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CAPÍTULO I O LUGAR DO CORPO

1. Perante o olhar do outro: o ambiente escolar

"E se nada do que respeita à identidade se inicia na adolescência, esta é certamente a altura de reformular um passado e construir um futuro" (Sampaio, 1995: 160)

Como refere Outeiral (1994), a escola não oporruniza somente a relação com o saber: ela tem também funções de socialização. A escola possui a sua própria cultura e especificidades, que como nos diz Sampaio (1995: 210), tem "uma espécie de personalidade e de «maneira de ser» que lhe é própria". Pensar na escola exige, antes de mais, que seja ajudada a analisar-se a si própria a partir do seu contexto sócio-cultural. E porque as escolas têm culturas diferentes, não podemos deixar de considerar que, do mesmo modo, ela se apresenta com significados diferentes de adolescente para adolescente (Peixoto et ai.: 2001). É neste espaço que o(a) adolescente passa a maior parte do seu tempo, pelo que vamos procurar esquadrinhar os "espaços" e os "lugares" escolares onde os corpos vivem, percorrem e ocupam, detendo-nos naqueles que neles habitam, percebem e sentem todos os seus movimentos.

1.1.0 espaço físico escolar

Começamos por pensar na escola enquanto espaço físico e imaginar o conforto que esta proporciona aos/às nossos(as) adolescentes. Podemos recordar Sampaio (1996b) que nos apresenta diversos panoramas de espaços escolares que visitou entre Lisboa, Alentejo e na ilha Açoriana de S. Miguel. O autor teve a oportunidade de se confrontar com espaços escolares degradados de tal modo que a expressão pelo autor utilizada basta para percebermos até que ponto se torna chocante: "julguei estar em Sarajevo". Perante esta confrontação questiona se "será possível alguém ensinar a

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aprender naquele gelo emocional" {ibid.: 19). Mas também pôde encontrar espaços escolar que espelhavam brio, envolvimento e afecto, com grandes espaços verdes, plantas interiores, flores, esculturas e quadros e até simpáticas esplanadas. Reconhecemos como essencial que "a escola necessita de ser um local minimamente agradável para que as pessoas se sintam lá bem", como Sampaio o afirma (ibid.: 17).

Importa questionar, parafraseando o autor, mesmo nestes espaços "ditos agradáveis", porque é que em muitos deles é proibida a passagem ou permanência dos alunos ou até a sua participação e envolvimento na sua manutenção. É que por vezes podemos encontrar escolas com regras severas quanto à ocupação, por parte dos adolescentes, de determinados espaços livres onde o lazer não é contemplado, como ouvir música, jogar "matrecos" ou bilhar.

A música "característica da idade", como heavy metal, tecno, rap e rock constitui- se muito importante nesta fase da adolescência. Os grupos e bandas representam-se normalmente como ídolos para os adolescentes com os quais se identificam. Podemos encontrar esta identificação representada nos seus comportamentos, que procuram imitar, projectando o "estilo" de forma tão maciça, determinada personagem que parece ter assumido a sua identidade na sua forma de vestir, na sua forma de falar, seus maneirismos, etc. Podemos do mesmo modo encontrar seus cadernos escolares encadernados com folhas de revistas destes ídolos que "chocam" os professores e as professoras.

Os adolescentes estabelecem pontes de identificação com estas bandas musicais e também com os temas que algumas delas desenvolvem, salientando o cariz revolucionário, a "revolta" pelas normas sociais, a "provocação" à moral e aos valores vigentes, ou a forma como abordam a morte, a guerra, a solidão, a exclusão, a pobreza e o sofrimento. Também a forma como estes temas são representados em vídeo clips confunde o mundo dos adultos, divididos entre a actividade musical como uma arte criativa e original de expressão de sentimentos e o seu marginalismo porque são "diferentes", porquanto representam a "anormalidade" reprovável socialmente.

