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Percurso da pesquisa: interesse pelo tema na graduação, na militância e no exercício

A autora do presente trabalho passou a se interessar pelas questões de gênero a partir do sexto semestre da graduação, quando, com um grupo de estudos, formulou uma pesquisa sobre a violência contra a mulher, apresentada para a disciplina de Oficina em Serviço Social, a qual era ministrada articuladamente com a disciplina de Fundamentos Históricos, Teóricos e Metodológicos do Serviço Social.

Após este primeiro trabalho, a autora teve a oportunidade de conhecer o Grupo de Mulheres e Diversidade Sexual Pão e Rosas40

, por meio de algumas estudantes da Faculdade Paulista de Serviço Social de São Caetano do Sul (Fapss/SCS), que levaram as militantes desse coletivo para uma apresentação sobre o Centenário do Dia Internacional da Mulher. Esta pesquisadora interessou-se pelo referido Grupo, nele inserindo-se posteriormente; a aproximação com esse coletivo ocorreu a partir de seu núcleo no ABC, composto por

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O Grupo de Mulheres e Diversidade Sexual Pão e Rosas é vinculado à Liga Estratégia Revolucionária – Quarta Internacional (LER-QI), uma organização impulsionada pela Fracción Trotskista Cuarta Internacional (Fração Trotskista Quarta Internacional), entidade internacional de luta revolucionária dos trabalhadores, signatária dos preceitos de Leon Trótski. O Pão e Rosas tem como estratégia de luta a denúncia do patriarcado no contexto capitalista e a defesa das mulheres trabalhadoras, englobando aquelas que pertencem aos segmentos mais explorados, como as funcionárias terceirizadas e temporárias, abarcando, ainda, em seus debates a questão das mulheres negras e da discriminação à população LGBT, sempre na perspectiva socialista.

estudantes da Faculdade de Filosofia e Letras (Fafil), pertencente à Fundação Santo André (FSA), universidade privada, mas fundada pela Prefeitura do Município de Santo André.

Por meio dessa participação, a pesquisadora teve condições de formular, no quarto ano de faculdade, boa parte da concepção política implícita (e explícita) em seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), cujo título foi O Papel do Assistente Social em Ações

Socioeducativas para Mulheres Vitimizadas.

A pesquisadora permaneceu nesse coletivo por um ano, saindo, posteriormente, para o Movimento Mulheres em Luta (MML), vinculado à CSP-Conlutas41, do qual se desligou recentemente. Esse coletivo é composto por várias militantes do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU), bem como por outras correntes de esquerda.

Enquanto isso, a autora realizou o curso de Promotoras Legais Populares (PLPs), organizado pela União de Mulheres de São Paulo e pelo Coletivo Dandara, composto por estudantes de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Além disso, passou a trabalhar como assistente social, a partir do mês de outubro de 2011, dez meses após sua formatura. A primeira instituição que a empregou foi o Centro Regional de Atenção aos Maus-Tratos na Infância (Crami), onde atuou por três meses, na cidade de São Bernardo do Campo/SP, atendendo crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica (psicológica, física, sexual, etc.) e seus pais e mães, os/as quais, algumas vezes, eram os atores que perpetravam as violências citadas.

Após esse período, a autora trabalhou como assistente social em um Pronto-Socorro, também na cidade de São Bernardo do Campo; depois de um mês nesse emprego, foi convocada para trabalhar no Ministério Público do Estado de São Paulo, após ter passado em concurso público. Atualmente, a pesquisadora exerce cargo de Analista de Promotoria I – Assistente Social, no Ministério Público do Estado de São Paulo, onde compõe, com outros/as assistentes sociais e psicólogos/as, o Núcleo de Assessoria Técnica Psicossocial (NAT).

A denominação do cargo desempenhado, conforme registros quando da admissão e na carteira funcional, demonstra a natureza do trabalho da pesquisadora nesse espaço sócio- ocupacional: como assistente social, realiza visitas (domiciliares e institucionais) e estudos sociais (de casos individuais e institucionais), com psicólogos/as e outros/as assistentes sociais, com vistas à elaboração de pareceres técnicos, separados quanto às especificidades de

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Central sindical oriunda do Congresso da Classe Trabalhadora (Conclat) de 2010, originária da cisão entre as Centrais Intersindicais e a Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas). Porém, a fração da Intersindical que se uniu à Conlutas passou a ser denominada Central Sindical e Popular (CSP), enquanto outra fração da Intersindical, que não se uniu a essa fusão, permaneceu com o velho nome.

ambas as profissões, como resposta às solicitações de promotores/as de justiça do Ministério Público Estadual.

O interesse por esse tema partiu do fato de o feminismo socialista acompanhar, de alguma forma, a intervenção profissional da autora deste trabalho, por meio da concepção de mundo que caracteriza o ideário transmitido por movimentos dessa natureza. Em 2012, a equipe técnica do NAT, da subárea de Direitos Humanos, fez visitas institucionais aos Centros de Acolhida, voltados à população de rua adulta, da cidade de São Paulo. Assim, pôde-se perceber que algumas instituições demonstraram, a partir da fala de gerentes e técnicos (assistentes sociais ou psicólogos/as), a inobservância das especificidades do público feminino42

em seu trabalho cotidiano, o que corrobora para a violação de alguns de seus direitos43. Isso fez a pesquisadora pensar sobre quais os limites e as possibilidades para que

as/os assistentes sociais pudessem desenvolver, em seu cotidiano profissional permeado por péssimas condições de trabalho, baixos salários e insuficiente articulação entre as políticas intersetoriais, atividades com o público feminino, visando à contestação de sua subalternização nas vias públicas, na família, no mundo, etc.

Assim, esta pesquisa teve o objetivo de analisar se o feminismo socialista interfere no trabalho cotidiano das assistentes sociais que militam em movimentos dessa natureza. Para tanto, foram elencados os seguintes objetivos específicos: compreender se a militância nesses espaços contribui para a educação permanente de tais assistentes sociais; apreender as lacunas na formação profissional acadêmica, quanto ao trato desse tema; entender se as assistentes sociais feministas têm colocado em prática, no seu trabalho profissional com a população usuária dos serviços em que atuam, os elementos libertários presentes no ideário feminista socialista, ante o contexto institucional em que se apresenta o seu espaço sócio-ocupacional; analisar quais os avanços do debate sobre gênero e classe, no curso da profissão, após a renovação do Serviço Social, e como as assistentes sociais entrevistadas veem esse processo.

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De acordo com as análises elaboradas pela equipe técnica do NAT do Ministério Público do Estado de São Paulo, após as visitas realizadas aos Centros de Acolhida e às Tendas (Espaços de Convivência para Adultos em Situação de Rua), pôde-se perceber que as mulheres em situação de rua estão expostas de maneira ainda mais cruel ao machismo, ao racismo e à lesbofobia.

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Em alguns serviços, não era realizado trabalho socioeducativo para que as mulheres pudessem refletir sobre as relações desiguais de gênero e de classe em que se inserem. Além disso, o desconhecimento, por parte de alguns serviços destinados à população de rua, do atendimento prestado pelos Centros de Referência da Mulher dá conta de que, mesmo tendo sofrido violências que as levaram à situação de rua, as mulheres atendidas não eram alvo de trabalho técnico conjunto, que pudesse fortalecê-las em sua luta contra o machismo e suas péssimas condições de vida.