultando em expressão gênica e proteica (66). Adicionalmente, os efeitos mediados pela via clássica parecem depender da concentração tecidual do hormônio (81), da afinidade dos andrógenos e da saturação do AR (112, 113).

Nossa estratégia principal consistiu em construir curvas concentração-resposta a agentes contráteis na bexiga (carbacol e CaCl2) e uretra (fenilefrina, CaCl2), assim como a agentes

relaxantes na bexiga (isoproterenol, mirabegron) e na uretra (SNP). Ainda, na bexiga, utilizamos a técnica de estimulação elétrica de campo (EFS), que envolve a aplicação de estímulos elétricos intermitentes na musculatura lisa vesical a qual promove a liberação de um conjunto de neurotransmissores das vesículas sinápticas, sendo a ACh e o ATP os principais mediadores contráteis, que se faz por meio da ativação de receptores muscarínicos M3 e

purinérgicos pós-sinápticos, respectivamente (114). Em todos os ensaios funcionais, utilizamos concentração única de testosterona ou 5α-DHT de 100 nM. Esta concentração foi escolhida em parte tomando por base estudo prévio do nosso grupo onde a reposição com testosterona em dose suprafisiológica (10 mg/kg) em ratas ovariectomizadas corrigiu a disfunção miccional (48), sendo que essa dose corresponde a concentração sérica aproximada de 175 nM. Ainda, estudos prévios mostraram que essa concentração de 100 nM de testosterona é capaz de produzir efeitos relaxantes na musculatura lisa vascular e das vias aéreas (81, 113, 115, 116).

Mecanismos genômicos versus não-genômicos dos andrógenos na bexiga e uretra de ratas controle e ovariectomizadas

Na primeira parte do trabalho procuramos identificar se os efeitos dos andrógenos nas respostas contráteis e relaxantes da bexiga e/ou uretra seriam devidos a mecanismos genômicos clássicos, não-genômicos, ou eventualmente ambos. Para tanto, empregamos a flutamida, que é descrita como um antagonista competitivo e seletivo do AR nuclear, utilizada na clínica principalmente como anti-andrógeno em doenças como câncer de próstata (117). Na experimentação animal, a flutamida é usada para se avaliar os efeitos dos andrógenos na musculatura lisa vascular (80, 81), vias aéreas (116) e bexiga de porcos (118). Porém, não há estudos voltados aos efeitos da flutamida na bexiga e uretra de ratas. De modo geral, nossos achados em bexigas de ratas controle mostraram que os andrógenos (100 nM) reduziram significativamente as respostas contráteis ao carbacol e EFS, ao passo que na uretra a testosterona aumentou a resposta contrátil à fenilefrina. Diferentemente da condição fisiológica, em ratas ovariectomizadas, os andrógenos foram capazes de reverter tanto a hipocontratilidade vesical ao carbacol como a hipercontratilidade uretral à fenilefrina. Nos animais controle, a flutamida não modificou os efeitos vesicais e uretrais dos andrógenos, mas nas ratas ovariectomizadas, a flutamida preveniu totalmente os efeitos dos andrógenos. Assim, sugerimos que, em condições fisiológicas, é possível que a testosterona e 5α-DHT exerçam seus efeitos fisiológicos no trato urinário inferior por meio de mecanismos não genômicos, envolvendo a ativação do AR citoplasmático ou na membrana plasmática; entretanto, na condição de OVX, os efeitos androgênicos envolveriam a via genômica clássica.

Nas ações da testosterona, além do AR intracelular clássico, há evidências de “novos” AR citoplasmáticos associados à membrana plasmática (119, 120). Dessa forma, para se investigar se os andrógenos exerceriam seus efeitos em bexiga e uretra por meio destes receptores, empregamos a testosterona conjugada com BSA (T-BSA). O complexo de alto peso molecular não atravessa a membrana, exercendo, portanto, seus efeitos na superfície da membrana plasmática. Nossos dados em bexiga de ratas controles mostraram que o T-BSA não afetou a contração induzida por EFS ou carbacol, mas reduziu a resposta a fenilefrina na uretra. Considerando os resultados com a flutamida, estes dados de T-BSA sugerem que o AR na bexiga se encontra no citoplasma da célula muscular lisa, ao passo que o AR uretral está na membrana plasmática. Quanto à presença do AR (RT-PCR), conseguimos detectá-lo na bexiga e uretra em ratas controles e ovariectomizadas, sendo que na uretra das ovariectomizadas a

expressão destes receptores se mostrou maior em relação ao grupo controle. Pela técnica de RT- PCR não é possível dizer sobre sua localização, se nuclear ou membrana plasmática. Protocolos como imunoprecipitação e co-localização teriam de ser feitos para esclarecer essa possibilidade (119).

É interessante que nossos resultados mostraram, pela primeira vez na literatura, também a presença da enzima 5α-redutase, sugerindo que no sistema urinário (bexiga e uretra) há conversão de testosterona para seu metabólito ativo, 5α-DHT, podendo assim exercer os seus efeitos androgênicos. Destaca-se também que a expressão desta enzima se mostrou elevada na uretra da ratas ovariectomizadas em relação ao controle, indicando um aumento da geração da 5α-DHT neste tecido, mas o significado fisiopatológico deste achado ainda não nos é claro.

Além do AR, na literatura já foi descrito diversos receptores que podem gerar mecanismos não-genômicos ativados pela testosterona (66, 119). Entre eles encontra-se o GPRC6A, receptor de membrana acoplado à proteína G sensível à toxina pertussis e ao cálcio (77). Uma vez ativado, inicia uma cascata de segundos mensageiros que inclui PLC, influxo de Ca2+, fosforilação de Src, Ras-Raf

1 ERK e ativação da PKC, PKA e MAPK (75, 77). Todos

esses mecanismos levam ao influxo e aumento dos níveis intracelulares de cálcio, promovendo a contração da musculatura lisa. Não obstante, não conseguimos detectar expressão gênica de mRNA nem na bexiga nem na uretra das ratas, sugerindo que no TUI não há este receptor. Isto reforça o conceito que testosterona e 5α-DHT atuam principalmente pela ativação de AR.

Vias de sinalização dos andrógenos na bexiga e uretra de ratas controle e ovariectomizadas Maquinaria contrátil

A ACh e seu análogo, carbacol, produz contração da bexiga por ativação de receptores muscarínicos M3, acarretando a estimulação de PLC que produz dois segundos mensageiros,

DAG e IP3. Este último ativa receptores específicos para IP3 (IP3R) no retículo sarcoplasmático,

aumentando Ca2+ intracelular que, por sua vez, funciona como gatilho para influxo de cálcio

extracelular, através de L-VOCC (25). Dessa forma, bloqueadores de L-VOCC são capazes de reduzir significativamente a resposta contrátil induzida pelo carbacol em bexigas (28). Para estudarmos a uretra, fizemos adição exógena de fenilefrina, agonista seletivo a1-adrenérgico,

que produz resposta contrátil semelhante a esta descrita para a bexiga, ou seja, ativação da PLC