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4. Desenvolvimento

4.1. Perturbações do comportamento alimentar

As perturbações do comportamento alimentar (PCA) caracterizam-se pela presença de um distúrbio na alimentação ou no comportamento relacionado com a mesma, resultando no consumo ou absorção alterada dos alimentos e no compromisso significativo quer da saúde física quer do funcionamento psicossocial do individuo.1

No manual de diagnóstico e estática das perturbações mentais (DSM-5)1 são descritos critérios de diagnóstico para seis perturbações do comportamento alimentar: a anorexia nervosa, a bulimia nervosa, a perturbação de ingestão alimentar compulsiva (binge eating disorder), a pica, a perturbação alimentar restritiva/evitante e a perturbação de ruminação, contudo, ao longo desta dissertação, serão apenas enfatizadas as três primeiras.

4.1.1. Anorexia Nervosa

A anorexia nervosa (AN) corresponde a uma PCA caracterizada pelo DSM-51 através dos seguintes critérios:

A. Restrição da ingestão calórica em relação às necessidades, levando a um peso corporal significativamente baixo para a idade, género, trajetória do desenvolvimento e saúde física. Um peso corporal significativamente baixo define-se como um peso inferior ao mínimo normal, ou no caso de crianças e adolescentes, inferior ao minimamente esperado.

B. Medo intenso de ganhar peso ou engordar, ou comportamentos persistentes que interferem no ganho de peso, mesmo estando este significativamente baixo.

C. Perturbação no modo como o próprio peso ou a forma corporal são vivenciados, influência indevida dos mesmos na autoavaliação ou ausência persistente de reconhecimento da gravidade do baixo peso corporal atual.

Com base na forma de apresentação da doença é possível distinguir dois subtipos de anorexia nervosa: o subtipo restritivo (AN-R) e o subtipo purgativo (AN-P). No subtipo restritivo, durante os últimos três meses, o individuo não se envolveu em episódios recorrentes de compulsão alimentar ou comportamento purgativo (vómitos autoinduzidos ou uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas) sendo a perda de peso conseguida essencialmente por meio de dieta, jejum e/ou exercício

6 excessivo. Em contrapartida, no subtipo purgativo o indivíduo esteve envolvido em episódios recorrentes de compulsão alimentar purgativa nos últimos três meses.1

O nível de gravidade pode ser inferido através do índice de massa corporal (IMC), sendo a doença classificada como leve para IMC > 17 kg/m2, moderada para IMC 16-16.99 kg/m2, grave para IMC 15-15.99 kg/m2 e extrema para IMC <15 kg/m2. Nas crianças e adolescentes devem ser usados os percentis do IMC correspondentes.1

A semi-inanição característica da anorexia nervosa, bem como os comportamentos purgativos que por vezes se verificam, afetam a maioria dos sistemas orgânicos, podendo impulsionar condições médicas severas ou até mesmo potencialmente fatais. Apesar de grande parte das alterações fisiológicas serem reversíveis com a reposição nutricional, outras como por exemplo a perda da densidade mineral óssea podem não ser completamente reversíveis.1

Ao nível da saúde mental, é comum a presença de comorbilidades como a depressão, a perturbação bipolar, perturbações de ansiedade e perturbação obsessivo-compulsiva, observando-se um risco de suicídio significativo, motivo pelo qual deve observando-ser feita uma avaliação abrangente destes indivíduos de forma a averiguar a presença de ideação suicida e da existência de tentativas prévias.1

4.1.2. Bulimia Nervosa

A bulimia nervosa é definida pelo DSM-51 através dos seguintes critérios:

A. Episódios recorrentes de compulsão alimentar. Um episódio de compulsão alimentar é caracterizado pelos seguintes aspetos:

a. Ingestão, num determinado período de tempo, de uma quantidade de alimentos definitivamente maior do que aquela que a maioria dos indivíduos consumiria no mesmo período sob circunstâncias semelhantes.

b. Sensação de falta de controlo sobre a ingestão durante o episódio.

B. Comportamentos compensatórios inapropriados recorrentes com o intuito de impedir o ganho de peso, como vómitos autoinduzidos, uso indevido de laxantes, diuréticos ou outros fármacos, jejum ou realização de exercício físico em excesso.

C. A compulsão alimentar e os comportamentos compensatórios inapropriados ocorrem, em média, no mínimo uma vez por semana durante três meses.