Sempre "altíssima", a música para o adolescente permite-lhe "entrar no seu mundo" de tal forma como se do "mundo exterior" se quisesse separar. Esta íntima relação, quase que de uma cumplicidade "dependente", demarca o início da adolescência e prossegue na fase seguinte como interesse fundamental da sua vida. Vemo-los alheios no espaço escolar com os walkman ou, mais recentemente, com os

discman gritando onde a onde pedaços das músicas que estão a ouvir, ou baloiçando o

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corpo entrando "na onda". Nem sempre este "tipo" de comportamento - "nas nuvens" - alheio a tudo e a todos, é compreendido pelos professores e professoras. De entre as muitas histórias para contar, podemos salientar aquelas em que são surpreendidos em sala de aula, quando disfarçadamente desejam parecer atentos. Isto vai durando até aquele momento em que são descobertos ou porque "se passaram" ou porque o "dito" professor ou "dita" professora os provocou com aquela indesejada e fatal pergunta seguida da habitual repreensão moral e/ou corporal que muito os envergonha perante os colegas.

Será justo valorizar as escolas que valorizam o "tipo de música" como actividade importante para o desenvolvimento do adolescente. Temos conhecimento da existência de projectos musicais liderados pelos adolescente quer dentro da escola quer junto da comunidade (como por exemplo da rádio). Também podemos já assistir a escolas que se esforçam por criar espaços físicos de lazer onde podem ouvir a "sua música" e ensaiar com o seu grupo musical.

Podemos falar também do futebol ou apenas de uns "chutos" durante os intervalos, grande paixão dos rapazes e também das raparigas (onde em algumas esta actividade ainda não é reconhecida como feminina). Mas o conflito dos vidros partidos é uma "praga" e por tal a solução são as restrições. Esta questão pode ser resolvida, de forma inteligente e prática, colocando redes em todas as janelas como determinada escola o fez, conta-nos Sampaio. É que, para esta, certamente os espaços lúdicos e actividades desportivas propiciadoras do bem-estar dos seus alunos durante o seu recreio são entendidos como uma necessidade favorecedora do desenvolvimento.

Não esquecendo a sala de aula Sampaio durante a sua visita encontrou-a "pobre e triste sem algo que a torne num espaço um pouco mais pessoal" (ibid. : 72).

Finalmente o espaço mais recôndito da escola e paradoxalmente o mais visitado e utilizado - a casa de banho. A vulgar e quase habitual falta de condições físicas e de higiene, além das "bocas" que podemos lá encontrar nas suas paredes e portas (se existirem) parece já não afectar ninguém do mundo dos adultos (mesmo aqueles que promovem em sala de aula a "dita" Educação para a Saúde).

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1.2. O espaço de sociabilidades

À semelhança de vários países ocidentais, em Portugal a escola constitui um espaço onde os nossos adolescentes passam a maior parte do seu tempo diário e por conseguinte constitui um lugar privilegiado para a formação de grupos de pares.

Alguns estudos feitos no nosso país revelam a existência de uma cultura diferenciada dos jovens sobre a escola. O estudo realizado por Peixoto et ai. (2001: 91) dá-nos conta que para uns a escola está orientada para os valores e regras de conduta dentro da mesma; outros respeitam menos e interessam-se menos pelo trabalho em sala de aula. De um lado podemos encontrar o grupo voltado para o sucesso académico submetendo-se à autoridade dos adultos (pais e professores) e do outro, mais irreverente, o grupo voltado para a obtenção do prazer.

Um outro estudo em escolas do nosso país, efectuado por Machado Pais (1998: 210), sobre grupos juvenis e modelos de comportamento em relação à escola revela que os jovens, comparativamente a dez anos atrás (1987), se encontram "bastante mais satisfeitos com a escola; mais satisfeitos com o convívio que têm com os colegas; mais satisfeitos com as instalações e equipamentos; mais satisfeitos com a cultura geral e conhecimentos adquiridos; e até com a preparação que a escola dá para a vida profissional". Segundo os resultados deste estudo, Machado Pais diz-nos ainda que estes jovens pensam "que a escola desempenha melhor as suas funções: que escolhe os

melhores e mais capazes; que desenvolve espírito crítico e criatividade; que proporciona convívio; que forma cidadãos para a vida social; que diminui as desigualdades sociais, etc." (ibid.: 210). E assim o autor termina reforçando que é aceitável os jovens se

encontrarem satisfeitos com a escola que os reprova (60% dos jovens já haviam

reprovado pelo menos uma vez) uma vez que a escola se constitui para eles como um desses espaços simbólicos de reconhecimento, afirmação e realização pelas sociabilidades que possibilita.

