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Perfil e funções do árbitro

No documento A arbitragem no desporto escolar (páginas 45-49)

Nos jogos desportivos coletivos, como é o caso do futebol/futsal, existem múltiplos papéis desempenhados, quer por jogadores, quer por treinadores e, mais importante, em razão do nosso estudo e perspetiva, pelos árbitros. A sua função é tão importante para o desporto que, num quadro de atividade formal, sem ele não é possível a realização do jogo (Gama, Corte, Monge, Araújo, Ramos, Horta, Marivoet, Serpa, Weinberg, & Richardson, 2011).

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As funções de um árbitro, seja de que modalidade for, estão, de uma forma genérica, consagradas na regulamentação de cada uma destas, não sendo, portanto, difícil enumerá-las. No entanto, a definição do perfil do árbitro não é propriamente uma matéria em que abundem estudos e, relativamente a árbitros da modalidade futsal, ainda o é menos. Não obstante, é possível encontrar várias fontes que referem características importantes que um árbitro, no geral, das várias modalidades desportivas coletivas, deve possuir. Ainda assim, as considerações baseiam-se em estudos empíricos, sendo estes, muitas vezes, baseados em artigos de opinião de peritos de arbitragem ou entendidos nas mais diversas áreas do desporto, sem qualquer estudo científico que sirva de base às conclusões.

Neste contexto, apesar dos contornos e limitações que o exposto anteriormente constitui, consideramos fazer sentido a análise às referências ao perfil e funções do árbitro. Assim, Barata-Moura (1991) considera que “o juiz é um mediador e, como tal, é um elemento integrante do jogo – submetido a regras e dependente de uma avaliação decisiva, autorizada, criteriosa. (…) Arbitrar desportivamente não é assistir de modo passivo, nem sancionar de maneira mecânica, é interpretar – de modo humanamente falível mas igualmente de modo humanamente fundamentado, a verdade de um jogo que, embora sujeito a regras universais pré-estabelecidas, a cada passo evidencia a criatividade historicamente irrepetível das circunstâncias, dos agentes, dos desempenhos. É por isso que arbitrar é difícil.” (p. 16).

Montiel (1998, p. 19) considera que arbitrar “consiste na apreciação e ajuizamento de situações, num período muito curto de tempo, protegendo a verdade do jogo”. Enquanto elemento integrante do jogo, o árbitro, seja ele de que modalidade desportiva for, tem o papel de mediar o que ocorre no terreno de jogo, com base nas determinações superiores da respetiva estrutura da arbitragem. No caso do nosso estudo, essa estrutura é a do futebol/futsal, sendo que, no ponto 2, alínea a), do artigo 20º do Regulamento de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol, pode ler-se que são deveres específicos dos árbitros: “Cumprir e fazer cumprir as leis do jogo e os regulamentos aplicáveis”. O artigo 19º, do mesmo regulamento refere ainda que “dentro do terreno de jogo, os árbitros são a autoridade máxima durante a realização do jogo, devendo, tanto os jogadores como os demais agentes desportivos, acatar as suas decisões sem discussão ou protesto” e que “os poderes dos árbitros começam no momento da sua entrada nas instalações desportivas e mantêm-se até à sua saída”.

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Assim, todas estas determinações têm incidência no período em que o árbitro se encontra nas instalações desportivas e enquanto elemento responsável pela direção do jogo. No entanto, a alínea h, do artigo 19º, correspondente aos deveres do agente da arbitragem é mais abrangente, considerando a atividade do árbitro fora deste domínio espaço temporal, ao referir que deve "abster-se da prática de atos na sua vida pública ou que nela se possam repercutir que se revelem incompatíveis com a dignidade, incluindo apostas desportivas, e probidade no exercício das suas funções”, chamando a atenção para a necessidade da assunção do papel de árbitro muito para além do momento da direção do jogo.

A este propósito, Sarmento, Marques e Pereira (2015), num estudo realizado com árbitros de futebol, deram conta da significativa importância atribuída ao saber estar dentro e fora do futebol, opinião igualmente defendida por Lima (2011), que atribui grande importância à formação humana do árbitro, a qual se reflete na prestação competitiva. Pelo exposto, depreende-se que ser árbitro ultrapassa o período temporal da direção do jogo e obriga à posse de um conjunto de características morais, sobre as quais se adquirem e desenvolvem as competências técnicas e disciplinares, que possibilitam a direção de jogos respeitando a verdade desportiva.

