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Karol WOJTYŁA

Pensando a pátria...

A Pátria, quando penso, me expresso e enraízo,

é o que me diz o coração, fronteira oculta que de mim se estende aos outros para os abarcar todos num passado mais antigo que cada um de nós: dele é que surgo... quando penso a Pátria – para guardá-la em mim feito te- souro.

Pergunto a cada hora como multiplicar, como alargar o espaço do seu domí- nio.

(...)

Refrão

Quando penso a Pátria, procuro o caminho que corta as encostas como a cor- rente de alta tensão, passando em cima – assim ele sobe correndo íngreme em cada um de nós e não nos deixa parar.

O caminho percorre as mesmas encostas, volta aos mesmos lugares, e torna- se um grande silêncio que cada entardecer visita os pulmões cansados da minha terra.

Pensando a Pátria, retorno a árvore...

terra, crescia conosco ao longo dos séculos, encravando-se na Igreja com raí- zes das consciências.

Carregávamos os frutos que pesam e que enriquecem. Sentimos o tronco rachando-se no fundo, embora as raízes penetrassem o mesmo solo... A história reveste a luta das consciências com a camada dos acontecimentos. Camada em que vibram vitórias e quedas. A história não as encobre, mas sim as realça...

Pode a história correr contra a corrente das consciências?

2. Em que direção ramificou-se o tronco? Em que direção seguem as cons- ciências? Em que direção cresce a história da nossa terra? A árvore da ciência não conhece limites.

Só a Vinda é o limite que unirá num Corpo só a luta das consciências e os mistérios dos tempos – e transformará a árvore da ciência numa Fonte da Vida a jorrar sem parar.

Mas até agora cada dia traz a mesma desagregação em cada pensamento e em cada ato, da qual a Igreja das consciências cresce nas raízes da história. 3. Que nunca percamos da vista a nitidez com que nos vêm os acontecimen- tos perdidos numa torre imensurável, em que, no entanto, o homem sabe para onde está caminhando. O amor, o amor só, contrabalança o destino. Que nunca estendamos a dimensão da sombra.

Que o raio solar alcance a cada coração e ilumine as penumbras das gera- ções. Que o fluxo de poder penetre as fraquezas.

Não podemos nos conformar com a fraqueza.

4. É fraco um povo que se conforma com a sua derrota e esquece que foi enviado para aguardar vigilante a sua hora. As horas sempre retornam no grande mostrador da história.

Eis a liturgia dos tempos. A vigilância é a palavra do Senhor e a palavra do Povo que vamos receber sempre de novo. As horas se transformam num sal-

mo das conversões perpétuas: vamos participar em Eucaristia dos mundos. 5. Vamos então em tua direção, ó terra, para te alargar em todos os homens – a terra das nossas quedas e vitórias que te ergues em todos os corações com o mistério pascoal.

– Ó terra que não cessas de ser a partícula do nosso tempo.

Aprendendo a nova esperança, atravessamos esse tempo rumo a terra nova. E te elevamos, ó terra antiga, como um fruto do amor das gerações que superou o ódio.

Kraków, 1974.

MAZUREK, Jerzy. Piórem i czynem (Pela pena e pela ação). Warszawa: Instytut Studiów Iberyjskich i Iberoamerykańskich UW, 2013, pp. 469.

Mariano KAWKA

A trajetória sul-americana de um líder polonês

Neste seu último livro, o Prof. Jerzy Mazurek apresenta-nos, com ri- queza de detalhes baseados em farta documentação, além de numerosas ilus- trações, a pessoa de Kazimierz Warchałowski, uma liderança polonesa que deixou marcas indeléveis na história da imigração polonesa no Brasil e na América Latina.

Nos primeiros cinquenta anos da colonização polonesa no Brasil é visível o predomínio dos camponeses simples e nada ou pouco letrados que, tentados pela perspectiva de melhorar as suas condições de vida e de se tor- narem proprietários de terras, migravam aos milhares, estabelecendo-se prin- cipalmente nos estados meridionais − Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Os estudiosos do assunto calculam que no início do século XX o seu número já beirava a cifra de 100 mil.

