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REVISÃO DA LITERATURA

I. PARTICULARIDADES DA OBESIDADE EM IDADE PEDIÁTRICA

1. HISTÓRIAEEPIDEMIOLOGIA

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que mais de um bilião de adultos têm sobrepeso e que, pelo menos, 300 milhões são obesos (WHO, 2006). Este organismo define a situação actual de sobrepeso/obesidade como a “Epidemia Global do Século XXI”.

A crescente epidemia, ao longo das últimas décadas, reflete profundas alterações dos padrões de comportamento alimentar da população em geral. Ascensão económica, modernização, urbanização e globalização dos mercados alimentares, são, apenas, algumas das forças consideradas subjacentes a esta epidemia (WHO, 2006). Países com um crescente desenvolvimento económico e uma rápida urbanização enfrentam dois desafios: combater a subnutrição infantil e o crescente aumento de sobrepeso/obesidade (Onis M, 2000; Ebbeling CB, 2002; Wang L, 2005).

A International Task Force (IOTF) estima que, aproximadamente, 155 (cerca de 10%) de crianças de todo o mundo, em idade escolar, têm sobrepeso (Lobstein T, 2004). Esta epidemia está a atingir grande proporção nos países do sul da Europa e estima-se, que em 2010, cerca de 38,2% de crianças apresentem sobrepeso na Europa (Wang YL, 2006; WHO, 2006). Estudos efectuados no Reino Unido e nos EUA, sugerem que a obesidade na infância parece explicar 33% da obesidade diagnosticada nos adultos. Por outro lado, o sobrepeso/obesidade observado em idade pediátrica tende a manter-se na vida adulta e, quando estabelecida esta situação, torna-se difícil revertê-la, aumentando a importância do desenvolvimento de estratégias de prevenção eficazes na luta contra a obesidade (Yanovski JÁ, 2000; Nader PR, 2006).

A história epidémica da obesidade inicia-se, nos anos 80 do século passado, e, desde então, tem aumentado exponencialmente. Em 1997, a OMS considera a obesidade um problema de saúde pública major (James J, 2005; James WP, 2008), e, em 1998, reconheceu-a como a maior epidemia, à escala mundial (WHO, 1998; WHO, 2000), não só pelas

repercussões negativas para a saúde, mas, e acima de tudo, pelas dimensões cada vez mais assustadoras (Rodrigues D, 2000; Coelho SM, 2003). A alta prevalência que apresenta na década de 90, do século passado, faz com que a obesidade seja considerada uma doença endémica, associada a um maior risco de morbilidade e mortalidade precoces, tornando-se, pois, um sério problema de saúde global (Seidell JC, 1999).

2. DEFINIÇÃO

Segundo a OMS, a obesidade é definida como uma patologia do foro nutricional, caraterizada pela acumulação excessiva de gordura corporal, com implicações negativas para a saúde (WHO, 2002). O excesso de gordura corporal total associado, ou não, a perturbações da sua distribuição anatómica, faz com que a obesidade se desenvolva, na maioria dos casos, na ausência de doença subjacente ou de causas orgânicas (Ballow ES, 1998).

Os períodos de maior vulnerabilidade no desenvolvimento da obesidade são: o último trimestre de vida fetal, os 1º e 2º anos de vida, o período do ressalto adipocitário e a adolescência (Dietz WH, 1994; Castanõ IB, 2006; Rego C, 2007). O ressalto adipocitário é normalmente iniciado por volta dos 5-7 anos de idade, consistindo numa replicação, mais acentuada, dos adipócitos, contribuindo para um aumento de massa gorda corporal e afecta o IMC na idade adulta (Williams S, 1999; Dietz WH, 2000; Cole TJ, 2004). É, também, considerado, por alguns autores, como um “epifenómeno”, que, quando acontece em idade inferior a 5 anos, significa um risco acrescido de obesidade na adolescência e na idade adulta (Dietz WH, 1994; Castanõ IB, 2006; Rego C, 2007). Dados recentes mostram que a mudança do IMC durante o ressalto adipocitário, é devida à rápida deposição de gordura, em detrimento de massa magra (Rolland-Cachera MF, 2006).

Outro período sensível para um ganho de peso acentuado, é a adolescência (Goran MIS, 2006). A OMS define a adolescência como o período entre os 10 e 19 anos de idade e alerta para as importantes mudanças na composição corporal, que ocorrem durante o período de desenvolvimento pubertário (Goran MIS, 2006; WHO, 2009). Durante a adolescência o desenvolvimento pubertário conduz ao aumento da replicação adipócitária,

sobretudo no sexo feminino, e, sempre que a idade da menarca seja inferior a 11 anos, é maior o risco de obesidade na idade adulta (Goran MIS, 2006; WHO, 2009; Sancho T, 2010). Estudos indicam que a obesidade na adolescência é preditivo de obesidade e de mortalidade na idade adulta (Engeland A, 2004). A presença de obesidade, na adolescência, parece ser mais importante para o futuro risco de obesidade, do que a presença de obesidade nos outros períodos de desenvolvimento. Por outro lado, a obesidade do adolescente tem tendência a persistir até à idade adulta, e prevê um leque alargado de comorbilidades associadas e aumento da mortalidade (Young-Hyman D, 2001). Observa-se que 80% dos adolescentes obesos vêem a ser adultos obesos (Must A, 1992; Goran MIS, 2006; Engeland A, 2004).

