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Período de relações inter-organizacionais

1. INTRODUÇÃO

1.2 Abordagens teóricas de análise de acidentes

1.2.4 Período de relações inter-organizacionais

Durante a década de 2000, surgem vários métodos de investigação de acidentes. Sklet apresenta o modelo MTO5 que articula eventos, causas e barreiras e pretende identificar causas raiz a partir de algumas listas de checagem. Rasmussen (1997) desenvolveu uma estratégia de gerenciamento de risco, e apresentou o ACCIMAP como uma ferramenta para mapear a localização das relações hierárquicas entre os

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Cognitive Reliability Error Analysis Method 5

tomadores de decisão e aqueles que contribuíram às causas dos acidentes. Seu complemento, o modelo STAMP6 de Leveson (2004) baseia-se em níveis de controle do sistema sócio técnico. Segundo a teoria por trás do STAMP, os acidentes ocorrem devido à violação das condições em que o sistema foi projetado (OKSTAD; JERSIN; TINMANNSVIK, 2012). O método TRIPOD apresentado por Groeneweg et al. (2010), é baseado na teoria de queijo suíço de Reason e apresenta a idéia de falhas latentes enraizadas na organização que permitem condições (barreiras enfraquecidas) para que apareçam mais tarde falhas ativas (atos inseguros); as falhas latentes estão ligadas a 11 Fatores de Risco Básico. Groeneweg apresenta um modelo „estendido‟, onde a investigação não está focada em “o que aconteceu quando?” ou "o que causou um evento", mas "quem foi o responsável?”. Os modelos MTO e TRIPOD são restritivos às causas pré-elaboradas e o segundo cai de novo no paradigma do erro humano (ato inseguro).

Segundo Dien, Dechy e Guillaume (2012), todos estes métodos apontam fatores organizacionais e humanos e alguns deles assinalam falhas do sistema. Não obstante, estes métodos apresentam várias limitações em comparação com as investigações de acidentes, mais complexas e exemplares. Estes métodos não questionam o contexto organizacional, os papéis e as características dos seus usuários, embora, exijam alto nível de domínio da ferramenta, além de competências subjacentes em fatores humanos e organizacionais. Além disso desconsideram o aspecto histórico da organização e os subjetividade dos trabalhadores.

Daniellou, Simard e Boissières (2013), afirmam que o erro humano é uma explicação insuficiente expondo os limites desta abordagem e que o modelo de segurança de queijo suíço de Reason seria insuficiente, porque ele corresponde a acontecimentos que puderam ser antecipados e portanto permitiram a concepção de barreiras. No entanto, produzem-se combinações que não foram previstas por mais sofisticados que sejam os aportes tecnológicos. A progressão da segurança se apresentaria se as situações sem consequências graves fossem analisadas enriquecendo o leque dos cenários antecipáveis.

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Para Lima (2005) a realidade do trabalho se apresenta, primeiramente, com variações não desejáveis. É necessário, portanto, reconhecer que nas empresas se confrontam duas lógicas, pelas quais se tenta lidar com as diferenças entre as previsões e a realidade da produção. Por um lado, a norma que representa a racionalidade do engenheiro ao tentar assegurar a efetividade do resultado planejado, e se materializa nas diversas formas de prescrição e de comando do trabalho vivo. Por outro lado, a atividade viva dos trabalhadores, os quais devem gerir quotidianamente a variabilidade das situações de trabalho. Para este autor a indústria clássica desenvolveu-se, até hoje, com base no “modelo técnico- econômico da operação” com as características de um modelo físico determinista: descritível a priori, previsível, regular e passível de ser regulado por antecipação, através de normas organizacionais que prescrevem a execução das tarefas. Em completa oposição a este modelo mecanicista e tradicional, que está fundamentado na norma e no padrão, os sistemas automatizados se diferenciam pelas situações eventuais. Assim a gestão de sistemas complexos tende, hoje, a depender da análise e da compreensão de eventos singulares. Segundo Zarifian (1995 apud LIMA, 2005, p. 61), os eventos apresentam quatro características: são singulares, imprevisíveis, têm certa importância e são caracterizados por uma forte imanência à situação.