A esses imigrantes juntavam-se também, aos poucos, alguns intelectuais que deram à imigração polonesa a possiblidade de ela se organizar melhor e de refletir sobre a sua condição e o seu destino. Os primeiros representantes dessa categoria foram os sacerdotes. Posteriormente, surgem nomes de cidadãos proeminentes em áreas diversas, que se gravaram na história da colonização polonesa no Brasil. Entre eles, podem ser citados, por exemplo, Jan Hempel, Stanisław Konrad Jeziorowski, Szymon Kossobudzki, Jadwiga Jahołkowska, Michał Sekuła, Juliusz Szymański, Witold Wierzbowski, Witold Żongołłowicz e também o protagonista do livro em análise − Kazimierz Warchałowski.

Kazimierz Warchałowski nasceu no dia 24 de novembro de 1872 em Woronez, uma cidade situada a 500 quilômetros ao sul de Moscou, numa fa- mília de intelectuais e de raízes aristocráticas. Nos anos 1889-1894, Casimiro estudou Ciências Naturais na Universidade de São Petersburgo. No entanto, ele não concluiu esses estudos. O jovem Casimiro, nos anos da sua juventude, realizou viagens por diversos lugares da França e da Itália. Em 1897 casou-se com Janina.

Warchałowski teve o primeiro contato com o Brasil em 1901, quando, em companhia de sua esposa, fez ao país uma viagem de reconhecimento de três meses. No Paraná teve uma impressão positiva da comunidade polonesa local, para a qual via apenas a necessidade da elevação do nível cultural. War- chałowski se posicionou a favor da emigração polonesa ao Paraná e propagou essa ideia tanto na imprensa polonesa como também no seu jornal Polak w Brazylii (O polonês no Brasil).

Em 1903 Warchałowski viajou ao Brasil com a família (que incluía os filhos Jorge, Luís e Estanislau) e fixou residência em Curitiba. A cidade conta- va naquela época cerca de 25 mil habitantes, dos quais cerca de dez por cento eram poloneses. O primeiro empreendimento de Warchałowski em Curitiba, já em 1903, foi a construção de um pavilhão, no estilo de Zakopane, no qual foi organizada uma exposição dos produtos agrícolas produzidos pelos co-

lonos poloneses da região. Em breve adquiriu na região do Bacacheri uma propriedade onde instalou uma serraria, uma fábrica de fertilizantes e um depósito de máquinas agrícolas.

Após uma viagem à Europa em 1906, instalou em São José dos Pi- nhais uma serraria. Costumava visitar regularmente a sua terra natal (em geral a cada dois anos), mas fixou-se definitivamente em Curitiba. Na Praça Tiradentes, mantinha a Livraria Polaca e a redação do jornal Polak w Brazylii, por ele fundado em 1905. Esse periódico semanal proclamava os ideais repu- blicanos e democráticos, popularizava as ciências naturais e sociais, difundia a literatura polonesa e consolidava a fé na libertação da Polônia.

Ao mesmo tempo Warchałowski visitou quase todos os maiores nú- cleos poloneses e dedicou-se à propagação do ensino, à fundação de bibliote- cas e círculos agrícolas, procurando elevar o nível cultural dos colonos e torná -los conscientes dos seus direitos e deveres. Nesse sentido, foi uma espécie de intermediário entre o mundo urbanizado e moderno e o mundo muitas vezes anacrônico em que viviam os colonos poloneses residentes no interior.

No período da I Guerra Mundial, a atenção dos líderes poloneses, inclusive nas áreas dos emigrados, concentrava-se nos esforços pela recupe- ração da independência do país. Também nessa área Warchałowski granjeou grandes méritos. Ele tinha um bom relacionamento com Rui Barbosa, com o presidente Venceslau Brás e com o então ministro das relações exteriores Nilo Peçanha. Foi em grande parte graças aos seus empenhos que o Brasil foi o primeiro país da América do Sul a reconhecer a independência polonesa após a Primeira Guerra.

Warchałowski voltou à Polônia independente em 1919. O seu jornal − Polak w Brazylii − foi adquirido por uma sociedade fundada pelos padres Vicentinos, o que deu origem ao jornal Lud (O Povo). Esse jornal circulou de 1920 até 1999.

ríodo de mais de um século de dominação estrangeira − teve de envidar es- forços para a reconstrução do país. Nesse período o país enfrentava sérios problemas, como o superpovoamento das aldeias e o desemprego nas cida- des. Naquele tempo, de uma população de 27,4 milhões, cerca de 20 milhões (quase 76% da população) viviam nas aldeias. Nos dez anos após a recupera- ção da independência, voltaram ao país 1.710.000 pessoas e dele emigraram 1.080.000, ou seja, a população da Polônia aumentou em 630 mil habitantes.