Para Gama et al. (2011), o bom desempenho é dependente da obtenção do suporte teórico, complementado pela experiência prática obtida ao longo do tempo, tendo em conta o objetivo da atualização permanente. O processo de treino do árbitro é visto como a própria competição e a formação encarada como um processo predominantemente vertical, com avanço progressivo à medida que se sobe na carreira desportiva.

No estudo atrás destacado, com árbitros de futebol, realizado por Sarmento, Marques e Pereira (2015) constatou-se que os valores éticos e deontológicos surgem como uma importante representação do significado de arbitragem. Os autores dão conta da importância atribuída aos valores como a idoneidade, isenção, responsabilidade, respeito e dignidade, mas igualmente a aspetos de ordem física, psicológica e de conhecimento das leis de jogo.

No que diz respeito às questões técnicas e psicológicas, as quais, para vários autores estão em permanente conjugação, Antunes e Reis (2007, citados por Brochado, 2012) referem que ao árbitro cabe “a responsabilidade de ter de tomar decisões imediatas, sem advogados de defesa, sob ambientes hostis e onde, muitas vezes, o nível competitivo do jogo se apresenta duro,

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conflituoso e até violento" (p. 46). São ainda identificados alguns fatores como determinantes para o ambiente que envolve o árbitro das diversas modalidades, tais como: grau de participação no jogo (o árbitro de uma modalidade como o futebol intervém mais do que o de ténis ou salto em altura); natureza do jogo (quando o contacto entre jogadores é permitido, existe maior pressão); margem de subjetividade permitida pelas leis do jogo (interpretação e aplicação das leis através de processos mais ou menos subjetivos); proximidade do público (mais pressão quanto maior a proximidade); quantidade de público; grau de identificação do público com as regras; importância do jogo; falta de espírito desportivo (dos intervenientes no geral) e clima de emotividade (acrescentado aos jogos pela comunicação social, ou pelos responsáveis das equipas, antes, durante e após os jogos).

No mesmo sentido, Reis (2005) refere-se a cinco motivos para os árbitros serem tão criticados: desconhecimento gritante das leis e regulamentos; inexistência de penas disciplinares exemplares para quem toma atitudes incorretas para com as equipas de arbitragem; fanatismo pelos clubes, o que leva à responsabilização dos árbitros pelos fracassos dos mesmos; falta de desportivismo (não aceitação da supremacia das outras equipas) e tendência para a análise cómoda dos erros do árbitro (pelo esquecimento da necessidade de decidir em instantes e nem sempre nas melhores condições).

Lima (1998, citado por Gama et al., 2011) considera que um árbitro tem de apresentar as seguintes características: (1) Boa condição física (boa postura corporal para observar e acompanhar as jogadas); (2) Boa condição psicofisiológica (velocidade de reação, perceção seletiva e memória visual); (3) Boa condição emocional (autocontrolo e confiança); (4) Boa condição técnica (recurso permanente aos conhecimentos técnicos e domínio dos códigos gestuais).

Sobre esta questão, Reis (2005, p. 57) afirma que “as quatro qualidades fundamentais de um árbitro são: honestidade e imparcialidade, com um sentido de justiça apurado; conhecimento aprofundado das leis do jogo e domínio perfeito das mesmas; adequada preparação física e personalidade forte e equilibrada. Nestas quatro qualidades podemos enquadrar os aspetos técnicos e as características de personalidade já defendidas por outros autores para os árbitros no geral”.

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Para além da vertente física e das qualidades de personalidade, há referências bibliográficas relacionadas com questões psicológicas mais focadas no domínio emocional. Pereira, Santos e Cillo (2007, citados por Brochado, 2012) referem que para desenvolver a atividade de arbitragem de futebol/futsal é necessária uma boa preparação, tanto física, como psicológica, na medida em que os árbitros têm de ter capacidade de tomar decisões importantes em pouco tempo e sob pressão. Para estes autores existem vários problemas de desempenho e/ou psicológicos que resultam das pressões e stress sofrido pelos árbitros dentro e fora de campo, pelo que a preparação dos árbitros deve ter tal facto em consideração, induzindo-os a desenvolverem comportamentos adequados, mesmo sob pressão, assim como à aquisição de autocontrolo e outras características de estabilidade emocional.

Pelo exposto e como conclusão, retemos a opinião de Brochado (2012), para quem, às estruturas formais de arbitragem compete a determinação das linhas orientadoras de ação, no sentido de uniformizar procedimentos, a determinação do perfil técnico e características do árbitro e a determinação do processo de formação, enquanto o próprio árbitro deve ter, em permanência, uma atitude de atualização de conhecimentos sobre as estratégias de jogo, de forma a agir proativamente face à movimentação e ação dos jogadores.

No documento A arbitragem no desporto escolar (páginas 45-49)