• Nenhum resultado encontrado

Pesquisa Crítica de Colaboração (PCCol)

CAPÍTULO 2 – ORGANIZAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA DA PESQUISA

2.1 Escolha da metodologia

2.1.2. Pesquisa Crítica de Colaboração (PCCol)

A Pesquisa Crítica de Colaboração (PCCol), tal como vem sendo desenvolvida por

Magalhães desde 1990 e aprofundada em colaboração com colegas e alunos pesquisadores do Grupo de Pesquisa LACE, é uma metodologia situada no Paradigma Crítico de pesquisa e tem como característica principal criar ZPDs organizadas por diálogos dialógicos e dialéticos entre professores e/ou coordenadores e pesquisadores, possibilitando que os participantes da pesquisa criem contextos cujas práticas da escola sejam problematizadas, compreendidas e transformadas durante trocas discursivas. Como define Magalhães (2010: 28),

a PCCol tem como meta organizar pesquisas apoiadas em uma práxis crítica como atividade transformadora e criativa, em que as relações entre teoria e prática são entendidas dialeticamente, em sua autonomia e dependência mútua, isto é, como práxis.

Segundo Sánchez Vázquez (2007: 220), baseado em Marx e Engels (1845-46), a práxis é uma atividade tipicamente humana que “apenas se verifica quando os atos dirigidos a um objeto para transformá-lo se iniciam com um resultado ideal, ou fim, e terminam com um resultado ou produto efetivo, real”. Em outras palavras, toda atividade social surge a partir de um desejo dos sujeitos de alcançar seu objeto, satisfazendo assim, mesmo que parcialmente, suas necessidades iniciais quanto a questões específicas do seu contexto.

Na mesma direção, a PCCol é uma metodologia de pesquisa de intervenção que busca a transformação das práticas vigentes através da participação e da contribuição de cada um dos participantes. Segundo Magalhães (2010), a pesquisa de intervenção é uma atividade organizada de forma que todos os participantes, ou seja, pesquisadores e professores, coordenadores, supervisores e/ou diretores, possam criar ZPDs mútuas (Vygotsky) através de ações intencionalmente planejadas – e dialética e dialogicamente organizadas – para repensar suas ações com base não apenas em seus próprios discursos e ações, mas também nas ações e nos discursos do outro. Em resumo, os participantes da

pesquisa compartilham a análise e a compreensão de seus sentidos e significados quanto a conceitos e práticas, desenvolvendo uma reflexão crítica sobre suas ações, através da argumentação sobre sentidos atribuídos a significados e da negociação na construção de significados compartilhados na/pela reorganização de práticas.

Partindo do pressuposto de que as práticas devem ser problematizadas para serem transformadas, esta metodologia apoia-se na colaboração e na contradição, que aparentemente seriam antagônicas, mas não o são, uma vez que são centrais para a negociação no compartilhamento de significados. Com base em Marx, Vygotsky já apontava que a transformação do objeto ocorre por meio da contradição, que gera conflitos e possibilita compartilhamento de novas compreensões. Se, por um lado, um processo que tenha apenas discordância de ideias, conflitos e questionamentos, sem o respeito ao conhecimento, dúvidas e necessidades do outro pode não levar à transformação, por outro, para que haja de fato uma mudança crítica nas ações dos participantes, é necessário que haja uma relação de contradição colaborativa, pois esta sozinha não traz transformação. Para Magalhães (2010: 29),

colaboração envolve uma intencionalidade em agir e falar para ouvir o outro e ser ouvido, revelar interesse e respeito às colocações feitas por todos, pedir e/ou responder a um participante para clarificar ou retomar algo do que foi dito, pedir esclarecimento, aprofundar a discussão, relacionar práticas a questões teóricas, relacionar necessidades, ações- discursos, objetivos. Mas também, envolve ações intencionais em pontuar contradições, nas colocações feitas quanto a sentidos e significados historicamente produzidos, nos e entre os sistemas de atividade.