D. A autoavaliação é indevidamente influenciada pelo peso e forma corporal.

E. A perturbação não ocorre exclusivamente durante episódios de anorexia nervosa.

7 Quando os indivíduos deixam de cumprir algum dos critérios previamente descritos considera-se que estão em remissão parcial da doença, considera-sendo necessário que não considera-seja preenchido nenhum critério por um período de tempo considerável para ser considerada remissão completa. Ao contrário do que se observa na anorexia nervosa, neste caso os indivíduos tendem a apresentar peso dentro dos valores padronizados como normais, podendo por vezes desenvolver excesso de peso.1

O grau de gravidade baseia-se na frequência dos comportamentos compensatórios inapropriados, sendo a doença classificada como leve quando existe uma média de 1 a 3 comportamentos por semana, moderada quando se observa uma média de 4 a 7, grave para uma média de 8 a 13 e extrema quando se observam 14 ou mais comportamentos inapropriados por semana.1

Relativamente às complicações médicas da doença, estas estão diretamente relacionadas com o tipo e frequência dos comportamentos compensatórios, sendo particularmente notórias nos casos de vómito autoinduzido e abuso de laxantes. A complicação mais preocupante é o desenvolvimento de desequilíbrios eletrolíticos, que podem conduzir, em situações extremas a disritmias ou até mesmo à morte.1

4.1.3. Perturbação de ingestão alimentar compulsiva / Binge eating disorder

De acordo com o DSM-51, a perturbação de ingestão alimentar compulsiva / binge eating disorder (BED) caracteriza-se pelos seguintes critérios de diagnóstico:

A. Episódios recorrentes de compulsão alimentar. Um episódio de compulsão alimentar é caracterizado pelos seguintes aspetos:

a. Ingestão, num determinado período de tempo, de uma quantidade de alimentos definitivamente maior do que aquela que a maioria dos indivíduos consumiria no mesmo período sob circunstâncias semelhantes.

b. Sensação de falta de controlo sobre a ingestão durante o episódio.

B. Os episódios de compulsão alimentar estão associados a três ou mais dos seguintes aspetos:

a. Comer mais rapidamente que o normal.

b. Comer até se sentir desconfortavelmente cheio.

c. Comer grandes quantidades de alimentos na ausência de sensação física de fome.

d. Comer sozinho por vergonha do quanto se está a comer.

e. Sentir-se desgostoso de si mesmo, deprimido ou muito culpado em seguida.

8 C. Sofrimento marcante em virtude da compulsão alimentar.

D. Os episódios de compulsão alimentar ocorrem, em média, uma vez por semana durante três meses.

E. A compulsão alimentar não está associada ao uso recorrente de comportamentos compensatórios inapropriados como na bulimia nervosa e não ocorre exclusivamente durante o curso de anorexia nervosa ou bulimia nevosa.

O individuo é considerado em remissão parcial da doença quando os episódios de compulsão alimentar ocorrem com uma frequência inferior a uma vez por semana durante um período de tempo sustentado. Para a remissão completa, é necessário, mais uma vez, que não seja preenchido nenhum dos critérios previamente descritos.1

Relativamente ao grau de gravidade da doença este é inferido tendo em conta a frequência dos episódios de compulsão alimentar. Assim, a doença é classificada como leve quando estes ocorrem 1 a 3 vezes por semana, como moderada quando se observam 4 a 7 vezes por semana, como grave quando ocorre uma média de 8 a 13 episódios por semana e como extrema quando se verificam 14 ou mais episódios de compulsão alimentar por semana.1

A perturbação de ingestão alimentar compulsiva pode ocorrer em indivíduos com peso normal, em indivíduos com excesso de peso e ainda na presença de obesidade, sendo estes dois últimos casos aqueles que mais frequentemente procuram tratamento médico. Apesar disso, esta perturbação difere da obesidade na medida em que a maioria dos indivíduos obesos não se envolve em episódios de compulsão alimentar. Para além disso, de acordo com a literatura, os indivíduos com BED consomem mais calorias, tem maior prejuízo funcional, menor qualidade de vida, maior sofrimento subjetivo e maior frequência de comorbilidades psiquiátricas.1

Este transtorno, associa-se a um conjunto de consequências funcionais como por exemplo dificuldades no desempenho de papeis sociais, insatisfação com a vida, elevada morbilidade, mortalidade e utilização dos cuidados de saúde.1

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