A obesidade é, claramente, uma condição multifactorial (Adair LS, 2008), que resulta, de uma forma global, de sucessivos balanços energéticos positivos, em que a quantidade de energia ingerida é superior ao gasto energético (Rego C, 2002; Direcção Geral de Saúde, 2005; Skidmore P, 2007). Este tipo de obesidade é denominada como exógena/primária (Direcção Geral de Saúde, 2005; Skidmore P, 2007), forma bem distinta da endógena/secundária, resultante, essencialmente, de causas genéticas, endócrinas ou iatrogénicas (Speiser PW, 2005). Devido à sua multifactoriedade, parece não existir um único tipo de obesidade, sendo, por isso, mais adequado utilizar o termo “obesidades”. Contudo, tanto na literatura, como no meio técnico, utiliza-se apenas a designação de obesidade (Teles AG, 1989).

Na obesidade primária, os fatores que determinam o desequilíbrio energético são complexos e de etiologia multi-factorial, onde se incluem factores genéticos e ambientais, antecedentes culturais e nível sócio económico, resultantes de um balanço positivo prolongado de energia (ILSI Press, 2000; Rodrigues D, 2000; Figueiredo S, 2003; Padez C, 2004; Castanõ IB, 2006; Rego C, 2008). Em termos antropológicos, a espécie humana evoluiu mediante genes poupadores de energia, que permitiram desenvolver a capacidade de acumular gordura, podendo ser utilizada em períodos de deficite energético (Castanõ IB, 2006; Sancho T, 2010).

A definição de obesidade durante a infância e a adolescência não é uma tarefa fácil, uma vez que são períodos de crescimento, durante os quais a composição corporal sofre alterações constantes (Schonfeld-Warder N, 1997; WHO, 2000; Rego C, 2008). Muito embora existam métodos mais sensíveis para caracterizar a composição corporal (ex: DEX, TAC e RN)

(Kopelman PG, 2000; Kumanyik SKB, 2007) para definir obesidade nas crianças/adolescentes, a OMS recomenda a utilização do Índice de Massa Corporal de Quetelet [IMC=peso (kg)/altura² (m²)], quer pela sua praticabilidade, quer pela sua fiabilidade (Himes JH, 1994; WHO, 2006). Trata-se, no entanto, de um parâmetro que não permite a avaliação da gordura corporal, muito embora apresente uma forte correlação com a magnitude da adiposidade, bem como com as complicações associadas à obesidade (Schonfeld-Warder N, 1997; Cole JT, 2000; Moreno LA, 1997; Gillman MW, 2003; Hui LL, 2003; Lissau I, 2004; Rego C, 2008).

Enquanto que nos adultos existe consenso quanto à definição de sobrepeso e obesidade (WHO, 2000), considerando-se sobrepeso um IMC igual ou superior a 25kg/m² e obesidade um IMC igual ou maior que 30kg/m², a avaliação da obesidade em idade pediátrica torna-se mais complicada, uma vez que ocorrem um grande número de mudanças, a nível de tamanho e composição corporal durante o crescimento (Rolland-Cachera MF, 2006; Kumanyika SKB, 2007; WHO, 2009).

Não existem pontos de corte fixos, de IMC definidos para a idade pediátrica, como existem para os adultos. A avaliação pediátrica passa, então, pela comparação do IMC da criança com valores médios de uma população de referência, em função da idade e do sexo (Cole TJ, 2000; NCHS, 2000; Lyznicki JM, 2001; WHO, 2007). Cole e colaboradores (Cole TJ, 2000), desenvolveram, portanto, pontos de corte segundo as diferentes idades e géneros, a partir do IMC, as quais são recomendadas em abordagens epidemiológicas (Cole TJ, 2000; Fisberg M, 2004; Speiser PW, 2005; IOTF, 2002). Assume-se, assim, que valores de Percentil (Pc) de IMC maior que 85 e menor, ou igual, que 95 (Pc> 85 ≤ 95) são considerados sobrepeso, e maiores que Pc95, obesidade.Por outro lado, o Center For Disease Control and Prevention (CDC) desenvolveu gráficos específicos de crescimento, através de curvas de percentis de IMC americanas (Ogden CL, 2002).

Também a OMS desenvolveu gráficos de crescimento, a partir de curvas de percentil, validadas internacionalmente, para um padrão que considera o aleitamento materno como recomendação da alimentação dos lactentes (WHO, 2006). Segundo este organismo, define- se excesso de peso sempre que o IMC se encontra num desvio padrão acima da média, para a idade, e obesidade quando se encontra 2, ou mais, desvios padrão, acima da média (WHO, 2006).

A Direcção Geral de Saúde (DGS) adoptou até, 2011, a classificação do CDC na monitorização do IMC em crianças e adolescentes portugueses. É esta referencia que, atualmente, se encontra nos Boletins de Saúde Infantil e Juvenil, evidenciando curvas de percentil a indicar pré-obesidade (IMC > Pec 85 e ≤ Pec 95) e obesidade (IMC ≥ Pec 95) (Direcção Geral de Saúde, 2006).

II.

FATORES

PREDISPONENTES

À

OCORRÊNCIA

DE

OBESIDADE