Como refere Sampaio (1996: 23), "as escolas do futuro (...) vão ser cada vez mais não só locais de estudo mas também de convívio". Neste sentido, o autor afirma que "o grupo adolescente desempenha uma função de catalizador do crescimento individual e de permanente aglutinador e protector face a uma ameaça externa" (ibid.: 107). É no grupo que os adolescentes realizam a troca de experiências, a partilha de sentimentos comuns e de problemas idênticos sem a interferência dos adultos, é o grupo que lhes permite adquirirem valores e competências que orientam o seu comportamento (Peixoto - 1 2 6 -

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et ai, 2001). Vários são os autores e teóricos que defendem a importância que a

pertença a determinado grupo possui para o processo de socialização dos adolescentes, dos quais pudemos destacar no capítulo anterior Erikson. Segundo Machado Pais (1996: 90), uma das razões desta importância poderá estar relacionada com "vazios de sociabilidade deixados por outras instituições como a família e a escola".

1.3. O espaço do prazer sob suspeita

Quanto às experiências vividas mais marcantes em contexto escolar, Louro (1999c) salienta que "as marcas que nos fazem lembrar, ainda hoje, têm a ver com as formas como construímos nossas identidades sociais, especialmente a nossa identidade de género e sexual". Mas, como temos vindo a analisar, o cinema, a televisão, as revistas e a publicidade também exercem sua pedagogia, como guias mais confiáveis para nos dizer como é ser uma mulher ou homem desejável e é inegávela sua influência na construção da representação do corpo ideal, à qual nos tentamos aproximar. Ao poder e influência dos media relativamente à questão da sexualidade na adolescência denominamos de "pseudo-educação sexual" porque eles ocultam a verdade, distanciando cada vez mais a imagem real do corpo e seu desempenho da imagem corporal ideal (ou até virtual). Por sua vez a escola pretende, a todo o custo, desviar o interesse para outros assuntos, não discutindo estas questões com que diariamente os adolescentes se confrontam. Negando a presença do corpo, seus movimentos, sua criatividade, sua atenção prazerosa, sua exaltação ou sua ocultação, seu sofrimento, seu abandono, etc., a escola mantém-se silenciosa. Pinto (1996) realça o facto de a pedagogia não valorizar a história, o passado, procedendo a ocultações. Trata-se de uma cumplicidade implícita e explícita de aceitação da dessexualização do espaço escolar. Reafirma Louro (1999b) que "na escola, pela afirmação ou pelo silenciamento, nos espaços reconhecidos e públicos ou nos cantos escondidos e privados, é exercida uma pedagogia da sexualidade legitimando determinadas identidades e práticas sexuais, reprimindo e marginalizando outras". Os corpos movimentam-se entre os espaços do contexto escolar e neste movimento produzem inegavelmente sexualidade.

Entre outras instâncias, a escola é o mentor de uma pedagogia da sexualidade, que Louro designa de "tecnologias de autodisciplinamento e autogoverno". Espera-se, segundo a autora, determinado comportamento e atitude, existindo em torno desta exigência determinados tabus sobre a expressão de determinados sentimentos e emoções -127-

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característicos dos homens e das mulheres, no quadro da "normalidade". Aqueles que se desviam desta "normalidade" ficam marcados, ao ponto de alguns carregarem um corpo negado, reprimido, estigmatizado perante uma instituição que o trata como vítima, coitado, ou sabido, perigoso. Fixa-se uma identidade "normal", articulada a um único modelo de identidade: a identidade que emerge pela existência de "outro" a quem se rejeita.

À semelhança da "transferência" dos impulsos, agressividades, fantasias e emoções dos adolescentes de casa para a escola, sendo os professores e professoras os seus "recipientes" (tal como acontece com os pais), temos que contar também com a transferência de sentimentos amorosos. Outeiral (1994: 38-39) lembra que os professores e professoras são muitas vezes os primeiros objectos de "amor edípico" ocorrendo a transferência amorosa. Este sentimento (incestuoso) acarreta no ou na adolescente sentimentos de culpa, vergonha e ansiedade, podendo revelar o interesse súbito de aprender ou ao contrário o desinteresse pela matéria.

