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O perfil da escola e da professora B1

2. Procedimentos de leitura dos professores de História em sala de aula

2.4. O perfil da escola e da professora B1

Esta escola é a mesma do item anterior, da professora B. Por isso, prosseguiremos somente com os dados desta professora denomina B1.

A professora informou que é formada em Estudos Sociais, com licenciatura em História, possui pós-graduação, lato sensu, em Estudos dos Problemas Brasileiros e Geografia e trabalha na Educação desde 1985. Está nesta unidade escolar há um ano, apenas, e não tem cargo efetivo, situação oposta de sua colega.

Sobre o que é texto, respondeu que é “linguagem” e leitura “é interpretação do texto”. O mais importante em seu trabalho com a leitura é que o aluno seja capaz de relacionar a História com nossa sociedade, que ele tenha uma visão crítica.

Durante as leituras desenvolvidas, percebeu que “a maior dificuldade é a pouca compreensão que os alunos têm das palavras do texto, sendo que alguns ainda apresentam dificuldade com a língua”, relatou.

Percebemos que a professora tem uma visão voltada para a comunicação. Acreditamos que ao usar o termo “linguagem” pensa na forma escrita que transmite uma mensagem a alguém. Sobre leitura, verificamos que está relacionada à interpretação, a qual seu aluno deveria comparar com a sociedade em que vive.

A avaliação é feita conforme a participação dos seus alunos nos debates em sala de aula e nas atividades de escrita e pesquisa, que solicita após o assunto abordado.

Sobre a forma como supera as dificuldades, ela disse que recorre ao “uso do dicionário e retorno ao texto”. Desta forma, percebemos que a

professora se prende muito ao sentido explícito, literal, das palavras. Talvez, porque alguns alunos ainda apresentam dificuldades de decodificação da língua.

Outro problema enfrentado refere-se ao pouco interesse dos alunos. “Eles não se expõem, preferem ficar despercebidos. Para incentivá-los, levo-os à biblioteca para pesquisa. Seleciono outros textos interligados com o assunto trabalhado. Às vezes, também peço ajuda do professor de Português ou de Leitura”.

Do nosso ponto de vista, esse modo de agir tira o foco do texto selecionado e volta-se para o conteúdo, ou informação, da matéria. Todavia, vamos analisar sua proposta para ampliar essa idéia.

2.4.1. A proposta de leitura B1

A proposta entregue pela professora revela, assim como as outras, um planejamento prévio, o qual estabelece como conduzirá a leitura, que solicitamos ao longo de suas aulas.

a) A professora inicia o trabalho com uma leitura individual do texto: A Revolução de 1930 (visão dos tenentes), e General Waldomiro Castilho de Lima, interventor federal no estado de São Paulo.

b) Depois uma nova leitura é solicitada, desta vez a carta escrita em agosto de 1929, por Luís Carlos Prestes. In: Mary Del Priore. Documentos de

História do Brasil de Cabral aos anos 90, São Paulo, Scipione, 1997.

c) Nesta fase, a professora faz uma série de comentários sobre a atuação da Coluna Prestes. Inclusive, utiliza um mapa para situar o território percorrido, destacando as dificuldades enfrentadas na maioria dos estados. Ressalta que, somente no Maranhão e no Piauí, a Coluna teve certa adesão popular, porque a população interiorana estava atrelada a uma estrutura coronelística. Situa que esses fatos ocorrem entre os anos de 1924 e 1926.

d) A professora distribui o trecho do texto Olga, de Fernando Morais, para uma leitura em grupo.

e) O próximo passo é assistir um recorte do filme Olga, de Jaime Monjardim, que destaca o trecho em que Olga é deportada para a Alemanha e embarca num navio da Alemanha nazista.

f) A professora faz um esclarecimento sobre o momento político do casal, que a esta altura fazia parte do Partido Comunista. Destaca o “ir e vir”, o momento político e a ameaça comunista.

g) A proposta termina com a solicitação de uma atividade: elaboração de uma charge com o tema “Ideologia do Partido Nazista”.

h) A professora sugere duas propostas de leituras: Uma epopéia brasileira: A coluna Prestes, de Anita Leocádia Prestes. Moderna, e Rebeliões tenentistas, de Eline Maira Ianni Segatto e José Antônio Segatto, Ática.

2.4.2. Análise da proposta B1

Verificamos que a proposta da professora foge completamente do texto solicitado por nós. Primeiro, há uma preocupação com o conteúdo da disciplina. Sabemos que este está relacionado ao texto oferecido; por isso, nosso trabalho volta-se para as práticas de leitura em sala de aula.

Essa preocupação com a transmissão de informação fica óbvia nos itens a e b, em que ela trabalha com a leitura de outros textos para resgatar a trajetória de Prestes.

Segundo, no item c, a professora continua com as informações e utiliza um mapa do Brasil para mostrar a extensão territorial percorrida por Prestes e seu desempenho político.

Somente no item d, ela distribui o texto para uma leitura em grupo. Dessa forma, fica evidente que o texto é somente um pretexto das abordagens em sala de aula. Não verificamos nada que ao longo desse processo os textos,

quaisquer textos, tivessem um encaminhamento para despertar uma leitura pessoal, criativa ou dialética, como diz Scholes (op.cit).

É uma leitura que se encerra na informação e na decodificação da língua, como se esta fosse capaz de criar uma significação ou interpretação. A professora procede desse modo porque, conforme relatou-nos, sua maior dificuldade “é a pouca compreensão que os alunos têm das palavras do texto”.

Do nosso ponto de vista, ocorre nessa proposta o que Freire (op.cit.) chama de “magicização da palavra”, não há “a inquieta procura de professores e alunos” para a construção de uma interpretação. A quantidade de textos selecionados e indicados não revela “adentramento” em nenhum deles.

Essa proposta contraria todas as correntes teóricas, aceitas e discutidas neste trabalho sobre leitura. Sobretudo, o que Paulo Freire acredita sobre um “ato de ler crítico e político, carregado de significação da experiência existencial de cada educando e não do educador; um movimento do mundo à palavra e vice-versa”.

Os itens seguintes (e, f, h) confirmam essa análise. A professora exibe parte do filme Olga, comenta sobre o momento político e a conjuntura política. Talvez, até nesse momento, esse filme pudesse resgatar ou despertar o interesse sobre o texto. Entretanto, o texto não é abordado direta ou indiretamente.

A professora explica o que foi o Nazismo, mas não observa esse tópico presente no texto quando Prestes revela: (19) “Pelo menos os nazistas daqui terão de arranjar um tradutor para censurar minhas cartas, (20) desafiou”.

As informações sobre o Nazismo são importantes e caracterizam a ideologia da política alemã da época. Não há garantias de que essas informações despertarão sensibilidade e crítica sobre o sofrimento de Olga, que ficou esquecida nas linhas do texto.

A atividade solicitada dá margem para que o aluno assimile o Nazismo como quiser, porém sem embate crítico algum. Uma charge sobre a ideologia

nazista pode ser simplesmente uma banalização dos momentos mais contundentes de nossa história humana.

Temos consciência de que a professora jamais pensaria ou provocaria banalização de propósito. Entretanto, sua prática inconsciente de leitura, em sala de aula, conduz a uma leitura superficial do texto. Ela tem conhecimento crítico e político sobre o assunto, mas a proposta não revela uma leitura crítica para seus alunos.

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