Nessas condições, muitas pessoas viam na colonização ultramarina a única chance de melhora de vida para essas enormes multidões de campone- ses e operários. Para essa situação, Warchałowski continuou a ver a solução na ação emigratória e colonizadora que − na sua opinião − devia ser direcionada à América do Sul. Ele via nisso também uma fonte de vantagens econômicas e políticas para a Polônia.

Foi nesse contexto que em 1926 foi criada em Varsóvia a Sociedade Colonizadora (Towarzystwo Kolonizacyjne), que em 1928 promoveu a coloniza- ção polonesa no Espírito Santo, na região de Águia Branca.

Em 1925 Warchałowski organizou uma expedição de reconhecimento pela América do Sul. Nessa época ele elaborou um projeto de colonização po- lonesa no Peru. No período de entreguerras foi um dos maiores propagandis- tas dessa ideia e finalmente se envolveu nesse empreendimento pessoalmen- te, por intermédio de uma cooperativa colonizadora, a chamada Kolonia Polska (Colônia Polonesa). Em 1927 obteve do governo peruano uma concessão para colonizar 350 mil hectares no leste do Peru (na região de La Montaña). Essas terras se encontravam na Amazônia peruana, ao leste dos Andes, nas mar- gens do Rio Ucayali, que juntamente com o Rio Marañón dá origem ao rio Amazonas. Não era uma área adequada para a colonização, principalmente em razão das grandes distâncias dos centros urbanos (a cidade mais próxima, Iquitos, ficava a 1.500 km de distância), e por ser uma região sujeita a perió- dicas inundações.

chegou ali no dia 14 de maio de 1930. No dia 6 de outubro de 1930 (com o quarto grupo de imigrantes), viajou para lá o Pe. Francisco Sokół, delegado do primaz da Polônia, para organizar ali a primeira paróquia polonesa. No total, em oito grupos, normalmente em intervalos de um mês, viajaram ao Peru 235 pessoas, sendo 107 adultos. Esses colonos não encontraram ali o que lhes havia sido prometido, sentiram-se frustrados e finalmente se dispersaram. Al- guns permaneceram no Peru, outros viajaram ao Brasil ou voltaram à Polônia. Todo o projeto encerrou-se em 1935, quando o Pe. Sokół, acompanhado de um grupo de 20 emigrantes, viajou para Curitiba. Algum tempo depois esse padre se estabeleceu na colônia polonesa de Águia Branca, no Espírito Santo. Enfim, todo o empreendimento resultou num grande fracasso. Foi um projeto mais baseado em ideologia do que na realidade, o que não podia ter produzi- do um resultado diferente.

Warchałowski e sua esposa voltaram a Varsóvia já em 1931. A questão da colonização no Peru lançou uma sombra sobre os últimos anos da vida de Warchałowski. Mesmo que as suas intenções tivessem sido as melhores, a culpa pelo fracasso do empreendimento recaiu sobre ele. Após essa empreita- da malsucedida, ele não se engajou mais na atividade colonizadora. No final de 1935 viajou mais uma vez à América do Sul com o objetivo de avaliar a possibilidade de exportação de produtos poloneses para os mercados locais. Warchałowski viajou ao Rio de Janeiro em 1937 e depois a Buenos Aires. Em 1938 voltou à Polônia e a partir de então dedicou-se à atividade jornalística e literária e a fazer palestras. Entre os livros por ele escritos estão: Do Parany (Ao Paraná), Cracóvia, 1905; Picada. Wspomnienia z Brazylii (Picada − Recorda- ções do Brasil), Varsóvia, 1930; Na krokodylim szlaku (Na trilha dos crocodilos), Varsóvia, 1936; Na wodach Amazonki (Sobre as águas do Amazonas), Varsóvia, 1938. Faleceu em Varsóvia, durante a Segunda Guerra Mundial, no dia 28 de maio de 1943, e ali foi sepultado.

Kazimierz Warchałowski foi uma personalidade de destaque, ainda que por vezes controvertida, na vida da colônia polonesa no Brasil e na Amé- rica Latina. Grande idealista, buscou a realização do que acreditava ser o me-

lhor para os seus compatriotas.

A leitura da sua biografia, em Piorem i czynem, é uma profunda aula de história sobre a diáspora polonesa na América Latina. Para quem desco- nhece a língua polonesa, o livro apresenta um resumo em inglês, português e espanhol.