Durante a fase grupai vivida na adolescência podemos encontrar um período predominantemente de um sexo só, um segundo com a entrada já de alguns elementos do sexo oposto, e um terceiro de namoros entre os membros. O "curtir" (na gíria dos adolescentes) passará numa outra fase para o "andar com", podendo o grupo fragmentar-se quando o envolvimento afectivo-sexual se torna mais marcado e formarem-se pares de namorados. O namoro constitui uma grande preocupação dos professores e professoras na escola quando se deparam com o surgimento destas experiências. Sampaio apela a que se dê espaço para que os adolescentes possam manifestar e desenvolver os seus afectos sem serem controlados. Estes pedem não só espaço, mas também aceitação, discrição, tolerância e respeito pela privacidade, pelo que pensamos que os professores e professoras devem, tal como os pais, sentir este apelo como dirigido a si, que devem acompanhar mas não controlar excessivamente e poupar-se a comentários que os coloquem em embaraço. Trata-se de tarefas fundamentais, conseguidas com avanços e recuos como nos refere Erikson (1976a), em que o corpo é essencial na construção da identidade pessoal e sexual e formação da sua personalidade.

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1.4. O espaço de "ataques" corporais

Sá (2002: 88-90), ao referir-se a riscos na adolescência, diz-nos que hoje, tão preocupados que estamos com os riscos em geral, que no que se refere especificamente aos nossos adolescentes devemos questionar-nos sobre a forma como os expomos ao querermos tanto protegê-los. Na verdade são vários os riscos que tememos que eles corram, mas mais especificamente os consumos de tabaco, de drogas e de álcool baseados no argumento das suas consequências para a saúde do adolescente (com o corpo ainda em desenvolvimento). Mas desta vez não vamos analisar este ponto de vista. Vamos, sim, seguir o pensamento de Sá, ao colocar a questão dos riscos que, tendo a ver connosco, se tornam em riscos para eles. O autor enuncia um conjunto de

riscos para que não se confunda prudência com fobia - porque "os riscos não são

obrigatoriamente maus", mas sim a "exigência obsessiva de não os correr e a impulsão para os correr compulsivamente". Trata-se, por exemplo, do 4o risco assim enunciado

pelo autor como o apresenta o autor: "o da adolescência de quem nunca foi adolescente e precipita os adolescentes para os riscos que não correu, e de quem, tendo sido adolescente, quer interditar aos adolescentes todos os riscos que desafiou".

Estar com um adolescente significa muitas vezes ser "inoculado" pela confusão que o adulto desperta neste e este no adulto - identificação projectiva. Com isto pretendemos realçar a importância que, tal como os pais, o professor e a professora têm no processo de identificação dos adolescentes. Por outro lado "esta confusão" é "contagiante" para todos os que convivem com eles. Ou seja, o professor ou a professora, conforme tenha vivido a sua adolescência, ao identificar-se com os adolescentes, este acontecimento faz com que "adolesça". Pode apresentar dificuldades, sentimentos e condutas adolescentes adormecidos até então, e fantasias que podem representar "crise" maior ou menor que tanto significa risco como oportunidade (Outeiral, 1994: 73).

Deveremos entender que a criatividade na adolescência, que inicialmente se poderá revelar impulsiva, difusa e incompreendida aos olhos de muitos dos adultos, irá necessitar, durante um determinado período de transição até ser integrada com um perfil mais nítido, de um ambiente favorecedor que lhe permita suportar estas tensões. À semelhança da família, a escola deve constiruir-se como um meio securizante, quase que "ansiolítico", na gestão destas tensões. O que se deseja é que a escola seja capaz de

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"oferecer" aos adolescentes determinados "limites" corporais (Outeiral, 1994: 34). Outeiral apresenta o conceito de limite como algo que se opõe à utilização dos termos que habitualmente são imbuídos de conotação negativa, a "repressão", a "proibição". Defende então o autor que limite é algo que significa "a criação de um espaço protegido dentro do qual o adolescente poderá exerce a sua espontaneidade e criatividade sem receios e riscos". Por outro lado, defende que a "falta de limites impede o adolescente de exercitar sua capacidade de pensar, de ser criativo e espontâneo" (ibid: 35).