Nessa metodologia, a linguagem tem um papel central e é considerada uma unidade básica constitutiva da consciência humana. Para mostrar tal importância, Liberali e Magalhães (2009: 47) discutem o papel da argumentação na formação de professores e sua relação com as escolhas metodológicas na organização e condução de pesquisas no contexto escolar. Para as autoras, o foco na argumentação dá suporte para transformação de realidades. Nesse caso, a argumentação não é compreendida no sentido de convencer o outro a mudar seu ponto de vista, mas sim como instrumento-e-resultado, que cria espaços para a colaboração entre parceiros por meio de uma maior participação dos educadores nas discussões sobre sua prática, no desenvolvimento de ideias e propostas concretas para a reconstrução de suas ações.

Magalhães (2010), ao discutir essa metodologia, aponta que nem sempre é fácil construir um ambiente colaborativo, pois os participantes em geral estão inseridos em contextos sócio-histórico-culturais muito diferentes, com diferentes compreensões sobre as questões trazidas durante a pesquisa. De acordo com John-Steiner (2000: 190), ao discutir o conceito de colaboração, “sobreviver na mente do outro exige confiança e convicção9”. Dessa forma, o trabalho colaborativo terá sucesso somente se houver um ambiente de confiança entre os participantes; caso contrário, o projeto pode ser interrompido até mesmo durante sua condução.

Em suma, a pesquisa crítica de colaboração busca desenvolver um trabalho criativo em que os participantes, juntos, traçam novos caminhos para o trabalho desenvolvido na escola. Nas palavras de Oliveira e Magalhães (no prelo),

atuar na perspectiva da colaboração crítica é propor o desenvolvimento de um trabalho criativo sobre os caminhos e projetos coproduzidos, que objetivam a construção de identidades, que são ao mesmo tempo singulares e plurais uma vez que se expressam na multiplicidade de sentidos e significados cristalizados colocados, explicitados e questionados em vozes diversas, divergentes e contraditórias, mas possibilitadoras de significados compartilhados em um contexto que se organiza pela confiança e consideração às colocações de outros, pelo foco na aprendizagem, em um discurso que se organiza pela argumentação.

Nessa perspectiva colaborativo-crítica, Oliveira (2009: 10) sintetiza a organização da linguagem como uma relação entre questionamento, compreensão e resolução de problemas que se constitui no momento da atividade, em diversos níveis de ações, representadas no quadro a seguir:

Quadro 1 – Os papéis e os significados das ações de colaboração

Papel dos

colaboradores Significantes das ações de colaboração

Questionamento

Os colaboradores pontuam a contradição com a finalidade de impulsionar as ações na atividade e a reconhecem como forma de enfrentamento nos cenários que se configuram na realidade das situações didáticas.

Compreensão

Os colaboradores estabelecem correlação de ideias e situações que emergem na atividade, marcando um “conhecer em ação”, que se dá a partir de significados compartilhados nas situações didáticas.

Resolução de problemas

Os colaboradores decidem coletivamente o

redimensionamento de ações e metas no desenvolvimento da atividade, possibilitando que essas construções coletivas configurem a uma nova significação das situações didáticas.

Fonte: Oliveira (2009: 58)

Essas considerações apoiaram a escolha da metodologia para esta pesquisa, cujo objetivo era o de propiciar um espaço de colaboração crítica para o professor-participante e a pesquisadora, em que ambos discutissem, em sessões denominadas reflexivas, as necessidades dos participantes no contexto em foco. É importante apontar que nesta investigação o objetivo principal do diálogo entre os participantes é identificar seus sentidos e significados cristalizados, de forma a poderem compreender as questões sócio-histórico-culturais que organizam o contexto em foco, para que possam produzir novos significados que possibilitem a transformação da realidade vivida.

A seguir, descrevo os procedimentos de produção de dados.