Esclarece Fernando Antonio de Vasconcelos :
"Com a República, ganhou o Ministério Público
nova feição. Através do Decreto n 5 848, de 11
de outubro de 1890, que organizou as bases re - formistas da Justiça do País e, posteriormente,
com o Decreto n e 1.030, de 14 de novembro do
mesmo ano, que estruturou a Justiça do Distrito
Federal, foi o Ministério Público reconhecido
como órgão institucional. E Campos Salles, como Ministro da Justiça, apregoava ser o Ministério Público uma Instituição necessária à organiza -
ção democrática, advogada da lei e fiscal de
sua execução. Para isso apresentou projeto-de -
lei que outorgava vitaliciedade ao Procurador
Geral e nomeação por quatro ano dos Procurado - res Seccionais, com direito a inamovibilidade'.' Campos Salles é por isso considerado o Patrono do M i nistério Publico no Brasil.
A primeira Constituição republicana de 1891, frustrou as expectativas. Limitou-se a se referir ao Procurador Geral da República, no Título do "Poder Judiciário" (a r t . 58, §2^, ape -
nas para dizer que o mesmo seria designado pelo Presidente da
República, dentre os membros do Supremo Tribunal Federal, e que suas atribuições seriam definidas em lei.
"Era uma situação curiosa a de juizes transformando - 115
se em membros do Ministério Publico'.'
Antes da segunda Constituição Federal, coube a São
Paulo, após a Revolução de 30, a primazia de aperfeiçoar a Ins
tituição. Laudo de Camargo, na qualidade de Interventor Fede -
r a l , expediu o Decreto n^ 5.197, de 1931, reestruturando o Mi - nistério Publico paulista, assegurando-lhe garantias de estabi lidade; de acesso, estruturando-lhe a carreira.
114
114. VASCONCELOS, Fernando Antonio de. Posição do Ministério
Público na Constituição .
Teses
do6 S
Congresso Nacional do
Ministério Publico, jun/86, p. 56.
115. FERREIRA, Sérgio de Andréa. Princípios institucionais
82
A Constituição de 1934, reservou ao Ministério Publi co, a Seção I, do Capítulo VI (artigos 95 a 98), localizando - o antes do Tribunal de Contas e dos Conselhos Técnicos, conferin do-lhe a natureza de "Órgão de Cooperação das Atividades Gover
namentais1.1 Cuidou do Ministério Publico junto aos Juízos Co -
muns, perante as Justiças Especializadas de que tratava (Mili -
tar e Eleitoral), junto à Justiça do Distrito Federal e dos
Territórios e do Ministério Publico dos Estados.
Nos Estados o Ministério Publico foi organizado com
grandes disparidades de tratamento . Em muitos casos as nomea -
ções eram feitas livremente, sem se observar a exigência de
concurso público previsto para o Ministério Público Federal.
Também foi criado o tratamento no tocante a relação
do Ministério Público frente aos poderes do Estado: "ora eram
considerados de "órgãos do poder judiciário", ora de "auxilia - res da administração da justiça", ou ainda, de "agentes do Po -
116 der Executivo'.1
Também foram desiguais de Estado para Estado, os crité - rios sobre as garantias de estabilidade, promoções, vencimen tos, etc., situação que se agravou no período do Estado Novo.
A Carta Constitucional de 1937, seguindo o exemplo de 1891, limitou-se tratar a Instituição esporadicamente: o art 99, versava sobre o Chefe do Ministério Público Federal; o art. 105, previa a participação de membros do Ministério Público na
composição dos Tribunais Superiores; o parágrafo único do art.
109 criava a possibilidade de se cometer ao Ministério Publico dos Estados a função de representar em juízo a Fazenda Federal.
A Constituição de 1946 deu ao Ministério Público lu - gar de destaque, reservando-lhe o TÍtulo III (arts. 125 e 128), atitude jurídico-constitucional que muito haveria de contribuir para a valorização da Instituição.
1 1 6 .VASCONCELOS, Fernando Antonio de. Posição do Ministé -
rio Público na Constituição."IN" Revista da Teses do 6 a Con gresso Macional do Ministério Publico, j u n / 8 6 , p . 5 7 .
Dessa vez o Constituinte consagrou diversos princípi os, que se firmam como conquistas definitivas: a) a instituição em carreira; c) a obrigatoriedade do Concurso para ingresso; c) a estabilidade; d) o acesso de entrância em entrância; e) a ir- removibilidade relativa.
É importante notar que, pela primeira vez, o texto da Constituição Federal traçava normas gerais que deveriam ser o -
bedecidas na organização dos Ministérios Públicos da União, do
Distrito Federal, dos Territórios e dos Estado, tornando visí - vel a intenção da criação de um Ministério Publico, prevenindo, quanto ao básico, as conseqüências advindas do texto constitu - cional de 1934.
Não se pode negar que o Ministério Publico saiu re forçado da Constituinte de 1946. Todavia, muitos aspectos nega tivos, perduraram.
0 Ministério Publico, a despeito de receber um título
próprio na Constituição, sugerindo a idéia de autonomização ,
continuou atrelado ao Poder Executivo. 0 Chefe do Ministério
Publico Federal não deixou de ser cargo de confiança do Presi - dente da República. Seria nomeado pelo Presidente da República
e, depois de aprovada a nomeação pelo Senado Federal (por que
não pelo Congresso Nacional ou pela Câmara dos Deputados?), po deria ser demitido "ad nutum". Os integrantes do Ministério Pú blico da União continuavam sendo os advogados do governo, lem - brando os "les gens du roi", e para os integrantes do Ministé - rio Público dos Estado-membros se previa a tarefa de "advoga rem" em favor do governo federal. Dessa maneira pecava-se cons titucionalmente contra a independência do Ministério Público Isso tudo agravado pelo fato de não se prever autonomia finan - ceira da instituição.
