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Partes utilizadas e modo de preparo

6. RESULTADOS E DISCUSSÃO

6.3. Uso e indicação de plantas medicinais

6.3.9. Partes utilizadas e modo de preparo

Entre as formas de uso foram consideradas a parte utilizada e o modo de preparo de cada planta. As partes das plantas consideradas foram:

- Parte aérea (Aer) = corresponde às folhas e ramos da planta

- Raiz (Rai) = corresponde às raízes (pivotantes e fasciculadas), bulbos, rizomas e outros órgãos de reserva subterrâneos. Foi utilizado o termo raiz para todas as partes subterrâneas, pois é dessa forma que os entrevistados fazem referência a estas partes.

- Folhas (Fol): as folhas inteiras das plantas - Casca (Cas): corresponde ao súber da planta

- Caule (Cau): corresponde ao cerne e entrecasca das plantas - Palmito (Pal): é o tecido meristemático das palmeiras - Resina (Res): substância resinosa secretada pelas plantas - Látex (Lat): secreção esbranquiçada das plantas

- Seiva (Sei) = liquído presente em toda a planta nos xilemas e floemas - Fruto (Fru) = corresponde ao fruto ou pseudofruto das plantas estudadas - Semente (Sem) = corresponde à semente propriamente dita dos frutos

De todas as plantas indicadas no trabalho, 47% tem suas folhas utilizadas para o preparo dos remédios, 24% tem suas casca e entrecasca, 11% suas raizes, 7% suas sementes, 3% seu caule (cerne), 6% sua seiva, látex ou resina, frutos, sementes. Doze plantas tem mais de uma parte que pode ser utilizada e as demais só uma parte utilizada.

A parte indicada para uso no preparo dos remédios depende sobretudo da família botânica a que pertence a planta. Os palmitos são subprodutos das palmeiras, portanto somente as Arecaceae tem essa parte utilizada. A resinas indicadas neste trabalho são retiradas de plantas da família Burseraceae e de uma Fabaceae. A seiva é retirada de plantas de duas famílias distintas, mas que possuem seiva abundante (Dilleniaceae e Mirysticaceae). Nas Zingiberaceae predomina o uso de suas raízes (rizomas).

A parte aérea é utilizada somente em plantas herbáceas. Enquanto as folhas predominam em plantas herbáceas e arbustivas, elas são menos frequentes em

árvores onde predomina o uso de sua casca, entrecasca e cerne, assim como nos cipós lenhosos.

A distribuição dos compostos secundários nas plantas é diferente dependendo da parte da planta em que está a estrutura secretora ou onde é armazenada esta substância. Uma mesma espécie tem compostos predominantes diferentes em partes diferentes da planta (LORENZI e MATOS, 2008). O estudo das partes utilizadas como remédio nas diferentes plantas permite a compreensão de como elas são extraídas e coletadas. Por exemplo, no caso da planta Amapá que produz latéx com o uso medicinal, sua coleta é feita próximo da data de uso, pois não é possível seu armazenamento por um longo período de tempo, enquanto a saracura-mirá (seu caule ou raíz) ou os breus podem ser armazenados por um longo período de tempo dentro das residências. Outras plantas que ocorrem em locais inundados (igapós) não são acessíveis o ano inteiro.

Algumas plantas que possuem mais de um uso, possuem mais de uma forma de preparo. A castanheira (Bertholletia excelsa Bonpl.) foi a espécie com mais partes diferentes utilizadas e formas de uso; dependendo do entrevistado, foram indicadas suas sementes trituradas (leite de castanha), sua entrecasca, sua casca, o epicarpo de seu pixídio, e um macerado preparado com a água deixada em repouso dentro deste pixídio.

O pinhão-branco (Jatropha curcas) que foi indicado para a malária e para dores-de-cabeça tem partes e formas de uso distintas, de acordo com seu uso. São usadas suas sementes para o tratamento da malária como um vomitório (emético) e o chá de suas folhas para as dores-de-cabeça.

As partes utilizadas podem variar de acordo com o estado fenológico da planta: das plantas jovens de saracura-mirá são utilizadas suas raízes e das plantas adultas a entrecasca e o cerne do cipó (Figura 21).

Foram identificadas 12 diferentes formas de preparo dos remédios, o mais popular foi a decocção, utilizada para o preparo de 44 diferentes plantas, quando a parte utilizada é colocada em água fria e esquentada até a fervura; seguida pela infusão, utilizada no preparo de 24 plantas, quando partes destas são colocadas sobre água fervida e deixadas em repouso; e pela maceração que foi utilizada em 22 das plantas, quando a parte da planta fica em repouso em água fria. Considerando que nestas três formas de preparo os remédios são consumidos em chá (bebida preparada com água), eles representam 74% das formas de preparo dos remédios indicados.

A tintura, indicada no preparo de 12 plantas, é utilizada somente pela Pastoral da Saúde. Neste método as partes das plantas ficam em repouso no álcool por um longo tempo. Todos os remédios preparados pela Pastoral são feitos em forma de elixir, com a mistura de cinco ou mais tinturas de plantas diferentes. Atualmente o veículo alcoólico utilizado pela Pastoral é proveniente de cachaça comercializada nos mercados, pois seu preço é mais baixo.

Seis espécies são utilizadas na forma de inalação, que pode ser feita de duas formas: na primeira, a parte da planta usada é queimada e sua fumaça é inalada pelo paciente (breus e fumo); e na outra as plantas são colocadas em uma infusão e o paciente inala o vapor desta infusão (hortelã, mamão e embaúba).

Outras formas de uso citadas foram o consumo in natura, feito principalmente com frutos e pseudofrutos utilizados como remédios, citado seis vezes (abacaxi e banana). O contato direto da planta com uma parte do corpo foi citado três

Imagem 4: Ampelozizyohus amazonicus (saracura-mirá). Raíz – esquerda. Caule – direita.

vezes, exclusivamente no tratamento de dores-de-cabeça (fruto do limão cortado sobre a cabeça e a folha chamuscada de café sobre a cabeça).

O banho com as plantas foi indicado como modo de uso para duas plantas (samambaia), o cozimento para consumo foi citado para uma planta (semente do umari) e a lavagem do trato intestinal foi citada para uma planta (eucalipto).

O vomitório, quando o remédio é consumido para provocar o vômito do paciente, foi citado para duas espécies (jatoá e pinhão-branco) utilizadas para o tratamento da malária. Neste processo os entrevistados que indicaram estas plantas falaram que junto com o vômito sai a bílis onde a malária está alojada.

Entre as diferentes formas de chá é possível distinguir que partes duras de plantas indicadas como remédios, como cascas, raízes, entrecascas e cernes, são preparadas na forma de macerados e decocções, enquanto pedaços mais tenros ou aromáticos das plantas, como folhas, são preparados como infusão.

É possível traçar uma relação do modo de uso das plantas com a compreensão sobre a doença. As defumações são utilizadas em benzimentos e o vomitório, quando se acredita que a malaria fica alojada no fígado. O modo de preparo também vária de acordo com a parte da planta utilizada, seu principio ativo e onde ele esta armazenado e tudo isto deve ser considerado no preparo de extratos vegetais utilizados nos testes de atividade metabólica em laboratório (GRAZ, 2004).