É comum assistirmos a frequentes queixas dos professores relativamente à violência e aumento da agressividade com que se deparam nos recreios e, mais incomodativo ainda, na sala de aula. Segundo eles, os adolescentes ficam quase que "histéricos" com brincadeiras "estúpidas", aos "empurrões", aos "puxões", acabando por vezes por se magoarem (aos olhos dos adultos, na maioria dos casos). Este tipo de comportamento revela uma necessidade incrível que o adolescente possui do contacto corporal entre si e o(s) outro(s). Não menos habitual é "cantarolarem" slogans provocadores de ataque a determinados aspectos físicos, principalmente aos "gordinhos" ou com qualquer aspecto físico "diferente".

Parece que as medidas disciplinares, a acusação do "tipo de educação que a família dá" ou até mesmo ajuizar sobre o "tipo de ambiente familiar" que possuem, não parece constituir-se como um limite adequado. A sugestão proposta por Outeiral é então criar o tal espaço e um tempo protegido que proporcionem substituir a agitação pela verbalização dos conflitos; e só um "professor sensível e arguto poderá ajudar os púberes nesta sua difícil "estrada" rumo ao desenvolvimento" (ibid.: 34). Determinar limites exige envolvimento do professor ao ponto de saber "conter" o adolescente, suportar suas acusações, reclamações e protestos.

Importa conhecer quais os limites entre comportamento de uma adolescência saudável - que comporta alguns actos paradeliquentes como situações episódicas inerentes ao desenvolvimento - e comportamento anti-social - que inclui uma diversidade de actividades como furtos, agressões, vandalismo, associadas a transgressões ou violações de normas ou de expectativas sociais (Sá, 2002: 64). Este tema merece um aprofundamento que de momento apenas desejamos questionar porquanto teríamos que compreender o contexto familiar em que estas crianças se desenvolveram, num clima onde a ausência de vinculações seguras lhes criaram carências graves de autonomia.

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Ainda na mesma linha de pensamento, interessa igualmente debater a questão da violência nas escolas como "fenómeno universal nas sociedades, culturas e ao longo da história" (Cordeiro, 2002: 631) tendo em conta que só recentemente em Portugal nos

despertamos para o assunto e nos mobilizamos pais, professores, Conselhos Directivos, polícia, governantes, etc. Segundo Cordeiro "nas formas mais inocentes, a violência consiste basicamente em ridicularizar e humilhar todos os que são diferentes do grupo ou, simplesmente, os mais novos e fracos, escolhendo bodes expiatórios entre os alunos e dentre os professores ridicularizando-os com alcunhas" (ibid : 64). Os actos descritos pelos alunos consistem em realizar comportamentos humilhantes e coercivos, algumas vezes para com outros colegas da turma, sob ameaça de exposição e tortura corporal, extorsão de dinheiro, roupas, haveres pessoais de valor, cigarros de luxo, etc. Provocando perturbações graves físicas e mentais na vítima, isso pode originar o sentimento de isolamento, solidão e rejeição pelo grupo. O autor assegura que estas ocorrências acontecem em todas as escolas, mas contam com a cumplicidade ou silêncio dos professores, impotentes e incapazes de intervirem ou até porque consideram como um comportamento normal. A vitimização tanto pode ser de aluno para aluno, como de professor para aluno e de aluno para professor. Existem normalmente também

testemunhas silenciosas que presenciam e são obrigadas a não denunciar. Vários são os

estudos em países como Escandinávia, Grã-Bertanha, EU, Japão, apresentados pelo autor, que mereceram a implementação de projectos de intervenção precoce.

Ainda a propósito da violência, parece-nos não menos importante dar alguma atenção à Praxe. Segundo Cordeiro, a praxe2 "mesmo sendo levada a cabo sob o álibi de

uma actividade meramente lúdica e consuetudinariamente lícita", é mais uma situação em que o jovem "vê calcados direitos fundamentais", tanto mais grave e perigosa quando todos somos sorrateiramente coniventes. Chega-se a situações de humilhação corporal e física e situações de violência quando os caloiros se recusam a ser "praxados"

(ibid.: 71).

1 Tema adaptado pelo autor de Bullying, Revista ECO 2000, de Professor Doutor Miroslaw Dabkowski,

(médico psiquiatra - Polónia).

2 Tema adaptado pelo autor de Praxe e Violência, Revista ECO 2000, de Dr. Jorge Estima (advogado).

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2. Espaço da disciplina versus Eros na sala de aula

É crucial que aprendamos "a entrar na sala de aula inteiros" dando lugar "à