Em vista desses dados que o texto constitucional de
1946 põe à disposição do analista, entendemos que se pode questio nar seriamente o discurso exageradamente otimista de alguns au
84
"Nasceu deste modo o que se pode chamar de Inde
pendência da Instituição, que foi mantida até
essa data, pelas Constituições seguintes, pa
tenteando um Ministério Publico soberano no
cumprimento legal para com a sociedade e a jus- tiça'.' 117
A Carta de 1967 reservou ao Ministério Publico uma
Seção (a IX - artigos 137 a 139) do Capítulo destinado ao Poder Judiciário.
Fernando Antonio de Vasconcelos sintetiza os princi pais pontos sobre o Ministério Publico contidos na Constituição de 1967.
"- A lei federal incumbe organizar o Ministério Publico Federal, o da Justiça Comum,Militar, e- leitoral e do trabalho.
- É a lei, constitucional ou ordinaria estadual
que, organiza a justiça e o Ministério Pu
blico estaduais.
- À lei federal compete organizar a Justiça do Distrito Federal.
- Não há exigência de que o Procurador Geral da
República, seja membro do STF e é demisivel
pelo Presidente da República.
- Ao Ministério Público local podem ser delega das funções federais.
- A equiparação do Procurador Geral do Estado -
Membro ao cargo de Desembargador, bem como a
promoção de entrância á entrância estão assegu radas .
- A estabilidade é assegurada somente após dois anos de efetivo exercício do cargo.
- 0 Ministério Público dos Estados (bem como o federal) será organizado em carreira.
- Regras são estabelecidas sobre a aposentado - ria e percepção de vencimentos'.1118
119
Para Jose Diogo de Almeida Magalhaes , a colocaçao
117.LIMA PEREIRA, Almir de. 0 ministério público e a le
gislação patria. Jmstltia, vol.87, p. 208.
118. VASCONCELOS, Fernando Antonio de. Posição do Ministé -
rio Público na Constituição, Rev. de
Teses
do 6 9Congresso
Nac.Ministério Público. jun/86, p . 59.
119 ALMEIDA MAGALHÃES, José Diogo de. "Jus", "IN", Revista
do Ministério Publico junto áo Poder Judiciário representou um avanço.
120
Ja no entender de Sergio Ferraz , essa alteraçao nao
traduzia o reflexo de qualquer princípio doutrinário, posto que na prática permaneciam inalteráveis os limites da ação do Mi nistério Público. Registra esse autor que essa inserção, no en tanto, trouxe vantagens materiais aos membros da Instituição co mo aposentadoria compulsória ao setenta anos e facultativa aos
trinta anos de serviço, com vencimentos integrais, fixação do
percentual nos vencimentos de uma para outra entrância. Con cluindo o seu pensamento afirma que essa inserção no Ministério
Público no Capítulo do Poder Judiciário é muito mais aparente
do que efetiva.
Por sua vez Pontes de Miranda pensa que "a colocação
do Ministério Público no Capítulo VIII, que cogita do Poder
Judiciário, prende-se, mais na forma do que na substância, a
esse conceito exaltado do Ofício do Ministério Público. Frisou- se a sua auxiliaridade à Justiça'.'
As críticas, mais que as falas de adesão, parecem es tar bem fundamentadas.
Comete-se contra o Ministério Público em 1967 os mes mos ataques à sua verdadeira independência.
"De fato, todas as atribuições da instituição a levam a estar mais próxima do Executivo do que do Judiciário, mesmo porque a chefia da organi
zação é de livre nomeação do Chefe do Poder
Executivo (art. 138) observadas somente "os re quisitos indicados no art. 113, §1, como também não há para a mesma nenhuma garantia durante o mandato pois a sua permanência no cargo vai de pender igualmente do Executivo, tanto na esfera federal como na estadual'.' 122
120.FERRAZ, Sérgio. 0 Ministério Público na Constituição Es
tadual de 1967, "IN", Jiustltla, Revista do Ministério Público
do Estado de Sao Paulo, n.61, p . 149.
121. MIRANDA, Pontes de. Comientários à Constituição de 1967
Tomo, IV, Ed. Revista dos Tribunais, 1967, p.
86
Em 17 de outubro de 1969, o regime militar, impõe ao
país uma nova ordem constitucional, já que a Emenda Constitu cional n. 1/69, enxertou na Carta de 1967 cerca de duzentas al
terações, sobressaindo do seu bojo o forte tom autoritário e
o fortalecimento do Poder Executivo (Presidência da República).
Nesse contexto o Ministério Público ocupou a Seção
VII do Capítulo VII, sobre o Poder Executivo. Para melhor não
houve alterações. Para pior, sim: a nomeação do Procurador-Ge -
ral da República voltou a ser ato exclusivo do Presidente da
República, como em 1891 (Art. 95); silenciou quanto a aposenta doria, após trinta anos completos de exercício de serviço pú blico, e quanto à paridade de vencimentos em relação aos juí
zes. Também foi omissa no tocante à fixação do percentual dos
vencimentos de uma para outra entrância. No restante, manteve o
já estatuído no regime jurídico-constitucional de 67: ingresso
à carreira por concurso público de provas e títulos ; estabili dade após dois anos de efetivo exercício do cargo; inamovibili dade relativa, acatamento ao princípio federativo de reconhe cer aos Estados-membros a faculdade de organizar o Ministério PÚbliço local. Continuou o mutismo quanto à autonomia financei
ra da Instituição.