No entanto a maioria das análises de acidentes na investigação interna das empresas usa métodos causais, cuja ferramenta mais famosa é a árvore de eventos. Dien, Llory e Montmayeul (2004) indicam que as análises de fatores técnicos que embasam as abordagens da causalidade tipo sequencial são apoiadas na racionalidade da engenharia, que, no entanto são insuficientes e não conseguem alcançar a dimensão social, subjetiva e organizacional. Assim são abordagens limitadas quando se pretende mostrar as interações entre eventos, dependências temporais e relações não causais. Estes métodos são insuficientes para revelar os fatores organizacionais na origem da ocorrência e o desenvolvimento de um acidente.

Assim este período se move num novo sentido, tomando em conta os “fatores organizacionais”. De acordo com Llory e Montamayeul (2014), os acidentes

industriais são fenômenos psico-organizacionais, onde a origem do acidente é uma relação disfuncional entre organizações. Para a análise de AT, ele e seus colegas usam contribuições da ergonomia, da psicologia, dos sistemas de engenharia e de outras fontes de conhecimento sobre aspectos cognitivos – individuais e coletivos -, e sobre a confiabilidade humana em sistemas sócio–técnicos abertos; também aparecem contribuições de análise do acidente desde a discussão de alguns aspectos de métodos de produção e de gestão de segurança. Eles propõem um modelo de análise de eventos, que envolve a exploração de três eixos principais: a dimensão histórica, as redes transversais e as relações verticais da organização (Figura 1).

Figura 1 – Modelo tridimensional na investigação de acidentes. Extraído de Dien et al. (2012)

Nesta mesma década Hollnagel (2014) propõe uma nova abordagem de segurança onde o propósito das investigações de AT seria entender como as coisas usualmente vão bem como base para explicar como as coisas ocasionalmente se dão mal. Isto significa que primeiro é preciso entender o cotidiano do trabalho, como ele é realmente feito, assim como é dito pela ergonomia da atividade, para poder explicar resultados adversos como os acidentes.

No Brasil foi desenvolvido desde um Centro de Referência e Saúde do Trabalhador (CEREST) o Modelo de Análise e Prevenção de Acidentes (MAPA). Este modelo está apoiado em conceitos da ergonomia da atividade, da engenharia de segurança, da psicologia cognitiva, da sociologia e da antropologia. Ele sugere a análise do trabalho habitual, das mudanças e das barreiras e explora aspectos de gestão da produção e da segurança (ALMEIDA; VILELA, 2010). O MAPA já foi usado para analisar acidentes de vários setores e de diferente gravidade, permitindo compreender as origens e a relação de fatores mais remotos. Um resumo das abordagens teóricas de análise de AT é apresentado no quadro 1.

Década Período Conceitos Modelos e técnicas

1970 Técnico Atos inseguros Dominó

1980 “Erro humano” Erro do operador e lições aprendidas Árvores (FTA, ETA)

1990 Sócio técnico Cultura de segurança Queijo suíço, CREAM,

STEP, MORT

2000- Relações inter-

organizacionais

AT = Fenomeno psico-organizacional FHOS

MTO, Accimap, STAMP, TRIPOD, MAPA, Análise Organizacional do Evento

Quadro 1 – Abordagens teóricas das análises de AT

É difícil encontrar estas abordagens inovadoras nas investigações dos acidentes em geral, mas é cada vez mais comum encontrar a relevância dos fatores humanos e organizacionais na discussão dos eventos mais graves, daqueles casos que têm um maior impacto para a sociedade e que requerem uma investigação profunda independente e externa às empresas onde acontecem os AT. Alguns exemplos de investigações ampliadas no setor de petróleo serão mostrados na continuação.